O Carnaval de 2009 mais uma vez prometia não ser dos mais fáceis para as escolas de samba de São Paulo. A crise econômica internacional afastou patrocinadores e complicou as finanças das agremiações, que viram suas dívidas tornarem-se impagáveis. O prefeito Gilberto Kassab chegou a encaminhar à Câmara Municipal uma proposta para que a dívida das escolas com a Prefeitura (do ISS) fosse perdoada mas, até o Carnaval, nada havia sido decidido.

Na política interna, mais turbulências. Em novembro, foi criada uma dissidência da Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo: a Superliga das Escolas de Samba de São Paulo, que seria responsável por tomar decisões em conjunto com a Liga, que continuaria organizando a festa. Os lucros, porém, seriam repartidos e produtos como o CD oficial não contariam com todas as agremiações. No CD da Liga, as escolas da Liga. No da Superliga, os da Superliga. Das 14 escolas do Especial, oito continuaram na Liga (Mocidade, Vila Maria, Rosas, Tom Maior, X-9, Nenê, Tucuruvi e Leandro) e seis fizeram parte da dissidência (Vai-Vai, Mancha, Império, Pérola, Gaviões e Peruche).

As tais decisões em conjunto criaram importantes mudanças no regulamento. Para começar, foram novamente abolidos os descartes. Todas as notas seriam válidas. Só que, em vez de três, seriam quatro jurados por quesito, o que levaria os desfiles de São Paulo a um número recorde de 36 notas válidas por escola – vale lembrar que no ano anterior haviam sido oito. A medida certamente traria ainda mais emoção à apuração.

Na pista, a Vai-Vai partiu em busca do bicampeonato com um enredo sobre a saúde, enquanto a Mocidade, com o vice de 2008 entalado na garganta, escolheu o coração como tema. A Vila Maria tentaria sua primeira conquista com um enredo sobre a história do dinheiro, enquanto a Rosas de Ouro escolheu falar sobre os personagens que constroem a magia do Carnaval e a Tom Maior, tentando voltar a surpreender, passearia por Angola em uma homenagem a Martinho da Vila.

Para voltar a figurar entre as grandes, a X-9 escolheu um confuso enredo sobre a internacionalização da Amazônia, enquanto a Mancha Verde resolveu homenagear Pernambuco, Estado que já havia tomado conta de boa parte de seu desfile de 2008, sobre Ariano Suassuna. Nenê de Vila Matilde e Império de Casa Verde comemorariam seus respectivos aniversários de 60 e 15 anos, mas a Caçula do Samba usaria a data cheia como pano de fundo para um enredo sobre feriados. Tucuruvi e Pérola Negra queriam se distanciar da zona de rebaixamento com enredos sobre Ouro Preto, no interior de Minas, e a Índia, respectivamente. Já a Gaviões da Fiel prometia voltar a brigar lá em cima falando sobre a roda. Voltando ao Especial, a Unidos do Peruche escolheu falar sobre a história das pedras preciosas. Também vinda do Acesso, a Leandro de Itaquera exaltaria as favelas e a apresentadora Regina Casé.

A jornada de desfiles começou com a Unidos do Peruche e o enredo “Do ventre da terra à indomável cobiça do homem”. A escola tinha um bom samba e fez uma apresentação simpática, mas fez um desfile muito aquém de suas tradições e do nível do Grupo Especial. O problema central do desfile é que um enredo sobre pedras preciosas demanda sempre muito luxo e a Filial do Samba definitivamente não estava em condições de apresentar um desfile assim.

O abre-alas, por exemplo, tinha uma concepção muito interessante, com o surgimento das pedras preciosas e um vulcão na parte traseira, mas estava muito pequeno e pobre, com um acabamento simples. No setor do ouro, o problema mais uma vez foi visível. Com muito dourado, a falta de luxo prejudicou o efeito visual da escola, o que foi facilmente percebido pelo público. O contraste entre a riqueza do enredo e a pobreza da escola prejudicaram e muito um desfile que já teria dificuldades naturais.

O lado bom foi o “chão” da escola, que cantou bem o samba e parecia alegre. A divisão cromática também cumpriu bem o seu papel, com cores muito pertinentes aos setores e bastante variadas. Os carros que fugiam um pouco das pedras preciosas em si, como o terceiro, sobre as joias no Brasil, e o último, sobre a “indomável cobiça do homem”, também passaram razoavelmente bem. A bateria obteve um bom desempenho,  com direito a uma bossa irresistível no trecho “foi de divina inspiração, o adorno da sedução”. A Peruche apresentou um desfile excessivamente simples e, por isso, era candidata forte ao descenso. Ainda assim, não foi um desastre completo. Era possível ao menos sonhar com a permanência.

rosasdeouro2009Quem também veio sonhar na Avenida foi a Rosas de Ouro, que apresentou o enredo “Bem vindos à fábrica dos sonhos”. A Roseira pretendia, com este tema, ir além dos carros impactantes e das fantasias luxuosas. Queria chamar a atenção do público, queria fazer, sobretudo, um desfile leve. Nisso contribuiu o samba, que não era uma obra-prima, mas tinha um refrão bem construído e era fácil de ser cantado.

A escola também pretendia exaltar suas coirmãs. A comissão de frente, por exemplo, trazia um integrante com cada pavilhão de cada uma das 14 agremiações do Grupo Especial. Uma coreografia simples, mas que ganhou o público e foi um bom início. O carro abre-alas também chamou a atenção dos presentes no Anhembi. Comparando a fábrica dos sonhos em que é feito o Carnaval com um castelo encantado cheio de magia, o carnavalesco Jorge Freitas deu vida a uma belíssima alegoria, muito bem adereçada e impecavelmente acabada.

O conjunto de fantasias da Roseira foi, mais uma vez, dos mais competentes do ano. Uma divisão cromática bem pensada, muito colorida, e fantasias luxuosas foram bem recebidas pelo público. Para o meu gosto, as alas podiam ser um pouco mais claras. Algumas eram de difícil leitura. No conjunto alegórico, a Rosas tropeçou em um ponto bastante comum: não manteve nos demais carros o padrão de luxo do abre-alas. O segundo carro ainda veio bem bonito, com arlequins e colombinas espalhando serpentina pela Passarela, mas os dois seguintes, apesar de também estarem bonitos e bem acabados, estavam bem mais modestos.

O ponto alto do desfile foi o último carro, que homenageou propriamente os artistas que dão vida ao Carnaval. Além de personagens como aderecistas, costureiros e demais profissionais, as próprias escolas de samba foram exaltadas. Alas como “Magia em Verde”, “Magia em Preto e Branco” e “Magia em Vermelho” foram outras homenagens a cada uma das 13 concorrentes da Roseira. A escola ficou tempo demais na pista e teve de apertar o passo no fim para não estourar o tempo. Foi um bom desfile, mas parecia insuficiente para brigar pelo título.

Cercada de bastante expectativa pelas duas últimas apresentações, a Vila Maria foi a terceira a pisar na Avenida com o enredo “Da sobrevivência a luxúria, da ilusão a alucinação. Dinheiro, mito, história e realidade”. No entanto, a agremiação da Zona Norte não conseguiu repetir os bons desfiles dos últimos anos e fez uma apresentação apenas regular. A crise econômica internacional parece ter afetado bastante a escola, que escolheu o enredo ainda antes do crash, esperando patrocínio de algum banco. Com a crise, esses patrocínios desapareceram.

Não foi um desfile ruim. O Carnavalesco Wagner Santos mais uma vez desenvolveu um bom trabalho, apresentou o enredo com correção e desenvolveu boas alegorias. Ainda assim, não foi nem de longe um desfile luxuoso como a escola vinha apresentando. Carros como o das primeiras civilizações a usarem o dinheiro, que era o abre-alas, e o do império romano, o segundo, trouxeram boas esculturas, com bom acabamento, mas não conquistaram a plateia. As fantasias pecaram um pouco na concepção pouco criativa, mas eram de bom gosto.

Outro ponto negativo do desfile foi o samba-enredo, que definitivamente não era dos melhores e se arrastou pela Avenida. Do terceiro setor em diante, os carros da Vila Maria passaram a apresentar algumas falhas de acabamento, o que culminou no último carro, sobre Wall Street. A concepção era de fato muito interessante, com uma pirâmide enorme lembrando a Pirâmide de Ponzi, mas o carro não foi bem executado e apresentou falhas de acabamento. Em suma, depois de dois anos de ótimos desfiles, a Vila Mais Famosa fez uma apresentação para ficar ali pelo meio da tabela.

Na sequência, entrou na Avenida a Tom Maior, que cantou o enredo “Uma nova Angola se abre para o Mundo! Em nome da paz, Martinho da Vila canta a liberdade!”. A Vermelho-e-Amarelo do Sumaré fez um desfile plasticamente muito mais modesto que seus três anteriores, mas, por outro lado, passou pelo Anhembi para, mais uma vez, deixar sua marca.

Primeiro, é preciso dizer que o espetacular samba da escola levantou o Anhembi como nenhuma escola havia feito até então. O refrão do meio, que tinha um irresistível “oi, deixa a gira girar / vamos girar / a proteção Zambi nos dá / vem na ginga de Angola e deixa o corpo balançar” conquistou o público, que respondeu bem. O primeiro setor foi daqueles que, em outras situações, em uma escola com maior potencial financeiro, seria um prenúncio de um desfile campeão. Uma espetacular comissão de frente chamada “Fuga de um povo esquecido” retratava os angolanos que fugiram da guerra civil nascida depois da independência angolana.

A miséria do povo angolano foi retratada com homens e mulheres negros, vestidos com trajes simples e com fisionomias que davam o tom do sofrimento foi levada ao público em uma ótima coreografia que impressionou a todos. O carro abre-alas também foi de alto impacto. Caveiras com armas nas mãos ocupavam um cenário de completa destruição. Casas com tijolos à mostra e totalmente destruídas eram ocupadas por figurantes que brigavam entre si eram a representação da guerra entre três grupos terroristas que tentaram tomar o poder após a independência.

A ideia era claramente chamar a atenção do público no início do desfile. Prova disso é que o segundo setor voltou no tempo para exaltar a Rainha Nzinga. Embora para tal ela tenha envenenado o próprio irmão, a Rainha em questão foi um marco na luta contra a dominação portuguesa. Esse segundo carro, apesar de não muito grandioso, também passou muito bem. Os demais, no entanto, destoaram bastante do resto. O quarto, sobre as riquezas vindas do petróleo, apresentou algumas falhas de acabamento.

Aliás, o enredo forçou um pouco a barra nessa exaltação à “nova Angola”. O país ainda é miserável e está longe de ter o futuro promissor que o desfile tentou mostrar. À parte isso, a Tom Maior apresentou fantasias razoáveis, de fácil leitura e que permitiam boa evolução. O enredo também se perdeu em pouco na exaltação à Martinho da Vila, o que ficou um pouco deslocado. Mas, por outro lado, o partideiro da Vila foi ovacionado pelo público. Dono dos versos “vai ter de amar a liberdade / só vai cantar em tom maior”, que foram inspiração para o nome da escola, ele veio ao lado da filha Mart’nália no último carro. O carro era simples, apesar de grande em comprimento, mas se destacou pela alegria do homenageado. Foi um bom encerramento para um bom desfile, que deveria ficar tranquilamente ali pelo meio da tabela.

Quinta escola da noite, a Mancha Verde apresentou o enredo “Pernambuco: uma nação cultural!” e sofreu um pouco, em alguns momentos, com a repetição de alguns pontos do enredo com o seu mesmo desfile do ano anterior, que homenageou o escritor Ariano Suassuna. Não era o mesmo enredo, muito pelo contrário, mas alguma coisa igual havia ao longo dos setores.

O início do desfile foi diferente e muito bom. A escola veio lembrar Netuno, o deus do mar que havia protegido os navegadores que haviam chego a Pernambuco na comissão de frente. O abre-alas lembrou a etimologia de Pernambuco, que é “onde o mar se quebra”. Todo em azul, apresentou boas esculturas e um acabamento interessante. Não teve luxo, mas foi um belo carro.

A Mancha Verde não tinha condições de brigar com as principais escolas, nem dinheiro para fazer um desfile luxuoso e grandioso. Por isso, inteligentemente apostou em carros mais modestos, mas com um ótimo acabamento. A divisão cromática foi bem estabelecida, as fantasias estavam boas e o desfile, apesar de morno pelo samba apenas razoável, foi bom. O destaque maior ficou para o último carro, que era a síntese da diversidade cultural de Pernambuco. Foi um desfile simples, mas de muito bom gosto, que também deveria ficar tranquilamente ali pelo meio da tabela.

Penúltima escola da noite, a X-9 Paulistana botou todo o Anhembi para quebrar a cabeça e tentar entender o que o carnavalesco Paulo Führo tentou mostrar no enredo “Amazônia…conseguimos conquistar com o braço forte…do esplendor da Havea Brasiliensis à busca pela terra sem males”. Contando com um samba bastante burocrático, a X-9 fez mais um desfile frio. E, dessa vez, sem um grande conjunto visual, além de um enredo extremamente confuso.

Os dois primeiros setores foram dedicados aos defensores da Amazônia. Os índios, no caso. A divisão cromática evidentemente valorizou bastante o verde e conseguiu boas fantasias, mas os dois carros, tanto o abre-alas quanto o segundo carro, apesar de também estarem bastante coloridos, não tinham nenhum luxo e apresentou algumas falhas de acabamento. A X-9 tentou levar para a Avenida um desfile grandioso, mas passou longe de ser a X-9 que fazia o Anhembi se impressionar com seus carros.

No terceiro setor, o que já era um desfile pra lá de convencional virou uma verdadeira salada para criticar a proposta de alguns países do primeiro mundo de tornar a Amazônia patrimônio do mundo inteiro. Essa crítica vinha simbolizada em esculturas de figuras como Amy Winehouse e Madonna. Também apareceu um palhaço tipicamente americano fazendo churrasco com os bois do Festival de Parintins, sintetizando assim o domínio cultural norte-americano sobre o Brasil.

A lógica do enredo foi para o espaço de vez no quarto setor, que foi uma homenagem a… Chacrinha. O Velho Guerreiro foi homenageado em fantasias com cores vivas e bem feitas. O carnavalesco dizia que o Brasil precisava recuperar a alegria de Chacrinha para defender a Amazônia. Enfim… Foi um desfile bastante irregular e confuso, que não dava a X-9 nenhuma chance de ir ao desfile das campeãs. Pelo gigantismo e pelo bom nível de algumas fantasias e alegorias, não havia risco de rebaixamento.

nene2009Para encerrar a primeira noite, já no amanhecer, a Nenê de Vila Matilde sacudiu o Anhembi, que já não estava mais lotado, na apresentação do enredo “60 anos – coração guerreiro, a grande refazenda do samba”. O refrão “samba aí que eu quero ver você sambar / vem comigo festejar / alô você que todo ano me espera / 60 anos, sou Nenê com a galera” pegou em uma atuação inspiradíssima do intérprete Royce do Cavaco e fez a escola da Zona Leste entrar pisando firme como de costume na Passarela do Samba.

Mas não faltaram problemas durante o desfile. Na verdade, os problemas começaram antes mesmo deste. Depois de um pré-carnaval não muito fácil, com um orçamento mais apertado, a escola chegou ao Anhembi tentando buscar nos quesitos de chão um bom resultado. Mas a coisa começou a ganhar contornos mais dramáticos já na concentração, quando um membro da diretoria discutiu com o carnavalesco Lucas Pinto. Muito irritado, ele chegou a ir embora do Anhembi. O Presidente Betinho disse ao final do desfile que tudo havia sido resolvido ali mesmo, mas isso é outra história.

Fato é que foi um desfile muito complicado. A Nenê fez uma apresentação emocionante, é verdade. O desfile não era uma exaltação apenas à escola, mas também a seu fundador, talvez o maior baluarte do samba paulistano. Depois de uma bela comissão de frente com 14 águias guerreiras à frente de uma maior, essa em escultura e não em fantasia, com um pandeiro que carregava a foto de Seu Nenê, veio o abre-alas com o próprio Seu Nenê em pessoa cercado por pavilhões de todas as agremiações do Especial.

O carro tinha uma concepção que lembrava um aquário, lembrando a fundação da escola no Largo do Peixe. A alegoria, como seria regra naquele desfile, estava muito pobre e muito simples. Com problemas de acabamento, não se destacou e ainda sofreu com a alta luminosidade natural daquela manhã de sábado de Carnaval. Em termos plásticos, o melhor setor do desfile foi o segundo, que lembrou os Carnavais da Nenê que exaltaram a África e os negros. O carro estava bonito e razoavelmente grande.

A Nenê voltou a sofrer com um problema que já havia atrapalhado e muito seu desfile de 2006: quebra de eixos. Dois carros alegóricos tiveram problemas e foram empurrados com muita dificuldade, atrapalhando a evolução da escola. As três últimas alegorias também estavam muito pobres e a última, com uma concepção futurista prevendo os próximos 60 anos, foi triste. As fantasias estavam até razoáveis, beneficiadas pela divisão cromática que valorizou e muito o azul-e-branco, mas parou por aí. Destaque também para a ala que lembrou o Carnaval de 1998 em homenagem a Mangueira. Mas, ainda assim, um desfile bem complicado. As expectativas para a apuração não eram das melhores.

Abrindo a segunda noite de desfiles, a Leandro de Itaquera apresentou o enredo “Leandro de Itaquera faz a festa das periferias do Brasil para o Mundo. Salve, Salve nossa estrela Regina Casé”. O Leão Guerreiro da Zona Leste, voltando ao Grupo Especial, fez um bom desfile dentro das suas condições e que lhe deu boas chances de permanecer no primeiro grupo.

Gostei muito da comissão de frente, que resgatou as origens do termo “favela”. Vem lá do sertão, de uma planta chamada faveleira. A boa coreografia deu um bom início ao desfile. O carro abre-alas, nomeado “O sertão vai virar mar”, tinha concepção interessante e estar relativamente grande e bem acabado, mas a opção por fazê-lo predominantemente em laranja não foi feliz e tirou um pouco do impacto visual da alegoria.

Foi um desfile, como um todo, bastante irregular. A Leandro parecia bem estruturada, pronta para um desfile de Grupo Especial, mas os carnavalescos que formaram a comissão responsável pelo desenvolvimento do desfile não foram muito felizes. A opção por fazer uma apresentação muito colorida prejudicou o impacto visual de fantasias e alegorias, prejudicando inclusive a leitura das alas. O bom samba rendeu razoavelemente bem.

Os setores finais ganharam as melhores fantasias, até com algum luxo. Em compensação, a alegoria do funk e da música das favelas decepcionou. O último setor homenageou Regina Casé e ganhou um carro relativamente grande, embora a escultura que representava a homenageada, que estava logo atrás, estivesse pouco parecida com a dita cuja. No todo, um bom desfile, mas o risco de rebaixamento existia.

Na sequência, a Pérola Negra entrou na pista para apresentar o enredo “Guiado por Surya pelos caminhos da Índia em busca da Pérola sagrada”. Contando com o carnavalesco André Machado como reforço, a agremiação da Vila Madalena apresentou uma evolução interessante em revolução ao seu desfile anterior. Veio mais luxuosa, mais grandiosa e, se não podia competir com as grandes, fez bonito.

A Pérola apresentou um grande samba, com um refrão forte e, ainda que não tenha contagiado o Anhembi, passou bem. O primeiro setor foi luxuoso, com uma bela comissão de frente e um luxuoso abre-alas, relembrando o deus do Sol. Todo em laranja, teve boa iluminação e belas esculturas. O segundo setor também estava bonito, mas também era predominantemente laranja, o que causou uma sensação de repetição. Do terceiro setor em diante, as coisas se inverteram. As fantasias exploraram mais outras tonalidades, chamaram mais atenção, mas os carros alegóricos ficaram consideravelmente mais simples.

O último carro, do Taj Mahal, por exemplo, apresentou algumas falhas no acabamento e estava bastante pequeno. A escola cantou forte como de costume e passou bem. O problema é que a escola ficou tempo demais na Avenida e acabou tendo que correr no final para não estourar o tempo, encerrando o desfile com 64 minutos, um a menos que o limite. Foi um bom desfile, que deveria ficar ali pelo meio da tabela, talvez até em posição mais confortável que o décimo lugar de 2008.

mocidadealegre2009cUma das grandes favoritas ao título, a Mocidade Alegre foi a terceira a abrir seu desfile com o enredo “Da chama da razão ao palco das emoções… sou a máquina, sou vida… Sou coração pulsando forte na Avenida”. A Morada do Samba veio com grandes ambições, prometendo trazer um desfile luxuoso e cumpriu. A escola do Limão apresentou a competência habitual em belos carros, embora mais modestos por conta do orçamento mais apertado.

Particularmente, acredito que o setor inicial destoou um pouco do enredo ao falar do sol. Ainda assim, a comissão de frente veio muito luxuosa e o abre-alas veio belíssimo. Ambos predominantemente dourados tiveram ótimo efeito e o carro alegórico ainda foi beneficiado por uma ótima iluminação. O segundo setor colocou o enredo nos eixos ao apresentar o coração como a máquina da vida. A escola soube carnavalizar algo que em tese seria de difícil leitura e bolou boas fantasias com leitura relativamente simples. O segundo carro, apesar da concepção um pouco complicada e das cores um pouco parecidas com a do abre-alas, se destacou pelo ótimo acabamento e pela presença de Washington, então atacante do São Paulo. O jogador tem o apelido de Coração Valente pelos problemas cardíacos que enfrentou.

O terceiro setor apresentou o coração como cenário de paixões. Grandes histórias de amor foram lembradas em um setor que apresentou as mais luxuosas fantasias, o melhor carro e, de quebra, a grande surpresa do desfile. Quanto ao carro, apesar de menos grandioso, ele foi, digamos, o mais bem pensado, o mais bonito e manteve o padrão impecável de acabamento dos dois primeiros. Mas era na bateria que estava o ápice do desfile. Lembra da coreografia formando a sigla “SP” em 2008? Pois bem, dessa vez Mestre Sombra e os componentes da Bateria Ritmo Puro foram além. Parte deles se deslocou e se posicionou de maneira que formassem um coração flechado pelo Cupido. Uma linda manobra que colocou o Anhembi abaixo. A arquibancada delirou.
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O desfile seguiu impecável até o final, com fantasias melhores que as alegorias e o lindo samba rendendo apenas razoavelmente por conta do andamento mais cadenciado. O quarto setor foi dedicado às obras literárias, artísticas e da música que abordaram o coração e as paixões. O mais emocionante momento do desfile foi o último setor, que falou sobre a própria Mocidade Alegre, sobre a paixão dos componentes pela escola, sobre o amor que cada um tem pela Morada do Samba. O último carro encerrou de maneira magistral o desfile, relembrando cada uma das conquistas da escola e também seus principais personagens. Com mais uma apresentação muito competente, a Mocidade mais uma vez se credenciou como uma das favoritas.

Quem também passou muito bem pelo Anhembi foi a Acadêmicos do Tucuruvi com o enredo “Ouro Preto – O esplendor barroco em uma Vila Rica, relicário da Pátria, patrimônio da humanidade”. Depois do péssimo desfile de 2008, o Zaca voltou a entrar nos eixos com uma apresentação de muito bom gosto e que abriu espaço até para um certo luxo. A contratação do carnavalesco Fábio Borges para desenvolver um enredo sobre a arte barroca e a religião se mostrou um inegável acerto pois, mais uma vez, ele se mostrou um dos mais competentes e caprichosos carnavalescos da cidade.

A Tucuruvi tinha um potencial financeiro mais reduzido, o que ficou evidente nas três alegorias finais que, de fato, passaram de maneira mais modesta. Um outro problema esteve no enredo que, embora tenha oferecido à escola a oportunidade de brilhar nos quesitos visuais, não se sustentou através dos setores. Ficou, no fim, uma incômoda sensação de que tudo aquilo já havia passado naquele mesmo desfile. Algumas fantasias pareciam se repetir e o enredo parecia não sair do lugar.

Ainda assim, foi um desfile de alto nível. A escola trouxe um belíssimo abre-alas atrás de uma muito bem coreografada comissão de frente. A ideia era representar os anjos guardiões de Ouro Preto e, para isso, foi montado um cenário bastante angelical. No carro, prevaleceu o azul claro mesclado a tons dourados com imagens cristãs. O excelente acabamento ajudou muito em uma alegoria relativamente grandiosa. Fábio também acertou em cheio na divisão cromática que, à exceção do terceiro setor, privilegiou as tonalidades mais claras e o dourado.

O enredo viajou de maneira competente, a despeito das repetições, pela história da Vila Rica e por suas influências barrocas. Arte e religião se misturaram através dos tempos e a Tucuruvi levou tudo isso para o Anhembi com a maior clareza possível. O segundo carro era predominantemente dourado e lembrava a riqueza do ouro, essencial para a construção das igrejas adornadas por imagens de Santos e demais representações sagradas – todas, claro, de ouro. A relação entre o homem e a religião nos séculos passados também foi muito bem abordada.

O desfile sofreu com uma queda abrupta de qualidade em termos plásticos nos setores finais. As alegorias ficaram mais compactas e a última apresentou falhas de acabamento. Ainda assim, no entanto, a Tucuruvi se destacou. O bom e animado samba foi bem cantado e a escola passou bem. Dificilmente brigaria pelas primeiras posições, mas passou bem. Depois do quase desastre de 2008, já era muita coisa.

gavioes2009Já a Gaviões da Fiel, pisou na Avenida para tentar voltar a brigar pelo título. O enredo “O sonho comanda a vida, quando o homem sonha o mundo avança. A fantástica velocidade da roda para a evolução humana. É pura adrenalina!” prometia emocionar e surpreender, mas, surpreendentemente, apesar do bom e empolgante samba, não conquistou o Anhembi, como costuma acontecer nas apresentações da Fiel Torcida. Além da torcida da escola, que deu seu show habitual, poucos esboçaram muitas reações em um desfile que, depois de seis anos, enfim voltou a ser um desfile de Gaviões da Fiel.

Depois dos mais diversos sobressaltos enfrentados nos anos anteriores, a Torcida Que Samba recuperou a grandiosidade e pareceu estar pronta para brigar novamente pelas primeiras colocações. Mas, em sua estreia pela escola, o carnavalesco Zilkson Reis, que desenvolveu um ótimo enredo, fez uma opção por alegorias de alto impacto, que acabaram prejudicando o efeito visual e a plástica da escola. O primeiro erro foi no excesso de preto. É claro que essa é uma cor que sempre aparece com destaque na Gaviões, mas as fantasias perderam um pouco do efeito por conta dessa opção.

O trabalho de acabamento dos carros alegóricos foi digno da Gaviões da Fiel do início do século. Os carros eram impactantes, enormes, com muitos efeitos e uma iluminação fantástica. Só não eram bonitos. Faltou para o desfile um pouco da leveza da comissão de frente, com homens dentro de rodas que giravam para apresentar a evolução das rodas. Um belíssimo trabalho que destoou de um conjunto alegórico muito pesado, de tonalidades muito escuras e excessivamente robotizado. O próprio abre-alas tinha esse problema, apesar de ser dos mais impactantes do ano. Ainda assim, foi o melhor carro do desfile por conta de uma concepção bastante interessante e pelo Gavião com trens de pouso de aviões.

Os dois carros seguintes pecaram não só nessa falta de leveza, mas também no excesso de verticalização. Eram inteligentíssimos mostrando a roda como instrumento para a evolução da humanidade, mas davam a impressão de que faltava alguma coisa. O terceiro, com um gavião robotizado à frente de um trem, é talvez o melhor exemplo. Curiosamente, o quarto setor, que tinha a tal leveza perdida, não teve a grandiosidade necessária. O mundo encantado da roda era o melhor setor do desfile. O carro prometia alto impacto com rodas gigantes e um globo da morte, daqueles com motos engaioladas correndo juntas. De fato, chamou a atenção, mas foi mal adereçado.

O último setor era uma homenagem a Ayrton Senna e foi o único que conseguiu unir grandiosidade, impacto e beleza. O carro alegórico com Ayrton recebendo uma bandeirada de seres alados à frente de São Jorge estava lindo e encerrou de maneira excelente um bom desfile. Bom, não. Muito bom. Enfim um desfile de Gaviões da Fiel. Ainda assim, um desfile que deveria brigar, no máximo, por uma das cinco vagas no Desfile das Campeãs.

vaivai2009“Estou fazendo um Carnaval para disputar com a Beija-Flor”. Ao entrar em uma disputa informal com a bicampeã do Rio de Janeiro, o carnavalesco Chico Spinosa mostrou que não havia espaço para a modéstia no desfile da então campeã do Carnaval Paulistano, a Vai-Vai, que partiu rumo ao bi em 2009 com o enredo “Mens sana ET corpore sano – O milênio da superação”. Chico pode não ter sido o mais humilde carnavalesco de 2009, mas foi, sem sombra de dúvidas, o mais criativo. Transformou um enredo complicadíssimo em algo leve e divertido. Fez o esquisito virar bonito e, com a Vai-Vai pisando forte como sempre, fez um desfile digno de brigar pelo título.

Depois de uma comissão de frente bastante burocrática, veio um começo pouco animador. Fantasias dos mais diversos insetos, todas em preto, pareciam se embolar nas cinco primeiras alas (diga-se de passagem, a Vai-Vai foi talvez a única escola de 2009 a apresentar um conjunto alegórico bastante superior às luxuosas, porém óbvias fantasias). A divisão cromática carregada, que logo seria substituída por um show de cores, deu a entender que viria aí um desfile carregado, esquisito, difícil. Nada disso.

O abre-alas tinha um nome complicado e falava da globalização das pestes e doenças. Mas foi um verdadeiro espetáculo… Gigantesco, tinha a peste negra à frente e, atrás, o paraíso encontrado pelos portugueses. Uma floresta belíssima com animais e um casal de onças flagrado em um momento, digamos, mais íntimo chamaram a atenção. Quem via aquele carro certamente não acreditaria em quem falasse em “Carnaval da crise. O carro esbanjou luxo e tinha uma iluminação que beirou a perfeição.
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O segundo setor foi dedicado ao encontro entre índios e colonizadores e, assim, viajou por uma troca de costumes. O de tomar banho todos os dias, que nós ensinamos a eles, foi um dos exemplos. Foi um setor com cores mais claras, um visual mais limpo e com mais um belíssimo carro. Chamado “Higiene”, lembrou doenças que podem ser prevenidas com hábitos simples ou com condições básicas de higiene. No terceiro setor, apareceu a alimentação ruim. “A folia do glutão” era um carro que trazia uma língua enorme cercada por doces. Era, claro, um alerta para a alimentação ruim que pode trazer riscos.

O quarto setor foi o último a tratar de doenças e falou sobre o meio ambiente. Se o homem matar o meio ambiente, o meio ambiente matará o homem. As fantasias apresentaram muito do verde, mas o carro veio preto com insetos usando máscaras para respirar. O carro ia se esverdeando à medida que evoluía, indicando o renascimento da floresta. No último setor, veio o remédio. A cura para as doenças através dos mais diversos ensinamentos. Do Tai Chi Chuan à prática de esportes. O carro foi um verdadeiro espetáculo. Não era bem humorado, não tinha uma sacada genial, mas foi muito bem executado. Em um ano de crise, a Vai-Vai sobrou em luxo e só não era a grande favorita ao título porque pecou em algumas fantasias. Ainda assim, a escola saiu da Avenida cotadíssima ao título e era difícil imaginar a Saracura em uma posição inferior ao segundo ou terceiro lugar.

Encerrando a jornada de desfiles já no amanhecer, o Império de Casa Verde apresentou o enredo “É festa, é feriado, é celebração. O Tigre comemora na Avenida e exalta seu pavilhão. São 15 anos de paixão!”. A ideia era viajar pelas celebrações, pelas datas comemorativas, pelos feriados sem uma grande preocupação com alguma ordem cronológica. E assim foi feito. Mesmo sem a grandiosidade dos seus primeiros desfiles no Especial, a Império passou muito bem e se colocou na briga pelo título.

A comissão de frente seguiu o padrão dos carnavais mais bem sucedidos da escola. Lembrando o domingo, o dia de folga da maioria das pessoas, a azul-e-branco privilegiou a indumentária em detrimento da coreografia. O carro abre-alas veio lembrando a Páscoa com uma fábrica de chocolate e ali vinha a grande surpresa. Pela primeira vez, não eram tigres que vinham à frente do abre-alas, mas sim Coelinhos da Páscoa e ovos de chocolate. O carro representava uma floresta onde seriam produzidos os ovos e tinha um bom acabamento. Não era gigantesco, mas estava muito bonito.

O segundo setor lembrou celebrações religiosas e caprichou nas tonalidades mais claras. O feriado de Corpus Christi foi um dos que ganhou uma fantasia luxuosa, toda em branco, mas o destaque mesmo ficou por conta do segundo carro, que lembrou o Natal. Todo em vermelho, verde e branco, ele perdeu um pouco do efeito por conta da luz natural, mas passou muito bem pela Avenida graças à presença do Papai Noel com sua casinha e do tal espírito natalino. Foi um desfile bastante fora dos padrões da escola, com a beleza dos carros se destacando mais do que o luxo e o tamanho, como acontecia em anos anteriores.

O terceiro setor foi dedicado a feriados nacionais como Tiradentes, a Proclamação da República e a Independência, que veio no terceiro carro, de concepção interessantíssima com um número enorme de destaques representando aqueles que lutaram pela libertação. O quarto setor homenageou datas que não são feriados, mas que são comemoradas por todos nós como o Dia das Mães, o Dia dos Pais e o Dia dos Namorados. As fantasias mais leves mereceram destaque, bem como o belíssimo carro que trouxe ursinhos de pelúcia e um coração onde estava um casal apaixonado.

A escola aproveitou o último setor para uma auto-homenagem e para lembrar, é claro, do Carnaval. Os 15 anos foram comemorados com a presença, agora sim, de um gigantesco tigre que espalhou centenas de bexigas azuis e brancas pela Passarela, pondo assim um ponto final aos desfiles de São Paulo. O “Carnaval da crise” teve desfiles bastante inferiores aos de 2008 e não teve nenhuma exibição arrebatadora, incontestável. Assim, Mocidade Alegre e Vai-Vai pareciam ter sido um pouco superiores a Rosas de Ouro e Império de Casa Verde na briga pelo título.

O fim dos descartes prometia dar muita emoção a apuração. Ao final do primeiro quesito, samba-enredo, Rosas, Nenê, Pérola, Mocidade, Gaviões, Vai-Vai e Império somaram os 40 pontos máximos. O quesito foi julgado com muita benevolência, a ponto das mais penalizadas, Peruche, Mancha e Leandro, terem perdido apenas 0,75 cada uma.

O segundo quesito, enredo, já mudou a situação. Rosas, Mocidade e Vai-Vai se isolaram na ponta com mais quatro notas 10, chegando assim aos 80 pontos. A Nenê foi direto para a zona de rebaixamento ao perder 4,25 pontos no quesito, enquanto a Império de Casa Verde tirou dois 9,75 e Gaviões e Pérola deixaram 0,75 pela pista cada uma. O destaque ficou por conta da Tucuruvi, que pulou para o quarto lugar, logo atrás das três líderes, com 79,75 (sete notas 10 e um 9,75 em samba-enredo). Em Comissão de Frente, Mocidade e Vai-Vai permaneceram invictas com 120 pontos, seguidas pela Tucuruvi, que seguiu firme com 119,75. A Rosas perdeu meio ponto e foi ultrapassada por X-9 e Império, que apareciam com 119,5 cada uma.

Em bateria, apenas duas mudanças significativas. A Tucuruvi desperdiçou 1,5 ponto e saiu da briga pelo título, enquanto a Império de Casa Verde, com um 9,5, ficou um ponto atrás de Mocidade e Vai-Vai – que já tinham meio ponto de vantagem para a terceira, Rosas – e ainda foi ultrapassada pela X-9, que tirou apenas um 9,75. Em harmonia, quinto quesito, quase nada mudou. Apenas a Império desperdiçou mais 0,25, assim como a X-9, e foi ultrapassada pela Gaviões no desempate.

Apenas na primeira nota do sexto quesito uma das duas líderes da apuração perdeu ponto. As fantasias da Vai-Vai levaram um 9,75, e deixaram a Mocidade isolada na ponta. A Saracura ainda receberia mais um 9,75, deixando a Morada com 240 pontos, 0,5 a mais que a Vai-Vai, que só não caiu para terceiro porque a Rosas também levou um 9,75 e foi para 239,25. A Gaviões pulou de maneira isolada para quarto, com 238,75, contra 238,5 da Império e 237,5 da X-9 que, com dois 9,75 e dois 9,5, saiu completamente da briga pelas primeiras posições.

O sétimo quesito foi bom para a Mocidade Alegre, que mais uma vez passou invicta e, com 280 pontos, manteve meio ponto de frente para a Vai-Vai. Todas as cinco primeiras somaram 40 pontos, menos a Rosas de Ouro, que tirou um 9,75 e ficou um ponto atrás da Morada a dois quesitos do fim. Quando a taça já parecia perto do Limão, um susto. A primeira nota do penúltimo quesito, evolução, foi um 9,75, enquanto Vai-Vai e Rosas tiraram 10. No segundo quesito, foi a Vai-Vai quem perdeu 0,25, fazendo a diferença voltar para meio ponto.

A Rosas, que tal como as duas primeiras tirou 10 no terceiro jurado, já ia se animando com a diferença reduzida para 0,75 e 0,25 quando um 9,5 no quarto jurado acabou de vez com o sonho do título – menos mal para a Roseira que Gaviões e Império perderam meio ponto cada. Dessa vez quem se animou foi a Vai-Vai, que viu a Mocidade tirar mais um 9,75 e, com seu 10, reduziu a diferença para 0,25. A apuração entrou no último quesito com a liderança da Mocidade, com 319,5 contra 319,25 da Vai-Vai e 318,5 da Rosas. A leitura das notas de alegoria, que prometia ser o momento de maior emoção da terça-feira gorda, beirava a monotonia com as três notas 10 para as cinco primeiras colocadas. Bastava mais um para a Mocidade Alegre, para que a Morada do Samba comemorasse mais um título.

Na mesa da Mocidade, a já tradicional cena da Presidente Solange abraçada ao seu marido, Mestre Sombra, com terços e demais patuás nas mãos. Na da Vai-Vai, logo ao lado, a espera de um milagre. Depois de alguns minutos de suspense, as notas de Zélia Bogar: na primeira noite de desfiles, nenhuma agremiação mereceu o 10 da jurada. Leandro de Itaquera e Pérola Negra, duas primeiras do sábado, também tiveram que se contentar com um 8,75 e um 9,75, respectivamente. E então veio a nota da Mocidade: 9,75! Parecia filme repetido… Será que pelo segundo ano seguido a Morada perderia um título para a Vai-Vai na última nota? Na mesa da Escola do Povo, a tentativa de disfarças a alegria enquanto o 10 consagrador não vinha. Tucuruvi, 9,5. Gaviões, 9,75. Vai-Vai… 9,5. Zélia estava mesmo decidida a não dar 10 para ninguém – a Império, última nota, levou 9,5 – e sacramentou, com uma boa dose de sofrimento, o título da Mocidade com 359,25 contra 358,75 da Vai-Vai.

A Rosas de Ouro, com 358,25, confirmou seu terceiro lugar à lá Mocidade: ouvindo a nota diferente de 10 para a Gaviões, que fechou em quarto com 358, 1,5 a mais que a Império, que voltou ao desfile das campeãs. Na sequência vieram X-9, Tucuruvi, Vila Maria, Pérola Negra, Mancha Verde e Tom Maior – em um inacreditável 11º lugar. A Leandro de Itaquera, voltando à elite, somou 345 pontos e conseguiu se manter no grupo. Caíram Nenê de Vila Matilde, com 342, e Peruche, com 339. No Acesso, vitória tranquila da Águia de Ouro, que voltou ao primeiro grupo ao lado da Imperador do Ipiranga. A escola da Pompéia somou cinco pontos a mais que a segunda colocada e oito que a terceira, a Dragões da Real.

Na quadra da Mocidade Alegre, a festa da vitória foi interrompida por um susto. Um dos fundadores da escola, o grande Juarez da Cruz, passou mal ao final da apuração, por ficar muito nervoso com a leitura das notas e foi direto para o hospital. Ele, que estava doido para ir para casa para poder tirar sarro dos companheiros de outras escolas, faleceria cerca de 20 dias depois. Morreu de parada cardíaca, uma triste ironia que contrastou com a felicidade da comunidade do Limão pela conquista de um título vindo de um enredo sobre o coração.

Curiosidades

– Pela última vez a TV Globo usaria a formação com Chico Pinheiro e Renata Ceribelli na narração e com Leci Brandão e Mauricio Kubrusly dividindo os comentários. A novidade foi a presença do sambista Jorge Aragão durante algumas escolas.

– A Globo instalou um gigantesco telão com sua transmissão em frente a arquibancada monumental, enquanto outros cinco foram instalados pela SPTuris. Alguns diretores acompanharam por ali detalhes das passagens de suas escolas.

– O locutor do Afoxé que se apresentou antes da primeira noite de desfiles se confundiu e mandou um alô para a torcida corinthiana, sendo vaiado pelos muitos palmeirenses que ali estavam para o desfile da Mancha. Já a Leandro de Itaquera usou o mesmo lema da campanha do Corinthians na Série B de 2008: “Eu nunca vou te abandonar”.

– Fim da brilhante passagem do carnavalesco Wagner Santos pela Vila Maria. Em nove Carnavais, de 2001 a 2009, ele ganhou o título do Grupo de Acesso e voltou quatro vezes ao desfile das campeãs (um vice-campeonato, um terceiro lugar e dois quarto lugares). A partir de 2010 ele iniciaria outra jornada de sucesso, agora pela Tucuruvi.

– Os dois CDs oficiais contaram com uma participação especial cada: no da Liga, Martinho da Vila cantou ao lado da filha Mart’nália o alusivo e o refrão anterior ao principal no fim da faixa. No da Superliga, Belo mais uma vez esteve na faixa da Império de Casa Verde ao lado do intérprete Raphael do Império.

– Foi o último desfile do intérprete Leandro Alegria no Grupo Especial. Em 2011, quando a Peruche voltou à elite, o intérprete já era Toninho Penteado.

– Despedida também do grande carnavalesco Raúl Diniz que, descontente com os rumos da festa, abandonou o Carnaval após ser rebaixado com a Peruche. Foi quatro vezes campeão do Especial, três delas no Anhembi (1989 com o Camisa, 1991 e 1992 com a Rosas e 1995 com a Gaviões). Atualmente, é artista plástico na Espanha.

– Com a queda da Nenê, apenas Mocidade, Rosas de Ouro e Vai-Vai participaram de todos os desfiles do Grupo Especial no Sambódromo do Anhembi.

– Foi, por sinal, a última vez que o saudoso Seu Nenê viu sua escola no Grupo Especial. Ele faleceria em outubro de 2010, cerca de sete meses depois da Nenê voltar à elite.

– Início do casamento de sucesso entre o carnavalesco André Machado e a Pérola Negra. Apesar de não conseguir voltar entre as campeãs e de acumular dois rebaixamentos, a dupla levou desfiles de muita qualidade ao Anhembi entre 2009 e 2014.

– O desfile de 2009 foi o primeiro de uma série de, por enquanto, sete Carnavais em que a Mocidade Alegre foi a terceira a desfilar no sábado. Em 2009, 2011 e 2012, foi sorte. Nos outros anos, escolha própria por ser a campeã vigente.

– O intérprete Carlos Júnior mais uma vez adaptou o seu grito de guerra para o desfile da Vai-Vai. Dessa vez, foi: “Alô, Bixiga! Quem for contra vai chorar porque a Terra vai tremer! E aqui tem, hein! Fogo neles!”

– O Prefeito Gilberto Kassab e o Governador José Serra compareceram ao Sambódromo e foram recebidos entre aplausos e vaias pelo público.

– Pela primeira vez a apuração foi realizada na parte da tarde e não de manhã, como acontecia em anos anteriores. Foi também a última vez que não foram adotados os descartes.

– Uma das irmãs de Juarez da Cruz, Lila, detestava Carnaval porque achava que a festa ainda mataria um de seus irmãos. Infelizmente, ela, de uma forma ou de outra, tinha razão.

Vídeos

O grande desfile da Rosas de Ouro
https://www.youtube.com/watch?v=-fcNC29Au0s

A empolgante largada da Tom Maior
https://www.youtube.com/watch?v=9LLsz8AfdOQ

O problemático desfile da Nenê
https://www.youtube.com/watch?v=t6AfR_nFN7g

Leandro e as favelas
https://www.youtube.com/watch?v=aCQo0t1Ctwo

A campeã Mocidade
https://www.youtube.com/watch?v=H2Z9xLG0Zng

Gaviões voltando a brigar pelo título
https://www.youtube.com/watch?v=LBaVLiC_tu4

A vice Vai-Vai
https://www.youtube.com/watch?v=rds6WGj4l6U

Os 15 anos da Império de Casa Verde
https://www.youtube.com/watch?v=IgzwIn-33mk

19 Replies to “Bodas de Prata – 2009: Mocidade vira na última nota, dá o troco e supera Vai-Vai; celebrando 60 anos, Nenê cai”

  1. Foi dramático.

    E foi muito engraçado o Chico e o Maurício, na transmissão da apuração: “Vai, Zélia, liga aqui, fala quem ganhou, a gente não conta pra ninguém”.

  2. 2009…Tanta coisa para falar.

    Meu pré-carnaval foi bastante legal, pela primeira vez entendi que uma escola de samba funcionava o ano todo graças a mudança de casa para próximo da Mocidade Alegre, e acabei acompanhando parte daquele pré-carnaval, não fui a final de samba-enredo, mas já tinha a letra do samba vencedor no dia seguinte, foi um contato muito interessante com a escola que antes só conhecia pela TV. Apesar de ter conhecido a Mocidade, a escola ainda não tinha arrebatado meu coração. Isso viria no desfile.

    Foi meu único ano morando próximo da morada, logo depois retornaria para a minha estadia original.

    Deixando minha vida pessoal um pouco de lado, acho 2009 um excelente ano de desfiles no geral, tivemos Rosas bem legal, Tom Maior interessante, Nenê emocionante, a Pérola veio bem, a Gaviões pisando firme para brigar pela taça, a Vai-Vai que foi bastante arrogante no pré-carnaval mas veio bem, o Império muito bem também e o MAIOR DESFILE QUE EU JÁ VI NO ANHEMBI : Mocidade Alegre 2009.

    Sobre o desfile foi simplesmente absurdo o que aconteceu no sábado 21 de fevereiro de 2009 no sambódromo do Anhembi foi simplesmente inesquecível.

    O Enredo do Coração foi extremamente bem desenvolvido, contado de forma clara e com muitíssimo bom gosto apesar de nem tanto luxo por conta da crise. O carro do can can era espetacular, assim como os inesquecíveis carnavais contados no último setor, que coisa maravilhosa.

    Sobre o samba, apesar de já estar na minha cabeça, ele ainda não havia acontecido no meu coração, mas quando ele começou a rolar no sambódromo foi totalmente diferente, a escola tocou completamente o meu coração e arrebatou ali o meu coração, após a inesquecível coreografia do coração, eu já tinha até mudado o samba-enredo de “faz pulsar o coração, o sonho de ser campeão” para “faz pulsar o coração, a certeza de ser campeão”, após o desfile perdi até a vontade de ver outros, eu só queria ver a Mocidade passar e na terça-feira nada além do título me satisfaria. Quando ele veio daquele jeito na apuração me dei conta que eu era Mocidade Alegre e que a mudança de casa só foi um alerta que acabou despertando justamente no desfile.

    Desculpem me alongar, mas no geral é isso.

    2009, Inesquecível, Mocidade Campeã. E que vem o Espelho em 2010!

  3. Aquele Carnaval foi muito bom mesmo. Eu lembro de estar com o meu vô vendo o desfile da Gaviões e falando pra ele: “esse ano não vai dar não”.

    1. Minha vó vendo a Gaviões, e eu dizendo pra ela: “A campeã já passou”, ela brava era muito divertido, grande ano.

  4. Ótimo texto, como sempre. O Carnaval de 2009 foi o primeiro que eu realmente me interessei (mesmo que na época não vi nem metade dos desfiles por ter dormido). Sobre o que eu me lembro (o que foi pouco), o desfile na Nenê tbm foi marcado por pancadaria na dispersão. Esse ano também começou a sina da Pérola de apresentar enredos de muito bom gosto e os jurados a canetarem sem dó.

    1. Pra mim, esse ano foi o melhor dos últimos em termos de desfile, o único porém é que ninguém bateria a Mocidade naquele ano, foi espetacular.

        1. 2010 é briga boa mesmo, é que a campeã foi um sono só, mas teve Mancha, Gaviões, Vai-Vai, Tucuruvi, e a Mocidade que era a minha campeã.

  5. Sobre a concepção do carro dos feriados cívicos, o Szanieck imaginou como centro da alegoria um grande capacete de um dragão da independência. Quase não é possível identificar esse detalhe, pela quantidade de informação ao redor dele. Mas, é um carro muito bonito!

    Abraço!

  6. Foi um bom ano, mas a Mocidade sobrou, nem vou me alongar pq já falaram bastante… Achei a Vai-Vai um pouco pesada, com muita poluição visual e a Rosas foi melhor que a Vai-Vai! A Rosas só pecou na CF, onde um componente sempre sobrava quando todos ficavam em linha, e as duas últimas alegorias deixaram a desejar. Sobre os demais desfiles:
    Peruche – Apenas passou… E pobre…
    Vila Maria- começava ali sua queda de qualidade, td isso graças a uma péssima escolha de samba…
    Tom Maior- Início emocionante, a CF, assim como a da Rosas de 2002, gera controvérsias por ser pesada, mas me agradou muito! A escola pecou em Evolução, como no buraco entre a CF e o Abre-Alas no início do desfile.
    Mancha Verde- De fato, um pouco repetitiva de 2009, e mais uma vez fez hora no final pra passar no tempo minimo…
    X-9- Discordo quanto ao visual, que me agradou, mas de resto concordo, mto confusa…
    Nenê- Complicado, tinha a ctz do rebaixamento ao final do desfile…
    Leandro- Veio bem, mereceu permanecer, só…
    A Pérola Negra arrasou, com o melhor samba do ano trouxe tb a melhor Alegoria do ano, o AA era espetacular! E, como bem lembrado aí em cima, começavam as perseguições com a Escola…
    Tucuruvi- Enfim, saiu da zona de conforto, de fazer apenas carnaval pra se manter. O visual me surpreendeu positivamente, o samba era animado msm, mas bom não era, era um festival de clichês rs
    Gaviões- Nestas suas críticas ao Zickson, faltou falar da falta de criatividade de colocar roda em todas as fantasias… Mas foi um bom desfile, apesar de alguns torcedores supervalorizá-lo…
    Império- Me lembro que a expectativa para a última alegoria era enorme, e valeu a pena haha… Chamou muito a atenção… Foi um belo desfile, minha 4ª colocada, sem dúvida!

    1. Mocidade sobrou onde colega? Alegorias foram bem inferiores ao da Vai Vai. Vice campeonato seria o mais justo.

  7. Uma coisa que nunca me esquecerei e exaltarei: Em 2009 apenas duas escolas não faziam suas alegorias num barracão: Mocidade Alegre e Pérola Negra, que faziam suas alegorias debaixo de pontes… Foram as únicas a gabaritarem o quesito Alegorias! haha

    1. Mocidade não gabaritou Alegorias, todas perderam 0,25 no mínimo graças a Zélia Katiúscia Bogar que quase me faz infartar.

      1. Desculpe, eu errei, foi em 2010 que isso aconteceu: Apenas as duas que faziam alegorias debaixo de viadutos gabaritaram o quesito!

  8. Sou Vai-Vai e não tinha como bater a Morada naquele ano.
    Espetacular o desfile. Um dos melhores da história do Anhembi.

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