Muito se tem falado sobre a aprovação por parte do Congresso da nova redivisão dos royalties de áreas petrolíferas, que levariam à perda de recursos pelos estados produtores. No momento em que escrevo não havia acordo para devolver parte dos valores devidos a estes estados.

O Projeto de Lei do Senado 448/2011 prevê a redução das fatias dos estados produtores, dos municípios também produtores e da União nos royalties em favor dos estados e municípios que não produzem petróleo. Estes últimos passarão a ter uma fatia de 47% do total dos royalties pagos em 2020, enquanto que os produtores terão queda de 53% para 24% no mesmo ano de 2020. Além disso, a fatia da União cai de 30% para 20%. Resumindo, é isto.

Entretanto, além de me parecer inconstitucional – pois o projeto mexe na divisão dos recursos do petróleo “pós sal”, ou seja, da Bacia de Campos e outras de menor expressão – em meu entender existe um sério erro conceitual neste projeto. Explico.

O conceito de royalties remonta ao início da exploração de petróleo na Arábia Saudita, na primeira metade do século XX. Para quem não conhece este país árabe possui petróleo quase que ao nível do solo, em grandes quantidades – é a maior reserva mundial, ainda hoje.

O nome “royaltie” significa literalmente “gravata real”. Quando os americanos e ingleses negociavam para deter os direitos sobre a exploração de petróleo no país, estranharam a maneira de se vestir do rei do país. Então determinaram que o reino receberia uma taxa sobre o petróleo extraído, para que o soberano pudesse se vestir melhor usando gravatas – daí o nome dado à taxa, “royal tie” – “gravata real”.

Hoje os royalties não servem para comprar gravatas, mas o nome ficou. É uma taxa paga à União, aos estados e municípios pelas empresas petrolíferas para compensar o uso da terra – ou mar territorial – e os danos ambientais advindos da exploração do ouro negro.

Portanto, soa como uma impropriedade a proposta em aprovação de redividir estes recursos com municípios que não possuem uma gota do líquido em seus domínios territoriais. Claramente é uma forma de fazer demagogia com o dinheiro alheio. Pior: estados e municípios que não são afetados pela exploração de petróleo terão renda maior que os estados e municípios produtores, o que é absolutamente insólito.

Na redivisão dos recursos do pré-sal, algo diferente, o valor destes cai substancialmente mas respeita o sentido original desta taxa. Na verdade o próprio conceito de “estado e município produtor” é bastante relativo, haja visto que os poços em operação se encontram no limite da plataforma continental brasileira – a aproximadamente 300 quilômetros da costa, em média. Complementando, talvez à exceção do município de Santos e cidades vizinhas (sede das operações da Petrobras para o pré sal) não faz muito sentido a tese de compensar os impactos causados aos municípios produtores pela exploração do óleo, sejam ambientais, econômicos ou de qualidade de vida.

Ou seja, seria muito mais razoável manter a divisão atual nos campos do “pós sal” e alterar esta distribuição nos novos campos do pré sal – que tendem a responder pela maior parte da produção brasileira em poucos anos – até de forma a não ferir o conceito original de “royalties”. Entretanto é mais fácil fazer demagogia com o dinheiro alheio.

Vale lembrar, também, que a chamada “participação especial”, paga em campos de maior produtividade, também poderia ser redistribuída em favor dos estados e municípios não produtores. E, se é para se tocar no asunto, vale a pena também rediscutir a questão do pagamento do ICMS no destino, determinada pela Constituição de 1988 e que favoreceu fortemente o estado de São Paulo em prejuízo do Rio de Janeiro. O petróleo é a única mercadoria cujo pagamento deste imposto é feito no local de destino e não de origem.

Por outro lado, os municípios que dispõem destes recursos incorreram no erro de não diversificar suas economias a fim de diminuir a dependência deste dinheiro. Um bom exemplo é Macaé, que tem até academia com equipamentos de última geração em praça pública, mas não diminuiu a dependência da economia da cidade do petróleo.

Entretanto acredito que a lei, ainda que aprovada e sancionada pela Presidente Dilma Roussef, não deverá entrar em vigor pelo menos no curto prazo, até por alterar contratos há muito estabelecidos – o que seria, em meu entendimento, inconstitucional. Contudo, ainda que os valores mantenham-se nos valores originais, serve como advertência aos municípios. Até porque tende a cair a importância relativa destes na produção total de petróleo e os valores recebidos a título de royalties, no médio prazo, tendem a ser decrescentes. Cabe a estes diversificar sua economia e diminuir a dependência de um recurso natural que sabemos finito.

Finalizando, não posso deixar de comentar a postura política que o governador do Rio está mantendo nesta história. Por mais que tecnicamente sua postura esteja correta, sua disposição de não negociar tende na a prática aumentar ainda mais as perdas do estado do Rio de Janeiro. O momento, a meu ver, é de minorar as perdas, restringindo-as ao mínimo necessário para um entendimento no Congresso Nacional.