A partir de hoje, teremos uma nova coluna no Ouro de Tolo: a “Jogo Misto”.

Como o nome diz, são mini-entrevistas mesclando perguntas referentes ao entrevistado com questões fixas envolvendo livros, discos e filmes. Não tenho pudores de dizer que tive inspiração na “5 Perguntas”, do Blog da Anninha – aliás, blog cuja autora, Anna Barros, deverá ser a próxima colunista do Ouro de Tolo.

Os entrevistados sempre serão pessoas formadoras de opinião, independente de serem pessoas públicas ou não. Obviamente, a equipe de colunistas deste blog estará aqui mais cedo ou mais tarde, bem como, um dia, o editor chefe. A coluna será publicada a princípio semanalmente, sempre no que eu chamo de “final de semana estendido” – sexta, sábado ou domingo.

Milly Lacombe, na casa dos quarenta, jornalista, pioneira e competente multimídia, militante da causa homossexual e leitora voraz e inveterada. Acompanhava a sua trajetória à distância até que, por uma destas maravilhas da tecnologia, pudemos estabelecer uma amizade bastante promissora, com algumas discordâncias, mas com muita soma de conhecimentos e especialmente muita inteligência. Ah, e lubrificada pelo petróleo do pré-sal…

Ela costuma dizer que é “paulistana, atéia, homossexual e corintiana”. Eu sou “suburbano, religioso, heterossexual e rubro negro”. Talvez o respeito às diferenças e a abertura a novas idéias tornem tão rica esta convivência. 

A jornalista, dona de um excelente blog sobre livros no Ig, é a convidada de estréia da nova coluna do Ouro de Tolo.

1 – Infelizmente (risos), tenho de começar apelando ao “lugar comum”. O que é ser mulher no jornalismo esportivo e militante da causa homossexual ?

ML – A vida de uma mulher no mundo do futebol não é moleza. Mas não sei dizer se é um mercado mais ou menos preconceituoso do que qualquer outro. Acho que o mercado de trabalho no Brasil ainda carrega muita misoginia, muito machismo, e a indústria do futebol talvez simplesmente não escape à regra. Quem sabe a eleição de uma mulher para presidente ajude a mudar esse cenário?

Sobre minha militância, ela aconteceu por acaso. Eu morava nos Estados Unidos e li numa matéria do LA Times que mais da metade dos jovens que se matavam, o faziam por serem gays e se acharem inadequados ao mundo. Quando li isso, achei que era apenas um dever falar abertamente de minha orientação. Desde então, nunca mais escondi ou deixei de alardear meu status (casada com uma mulher). Não me preocupo em panfletar, embora não fosse recusar um convite para sair pelas ruas levantando bandeiras. Eu me preocupo em não esconder quem sou e que ser gay faz parte de ser quem sou. Acho que assim posso ajudar outras pessoas.

2 – Quais as diferenças entre o estilo de vida americano e o brasileiro, em especial na área cultural ?

ML – O estilo de vida nos Estados Unidos, culturalmente falando, é diferente do nosso por ser mais rico. Quando digo isso não quero sugerir que a cultura deles seja mais rica do que a nossa. Pode ser, pode não ser, mas o que importa dizer é que eles têm mais tempo livre para usar em jornadas culturais, seja uma ida ao cinema ou a visita a um museu. Por terem mais tempo, são mais familiarizados com esses hábitos desde pequenos. E eles têm mais tempo porque a jornada de trabalho é diferente da nossa. Muita gente trabalha de casa e pode fazer seu próprio horário. Outros, cumprem uma agenda fechada, estilo ‘9am/5pm’, e nem um minuto a mais. Essa foi pelo menos minha experiência por lá.

3 – O que é importante em sua vida ? E de que forma os livros fazem parte desta gradação de valores ?

ML – Liberdade é importante em minha vida. Poder fazer meus horários, ir e vir. E amor, claro. A vida com minha mulher e nossa rotina são coisas sagradas. Os livros, assim como o futebol, são parte integrante dessa rotina e eles me ajudam a entender onde estamos e quem somos. Mesmo os mais superficiais acabam me contando uma história, e essa necessidade, a de ouvir uma história, é de nossas necessidades mais básicas.

4 – Um livro inesquecível. Por quê ? Como sei que é leitora voraz, pode decretar um empate…

ML – “A Cidade e as Serras”, de Eça de Queiroz. Acho que tem nele todos os componentes de um clássico: boa história, personagens inesquecíveis, acidez, crítica social, deboche, reflexões inusitadas e, acima de tudo, humor.

5 – Uma canção inesquecível. Por quê ?

ML – Musica não é meu forte, mas acho que Imagine, de Lennon, é a maior oração já construída pela humanidade. Eu sugeriria que em vez de Pai Nossos e Ave Marias, começássemos a entoar Imagine antes de dormir. Se tivesse um filho, ensinaria-o a “rezar” Imagine todas as noites ;-)

6 – Livro ou filme ? Por quê?

ML – Livro, acho. Mas só faria essa escolha com uma arma apontada para minha cabeça.

7 – Finalizando, com os agradecimentos do Ouro de Tolo, algumas poucas palavras sobre o blog ou seu autor/editor

ML – O autor de Ouro de Tolo não poderia ser alguém mais diferente de mim: flamenguista, homem de fé, petista … e exatamente por isso estabeleci com ele um laço de afeto e amizade que talvez não fosse tão forte com alguém que espelhasse todos os meus conceitos. Não há amadurecimento ou crescimento sem troca, e não há troca com quem pensa igual à gente. O fundamental é que o diálogo não carregue preconceitos. Sem intolerâncias, qualquer ideia contrária vai apenas nos enriquecer. Por isso, o Ouro de Tolo é hoje leitura obrigatória para mim.

[N. do E.: apesar de muitos leitores do Ouro de Tolo, inclusive a Milly, acharem que sou petista, na verdade não somente não sou filiado ao partido como ainda discordo de algumas das teses do PT. Um dia escreverei sobre o assunto, mas me definiria como um economista keynesiano e um social-democrata no sentido estrito do termo. Hoje, quem chega mais perto disso no Brasil é a corrente política representada pelo Presidente Lula.]

(Foto: Revista TPM)

2 Replies to “Jogo Misto – Milly Lacombe”

  1. “me definiria como um economista keynesiano e um social-democrata no sentido estrito do termo. Hoje, quem chega mais perto disso no Brasil é a corrente política representada pelo Presidente Lula.” [2]

    Escreveria da mesma forma.

  2. Milly Lacombe?

    Não é aquela que de maneira leviana acusa as pessoas de forjar documentos em programas televisivos?

    Ah sim, ela realmente é pioneirísima…

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