Não, leitor, ainda não é a vez em que o livro sobre a história do petróleo será objeto de nossa coluna. Ainda faltam umas 400 páginas…
Nosso objeto de hoje é um livro atualíssimo e que mostra o desastre financeiro mundial, em especial o americano, e todo o jogo de pressões que levou a algumas das decisões mais disparatadas em termos de política econômica dos últimos tempos.
Escrito pelo Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz, este “O Mundo em Queda Livre” mostra como a desregulamentação pregada pelos teóricos do livre mercado levou a uma catástrofe.
Stiglitz explica como a falta de controle sobre o sistema financeiro americano, trazida pelo “fundamentalismo de mercado” de Reagan e Bush, levou ao crescimento indiscriminado dos bancos, ao surgimento de produtos financeiros extremamente sofisticados – muitas vezes simples apostas, quando quase fraudes – e a falta de ação do Banco Central americano sobre a “bolha” do mercado imobiliário, que acabou “estourando”, provocando a crise americana e, por “contaminação”, mundial.
O economista explica que as hipotecas do mercado imobiliário americano, “tóxicas” por envolverem má concessão de crédito, casas avaliadas a um preço irreal (a bolha) e juros absolutamente altos e refinanciáveis foram “embaladas” e revendidas a outros bancos como produtos financeiros “bons” – contaminando todo o mercado mundial.
Outro ponto do livro é mostrar que o socorro financeiro fornecido pelo governo, com recursos públicos, acabou sendo utilizado pelos bancos não para estimular a economia americana, mas para recompor as reservas de capital, por um lado, e pagar bônus a seus executivos. Na visão destes últimos, a culpa pela crise econômica seria dos próprios consumidores e compradores de hipotecas, “que não teriam se informado sobre os riscos”.
Também aponta os problemas da baixa regulamentação do mercado financeiro americano, em especial a não separação entre os bancos comerciais e os de investimento, e a formação de bancos “grandes demais para quebrar”, que acabam em uma situação de virtual impunidade: se tornam-se insolventes, o governo tem de vir em seu socorro para que a perda de confiança no sistema bancário não venha a provocar uma quebra geral, com consequências catastróficas. O autor defende que estes bancos deveriam por ação do governo serem divididos em unidades menores, a fim de não possuírem uma influência demasiada sobre o sistema financeiro.
Stiglitz promove um debate teórico expondo o porquê das idéias keynesianas – de John Maynard Keynes, economista e cuja filosofia econômica eu também me alinho – serem mais adequadas neste momento para os Estados Unidos e o mundo desenvolvido saírem da crise econômica. A explicação é que, com muitos  americanos perdendo suas casas, seus empregos e renda, somente uma ação de gastos governamentais irá estimular a economia suficientemente a ponto de fazer girar o “círculo virtuoso” do crescimento.
Diminuir gastos governamentais e aumentar impostos, como pregam os neo liberais, somente diminui a massa de consumo da economia e aumenta a crise – as pessoas tem menor dispêndio, as empresas trabalham abaixo de sua capacidade possível e empregam menos pessoas, diminuindo a renda.
Em outro capítulo o autor mostra como o presidente americano Barack Obama sucumbiu ao poderosíssimo lobby dos banqueiros e de Wall Street, adotando medidas que eram boas para este segmento, mas ruins para os Estados Unidos e para o povo.Na prática, os bancos que adotaram uma gestão temerária foram premiados, enquanto o povo ficou com a conta para pagar na forma de encolhimento de renda, da perda de suas casas e de seus empregos. 
E o presidente americano, na prática, atuou a serviço dos interesses de Wall Street, capitulando e renegando tudo o que defendeu na campanha.
Embora mais sofisticada teoricamente (até por terem objetivos diferentes), a abordagem do livro lembra a de “Enganados”, de John Perkins, que resenhei anteriormente. São um bom exemplo de como o Estado pode ser utilizado a serviço dos mais poderosos e em prejuízo da população, que acaba escravizada pelas dívidas.
Fico longe, muito longe de esgotar aqui os assuntos tratados no livro, mas digo aos leitores que é leitura obrigatória para se entender a mais recente crise econômica. Conhecimento anterior em teoria econômica ajuda na compreensão, mas mesmo o leitor não-especialista consegue acompanhar bem o raciocínio, ajudado por uma tradução que não complica a compreensão.
Na Travessa, custa R$ 66 – livros de Economia não são exatamente baratos…

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