A notícia política da última semana foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) dando conta que o chamado “Mensalão Tucano”, iniciado em Minas Gerais e que atendeu também a políticos nacionais do PSDB, será julgado em primeira instância e não na corte máxima do país.

Isto significa que, dado o prazo exíguo para prescrição do processo, todos os acusados, na prática, estão livres da Justiça. Ainda que a primeira instância julgue antes dos prazos prescreverem, os recursos a tribunais superiores levarão fatalmente à impunidade dos acusados.

O Mensalão Tucano, para quem não sabe, foi a utilização do mesmo esquema do Mensalão petista, julgado, para arrecadação de recursos de campanha. Utilizava o mesmo Marcos Valério, publicitário, como artífice do esquema de geração de “Caixa Dois” para campanhas eleitorais. Entretanto, as semelhanças terminam aí.

O Mensalão petista foi julgado pelo STF ainda que apenas oito dos 40 réus tivessem direito ao chamado “foro privilegiado”. Além disso, se utilizou a teoria do “domínio do fato” – traduzindo do juridiquês, “ele devia saber” – para condenar José Dirceu e José Genoíno. O julgamento levou um tempo curto considerados os padrões brasileiros e a execução das sentenças, relativamente rápida. Ainda com alguns flagrantes de exceção – basta lembrar que no momento em que escrevo José Dirceu não somente se encontra em regime fechado como com restrições mesmo nesta forma, ainda que condenado ao regime semi aberto.

O Mensalão tucano, ainda que mais antigo, entrou depois na pauta de julgamento, mas ficou longo tempo dormindo nas gavetas do Ministro Gilmar Mendes – de notória ligação com o partido. Agora, com a devolução à primeira instância, todos os crimes cometidos prescreveram.

Onde quero chegar?

A condenação dos petistas foi saudada por articulistas mais afoitos – e reacionários – como um “novo tempo na política brasileira”: o tempo em que acusados de corrupção são punidos e presos. Um José Dirceu, um José Genoíno na cadeia significariam que “corruptos finalmente são punidos no Brasil”. Entretanto, como articulistas mais independentes já avisavam, o que houve foi apenas mais um exemplo de algo que muito vem acontecendo nos últimos anos: a judicialização da política.

O mensalão petista foi punido não por ser corrupto; foi punido por ser petista. E olha que aqui nem entro em controvérsias sobre as acusações, que são muitas.

Ou seja: o processo foi utilizado politicamente como uma forma de tentar tirar o PT do poder central, ou pelo voto, ou por algo similar ao que ocorreu no Paraguai. Vale lembrar da “tabelinha” entre o presidente do STF Joaquim Barbosa e setores da grande imprensa, sempre com decisões visando repercutir o máximo possível no noticiário. Ou ainda as vezes em que se atropelaram ritos do processo a fim de tornar a punição “mais rigorosa”.

Metro_de_São_PauloNem se precisa ir muito longe: está aí o escândalo do Metrô paulista, onde a empresa que pagou as propinas fez a denúncia, mostrou os documentos, entregou tudo à Justiça brasileira e está tudo parado em alguma gaveta empoeirada de algum tribunal. Apesar das evidências de propinas multimilionárias a altas autoridades, não há a menor perspectiva de punição – sequer investigação ou inquérito – a qualquer dos envolvidos. Qual o partido? O PSDB.

Outro bom exemplo: que fim levou o “Caso Paulo Preto”, que abordei aqui em 2010, onde o arrecadador de recursos do partido teria sumido com R$4 milhões de doações de empresas para um suposto “Caixa Dois”?

Parêntese: no momento em que escrevo o governador de São Paulo manobra abertamente para colocar um protegido como Procurador Geral do Estado. Por quê?

A bandeira do “combate à corrupção”, no Brasil, historicamente foi utilizada a partir das conveniências dos grupos ocupantes ou fora do poder. Não há a menor vontade de se estabelecer um combate a esta chaga brasileira quando persistem o financiamento privado de campanha e o modelo político extremamente fragmentado no Congresso, por exemplo. Ou quando se mantém inalterada a anacrônica lei de Licitações, a Lei 8.666, burocrática e um prato cheio para “criar dificuldades a fim de vender facilidades”.

Note-se que em outras ocasiões o próprio STF julgou decisões do Executivo que contrariavam a grupos com poder de pressão, a fim de impedir medidas exclusivas deste poder. Ainda chegou ao cúmulo de conceder liminares impedindo a tramitação de processos no Congresso antes de sua votação.

Finalizando, fica claro que o objetivo não é o de combater a corrupção, mas sim fazer política. E, caro leitor, se você comemorou “a punição dos corruptos” e que “a impunidade finalmente acabou”, há duas alternativas:

mensalao-10-marcos-valerio1 – Você é um otário que foi enganado pelo sistema político e midiático, sendo feito de massa de manobra para interesses políticos e partidários nem sempre confessáveis;

2 – Assuma que você torce pela oposição e que quer a remoção do governo atual, no voto ou no grito. Mas depois não grite por “democracia” – até porque os “salvadores do Judiciário” podem ser tudo, menos democratas. Estão ali a serviço de quem detém o poder, midiático ou financeiro.

2 Replies to “Otário é quem acredita em combate à corrupção”

  1. Existe uma diferença entre os dois processos que levou a esse desfecho. Alguns deputados da AP470 não pediram exoneração do cargo, fazendo com que a competência continuasse no STF até o fim do julgamento. Já na AP576, o Azeredo pediu pra sair assim que viu que ia ser preso, reiniciando o julgamento.
    É escroto, mas como bem colocado, é um sistema que não foi feito para punir os corruptos, permitindo esse tipo de manobra visando a impunidade.

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