Um domingo falando de impostos. Após o texto do Deputado Brizola Neto analisando a aprovação preliminar do Imposto sobre Grandes Fortunas, o segundo texto da coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro.
O tema é algo polêmico, mas visão que corroboro: que a carga tributária brasileira, apesar de distorções aqui e ali, não pode ser considerada alta. Penso que temos de debater a qualidade do gasto público, não a carga em si.
Vamos ao texto:
IMPOSTOS SIM, ORA BOLAS!

Há poucos dias o Presidente Lula teve mais um rompante e disse uma frase bombástica, dessas que fazem toda a imprensa se levantar contra ele. Às vezes Lula diz asneiras impagáveis, como quando enfatizou ser filho de uma mãe que nasceu analfabeta. Por outras diz coisas ridicularizadas de pronto, mas que depois se revelam verdadeiras, sem que seus críticos tenham a humildade de reconhecer que estavam errados; como no caso em que apostou que a crise mundial seria um tsunami em boa parte do planeta e uma marolinha no Brasil, o que realmente ocorreu. E agora Lula volta a ser alvo de tomates e impropérios, tudo porque teve a ousadia de defender a carga tributária do país, algo que os políticos com um pingo de seriedade deveriam, do mesmo modo, senão defender, ao menos relativizar as sempre pesadas críticas.

Todo brasileiro alimenta a crença de que aqui se paga mais impostos do que em qualquer outro lugar do planeta, principalmente porque nossos políticos seriam todos uns ladrões e para dar conta de tanta roubalheira a fúria fiscal não pode ter fim. Até um jocoso “impostômetro” já foi inventado, para informar quanto se arrecada de tributos a cada segundo. Mas será que alguém consegue dizer de sopetão qual é a carga tributária do Brasil? 35%, 36%, 40%? Ela subiu ou caiu nos últimos anos? E como se mede essa maldição?

Acredite: por mais que seja deselegante lembrar, no Brasil não se paga tanto imposto assim. E a carga tributária é um dos indicadores mais inúteis que já foram inventados, porque é o tipo da informação sem qualquer utilidade prática, a não ser estimular o falatório dos demagogos de sempre.

Carga tributária é meramente a expressão percentual de quanto foi arrecadado pelo Estado em comparação ao PIB de um determinado período – ou, em outras palavras, é uma simples medida com duas variáveis, o quanto o país arrecadou e a sua taxa de crescimento. Se o país cresce muito rapidamente, mas esse crescimento é estimulado por alguma atividade pouco taxada (por exemplo, exportações de produtos agrícolas), a carga tributária vai cair. E, no sentido inverso, se o país não cresce ou mesmo diminui (entrando em recessão) ao mesmo tempo em que são criados mecanismos de combate à sonegação que aumentam o recolhimento de impostos, a carga tributária subirá muito. Isso tudo sem que rigorosamente ninguém tenha pago menos ou mais impostos.

Repetindo: carga tributária NADA tem a ver (vá lá, pouco tem a ver) com aumento ou diminuição de impostos no curto prazo. Tem muito a ver com eficiência na arrecadação e com o comportamento da economia. E NÃO é verdade que o Brasil tenha a maior carga tributária do planeta – aliás, não estamos nem entre as 10 maiores.

Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, França, Holanda, Inglaterra, Itália, Noruega, Suécia e vários outros países nos superam nesse índice. Por outro lado, Afeganistão, Angola, Congo, Haiti e Sudão estão entre as menores cargas tributárias do mundo. Os Estados Unidos, sempre uma referência em termos de liberdade econômica, não tem uma carga assim tão baixa, ela gira em torno dos 28%. E a média dos países da OECD[i]é de 36%, algo bem próximo da realidade brasileira.[ii]

O Brasil tem impostos do tamanho que a sua sociedade demanda. Afinal, de tudo o que o governo central arrecada, a METADE é imediatamente consumida em pagamento de aposentadorias, pensões e outros benefícios previdenciários. 25% paga os salários dos servidores públicos, aí incluídos militares, policiais federais, pessoal da Receita Federal, Ibama, enfim, um monte de serviços essenciais, que simplesmente não podem ser cancelados ou sequer terceirizados. Quase 20% é transferido automaticamente para estados e prefeituras. O restante é consumido pelos Ministérios da Saúde e da Educação, Legislativo, Judiciário e demais gastos. Sem contar, claro, a necessidade de investimentos.

Como dar conta de tudo isso sem cobrar impostos? Talvez, quem sabe, reduzindo os gastos com a Previdência Social. Ora, isso é tudo que os brasileiros nem querem ouvir falar, ao contrário até, defendem ardorosamente aumentos para os proventos dos aposentados. Então, contentemo-nos com o nosso impostinho básico de todo dia – não sem antes lembrar que apenas 3% da população brasileira paga impostos equivalentes iguais ou superiores a 15% da renda mensal. O problema é que essa minoria barulhenta conduz o debate, com o apoio irrefletido da maioria pouco afetada diretamente pela tributação.

[i]Organização fundada em 1960 e que hoje reúne 31 países, sendo a maioria de países considerados “ricos” ou “desenvolvidos”
[ii]Fonte: Heritage Foundation, 2009 Index of Economic Freedom”