Ô missão complicada… Escolher os dez mais de uma escola conhecida e reconhecida pela qualidade de seus sambas. De uma escola que tem o compositor que é conhecido e reconhecido como sendo o maior do gênero em todos os tempos. Foi só essa a minha incumbência neste espaço!

Mas verás que um filho teu não foge à luta (que já homenageio aqui porque o lindo hino de 1996 não estará listado abaixo). Aceitei o desafio e dividi a discografia imperiana em quatro períodos para fazer minhas escolhas de Sofia. A Era dos Primórdios, de onde escolhi uma obra. A Era de Ouro, quando Silas, Dona Ivone, Mano Décio e companhia reinaram. A Era das Transformações, quando novos elementos surgiram. E assim também surgiram as super escolas de samba SA. E a Era Moderna, autoexplicativa.

Pensei em distribuir os meus eleitos em ordem cronológica. Mas desisti. Achei que seria uma forma de não me comprometer com minhas escolhas. Se são os meus dez mais que sejam na ordem em que eu os considero.

O Império Serrano completará 70 carnavais. Numa conta simples, tive que deixar 60 obras de fora. Obviamente, não são sessenta obras primas. Mas muita coisa boa, excelente e divina ficou de fora. É a regra do jogo. Sem mais delongas…vamos nessa.

10 – Exaltação a Tiradentes (Estanislau Silva, Mano Décio e Penteado, 1949)

Conheço muita gente que se surpreende ao saber que esse samba passou na avenida. Acreditam que era só tema de uma aula do Telecurso Segundo Grau. Perdoados porque faz muito tempo. Mas Exaltação a Tiradentes é, não só um grande samba-enredo, como deu ao recém fundado GRES Império Serrano o bicampeonato da folia. Aula de história concisa, música e letra curtos, mas imortais. Representa a Era dos Primórdios, dos primeiros anos e primeiros títulos imperiais.

9 – O Rio corre para o mar (Arlindo Cruz, Carlos Sena, Elmo Caetano e Maurição, 2001)

É um samba da Era Moderna e sei que muita gente boa não o colocaria numa lista de dez mais da escola. Mas essa lista é pessoal e sentimental. Esse samba marcou uma volta por cima depois de dois rebaixamentos. Era o Império se apresentando de forma digna, altaneira, com um samba valente, melódico, bonito, de refrão contagiante. O Império que fala tanto e tão bem de si mesmo. Um Império de bem com a vida. O desfile poderia ter sido menos acidentado. Mas o samba foi premiado com o Estandarte de Ouro daquele ano.

8 – Fala, Serrinha. A voz do morro sou eu mesmo, sim senhor (Beto sem Braço, Jangada e Maurição, 1992)

Última obra de Beto sem Braço na escola, este samba, ao contrário do samba-enredo de 2001, não mostra um Império de bem com a vida. É um pote até aqui de mágoa. É um grito preso na garganta, um desabafo. É cantado com a alma de cada imperiano que chorou a queda de 1991. Sou Império, sou patente é uma convocação à guerra. Sempre que ouço na quadra eu me emociono lembrando daquele desfile cheio de percalços, dificuldades, pobre, mas extremamente aguerrido depois de uma maratona exaustiva de sei lá quantas escolas. Fomos a última escola a entrar na avenida e as arquibancadas ainda nos aguardavam. Abra meu livro pois tu sabes ler.

7 – Os cinco bailes da história do Rio (Silas de Oliveira, Dona Ivone Lara e Bacalhau, 1965)

O primeiro samba-enredo composto por uma mulher a passar na avenida. Só por isso já mereceria estar na lista. Mas os Cinco Bailes, rebuscado e dolente como não se veria hoje em dia, é mais do que isso. É uma obra fundamental na discografia do carnaval carioca. Marca a Era de Ouro do poeta maior da Serrinha, o Viga Mestre, Silas de Oliveira. Carnaval, doce ilusão…

6 – O Império do Divino (Aluízio Machado, Arlindo Cruz, Carlos Sena, Elmo Caetano e Maurição, 2006)

O melhor desfile do século do Império Serrano representado por mais um samba laureado com o Estandarte de Ouro. Basta dizer que o verso “Imperiano de Fé não cansa” virou uma espécie de mantra, um hino, um lema daqueles que se carrega para a vida. Parceria entre dois bambas, Arlindo e Aluísio, rendendo frutos. Este ano eles estão novamente juntos.

5 – Nordeste, seu povo, seu canto, sua gente (Heitor, Maneco e Wilson Diabo, 1971)

Vindo da Era das Transformações marcou a estreia de Fernando Pinto como carnavalesco da escola. O tom de ladainha ao tocar a boiada emociona. Esta é outra obra que se cerca de magia quando ouvida na quadra. Pelo menos eu sinto assim.

4 – Eu Quero (Aluízio Machado, Jorge Nóbrega e Luis Carlos do Cavaco, 1986)

Outra obra premiada com o Estandarte de Ouro. O saudoso Doutor Sócrates, escalado para jurado de samba-enredo há trinta anos, chegou a declarar antes do Carnaval que, para este samba, era impossível não dar nota dez. Certamente a conotação política pesou – como pesou na minha escolha. O que não diminui em nada o mérito técnico de um samba que fez a Sapucaí e o Brasil cantarem “me dá, me dá, me dá o que é meu, foram vinte anos que alguém comeu”. Mais atual, impossível. Desfilaço com a assinatura de Renato Lage. Grande momento do Reizinho de Madureira.

3 – Aquarela Brasileira (Silas de Oliveira, 1964 e 2004)

Coisa rara hoje em dia esse negócio de assinar samba sozinho. Aquarela é a obra que imortalizou Silas de Oliveira no gênero. É, de acordo com a querida Rachel Valença, um hino do carnaval. Gravado e regravado ao longo do tempo. Maravilha de cenário, episódio relicário. Antes de publicar a lista pensei se deveria buscar o lado B do talento imperial ou me render aos clássicos. Acabei rendido pelos clássicos. Fazer uma lista de dez mais e não listar Aquarela Brasileira seria uma heresia da minha parte.

2 – Bumbum paticumbum prugurundum (Aluízio Machado e Beto Sem Braço, 1982)

A deliciosa onomatopeia conquistou o público bem antes da avenida. E conduziu o Império nela ao seu último título no Grupo Especial, o grupo das super escolas de samba SA. O primeiro título da vitoriosa carreira de Rosa Magalhães – em parceria com Lícia Lacerda. Sacadas geniais de letra e melodia, um refrão que caiu na boca do povo e, como é uma escolha pessoal e afetiva, a minha primeira memória de um samba-enredo. Só não ficou em primeiro porque, a seguir, vem o maior samba de todos os tempos.

1 – Herois da Liberdade (Mano Décio, Manoel Ferreira e Silas de Oliveira, 1969)

Se Aquarela é um hino do carnaval, Herois é um hino do Império Serrano e do próprio Brasil. E se a lista é para contar a história do Império, ser um hino da escola vale mais para mim. Considero o maior de todos os tempos pela rara felicidade de unir uma melodia cativante a uma letra absolutamente esplêndida. A partir de “ao longe, soldados e tambores…” até o “ô ô ô” final não há nada mais poético em matéria de samba-enredo. E desculpem minha empolgação ao falar dessa obra. É em legítima razão que o defendo. O samba que desafiou a ditadura é a minha escolha para encabeçar a lista dos dez mais do Glorioso.

18 Replies to “TOP 10: Império Serrano (por Carlos Gil)”

  1. Carlos, concordo com a sua colocação precisa quando diz que é dificil ter que eleger “apenas” 10 sambas desta escola que sempre nos brindou com sambas antologicos.

    Como voce já citou o samba de 1996, “Verás que o filho teu não foge a luta”, nem preciso reforçar que este tambem estaria se pudesse ser feito um TOP 15. E colocaria tambem o samba de Dionel, Arlindo Velloso e Vicente Mattos: “A lenda das sereias e os mistérios do mar”, do carnaval de 1976 e reditado em 2009.

    Da sua lista o meu favorito é “Aquarela Brasileira” e “O Imperio do Divino”. Sensacionais!!!

  2. E finalmente, os dez mais da escola com a melhor discografia de todas! O Império Serrano tem tantos sambas antológicos que não dá pra discordar de nenhum samba presente em sua lista Carlos! Apenas citar outros que ficaram de fora, mas que gosto muito, como, 1983, “Mãe, Baiana Mãe”, 1977, “Brasil, Berço dos Imigrantes”, e o citado por você, 1996, “Verás que um filho teu não foge a luta”.

    Apenas por questão de sentimentalismo, pois sei que não entrariam numa lista definitiva, cito a trinca 2010-2012 do grupo de acesso, começando com “João das Ruas do Rio”, passando por “A Benção Vinícius” e finalmente terminando no emocionante “Dona Ivone Lara – O Enredo do meu Samba”. Considero sambas que mostram que o Império, mesmo com todos os percalços e dificuldades, que nesses três anos foram vários, luta com aquilo que tem de melhor, um belo samba, aliado a muita paixão e garra. Por adorar o desfile e o enredo, também cito 2002, “Aclamação e Coroação do Imperador da Pedra do Reino: Ariano Suassuna”.

    1. Luis Fernando,

      Sacrilégio da minha parte esquecer o samba de 2002! Gosto também do de 2012, pela bela homenagem a Dona Ivone Lara.

      Não tem como, o Império é diferenciado em discografia. Começo aqui a campanha: Império é TOP 30!…rsrsrs

      #imperiotop30

  3. Embora sua lista tenha bastante escolha pessoal, não há como parabenizar!! Fazer um top-10 do Império Serrano é pouco. A serrinha tem samba para uns 20 top-10 sem perder qualidade.

    Eu, pessoalmente, tiraria 1971 e 1986 para colocar 1996 e 1976/2009. Mas ficou fantástica.

    E sim, Heróis da Liberdade é um hino do povo brasileiro!!! “Liberdade, senhor”!!!

  4. Não sou tão antigo, mas meu top-3 da Serrinha seria Aquarela, O Império do Divino e Heróis da Liberdade. No mais, o Império tem tantos sambas antológicos que é difícil escolher 10

  5. É pessoal, foi duro mesmo. A homenagem ao Betinho seria meu décimo segundo jogador (no caso aqui, décimo primeiro). Aquele primeiro a sair do banco e jogar. Deixaria aquecendo ao lado do banco, prontos pra entrar em campo, Mãe Baiana Mãe, Lendas das Sereias, Dona Santa, Rainha do Maracatu, Pernambuco, Leão do Norte e Acalamação e Coroação….Ariano Suassuna. Silas também compôs belos sambas, como Bahia 1966. Da fase atual, desses setes anos de Acesso, eu destaco o do ano passado, Poema aos peregrinos da fé. Também gosto de 2010, João do Rio. E tenho grande carinho por 2008, um dos desfiles mais emocionantes dos quais participei. Campeões no aguaceiro.

  6. Tarefa inglória escolher apenas 10 sambas de um dos maiores patrimônios culturais do nosso país. Fecho perfeitamente com “Heróis” como o melhor de todos os tempos, o samba que desafiou a ditadura apenas com a sutileza da poesia. Parabéns Carlos Gil! Império Serrano, uma escola de samba!

  7. Realmente, a lista do Império precisava ser no mínimo um Top 20. Parabéns, Gil, por encarar esse desafio.
    Sou do interior de São Paulo. Em 1992, nem sonhávamos em receber os sambas do Grupo de Acesso em discos. Confesso que me emocionei ao ver agora, pela primeira vez, esse samba.
    Não sou Império de coração, mas tenho uma enorme simpatia pela agremiação e sempre gostei demais dos sambas do Reizinho de Madureira. “Eu quero”, de 86, e “Verás que um filho teu não foge à luta”, 96, são ao mesmo tempo críticas sociais e hinos históricos do Carnaval. Maravilhosos, como todos que foram listados e outros tantos da escola que tiveram que ficar de fora.

  8. Poderia ter uma menção honrosa ao samba “Estela de Madureira” apesar de não ter vencido a disputa na quadra.

  9. Gosto muito do samba perdedor mas imortalizado por Roberto Ribeiro. Também gosto do vencedor, mas não acho top 10. A questão de inclui-lo (o derrotado na disputa) é que acredito que fugiria do conceito original, uma vez que não foi para a avenida. Sobre os piores…1981 e 2005 também são bem fracos.

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