Pouco tempo após a divulgação oficial das faixas completas do CD do Grupo de Acesso, trago aos leitores a avaliação completa dos sambas deste grupo. Ressalto que esta opinião é definitiva e que não estou me baseando no manual de julgador. Apenas utilizei o critério de notas que variam de 9 a 10. Abaixo avalio as músicas que embalaram os desfiles de sexta-feira na Marquês de Sapucaí:

Acadêmicos da Rocinha

Enredo: “Nova Roma é Brasil, Brasil é Rocinha!”

Compositores: Edinho, Diego do Carmo, Vitor Coutinho, Rico Bernardes, Rafael Mikaiá e Wander Timbalada
Participação especial: Luiz Thiago, Alex Santos, Daniel Barbosa e Wilson Pessino

Intérprete: Leléu

De um enredo extremamente confuso surgiu um samba bastante agradável. O tema foi desenvolvido de maneira correta pelos compositores, que tentaram seguir o que a confusa sinopse dizia. O ponto forte deste samba é sem dúvida a melodia, bastante agradável e de variações interessantes. Muito por isso me agrada a melodia da cabeça do samba, de feliz composição para o que propunha a escola. Além disso a letra, apesar de um tanto confusa por culpa do enredo, tem boas sacadas como nos versos do refrão de meio que contagia quem está ouvindo. Em resumo, se não é um samba perfeito e nem antológico, com toda certeza funcionará bem para a ingrata missão de abrir os desfiles da Série A. Leléu tem bela atuação, sendo um dos destaques positivos do CD.

Nota: 9.7

Alegria da Zona Sul

Enredo: Ogum

Compositores: Pixulé, Meiners, Tubino, James Bernardes, Alex Bagé, André K, Gilson, José Mario, Junior e Victor Alves

Intérprete: Tiganá

De um enredo afro, surgiu outro bom resultado no CD. Os compositores foram extremamente felizes na composição para o desfile sobre “Ogum”. Este samba é forte desde o começo, no qual já invoca o “Vamos bater os tambores”. Posteriormente, temos mais um trecho fortíssimo que é o verso “Coragem, valentia e resistência”, que invoca o lado guerreiro de Ogum. Além da letra forte, a melodia muito bem trabalhada também ajuda neste bom samba. O ponto de mais destaque da melodia é visto no contagiante refrão de meio. Além disso, me encanta também a melodia dos versos finais da segunda parte. No geral, a Alegria conta com um belo samba para 2016, samba forte e afro que deve ter bom desempenho na avenida, mas que na comparação com outras obras sai prejudicado. Tiganá não brilha e nem decepciona em sua atuação segura e correta.

Nota: 9.9

Unidos do Porto da Pedra

Enredo: Palhaço Carequinha, paixão e orgulho de São Gonçalo. Tá certo ou não tá?

Compositores: Porkinho, Kiko Ribeiro, Vitor Gabriel, Daniel Morais, Marcio Souza, Bizzar, William do Barreto e Flavinho

Intérprete: Anderson Paz

Agora começa a ficar complicada a situação. O samba da Porto da Pedra infelizmente não conseguiu ficar à altura do homenageado pelo enredo. A sinopse não era nenhum grande complicador, mas acredito que, pela excessiva intenção de quase todos os compositores em tentarem fazer um samba alegre que acabou sendo oba-oba, os níveis da disputa e por consequência do vencedor ficaram aquém do imaginado. O samba é correto mas não empolga em nenhum momento e tem trechos de puro trash como nos versos: “Quando o Circo do Tigrão passar” e “Vamos juntos cantar, aquela musiquinha, parabéns Carequinha”, no qual a palavra “música” só foi para o diminutivo pra rimar com “Carequinha”. Enfim, é um samba apenas alegre e por isso não deve ficar na memória dos amantes do Carnaval. Anderson Paz teve atuação correta.

Nota: 9.5

Acadêmicos do Santa Cruz

Enredo: “Diz mata! Eu digo verde. A natureza veste a incerteza. E o amanhã?”

Compositores: Zé Gloria, André Felix, Júnior, Marquinho Beija-flor, Roni Remandiola, Betinho, De Araújo e J. Giovanni. Participação especial: Macumbinha

Intérprete: Carlos Pavaroti (Part. Especial: Gabby Moura)

Este é o samba mais superestimado do ano, talvez, pelo histórico recente da escola. É um bom samba inegavelmente, mas sofre na comparação com outros sambas do grupo. Entendo que o tema é batido e era difícil fazer algo novo, mas a sensação é de que a melodia já passou em outras escolas e em outros temas. A letra por outro lado consegue ser mais criativa em relação a melodia. Gosto de algumas sacadas como as dos versos: “Hoje a nossa fantasia só não será em vão, se houver mais união e menos hipocrisia”. Nestes versos, os compositores conseguiram fazer uma crítica pertinente e um bom alerta ao mundo moderno como é a ideia do enredo. No todo, é uma composição interessante – apesar de desequilibrada – com uma melodia batida e de letra criativa em relação ao tema da escola. O intérprete Pavaroti conta com a bela ajuda da cantora Gabby Moura para dar um molho especial à faixa. Boas atuações.

Nota: 9.8

Unidos do Viradouro

Enredo: “O Alabê de Jerusalém: A Saga de Ogundana”

Compositores: Paulo César Feital, Zé Gloria, Felipe Filósofo, Maria Preta e Fabio Borges William. Participação Especial: Zé Augusto e Bertolo

Intérprete: Zé Paulo

Esse é o samba do grupo e o samba do ano no Carnaval do Rio de Janeiro. Difícil não elogiar um samba que é praticamente perfeito em todos os seus versos, mais difícil ainda é não ser redundante nos elogios. O samba da escola de Niterói passeia de forma perfeita e com inspiração impressionante pelo tema da escola. A melodia é forte e ao mesmo tempo contagiante fazendo com que qualquer um cante o samba da escola. Muito por isso, falar da força e da beleza deste samba é chover no molhado. Entretanto, é importante que o refrão de meio mereça um destaque especial. Poucas vezes se viu tanta beleza e força como nos versos: “Meu nome é Alabê de Jerusalém, voltei a terra pra matar saudade, vim falar de amor, de tolerância e igualdade”. Além da felicidade ímpar no refrão de meio, a sacada genial deste samba está em minha opinião na segunda parte onde ele diz que: “O rei dos reis que conheci se espanta e chora com esta guerra santa que sangra este planeta azul”. Amigo, é de chorar de tão bonito. Enfim, como já foi dito acima, impossível não considerar este samba o samba do ano. Fantástico, Viradouro. A atuação de Zé Paulo mesmo não sendo a ideal, emociona quem escuta.

Nota: 10,0

Renascer de Jacarepaguá

Enredo: “Ibejís – Nas brincadeiras de criança: Os orixás que viraram santos no Brasil…”

Compositores: Cláudio Russo, Moacyr Luz e Teresa Cristina

Intérpretes: Diego Nicolau e Evandro Mallandro

Sabe aquele samba que você escuta, escuta, escuta e gosta cada vez mais? É esse. Se não é aclamado como o de 2015, este samba é brilhante e os compositores acertaram em cheio de novo. O samba tem uma melodia simplesmente espetacular e totalmente pertinente ao enredo. Além disso, falar da beleza da letra é apenas ressaltar o brilhante trabalho do trio. Os compositores foram totalmente felizes ao não tentar copiar o sucesso de 2015 e sim fazer uma composição alegre sem que ficasse oba-oba ou perdesse o meado do enredo proposto pela escola. Além do excelente resultado musical, que não possui nenhum momento de queda ou de não riqueza poética ou melódica, vale frisar que o samba foi feito na medida certa para que a sensacional dupla de intérpretes brilhasse na condução do samba. Com isso, Diego Nicolau e Evandro Malandro fazem a melhor gravação do disco e dão um molho a mais a um grande samba.

Nota: 10,0

Império da Tijuca

Enredo: “O tempo ruge e a Sapucaí é grande”

Compositores: Jussara Pereira, Dalton da Nelci, Luiza Fontella, Adriana Vieira e LID

Intérprete: Rogerinho

Lamentavelmente esse é o pior samba do grupo. Complicado falar de um samba que está tão abaixo do restante dos sambas do grupo. Se o enredo não é o desastre que muitos pintam, este samba é mal construído desde o refrão principal. A tristeza da letra que lembra a morte do homenageado no refrão e a alegria da melodia é um contraste complicado de se entender. Outro ponto negativo da obra é o refrão de meio que nada acrescenta ao enredo e que me parece totalmente alheio ao restante do samba. Para não dizer que não elogiei nada, gosto do verso que se lembra da sua veia de crítico de cinema e a tentativa dos compositores de fazerem uma composição mais alegre e popular para encerrar os desfiles. O intérprete Rogerinho se por um lado não consegue salvar o samba, também não decepciona.

Nota: 9,3

Qualquer discordância sobre a análise pode ser feita nos comentários, estarei respondendo a todos.

É isso

Um abraço!

15 Replies to “Os sambas de enredo da Série A (Grupo de Acesso) do Rio de Janeiro – sexta-feira”

  1. Parabéns pelo artigo, muito bem fundamentado. Eu concordo quando você fala que a nossa boa vontade com o samba da Santa Cruz também é devido ao histórico de sambas sofríveis da escola. Mas gosto bastante do samba que, se não é obra-prima, tem passagens inspiradas. Gosto particularmente de “pra cada palmo de devastação, nasce um ramo de amor”. Sobre Porto da Pedra e Império da Tijuca não precisa falar mais nada, você já exprimiu o sentimento geral. Viradouro é obra-prima, samba do ano em todas as divisões. E sobre a Renascer você tem total razão, é um samba que vai crescendo à medida que você houve mais vezes, trabalho sensacional dos compositores que caiu como uma luva pra gravação.

    1. Concordo com o comentário sobre a Santa Cruz, há trechos inspirados na letra que me causa até tristeza pela melodia ser tão batida. Porto da Pedra e Império da Tijuca é isso aí mesmo, infelizmente duas obras que não serão lembradas e jogam o nível da safra na média pra baixo. Viradouro é espetacular e Renascer também, sambas diferentes e que mesmo assim são impossíveis de enjoar.

      Obrigado pela leitura e pelo comentário
      Abraços!

  2. Mais uma vez, concordo com quase tudo. Acho o samba da Santa Cruz um dos melhores, mas não gostei tanto da gravação, principalmente e infelizmente, por causa da Gabby. Ela exagerou nas “manobras vocais” (não sei que nome dar pra isso hahaha), fazendo muitos malabarismos com a melodia e impedindo que as pessoas compreendam perfeitamente qual é, de fato, a melodia do samba em alguns trechos. A versão do CD é a que fica na cabeça das pessoas, tanto que, em muitos sambas, os cacos que os intérpretes fazem no CD fica na memória como se fizessem parte do samba. Com todas essas firulas, a melodia real do samba fica difícil de ser assimilada, ainda mais pra quem não conhece a versão dos compositores.

    Sobre a Porto da Pedra, o “musiquinha” não está no diminutivo só pra rimar, como a maioria das pessoas pensa. É uma alusão à música “Parabéns, Parabéns”, que Carequinha cantava:

    “chegou a hora de apagar a velinha
    vamos cantar aquela musiquinha
    parabéns pra você
    parabéns pra você
    pelo seu aniversário”

    A Viradouro tem, de fato, o samba do ano, ainda que eu prefira a versão do Wander. Renascer virou sinônimo de sambaço, e esse é mesmo mais um. Acho que vai dar certo demais no desfile. E Alegria, pra mim, tem o seu segundo melhor samba, só ficando atrás do de 2011. O da Rocinha cresceu demaaaais no CD, e muito por conta da atuação incrível do Leléu, principalmente na segunda parte. O do Império da Tijuca é lamentável, mas não dá pra negar que encaixou bem com Rogerinho. E com o passar das audições, já fica até um pouco mais aceitável, ainda que a letra não tenha como deixar de ser tosca.

    De qualquer forma, o primeiro dia da Série A será musicalmente bem interessante!
    Abraços! Bye bye, Bruninho kkk

    1. Sobre a Santa Cruz, eu não gosto tanto dessa melodia desde a versão concorrente com o Luizinho, mas de fato, a Gabby deu uma floreada mesmo.

      Porto da Pedra me cantaram isso, confesso que não me lembrava, mas ficou bem tosco de qualquer maneira, assim como o restante do samba.

      Império da Tijuca é complicado demais de avaliar, esse samba é uma coisa difícil de aceitar, principalmente esse refrão principal

      E concordo muito que a primeira noite será interessante no nível de sambas.

      Obrigado pelo comentário e pela leitura, André!
      Abraços! E bye bye ABC!

  3. Caro Bruno, na sua opinião, por que o samba do Alegria da Zona Sul não está a altura dos sambas da Viradouro e Renascer? Por causa da bandeira? Ou por que não tem compositores “famosos”? Em seu comentário, não consegui identificar aonde você retirou 0,1.

    1. Maurício, nesse caso é a famosa comparação. Eu acho o samba da Alegria excelente, só que não me agrada tanto quanto Viradouro e Renascer. Aí para não banalizar a nota 10, resolvi tirar 0,1 nesse caso e num caso parecido de uma escola do sábado.

      Só ressalto que não me baseei no regulamento e o 9,9 foi por causa do gosto pessoal mesmo, sem nenhuma questão de compositores/bandeira. Somente pela questão comparação mesmo.

      Obrigado pelo comentário e pela leitura.
      Abraços.

  4. Mais uma vez.. Bruno Parabens pelas ótimas analises… Eu sou seu fã e assumo… kkkkkk… Agora este samba da Império da Tijuca eh meio deprimente… ainda mais quando se analisa o ótimo histórico da escola… Viradouro simplesmente Acertou em cheio… Parabens mesmo….

  5. Escrevi em outro tópico e repito aqui: mesmo o da Alegria não me agradando por completo, acho que é o que mais pode encantar na avenida.

    Tirando Viradouro e Renascer, claro. Esses eu acho que já estão na história!

    Ótima análise!!!

    1. De fato, Ricardo, foi retirado de lá. O que conota ainda mais a falta de criatividade dos compositores que fizeram um samba bem pobre. Mas agradeço o alerta do amigo.

      Obrigado pela leitura e pelo comentário.
      Abraços!

  6. Bruno, parabéns pelo seu trabalho. No entanto gostaria de ressaltar que no samba enredo da Porto da Pedra “música” não foi para o diminutivo para rimar com carequinha. Ela é cantada, há anos, nas mesas de aniversário como “musiquinha”. “Vamos cantar aquela musiquinha, parabéns, parabéns, pelo seu aniversário”. Gravada em disco. Também concordo com você que o samba não foi dos melhores, na quadra. Mas cumpriu muito bem o seu papel na avenida. Minha admiração e um forte abraço.

  7. Liberade, liberdade! Abre as asas sobre nós !… Será que também foi falta de criatividade de Niltinho Tristeza, Preto Jóia, Vicentinho e Jurandir, utilizando trecho do hino para fazer o samba enredo da Imperatriz ???

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