(por Rodrigo Gonçalves)

Para quem assim como eu nasceu na segunda metade da década de 80 e passou a acompanhar esportes no começo da década seguinte, os anos 90 não foram nada satisfatórios no que diz respeito ao basquete.

O país que sempre foi uma grande força em termos mundiais na modalidade – conquistou o mundo em 59 e 63 – teve bons resultados com a geração de Oscar Schmidit, muito embora não tenha conquistado outro título mundial ou medalha olímpica. A melhor colocação dessa geração foi um terceiro lugar no mundial da Indonésia em 1978 e uma vitória histórica contra os EUA no pan de Indianápolis em 1987 – mas parou completamente no tempo e não preparou de maneira adequada a transição de gerações.

Mas o pior ainda estava por vir: uma sequência de gestões desastrosas na CBB, falta de investimento na formação de novos valores e sucateamento do campeonato nacional, afastamento do estilo de jogo que o Brasil costumava praticar, baseado no jogo coletivo e no forte jogo de transição, para um jogo de egoísmo, centrado em apenas um bom chutador, trouxeram danos que por muito tempo pareciam irreparáveis ao tradicional esporte da bola laranja.

https://www.youtube.com/watch?v=wmvH0toLEQA

Como se besteira pouca não fosse bobagem, em meados dos anos 80, a vizinha Argentina começou uma profunda reformulação em seu basquete que atingiu a confederação local, o campeonato, a formação de atletas e técnicos, o estilo de jogo e que acabou dando fruto quase 20 anos depois, quando a equipe se sagrou vice-campeã mundial – numa decisão que só perdeu graças a uma arbitragem polêmica – e culminou com o título olímpico dois anos depois com aquela que ficou conhecida como a geração dourada.

Para complicar ainda mais, como resultado dos anos de desorganização, o Brasil passou 12 anos afastado das Olímpiadas, mesmo contando com uma excelente geração, de jogadores que chegaram a seleção como Nenê e Anderson Varejão, que fizeram sucesso no Brasil e na Europa como Marcelinho Machado, entre outros.

Felizmente após anos de discussão através da imprensa, diversos setores ligados ao esporte perceberam que era hora de fazer uma mudança e esta passou a ser implementada em 2007: com a contratação do treinador espanhol Moncho Monsalve, um maior envolvimento dos atletas que disputavam a NBA, maior organização fora de quadra e a criação da liga nacional de basquete, responsável por organizar o principal campeonato da modalidade no país, o Novo Basquete Brasil.

https://www.youtube.com/watch?v=UxXhPAtu6bA

Como tudo na vida, os resultados não vieram de imediato, o país sofreu derrotas doloridas para a Argentina no pré-olímpico de 2007 e também no mundial de 2010. Mas nem tudo foi tragédia. Tivemos grandes momentos como a exibição espetacular diante dos Estados Unidos no mundial da Turquia em 2010. Àquela época, os americanos contavam com uma grande seleção, que tinha entre seus destaques Kevin Durant e James Harden.

O ponto de virada veio no pré-olímpico de 2011 disputado na Argentina, quando a seleção comandada pelo argentino Ruben Magnano conquistou a tão sonhada vaga olímpica após ficar com o vice-campeonato da competição, tendo inclusive vencido a Argentina na fase de classificação. Impossível esquecer a emoção do bicampeão mundial Wlamir Marques que comentava a competição para a ESPN Brasil.

Em 2012, pela primeira vez em muitos anos, o Brasil foi a uma competição com sua força máxima. Sem problemas de lesão ou de pedidos de dispensa, o técnico Ruben Magnano pôde convocar e escalar o que julgava serem os melhores jogadores que tinha a sua disposição.

E o Brasil fez uma campanha excelente, conquistando o quinto lugar, sua melhor campanha desde a Olímpiada de 92 em Barcelona. Mas não foi apenas a boa colocação que encheu os olhos dos torcedores. O Brasil jogou um basquete excelente, coletivo, como há muito não se via por aqui. Além disso, a equipe brasileira conquistou importantes vitórias como a contra a temida Espanha, em jogo controverso, onde os Espanhóis supostamente tiraram o pé para fugir da chave dos americanos nos confrontos da próxima fase.

Não tivesse perdido para os russos com uma inacreditável cesta de três no último segundo de jogo, o Brasil poderia ter evitado um confronto contra a Argentina nas quartas de final e poderia ter enfrentado outro adversário, onde teria mais chance de chegar à semifinal e talvez conquistar uma medalha. Mas quis o destino que o Brasil enfrentasse mais uma vez a Argentina de Ginóbili e Scola e saísse derrotada por apenas cinco pontos numa partida emocionante. O troco veio dois anos depois, no mundial da Espanha, onde os Brasileiros venceram por 20 pontos e avançaram às quartas de final.

Infelizmente, todo esse bom trabalho novamente está sendo colocado em xeque devido à incompetência administrativa da CBB. Após a pífia participação na Copa América de 2013, onde perdeu os quatro jogos que disputou e fez a pior campanha de sua história, o imaginável aconteceu. Como se não bastasse ter que lidar com o vexame de perder para uma equipe sem qualquer tradição como a Jamaica, o Brasil ainda teve que lidar com uma consequência ainda mais drástica: pela primeira vez na história o Brasil não conseguiu a classificação para o campeonato mundial de basquete dentro de quadra. E foi aí que começou o martírio brasileiro.

Assim como no futebol, o Brasil é o único país presente em todas as edições do campeonato. Para evitar o vexame de ficar fora do mundial, só existia uma alternativa: apelar para a boa vontade da FIBA que se reserva ao direito de distribuir quatro convites para a competição. Quer dizer, boa vontade em partes. Porque não existe almoço grátis. A vaga ia custar. E cara, bem cara. Com uma forte campanha de lobby nos bastidores, que incluiu carta dos jogadores da NBA e que jogam na Europa se comprometendo a participar da competição, o Brasil conseguiu o tão sonhado convite após se comprometer a pagar um milhão de euros pelo mesmo.

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Mas a confederação brasileira de basquete, sem patrocinador oficial e cada vez mais endividada, pagou apenas uma fração desse valor (extraoficialmente se fala em 300 mil euros). Talvez apostando que a dívida cairia no esquecimento, a CBB não saldou o compromisso assumido. Mas a FIBA resolveu cobrar. E da pior maneira possível para o basquete brasileiro.

Normalmente o país sede tem sua vaga garantida para a Olímpiada. Como o Rio de Janeiro será a sede em 2016, por muito tempo acreditou-se que a confirmação da vaga no torneio olímpico era uma mera questão de formalidade. Mas diante da dívida, a entidade máxima que comanda o basquete mundial resolveu apelar e agora ameaça os brasileiros com a exclusão da vaga automática se a dívida não for quitada até o dia 31 de julho. Completamente endividada, a confederação brasileira propôs um parcelamento em reunião realizada em maio, proposta prontamente recusada pela FIBA. Agora acena com a possibilidade de pagamento à vista graças a uma ajuda da Nike e do Bradesco (tido como novo possível patrocinador da entidade).

Uma decisão definitiva só deve sair após a próxima reunião do conselho da entidade, marcada para o final dessa semana. O problema é que essa reunião deve acontecer poucos dias antes do começo do pré-olímpico, que o Brasil ainda não sabe se terá que disputar. Uma situação que, no mínimo, já prejudicou e muito a preparação brasileira para uma competição importantíssima que será disputada dentro de casa.

O mistério da seleção americana

Um dos assuntos que tem provocado mais discussão nas rodas de conversa entre os torcedores de basquete é especular sobre qual elenco a seleção americana mandará ao Rio de Janeiro. Atual bicampeã mundial e olímpica, a seleção americana sempre entra como favorita em toda competição que disputar. Mesmo se o elenco tiver passado por um grande processo de renovação após o título olímpico em Londres.

Dos atletas que disputaram aquela competição, muitos declararam publicamente sua aposentadoria da seleção, caso do ala Kobe Bryant do Los Angeles Lakers. Apesar de ser um notório fominha, Kobe está entrando em seu último ano de carreira na NBA e uma volta atrás em sua decisão parece bastante improvável. Outros como LeBron James, Blake Griffin e Carmelo Anthony escolheram não disputar o mundial da Espanha, mas ainda não falaram publicamente sobre os jogos olímpicos do Rio de Janeiro – embora o último pareça disposto segundo as últimas notícias.

Com isso, o técnico Coach K resolveu promover uma profunda mudança no elenco que levou para o mundial, rejuvenescendo a equipe em várias posições, principalmente na criação e nos pivôs. E um dos jogadores pincelados pelo treinador se destacou no mundial e se transformou num dos maiores nomes da NBA. O ala-pivô Anthony Davis fez uma temporada espetacular pelo New Orleans Pelicans, levou seu time aos playoffs pela primeira vez em muitos anos e estendeu seu contrato com a equipe da costa oeste, se tornando o jogador mais bem pago da Liga – cortesia do novo acordo com a TV que dará ainda mais fôlego financeiro para uma liga que já era bilionária.

Junto com Davis, dois jogadores que brilharam na última temporada da NBA foram destaques na seleção americana que conquistou o mundo pela quarta vez. O armador Stephen Curry, MVP da temporada regular e o ala James Harden, que foi o melhor jogador do último mundial, também se destacaram bastante na campanha americana.

Além deles os pivôs DeMarcus Cousins e Keneth Farreird formaram um garrafão jovem, atlético e de alta categoria, dificultando e muito o trabalho dos adversários nos dois lados da quadra.

A dúvida agora é se o treinador americano manterá boa parte do grupo que conquistou o título mundial, ou se aproveitará o fato da competição olímpica ter mais apelo entre os jogadores e tentará convencer alguns nomes mais famosos, como os companheiros de Cleveland LeBron James e Kevin Love, além da dupla do Oklahoma City Thunder Russell Westbrook e Kevin Durant, que só não foi para o último mundial porque estava se recuperando de uma cirurgia no pé.

Mas independente de qual a decisão do Coach K, se ele irá continuar apostando na juventude ou se tentará o retorno de alguns medalhões como LeBron e Kevin Durant, fato é que os americanos entram na competição como principais favoritos.

Os 12 do Rio de Janeiro

A brincadeira entre todos que gostam de basquete é dizer que a partir do dia 5 de agosto de 2016, 11 equipes entrarão em quadra para brigar pelo direito de competir para ver quem irá perder para os Estados Unidos na final.

Por ter sido o campeão mundial no ano passado, os Estados Unidos são o único país com classificação garantida para os jogos olímpicos do Rio de Janeiro. O Brasil, por ser o país sede, também deveria ter vaga automática. Deveria, mas o imbróglio com a FIBA pelo pagamento da vaga mundial continua e a impressão que tenho é que o país terá mesmo que brigar pela vaga dentro de quadra, apesar do que indica a seleção convocada pelo técnico Ruben Magnano para o pré-olímpico. Mas isso é assunto para mais para frente.

São ao todo 12 vagas que serão distribuídas em torneios disputados em cinco continentes: Américas (duas vagas), Europa (duas vagas), África (uma vaga), Ásia (uma vaga) e Oceania (uma vaga).

Se o Brasil conseguir a vaga de forma direta, o torneio pré-olímpico do ano que vem distribuirá 3 vagas. Se os brasileiros tiverem de conquistar seu direito de disputar os jogos olímpicos em quadra, o torneio dará quatro vagas.

Do torneio europeu, um dos classificados deve ser aquele que todos tem como o único time com capacidade de bater os Estados Unidos numa eventual final: a Espanha. Com a melhor geração de sua história, os espanhóis foram campeões em do mundo em 2006, vice-campeões olímpicos em 2008, bronze em 2012 e caíram nas quartas de final do mundial do ano passado diante da França.

A forte equipe espanhola conta com nomes como os irmãos Marc e Pau Gasol, Sergio Llull, Sergio Rodriguez, Felipe Reyes, Juan Carlos Navarro e outros. Outra equipe que deve beliscar a sua vaga é a França, atual campeã europeia e que nos últimos anos tem repetidamente derrotado a Espanha. Foi assim no campeonato europeu de 2013 e no mundial do ano passado. Os franceses contam com uma de suas melhores gerações e ainda podem se dar ao luxo de poupar um craque como Tony Parker em torneios classificatórios, reservando-o apenas para os momentos decisivos.

Equipes que podem surpreender e roubar espaço dos favoritos são a Sérvia e a Rússia, que contam com jogadores nas principais equipes da Europa e também muitos na NBA.

Nessa parte do mundo, a Copa América promete ser uma verdadeira briga de foice. Com apenas duas vagas disponíveis e um bom número de seleções aptas a conquista-las, temos duelos interessantes se desenhando. Ao todo são seis seleções capazes de conseguir uma das duas vagas disponíveis: Brasil, Argentina, México, República Dominicana, Porto Rico e Canadá.

De forma surpreendente, o técnico Ruben Magnano decidiu continuar o processo de renovação e manteve a base que conquistou o ouro no Pan Americano, apostando em jogadores como Vitor Benite, Augusto Lima, Rafael Luz e Rafael Hettsheimeir e convocou também nomes como Marquinhos, destaque do Flamengo. Impressiona a ausência dos medalhões da NBA e dos principais times europeus, como Thiago Splitter e Marcelinho Huertas, respectivamente. [1]

Os argentinos deverão contar com Luis Scola e Nocioni. Os mexicanos, dominicanos e porto-riquenhos também deverão ir com força máxima. Assim como o Canadá, que terá a base que perdeu para o Brasil na final do Pan Americano reforçada por nomes da NBA como Andrew Wiggins, do Minnesota Timberwolves e eleito calouro do ano na temporada 2014/2015.

Especular sobre classificados em um cenário complicado desses é difícil, tudo vai depender se o Brasil entrará no torneio com a vaga assegurada, mas a minha aposta é em Brasil e Canadá.

Nos outros torneios, confesso que não tenho a menor ideia do que pode acontecer, exceto pela Austrália provavelmente conquistando a vaga da Oceania. África e Ásia são um completo mistério para este escriba.

[N.do.E.: a convocação corrobora o que se comenta no meio desde a última sexta feira: que se chegou a um acordo entre a CBB e a FIBA, com nossas vagas diretas garantidas. O pagamento da dívida seria feito pelos patrocinadores da entidade. PM.]