Em 2012, logo após o carnaval, quando todos ainda estavam discutindo o tão contestado resultado do então grupo de Acesso A, a LIERJ surge para ocupar o lugar da fracassada LESGA. E já para 2013 é posta em prática uma ideia arriscada e, ao mesmo tempo, audaciosa: unir os dois principais grupos de acesso até então, os grupos A e B, em um só desfile. A receita parecia simples, um único grupo desfilando em dois dias de desfiles, na sexta e sábado de carnaval.

Porém a tarefa iria mostrar-se um pouco mais complexa.

À primeira vista, como poderíamos juntar, em um mesmo grupo, escolas que acabaram de sair da Intendente Magalhães e escolas que acabaram de descer do grupo Especial? A monstruosa diferença estrutural e financeira entre essas escolas ficara evidente logo nos primeiros momentos. Tínhamos então três grupos diferentes em apenas um. Um deles, de escolas de ponta, que habitualmente desfilavam ou brigavam por um lugar no Especial: casos da Viradouro, Império Serrano, Renascer, Estácio, Porto da Pedra.

Em um segundo degrau, tínhamos escolas tradicionais do antigo grupo A, como Santa Cruz, Império da Tijuca e Rocinha, que figuravam há alguns anos no grupo, porém ocupando posições intermediárias. E um terceiro e último time, de escolas que vinham lutando apenas pra se manter no grupo e as 8 escolas do grupo B. Oito escolas, a maioria delas tradicionais, mas que há muito tempo, em sua maioria, não sentiam o calor dos holofotes do sábado de carnaval.

20130210_052114Com 19 escolas e diferenças abissais, lá foram elas para a disputa em 2013. Os desfiles foram, em sua maioria, de um bom nível, mas ficou claro o que já se esperava, uma disparidade total de estilos, estrutura e plástica. Escolas com problemas de acabamento nos carros, sem fantasias ou parte delas, nas alas, com reduzido número de componentes, em suma, todos notaram que seria um longo caminho até que houvesse uma maior unidade e homogeneidade. A campeã, desta vez, sem contestações, a Império da Tijuca, fez um desfile maduro e sob o título “Negra, Pérola Mulher”, abocanhou o título e de quebra a volta ao Especial após 18 anos.

Podemos destacar ainda alguns excelentes desfiles, como o caso da vice-campeã, Viradouro. Em uma homenagem aos 60 anos do Salgueiro, a escola de Niterói pisou forte na avenida, com um samba-enredo que lembrava o estilo dos anos 70 e 80, curtinho, sem refrão, apenas com um bis que dizia “Tira da cabeça o que do bolso não dá”, clara referência à Fernando Pamplona.

Outro ponto alto e de certa forma, uma grata surpresa, foi o desfile e o 5º lugar da Acadêmicos da Rocinha. A escola deveria ter sido rebaixada, pois havia ficado em penúltimo lugar um ano antes, no derradeiro desfile da Lesga e foi salva pela mudança de regulamento. Com um enredo falando sobre a comida e os hábitos à mesa do brasileiro, especialmente o carioca, a escola desfilou leve, irreverente, destaque para a comissão de frente que fez uma representação de churrasquinho de gato em plena Sapucaí. O público entrou na onda e o resultado, merecido.

Outra surpresa, a Caprichosos ressurgiu com força e totalmente diferente. Após chegar ao Grupo B em 2012 e conquistar o título, a escola conseguiu um notável ganho de qualidade, e com um enredo que abordava o fanatismo e suas diferentes formas, mostrou-se a boa e velha Caprichosos. Com alegria, garra e uma certa dose de irreverência, beliscou o 6º lugar. Era o que bastava para apagar 4 anos de péssimos desfiles e uma volta, de fato, por cima.

Ser rebaixada no Especial, em 2012, não fez muito bem às escolas Renascer de Jacarepaguá e Porto da Pedra, respectivamente 8ª e 9ª colocadas. Com desfiles apáticos e sem grandes atrativos, ficaram posicionadas abaixo, inclusive, de duas escolas vindas do antigo grupo B, caso da Caprichosos, como dito acima e da Unidos de Padre Miguel, a 7ª colocada.

20130209_043354Reeditar samba também não pareceu ter sido a melhor escolha para esse ano de 2013. As duas escolas que levaram reedições pra avenida não foram bem. A União do Parque Curicica cantou Portela e seu samba de 1994 e, sentindo a falta de estrutura e o desfile entre as grandes, acabou apenas em 12º lugar. O samba foi muito bem cantado pela escola, o que acabou não sendo suficiente para voos mais altos. A Tradição foi a outra escola a reeditar, e também um samba da Portela, o de 1981. Cantar “Das maravilhas do mar, fez-se o esplendor de uma noite” deixou a escola apenas em 16º lugar, o último entre as escolas que ficaram no grupo. A plástica e a organização do desfile foram os pontos fracos da escola, que obteve de forma justa sua posição – muito ajudada pelo samba, é verdade.

E as três rebaixadas, de forma merecida, pareceram ter acabado com a fase polêmica do Acesso e ajudaram, em parte, a estruturar o grupo e fortalecer a ideia, até então, considerada “maluca”. A Sereno de Campo Grande , a Unidos do Jacarezinho e a Unidos da Vila Santa Teresa, esta última tendo desfilado com alas e composições sem parte ou totalidade das fantasias, foram as que pior se apresentaram.

Para 2014, 17 agremiações novamente se apresentaram. Desta vez, fomos surpreendidos por grandes desfiles, principalmente no segundo dia, sábado de carnaval. Além das tradicionais escolas, que mostraram alto nível, como Estácio, Viradouro, Porto da Pedra, entre outras, fomos brindados com ótimas apresentações da Cubango, Curicica, Império Serrano e Unidos de Padre Miguel.

A diferença entre as escolas mostrou-se menor e isso pode ser exemplificado se olharmos para o resultado final: o 10º lugar da Inocentes de Belford Roxo, recém rebaixada do Especial e o 13º lugar da Em Cima da Hora, campeã do Grupo B, nos fez perceber que, na prática, a avenida já estava mais equilibrada, independente do pavilhão ou posição no carnaval anterior.

20140228_221905Aquela ideia de 2013 de que tínhamos 3 grupos diferentes em um só, parece ter desaparecido. Ficou claro, após os desfiles, que a vida dos julgadores ia ficar sensivelmente mais difícil. O título ficou nas mãos da Viradouro e pôs fim aos 4 anos de espera e agonia fora da elite carnavalesca. Com um enredo em homenagem à Niterói, a festa pareceu completa. A escola rasgou a avenida com um samba de refrão fácil e cantado com entusiasmo pelos componentes e pela avenida.

Assim que a Viradouro encerrou o seu desfile, a Estácio de Sá entrou na avenida. A missão era dura. Nem o grande desfile, puxado por um samba muito bem cantado pela dupla Leandro Santos e Dominguinhos, foi capaz de tirar de Niterói o acesso. O vice-campeonato pareceu pouco para a Estácio, mas diante das circunstâncias mostrou-se um justo e louvável posto.

No sobe e desce do Grupo, podemos destacar cinco escolas que alcançaram colocações bem superiores ao ano anterior e outras quatro que perderam posições de forma bem significativa. A Unidos de Padre Miguel subiu 4 posições e veio do 7º para ocupar um belíssimo 3º lugar, a apenas seis décimos da Estácio. Outra escola que deu um salto foi a Cubango, última a desfilar, já na manhã de domingo. A agremiação que havia ficado em 11º um ano antes alcançou de forma justa e merecida a 5ª colocação. A Porto da Pedra recuperou-se enfim da queda do Especial e veio imponente. Como resultado, um 4º lugar, bem acima da 9ª colocação um ano antes. A União do Parque Curicica falou da cachaça e arrancou do 12º para o 7º lugar. Por fim, e não menos relevante, a Paraíso do Tuiuti reeditou Kizomba e subiu do modesto 13º lugar para o 8º posto.

20140302_062109Entre as que tiveram maior queda de rendimento em relação a sua posição no ano anterior, podemos citar o Império Serrano (de 3º para 6º lugar), a Caprichosos (de 6º para 9º), A Renascer de Jacarepaguá (da 8ª a 11ª posição) e a mais relevante, a Acadêmicos da Rocinha, que caiu do bom 5º lugar para o 16º posto. Com isso, Rocinha juntou-se à União de Jacarepaguá, 15ª colocada e à Tradição, 17ª e última. As três caíram para o Grupo B e, em 2015, terão a Intendente Magalhães como palco para seus desfiles.

É claro que essa dança de números é apenas curiosidade. Uma leve olhada para a estatística. Nada que se compare com a emoção e a paixão que cada desfile desperta.

Agora o gargalo começa a ficar ainda mais estreito. Para o ano que vem, apenas 15 escolas disputarão a tão sonhada vaga no Grupo Especial. Sete escolas na sexta de carnaval e mais oito escolas no sábado, terão sua sorte lançada e o pontapé para o novo desafio. A LIERJ já definiu a queda de duas escolas para o Grupo B, o que significa alcançar um total de 14 agremiações a partir de 2016, o que era desenhado desde a fundação da Liga. O tempo de desfile permanecerá de 55 minutos. Assim como o limite de 4 carros alegóricos.

O futuro do grupo parece bem definido a alinhado com a Liesa, responsável pelos desfiles do Grupo Especial. A fixação do número de escolas em 14 deve trazer, a curto prazo, duas realidades bem distintas e aí que devem ser concentrados os esforços da liga. Se por um lado, teremos cada vez mais desfiles grandiosos, competitivos e de qualidade, em que a briga por aquela única vaga no Especial se tornará cada vez mais dura, por outro lado o crescimento exponencial da Série A pode trazer um grande dilema. Exatamente aquele que discutimos no início do texto: a disparidade entre as escolas do grupo e aquela oriunda do Grupo B, da Intendente Magalhães.

20140302_020457Se na época da criação da liga o problema era a diferença dentro deu seu próprio grupo, agora os olhos devem voltar-se para quem está de fora também. Em 2015, 18 escolas desfilarão no Grupo B, pela Intendente e disputarão uma única vaguinha pra Série A. Mas, de que forma essa campeã será recebida na Sapucaí? Como conseguirá competir e se portar diante de escolas que estão compondo um tipo de Especial B? Como agremiações que desfilam com 1 carro e um tripé ou 2 carros, no máximo, com cerca de 800, 1000 componentes conseguirão, em menos de um ano, enfrentar escolas de peso, com muito mais estrutura e dinheiro, em um palco maior?

Talvez a resposta esteja na própria dinâmica do desfile, talvez seja preciso fazer apenas o que a LIERJ vem fazendo e o equilíbrio será natural. Mas ainda não sabemos. Se a liga conseguir a curto prazo resolver essa equação, alcançará a plenitude de sua maturidade, que por ora, apenas flerta.

Em Novembro, poderemos sentir o gostinho do que vem por aí, nas gravações oficiais dos sambas no CD da Série A, que já finalizado, chegará ao mercado em meados do mês. A safra mostra-se promissora e destaca-se como uma das melhores dos últimos anos. Nos próximos posts destacaremos mais novidades e impressões do pré-carnaval da Série A.

Até a próxima.

Imagens: Arquivo Pessoal do Editor

[N.do.E.: o jornalista Rodrigo Farias irá assinar uma coluna semanal, voltada especialmente a carnaval – mas não somente]

One Reply to “LIERJ flerta com a maturidade”

  1. São 18 escolas desfilando em dois dias, agora resta saber como a AESCRJ mudará o conceito, pois a Intendente com todo respeito, não dá mais pra fazer desfile das escolas do Grupo B, C, D, E. mas como já se tem o projeto do Sambódromo de Deodoro, que deva sair realmente do papel, fará com que as escolas filiadas a AESCRJ tenham estrutura melhor.

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