Logo após o fim da “Era Carlinhos Madureira” em 1992, a Portela revelou outro grande compositor: Cláudio Russo, que venceu em 1993 e 1994. Depois dessas vitórias ele saiu da Portela e fez vários sambas famosos em diversas escolas, em sua maioria na Beija-Flor.

Mas a década de 90 foi marcada pelo momento de brilho de outro nome da Portela já consagrado muito anteriormente pelos seus ótimos sambas de quadra: Noca da Portela (76, 85, 95, 98, 99, 2005 e 2015). Não que Noca fosse novato na arte de ganhar sambas-enredo. Sua carreira na Portela já remonta ao Trio ABC da Portela (foto ao alto do post), montado junto com Picolino e Colombo no fim da década de 60.

http://www.youtube.com/watch?v=GNngK-eci9w

Sua primeira vitória de samba-enredo ainda ocorreu durante a renovação pós-1974, mais especificamente em 1976, derrotando em decisão bastante controversa o concorrente de David Correa e Norival Reis. Um bom samba que ficou escondido na famosa “safra demoníaca” – considerada por muitos a melhor de todos os tempos (para quem quiser tirar suas próprias conclusões, o samba que foi para a avenida está acima, enquanto o derrotado, em gravação do próprio David Correa, abaixo).

Apenas nove anos depois ele ganharia o seu segundo samba em 1985, no primeiro desfile após a criação da Tradição.

Depois mais 10 anos de jejum até o seu terceiro título em 1995. Aqui começa a sua “Era de Ouro”. O samba de 1995 marcou um desfile mágico e deu a Noca seu primeiro Estandarte de Ouro e o primeiro samba eternizado no “dia a dia” da Portela. Em 1996 outro ótimo samba de Noca que não foi à avenida, vítima de uma escolha desastrosa da escola na final de samba-enredo.

Em 1998, Noca ganhou seu segundo Estandarte de Ouro com outro samba que também é cantado até hoje na quadra. Fechando esta fase fantástica, Noca conseguiu o bi em 1999, emplacando assim seu quinto samba na escola.

http://www.youtube.com/watch?v=QsjJSszYjgI

Após essa grande fase, para igualar Candeia e Waldir 59, Noca ainda ganhou o concurso de samba-enredo para o desfile de 2005, um samba tão trágico quanto o desfile. Depois de outro longo jejum de dez anos, Noca assinou o samba vencedor do concurso para o desfile de 2015.

Assim Noca igualou o recorde de sete vitórias de David Correa e hoje os dois figuram empatados como os maiores vencedores da história portelense. Outro fato interessante a se considerar é o interstício de 39 anos entre sua primeira e a última vitória, um raro caso de longevidade no mundo dos concursos. O que torna ainda mais curiosa a estatística é que desde a década de 70 Noca não deixou de levar um samba seu para a avenida em nenhuma dessas cinco décadas. Um caso de longevidade e consistência só superado por Martinho da Vila.

Não posso falar de sambas-enredo de Noca sem citar seu fiel escudeiro, Colombo. Parceiro de longa data de Noca como já explicitado acima, Colombo também foi autor de 4 desses 5 primeiros sambas ganhos por Noca (76, 95, 98 e 99) entre eles os dois agraciados com o Estandarte de Ouro. O “se” em história não existe, mas possivelmente ele só não está na lista de hexacampeões da Portela pois, como morreu em 2004, não pode acompanhar Noca em seus dois últimos títulos.

Como a história dos compositores portelenses sempre nos surpreende, Noca não é o único a ter 39 anos de interstício entre vitórias. Pelo contrário, com a vitória de 2015 foi Noca quem igualou outro bamba persistente de Oswaldo Cruz: Ary do Cavaco (69, 71, 86, 92, 2006 e 2008).

Figura histórica da escola, sua primeira vitória remonta ainda ao ano de 1969. Mesmo que durante sua longa jornada na Portela ele não tenha nem marcado uma época nem feito sambas marcantes, a exceção do brilhante samba de 71 eternizado na voz de Paulinho da Viola, Ary do Cavaco foi um fiel representante da Portela, membro da Velha Guarda Show e conseguiu nada menos que seis vitórias em concursos.

Dessa forma ele escreveu seu espaço no “superpanteão” da Portela, ao lado dos gigantes Candeia, Waldir 59, David Correa e Noca da Portela como os únicos a ganharem mais de cinco sambas na agremiação.

A partir de 2000 a Portela entra em uma fase política bastante conturbada. A política conturbada gerou uma série de escolhas questionáveis das diretorias portelenses, o que  em conjunção com uma falta de renovação de talentos na Ala de Compositores fez com que a primeira década do século fosse praticamente uma década perdida em qualidade de sambas.

Neste período surgiram dois pentacampeões que se notabilizaram muito mais pela política e pela força econômica do que por seus dotes autorais: Naldo (2002, 2006, 2010, 2011 e 2012) e Junior Escafura (2006, 2008, 2009, 2010 e 2011). Junior, alias, deve ser um caso único de ter sido Diretor de Harmonia de seus próprios sambas.

Com esses resultados, Junior Escafura também igualou o recorde de quatro vitórias consecutivas de David Correa.

Por que o também acima? Ainda nessa época se notabilizou a dupla tetracampeã, Ciraninho e Diogo Nogueira (2007, 2008, 2009 e 2010).

O filho de João Nogueira é muito mais conhecido por seus trabalhos pessoais como cantor e compositor, mas ele “vingou” o pai, mesmo que sem nenhum samba digno de grandes lembranças posteriores. Junto com ele, apareceu seu parceiro Ciraninho, um jovem compositor e autor de alguns dos sucessos da carreira de Diogo. Com essas 4 vitórias entre 2007 e 2010 eles foram os primeiros a igualar o recorde de David Correa, mas o melhor samba dos dois para a escola perdeu a final para o desfile de 2011 (acima).

A situação começa a melhorar no final da década com o surgimento de três novos nomes, não necessariamente novos de idade.

O primeiro samba a marcar essa virada é o de 2009. Além de Diogo, Ciraninho e Escafura, a parceria ainda trazia os nomes de Luiz Carlos Máximo e Wanderley Monteiro, ganhando pela primeira vez. Essa talvez seja a única superparceria da história recente da Portela e é o melhor samba ganho pelos três primeiros – embora em uma escolha que muitos à época contestaram.

Já Wanderley Monteiro e Luiz Carlos Máximo eram relativamente novos nas disputas da Portela (desde 2004), mas ambos já são cinquentões e chegaram na Portela após longa carreira de compositores e, no caso de Wanderley, de cantor de sambas de meio de ano.

Logo depois, em 2011, começou a “Era Máximo”. É verdade que ela partiu de uma vitória bastante injusta em parceria com Wanderley Monteiro, Junior Escafura e Naldo.

Porém em 2012 Máximo, Wanderley e Naldo, com a adição de Toninho Nascimento, apresentaram um samba que rapidamente se tornou um fenômeno, revolucionando a forma de se fazer sambas enredo e modificando profundamente as concepções de samba na Portela: o famoso “Madureira sobe o Pelô” que arrebatou mais um Estandarte de Ouro para a Portela – quebrando um jejum de 14 anos.

Sem Naldo, repeteco da parceria e do título em 2013. Já em 2014, Wanderley abandonou a parceria, porém Máximo e Toninho mantiveram a nova linha e conquistaram mais uma vez a disputa. Com essa sequência entre 2011 e 2014, Máximo também entrou na turma que igualou o recorde de quatro vitórias consecutivas.

Ao fim desta era, a Portela recebera mais três grandes nomes na história de suas disputas: o pentacampeão Luiz Carlos Máximo (2009, 2011, 2012, 2013 e 2014), o tetracampeão Wanderley Monteiro (09, 11, 12 e 13) e o tricampeão Toninho Nascimento (12, 13, 14).

Alias, Toninho Nascimento é outro caso curioso daqueles típicos da Portela. Mesmo desconhecido do grande público, Toninho já tinha grande fama entre cantores e gravadoras. É dele alguns sucessos, especialmente “Conto de Areia”, gravado por Clara Nunes ainda em 1974. Porém seu reconhecimento em sambas enredo na Portela só ocorreu depois de 30 anos de profícua carreira como compositor de meio de ano

Máximo e Toninho perderam em 2015, mas suas inovações permaneceram. O samba vencedor era um seguidor da nova linha e tinha três refrões, em estrutura parecida com os três sambas que o antecederam.

Assim chegamos nesta atual disputa para 2016, no qual a maioria dos sambas favoritos abraçou a estrutura de três refrões, sendo pelo menos dois deles mais curtos. Dos compositores citados nesta série, Máximo, Toninho Nascimento, Noca, Waldir 59, Casquinha, Carlinhos Madureira (já eliminado), Espanhol, Sílvio Paulo e Wanderley Monteiro participam da disputa.

Outros favoritos, embora não vencedores, são o egresso da Beija Flor (mas portelense) Samir Trindade, o compositor Neyzinho, este já finalista em 2012 e 2013, e Jorge do Batuke, finalista em 2015. David Correa está disputando no Salgueiro e Cláudio Russo, até este momento, ganhou o samba na Paraíso do Tuiuti e na Renascer (este sob encomenda), além de estar na final da Cubango.

Não posso terminar esta série sem fazer calorosos agradecimentos ao grupo PortelaWeb. Sem as pesquisas históricas disponíveis no site do PortelaWeb seria impossível escrever estas linhas.

Obs1: como já diria Donga, “Samba é que nem passarinho, é de quem pegar”. Nós do Ouro de Tolo não somos hipócritas e sabemos que existem verdadeiros compositores que não assinam sambas e outros assinantes que não fizeram sequer uma linha ou nota. Porém, há poucas histórias desse tipo que são confirmadas. Muitas delas até temos certezas – porém não provas, enquanto outras jamais deixarão o mero terreno da desconfiança. Sendo assim, não nos resta outra possibilidade a não ser seguir a história das assinaturas oficiais.

Obs2: após as ameaças recebidas pelo Migão, como protesto pelos rumos que as disputas estão tomando, decidi não “bater palmas para palhaços” e não comentarei aqui nenhum samba concorrente de nenhuma escola. Isso inclui a Portela, mesmo sabendo que lá não terei problemas.

Não me furtarei a dar opiniões sobre a nossa escola, mas elas serão restritas aos grupos internos e as boas conversas de quadra.

10 Replies to “Uma Breve História do Samba Enredo da Portela: Parte III”

  1. Migão, obrigado pela aula. A relação do Cláudio Russo com a Portela eu também desconhecia. A Portela, depois de alguns anos de sambas pouco marcantes, descartáveis mesmo, trouxe formatos diferentes e apostou na qualidade do samba. Não foi em vão. A escola evoluiu de maneira mais feliz, mais harmônica, fez o portelense cantar com orgulho. Sou muito fã dos sambas dos anos 80 (no caso da Águia, 1980 e 1984 me são muito caros). Mas esse “saudosismo” não nos pode cegar. Não deve nos tornar ingratos e injustos com as safras atuais. Há, sim, muita coisa boa sendo feita. Apesar de tudo. E a Portela, em 2016, tem nas mãos a possibilidade de levar para a avenida outro grande samba. A final promete. Sei que você não vai se manifestar. Eu, que sou imperiano, posso. Iria de Samir e Wanderley. Com menção honrosíssima para LC Máximo e Toninho Nascimento.

    1. Gil, embora eu tenha dado alguns pitacos, os três artigos são mérito do Rafael Rafic, colunista, que fez a pesquisa e o texto. Eu pessoalmente gosto muito do samba de 94, do Russo.

  2. Muito bom os artigos,porém senti falta do nome de Celso Lopes, Campeão de 2015 e em 9 disputas foi finalista em 8.abraços!

  3. Rafael, porque você diz que o samba da Portela de 1995 foi trágico? Era um samba com a cara da Portela e me parece que ganho até o Estandarte de Ouro. Particularmente eu achei de uma bela melodia.

    1. Paulo,

      Leia o texto com calma. O samba trágico é o de 2005, não o de 1995. Eu seria louco se dissesse que o samba de 1995, Estandarte de Ouro, era trágico.

      Abraços.

  4. Ok, Rafael. Me desculpe. A paixão pelo samba é tanta que as vezes lemos rápido. O de 1995 foi 10. Lembro agora o de 2005. Foi trágico mesmo.Abs

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