No apagar das luzes do Carnaval-2017, do complicadíssimo Carnaval-2017, tivemos um fato inusitado no Desfile das Campeãs, mais precisamente no desfile do Acadêmicos do Salgueiro.

O Salgueiro fez um grande desfile, acabando em terceiro lugar, perdeu décimos importantes em samba-enredo e, não por coincidência, daí veio o fato inusitado. No esquenta na avenida, cantou um dos sambas que perdeu no concurso de samba-enredo da escola, a obra da parceria de Antonio Gonzaga.

Inusitado, surpreendente, polêmico, várias foram as teses ditas no acontecido, a mais forte foi que a de que presidente Regina queria o samba derrotado e foi convencida do contrário por dirigentes e pela comunidade, daí teria aproveitado a situação para que seu samba preferido fosse tocado.

Não foi legal, foi algo no mínimo deselegante, passou a impressão para todo o público presente ou que acompanhava o desfile de que a escola estava culpando o samba e sua parceria para derrota lhe jogando assim aos leões.

Uma parceria com história na escola, que não caiu de para-quedas na mesma, que tem em um dos compositores o Marcelo Motta, um cara que conheço e sei do seu amor pela escola. Marcelo é um apaixonado, um entusiasta do Salgueiro vencedor de seis concursos na agremiação, faz parte de uma galera que está lá em todos os momentos, sejam bos ou ruins.

Marcelo, salgueirense apaixonado, evidentemente que ficou devastado com a derrota da escola, se sentiu culpado pelos décimos perdidos em seu quesito e devastado ficou no Desfile das Campeãs com a surpresa no esquenta. Sua imagem com a mão no queixo na hora do acontecido correu pelos sites de samba e nos deixou com compaixão pela grande pessoa e compositor e indignados.

Como eu escrevi acima, não sei qual foi a intenção do Salgueiro, pode até não ter sido de expor, humilhar, mas foi isso que ocorreu. A parceria foi exposta de uma forma cruel e injusta.

O glorioso Acadêmicos do Salgueiro, o líder do ranking da Liesa com todo merecimento e que todos os anos disputa o título do carnaval, nas últimas quarenta e duas disputas ganhou apenas dois campeonatos.

A culpa foi dos sambas nas quarenta derrotas? Evidentemente que não. Em 2011, por exemplo, o samba era apenas razoável, mas o desastre ocorreu durante o desfile no trabalho de harmonia, alguém pediu desculpa aos compositores? Alguém pediu desculpas aos compositores quando os sambas foram superiores aos desfiles como em 2007 com Candaces ou 2014 com Gaia?

Tem estátua na frente da quadra para os compositores de “Peguei um Ita no Norte”? Porque se um samba fez perder o Carnaval de 2017 todo mundo sabe que o que deu o título a escola em 1993 foi o samba, já o desfile em si foi comum, mas o samba (como eu disse aqui antes do Carnaval) fez toda a diferença e fez do desfile antológico.

Eu em 2012 compus com meus parceiros (entre eles Pedro Migão) um samba para o Acadêmicos do Dendê que se tornaria um desfile histórico para mim e a escola porque o Dendê seria campeão e desfilaria na Sapucaí em 2013. Não ocorreu por uma confusão da agremiação na contagem dos ritmistas. A escola achava que precisava de 60 e eram 70 o mínimo, botou 65, perdeu 1 ponto e assim o desfile que foi campeão nos quesitos acabou em quarto.

E 2014 também com Migão e outros parceiros fizemos um samba que venceu três prêmios, considerado um dos melhores da história da escola e o Dendê caiu. Alguém pediu desculpas para nós? Não e eu nem queria, sabem por quê?

Porque ninguém é o suficiente sozinho. Ao contrário do pensamento de alguns dirigentes de escolas pequenas que conheço no samba o “eu” não funciona. Não existe o “Eu venci”, “Eu fiz e aconteci”, “Me ajudem porque preciso de vocês”, “eu fracassei” ou “Me desculpem qualquer coisa”, é um discurso egoísta e arrogante. Escola de samba, por menor que algumas sejam, são empresas e tem que trabalhar como empresas, sempre com o “Nós”, um precisa do outro para a engrenagem funcionar, um tem que dar a mão para o outro então ninguém vence ou perde sozinho. Não foi o samba que perdeu, foi o Salgueiro, não foi o Samir Trindade e sua parceria que venceram na Portela, foi a Portela e assim sempre é.

Compositor não bota faca ou pistola no peito de dirigente para ganhar concurso. Joga pesado, sim, muitas vezes sujo, comprando comunidades ou fazendo promessas, mas a palavra final não é dele. Quem manda é a direção da escola e mais ainda o presidente.

Ano passado na Nação Insulana, ganhou o samba que eu queria por mais que o presidente não quisesse, mas eu que tinha mais experiência no assunto samba-enredo. Garanti a ele que o samba daria 10, fiz as mudanças necessárias, alguns dirigentes reclamaram das mudanças, mas o samba levou o 10 e a escola subiu. Porque é preciso responsabilidade, é preciso matar no peito e dizer é contigo quando o dirigente da determinada função entende dela. Cada um exercendo a função que lhe compete de forma satisfatória garante o sucesso. Assim é uma empresa.

O samba do Salgueiro foi escolhido pela direção e teve a chancela da presidente, então o quesito é de responsabilidade deles até porque as escolas sempre se vangloriam após as escolhas que os sambas são delas, não dos compositores.

Que fique a lição para os compositores de samba-enredo. Que parem de tratar os concursos apenas como vaidade e algo em que vale tudo, até pisar no pescoço da mãe para vencer. Compositor não sabe a força que tem por isso faço agora dessa coluna uma carta. Carta ao compositor de samba-enredo.

Caro compositor, você não é figurante, você não é um pedinte, você é protagonista, você é força de uma escola de samba. Por mais patrocínios, estrelas e mídia que as escolas de samba têm elas só abrem suas portas de agosto a outubro por sua causa. Só abrem as portas porque vocês movimentam as agremiações, não é o super carnavalesco midiático, popular e que faz chover na avenida que faz a agremiação existir nesse período, é você, você com seus sambas já que a escola pode desfilar sem um furacão estrelado como enredo ou um carnavalesco egotrip, mas não pode desfilar sem um samba-enredo, até porque o nome da brincadeira é desfile de escolas de SAMBA.

Vocês que compram ingressos pra cacete, muitas vezes caros, para por suas torcidas dentro da quadra, você que compra baldes e baldes de bebida do bar da agremiação, você que paga cantores caros, músicos, churrascos, ônibus de torcida, fazem cds, clipes, que movimentam as quadras e fazem existir carnaval no segundo semestre do ano. Então imponha-se como tal, saiba o tamanho de seu valor, a intensidade de sua força, não se deixe humilhar, não abaixe a cabeça para injustiças porque ama a agremiação e quer vencer o samba no ano seguinte. Amor só é bom se for correspondido, respeito só existe se for mútuo.

Meu forte abraço e eterno respeito Marcello Motta.

Meu abraço compositores de samba-enredo.

Que vocês um dia virem os donos do circo.

Twitter – @aloisiovillar

Facebook – Aloisio Villar

5 Replies to “Carta ao compositor de samba-enredo”

  1. O Salgueiro sempre perde pra ele mesmo. Mas vai criticar algo da gestão Regina… vão falar que é coisa de machista!! ¬¬

    Foi medíocre, bizarro e, fosse eu o Marcelo, nunca mais comporia para o Salgueiro até mudarem a presidência!

  2. Foi ridículo isso!!! Na próxima escolha, manda a Dona Regina fazer que nem o Ivo Meirelles, escolhe o samba e puxa a responsabilidade para si. Só espero que ela tenha a sabedoria como o Ivo teve, principalmente em 2011.

  3. Isso ocorre sempre e em todas as escolas, o que me incomoda é esta revolta com este acontecimento. E outros mais que ocorrem todo ano, não revoltam? Fica a pergunta.

  4. Eu como Compositor de Alguns Sambas em Diversas Cidades e Escolas de Samba .Fiquei muito Constrangido com o Acontecimento..Achei.uma Total Falta de Respeito aos Compositores de um Modo Geral, não só do Glorioso Salgueiro como de Uma Classe em todo o Brasil…Além do Vexame exposto vimos uma Presidente saltitante vibrando com o Acontecimento, Como quem diz, é isso aí..Esse seria o Samba que deveria vir na Avenida….Triste fato.marcado no Aniversário da Academia do Samba…Nem quem é SALGUEIRO entendeu….tomara que isso não vire Moda..

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