barriga-de-gravida

Neste domingo, a coluna “Orun Ayé”, do compositor Aloísio Villar, retoma o encerramento de seu texto anterior partindo de algo pessoal para dissertar sobre o conceito de família.

Acrescento que a revelação por parte do ator José de Abreu de que é bissexual, ocorrida esta semana, também causou bastante frisson na imprensa e em redes sociais – corroborando o argumento do colunista.

A nova família

Como noticiei na coluna de semana passada, serei pai pela segunda vez. Sou pai da linda Ana Beatriz que fará quatro anos em maio e a partir de setembro serei pai de um menino ou menina.

Surpreendi todos os meus amigos e familiares com a notícia, já que não alertara a ninguém da possibilidade, só o dono do blog sabia da possibilidade por ser muito curioso e ser o Nelson Rubens das redes sociais.

[N.do.E.: nada disso: apenas sou uma pessoa inteligente e acertei na mosca a charada que ele mesmo propôs.]

Surpreendi mais ainda pelo fato de não estar namorando. Começamos o ano de 2013 e pessoas ainda acham que necessariamente tem que estar namorando ou casado para ter filhos.

Como muita gente sabe, inclusive os leitores deste blog, a Bia não é minha filha biológica. Sua mãe é uma ex-namorada antiga minha. Há quase dez anos nos separamos e um tempo depois ela começou uma relação estável com uma mulher – que dura até hoje.

Por um acidente de percurso ela engravidou e não sabia quem era o pai. A menina cresceria com um espaço em branco na parte do pai na certidão de nascimento, sem referência masculina.

Eu tinha passado com uma ex-namorada experiência de gravidez, mas ela perdeu a criança aos quatro meses de gestação. Eu caminhava para os trinta e três anos de idade e achava estar na hora de ser pai. Propus a ela registrar a Bia.

Nasceu assim minha história com a menina que mudou a minha vida. Era pra ser apenas um registro, uma presença oficial e transformou num caso de amor. A Bia seguramente é hoje a pessoa mais importante da minha vida, sinto todo o amor que ela tem por mim. Esse amor me reconforta nos momentos de dor, me alegre nos momentos tristes e faz de minha vida mais feliz – por principalmente saber que isso é para sempre.

Quase quatro anos depois, elas sentiram a necessidade de aumentar a família e dar um irmão à Bia. Eu sou filho único e senti na própria carne muitas vezes a necessidade de um irmão, alguém para dividir momentos e sentimentos.

Eu, já com quase trinta e sete anos, sem namoro ou perspectivas de casamento pensei em construir minha família, mas acabei construindo de uma forma diferente. De trás pra frente. Com dois filhos, um alicerce criado, vou com mais tranqüilidade para encontrar um amor, sem tem que correr o risco de, com a demora, ser “avô de meus filhos”.

Dessa vez foi tudo planejado entre nós três, pensado, calculado e depois de algum tempo, o que queríamos ocorreu. Essa criança que chegará em 2013 receberá todo amor e carinho possível. Não temos a fórmula certa para criar um filho, mas eu tento me basear em três alicerces para que tudo dê certo e eu crie um adulto feliz. Amor, educação e cultura. Dar essas três coisas não garantem a felicidade e caráter de ninguém, mas ajudam bastante.

Assim está sendo com a Bia, uma criança adorável, amorosa, esperta e carismática. Criar em cima desses três itens vem dando certo e assim será com o novo membro da família.

E por que estou dividindo isso tudo com vocês? Algo que a princípio parece tão pessoal?

Porque é um exemplo da família moderna, do século XXI.

É o certo? Não, não é o certo e nem é o errado. Cada um escolhe a sua maneira de ser feliz e criar sua família. É aquele clichê de rede social “Deus deu uma vida a cada um para que cada um cuide da sua”.

Quem me conhece bem ou mesmo acompanha essa coluna desde o início sabe do quanto a Bia é amada por mim, por suas “mães”, família e amigos e o quanto ela vem sendo bem criada mesmo não sendo de uma família de estereótipos.

Mas mesmo as pessoas sabendo disso, muita gente se assusta e faz uma série de perguntas  – como fizeram em razão da segunda gravidez. Sei que muitos torcem o nariz e fazem piadinhas por trás, mas eu não ligo porque EU sei que estou fazendo o certo. Não sou uma pessoa intransigente, sou facilmente convencido quando estou errado ou não tenho firmeza nas minhas opiniões.

Mas quando EU sei que estou certo ninguém, nem o Papa e seus preceitos retrógrados, me fazem mudar de idéia.

Porque a igreja e grande parte da população que vaga por esse planetinha azul hipócrita chamado Terra acha que família que presta é a formada por papai e mamãe casados e filhinhos.

Só que muitas vezes papai e mamãe vivem brigando em casa traumatizando filhos, sejam em discussões ou mesmo agressões físicas. Em muitas famílias papai chega bêbado em casa, bate na mamãe, nos filhinhos e vai assistir futebol na TV como se nada tivesse acontecido. 

Outras vezes o casal teve sua união selada pela igreja e a lei dos homens se separa. Papai arruma nova família e não liga mais para os filhinhos do primeiro casamento, mamãe cheia de rancor por ter sido trocada faz dia a dia a cabeça dos filhinhos contra o papai – nascendo assim sentimentos como mágoa e rancor.

Fora os casos mais raros, mas que acontecem de papai que é casado com mamãe visitar filhinho em seu quarto no meio da noite para fazer coisas que pais e filhos não devem fazer.

Quando eu nasci, meu pai era casado com minha mãe na igreja e no civil. Separaram-se um pouco depois e nunca tive um grande contato com meu pai. Nunca me deu presente de Natal, aniversário, nem mesmo me ligou para um “feliz aniversário”. Olha que nem é difícil de lembrar, porque meu aniversário sempre cai perto do dia dos pais. 

Minha mãe morreu e desde então a única pessoa do lado paterno da família que me procurou foi um tio, semanas depois da morte, para tentar me vender vassouras.

Meu pai sabe que a Bia existe, mas não sabe seu nome e nunca veio visitar mesmo sabendo onde mora.

Enfim, contei vários casos acima. Casos comuns, outras aberrações que existem, casos meus e o que causa estranhamento e uma série de perguntas é a família harmoniosa e feliz que estou criando.

Meus avós tinham problemas no casamento, meus pais tinham problemas, alguns tios tiveram, mas o que surpreende é justamente uma das relações mais tranqüilas e afetuosas dessa família desde que me entendo por gente.

Se eu morresse ou sumisse hoje já seria um pai melhor que o meu foi para mim e a maioria dos homens que conheço foram e são. Não sei quem criou os dogmas ou preceitos da família ideal ou família certa. Só sei que estão ultrapassados. Vivermos um novo tempo, uma nova sociedade. 

Não temos a família perfeita. Claro que discutimos, brigamos, que às vezes a Bia leva suas palmadas (nunca soube de alguém que se perdeu na vida ou criou rancor com os pais porque levou palmada no bumbum) ou nos estressamos. Mas o amor e o respeito que são fundamentais não só em uma família como em qualquer relação prevalecem.

Eu perdi minha mãe em 2005, a mãe da Bia perdeu seu padrinho e homem que lhe criou meses depois, sua companheira também perdeu o pai. Pessoas unidas pela dor.

Provamos que pessoas que se unem pela dor podem dar luz à alegria.

Um dia as pessoas entenderão que para se constituir família não é necessariamente ter um homem e uma mulher. Podem ser dois homens, duas mulheres, um homem e uma mulher ou duas mulheres, um homem e duas crianças como a nossa.

Um dia uma gravidez não trará tanto espanto e perguntas como se ao invés de trazer uma vida a Terra a pessoa que anunciou tivesse entrado em um colégio e matado trinta crianças.

Será no dia que as pessoas entenderem que para se construir uma família de verdade só é necessária uma coisa.

Amor.

(e-mail para o colunista: aloisiovillar@pedromigao.com.br)

3 Replies to “Orun Ayé – “A nova família””

  1. Eu acompanhei tua história de paternidade desde o inicio e nunca tive dúvidas que tu serias um grande pai para Biazinha que está mais linda a cada dia que passa.
    Família é muito mais do que papaizinho e mamãezinha casados perante Deus e os homens. Família é cumplicidade, respeito, tolerância, limites e principalmente amor.
    A minha é uma mistura de tudo isso, pais casados certinhos na igreja e no civil, que tiveram 04 filhos biológicos e um adotivo, seis netos, dois biológicos, três do filho adotado e um neto adotivo e negro. Onde sabemos que neste país as crianças negras para adoção são as ultimas escolhidas. Só sei dizer e com muito orgulho, que meu sobrinho é o negro mais lindo deste mundo, a tia ama demais. E para completar a minha família amada, serei mãe de duas crianças em breve (já em busca para adoção) e o pai será meu irmão gay e nossos filhos serão imensamente amados e terão uma grande família, disso não tenho dúvida nenhuma.
    Quando tu dizes “que para se construir uma família de verdade só é necessária uma coisa Amor.” Concordo plenamente. Dissestes tudo amigo.
    A minha tem amor de sobra e eu não a troco por nada neste mundo, amo incondicionalmente minha grande família unida e ouriçada.
    Todos os dias agradeço a Deus pela minha grande riqueza.
    Parabéns amigo pela coluna.

  2. Caro Aloísio, fico feliz por você expor assim a sua família. Tenho uma história parecida com a sua quando se trata de falar de filhas. Atualmente tenho três. A primeira veio para mim quando tinha um ano. Tive um relacionamento com a mãe dela e após a separação, a mãe foi embora, mas a filha ficou. Depois de alguns anos separados, minha ex-mulher descobriu ser portadora do vírus HIV e não sabia como ficaria a menina. Após saber da doença dela tratei de abrir um processo de reconhecimento de paternidade e 21 anos depois esta minha “menina” tornou-se mulher, casou-se e vai me dar uma neta linda em abril. A segunda, veio 16 anos depois da primeira. Esta sim é biológica. Atualmente com cinco anos é a detentora do título de furacão da casa. A terceira também não é biológica. Esta é filha da minha mulher atual. Tem 20 anos, extremamente estudiosa, mas muito bagunceira. O quarto dela é uma “zona”. O único problema é que amo e respeito as três da mesma forma. Não consigo fazer a distinção de filha biológica, adotada, emprestada. Enfim, aquela discriminação pela qual pessoas sempre fazem questão de demonstrar. De deixar claro que A é sua filha, B é adotada, C é isso, D aquilo. Gostaria de parabenizá-lo pelo exemplo e pela coragem de se expor. Nunca deixe se levar pela opinião das pessoas, sejam elas quem for. O que mais importa nessa vida é o AMOR por aqueles que prezamos, principalmente nossas filha(o)s. Um grande abraço, parabéns pelo bebê e pela coragem e ame este ser que vem aí da mesma forma que voce ama a Bia. Dê um grande abraço nesse meu amigo Pedro Migão também.

  3. Parabéns amigones pelo bebê que chega esse ano. Parabéns pela forma como está formando essa nova família. Concordo, so´é preciso amor… bjs

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