Na edição de hoje da coluna “Made in USA”, o advogado Rafael Rafic deixa um pouco de lado os esportes americanos para iniciar uma sequência de colunas sobre os Jogos Olímpicos.

Acrescento a informação que em 2016 teremos vagas em todos os esportes, de forma que o trabalho de formação dos atletas terá de ser acelerado.

Brasil Olímpico: O País do Esporte Coletivo?

Começo a série de colunas sobre os Jogos Olímpicos abordando um tópico que muito me incomoda.

È voz corrente no mundo olímpico (não apenas aqui) que o Brasil é muito forte nos esportes coletivos e que, refletindo as características gregárias de nosso povo, nos dedicamos demais aos mesmos. Assim não desenvolveríamos os esportes individuais, que dão mais de 85% das medalhas dos jogos olímpicos, e isso explicaria nosso baixo desempenho no quadro de medalhas.

Esse argumento sempre me incomodou porque não concordo em nada com ele.

Inicialmente, sempre discordei que a preferência nacional pelos esportes coletivos (que é indiscutível) possa servir de desculpa para não darmos a devida atenção à parte de alto rendimento dos esportes individuais. Especificamente o atletismo e a natação que oferecem uma chuva de medalhas nos Jogos Olímpicos [N.do.E.: acrescentaria também aí esportes como o boxe e o levantamento de peso, que igualmente distribuem muitas medalhas].

Mas analisemos com calma: é muito mais fácil criar um sentimento de ligação com um clube, uma instituição, do que com um atleta singular – que invariavelmente um dia se aposentará deixando seus fãs órfãos.

Exemplificando: é muito mais fácil criar uma ligação com o futebol torcendo pelo Flamengo, Vasco ou o Barcelona, existentes há mais de um século e que continuarão a existir por muito tempo; do que se ligar permanentemente ao atletismo por causa do sucesso de Maurren Maggi, que invariavelmente se aposentará no médio prazo.

Ainda há o fato de que, seja na infância, seja nos finais de semana da vida adulta, os esportes coletivos são mais jogados por proporcionarem maiores experiências de vida social do que a prática da maratona ou do tiro ao alvo. É justamente marcando uma pelada ou jogando um vôlei de praia que, entre os jogos, os amigos conversam, as pessoas se conhecem e as cervejas do fim de semana são tomadas.

É assim no Brasil, na Itália ou nos EUA. Logo, os esportes coletivos são os preferidos em todo mundo, com as grandes exceções apenas da China e da Índia (tênis de mesa e badminton respectivamente).

Ainda sim, isso não impede que os EUA (baseball, futebol americano, basquete e hóquei no gelo), a Rússia (futebol e vôlei), a Grã-Bretanha (futebol e rugby) e a Austrália (rugby e cricket) ganhem várias medalhas em esportes individuais jogos sim e no outro também.

Por isso, não aceito esse argumento simplório para justificar nosso fraco desempenho olímpico historicamente. Acredito na falta de um planejamento dos órgãos esportivos (e um pouco do Estado também) que dê a oportunidade de um grande número de crianças praticarem vários esportes e posteriormente aumentando nossa base de atletas de alto rendimento.

É dessa base que técnicos capacitados (que também não temos com sobras) garimpam os excepcionais que poderão competir em alto rendimento. Após finalmente encontrar as pessoas certas para o alto rendimento, é necessário continuar a treiná-los constantemente – com pessoas, equipamentos, torneios preparatórios pelo mundo e intercâmbio com países que possuam expertise na modalidade. Assim pode-se esperar que sempre melhorem suas técnicas, táticas e estratégias para terem chance de competir em âmbito mundial, ou seja, no nível em que os Jogos Olímpicos são disputados.

A boa notícia é que as cabeças pensantes do nosso comitê olímpico já perceberam isso e, pelo menos no treinamento dos atletas que já estão no alto rendimento, estamos continuamente melhorando as condições dos atletas. O Brasil terá em Londres uma das melhores estruturas de treinamento, com direito a um centro exclusivo no Crystal Palace (algo inédito para o Brasil).

Esse trabalho é árduo, lento e mambembe, pois só é feito em alguns esportes (privilegiados pelas medalhas oferecidas e pelo nível que o Brasil já apresenta) e só na ponta da pirâmide. O trabalho de base, apesar de ter havido melhora, ainda tem muito o que caminhar. De qualquer forma ele já começa a apresentar bons resultados.

Também não consigo concordar com essa nossa dita força nos esportes coletivos. Que força é essa que nos deu apenas três das vinte medalhas de ouro da nossa história – cinco se incluirmos o vôlei de praia? Pior ainda: todas as três medalhas foram no mesmíssimo esporte: o vôlei. Ou seja, essa dita “força” nos esportes coletivos pode se resumir a apenas um trabalho brilhante feito por apenas uma confederação durante mais de vinte anos.

Afinal de contas, por qualquer crítica que possa ser feita à dupla Nuzman/Graça, é inegável que ambos deram ao vôlei nacional a estrutura necessária fora de quadra para que nos tornássemos a primeira potência mundial do vôlei. Até hoje é a única confederação que tem um trabalho respeitável de âmbito nacional de aumento de base e garimpagem de talentos (o ‘Viva Vôlei’).

Mesmo no basquete, um esporte historicamente dito como nosso forte nosso, temos uma potência mundial que nos é intransponível, os EUA. E a seleção masculina ficou 16 anos sem levar um time para os Jogos Olímpicos.

E o que dizer do futebol? Esse esporte que monopoliza 95% das atenções esportivas nacionais (até durante os Jogos Olímpicos), criando o que eu chamo de “monocultura esportiva”, ainda não foi capaz de trazer um mísero ouro dos Jogos, seja no masculino, seja no feminino.

No handball, nunca chegamos sequer às quartas de final e no hóquei de grama mal temos um time formado, enquanto somos obrigados a ver as “leonas” argentinas n°1 do ranking mundial.

Logo, eu também não aceito o argumento que somos fortes nos espores coletivos. Nós estamos é atrasados mesmo na preparação de atletas, seja nos coletivos, seja nos individuais.

Por fim, faço uma análise das chances de nossos esportes coletivos em Londres.

Vôlei

Ambas as seleções não apresentam o vôlei vistoso, acima da concorrência, que apresentaram nos ciclos olímpicos de 2004 e 2008. Ainda sim, ambas estão classificadas e sem dúvidas disputarão o ouro em Londres. Apenas não serão mais a maior favorita como foi em 2008.

A médio prazo me preocupa a situação da Confederação. O atual presidente Ary Graça é candidato favorito à presidente da federação internacional nas eleições após os Jogos e eu não vislumbro atualmente um substituto pronto.

Masculino: Depois de duas gerações sensacionais que criaram variações técnicas e táticas hoje imitadas por todas as grandes seleções (destaco a famosa bola de “tempo atrás” que até hoje é bastante imitada e pouco acertada), tivemos uma transição para a terceira um tanto atrapalhada, de tal forma que devemos ir a Londres com a geração 2,5.

Tanto isso é verdade que Bernardinho se rendeu e convocou o levantador Ricardinho de volta após um afastamento de quatro anos. O grupo começa a apresentar sinais de cansaço do método Bernardinho e acho muito difícil a manutenção dele como técnico após a competição.

Mesmo com a volta de Ricardinho a seleção jogou muito mal a primeira rodada da Liga Mundial 2012. Porém já percebi muitas melhoras na segunda rodada e prefiro creditar o desempenho ruim da primeira rodada à falta de entrosamento do time com o “novo” levantador.

A Rússia está jogando um vôlei vistoso com um levantador muito talentoso (novidade por lá), Grankin, e é ligeira favorita. Mas o torneio será uma pedreira com cinco seleções disputando o ouro e mais duas ou três que não aspiram ao lugar mais alto do pódio, mas que podem fazer alguém tropeçar no meio do caminho. Minha aposta: Brasil medalha, não sei a cor.

Feminino: após a aposentadoria de duas levantadoras fora de série, Fernanda Venturini e Fofão, viramos uma Rússia: um time com cinco atacantes sensacionais que não tem quem levante a bola para elas.

Só que, diferentemente da Rússia, não temos altura, o que nos faz necessitar muito de uma boa levantadora. Essa falta tem matado a seleção feminina. A boa notícia é que achamos essa levantadora: a Fabíola do Sollys/Osasco. Agora só falta ela jogar na seleção o que joga no clube, o que não ocorreu até o final do ano passado. Acho que com os dois meses de treinamento antes dos jogos esse problema será resolvido.

Graças a zebras inacreditáveis nos torneios qualificatórios, o nível das seleções femininas em Londres será o pior dos últimos anos. Creio que apenas EUA, Rússia, Itália e Brasil têm chances de medalha (não aposto um centavo no time chinês). Minha aposta: Fabíola se acerta e o Brasil defende o título olímpico.

Basquete

Mesmo classificando as duas equipes após 16 anos, o basquete vem capenga mais uma vez já que só uma seleção é forte e luta por medalha. A diferença é que, em uma inversão, dessa vez é a seleção masculina que virá forte.

Também me preocupa a situação da confederação. Após mais de uma década de desmandos de Gerasime Bosikis, o “Grego”, destruindo o basquete nacional (ele foi grande responsável pelo hiato de 16 anos da seleção masculina nos Jogos), Carlos Nunes foi eleito em 2009 e colocou a CBB no rumo correto.

Porém em 2013 haverá novas eleições e “Grego”, ainda presidente da confederação sul-americana, já se articula para ser candidato. Que nossas federações estaduais tenham juízo e não estraguem o trabalho de Nunes.

Masculino: após um longo lapso de 16 anos, a seleção volta aos Jogos Olímpicos – e volta com força.

Apesar da lesão do herói da classificação, o pivô Rafael Hettsheimeir, iremos para Londres com a melhor seleção brasileira da história, com direito a quatro jogadores da NBA e ótimos jogadores da liga européia.

Graças à acertada contratação do técnico argentino Rubén Magnano (ouro olímpico em 2004, na foto), os problemas de entrosamento da seleção diminuíram bastante e atualmente ela realmente atua como um time. Ela também está com foco na defesa (falha histórica do Brasil).

Se não cruzarmos com os EUA nas quartas-de-final, essa seleção luta por medalha. Alias os jogadores americanos, um a um, estão ou se machucando ou abdicando dos Jogos. Dependendo do time que sobrar, sei não…

Os EUA são favoritíssimos, mas Brasil, Espanha, Argentina, França e Grécia (a ultima sem vaga garantida ainda) correm por fora. Minha aposta: bronze ou 4° lugar.

Feminino: aqui está o grande calo da gestão Carlos Nunes, mas não por culpa dele. Por não ser especialista no basquete feminino, ele corretamente nomeou uma supervisora técnica para a mesma: Hortência.

Porém ela não mostrou fora das quadras o mesmo talento que tinha dentro das quatro linhas e, na minha opinião, só embrulhou os pés com as mãos no exercício do cargo. Por isso, aqui não estou entusiasmado e não vejo o Brasil indo longe.

Os EUA são favoritos ao cubo e as outras medalhas serão disputadas por Austrália, Rússia e mais dois ou três times europeus que serão definidos no pré-olímpico mundial no fim deste mês. Aposta: Brasil cai nas quartas.

Futebol

Aqui o Brasil sempre morreu na praia, será diferente em Wembley?

Também me preocupa a situação da CBF, mas isso é assunto para os boleiros Pedro Migão, Walter Monteiro e Affonso Romero.

Masculino: aqui times que deveriam ir bem caem na primeira fase e zebras chegam à semifinal. O que posso dizer é que pelo que vi da seleção olímpica, ela está bem entrosada e tem um talento que pode desequilibrar a qualquer momento: Neymar. Mesmo que ele não faça nada, ele atrai naturalmente dois defensores. Se tem dois defensores em um atacante, naturalmente alguém sobrará livre sempre. É a melhor equipe que levamos desde 1996, só que sem técnico desta vez.

Os ‘gatos’ africanos classificaram três times sem sal e a Argentina está fora. Das seleções classificadas apenas Espanha e Suíça me assustam. Alias, a seleção espanhola joga coletivamente até melhor que a atual campeã mundial. Para mim é favorita. Aposta: Brasil medalha, mas não será dourada.

Feminino: Suécia, EUA, Brasil, Japão e França (a última um pouco atrás das outras) sobram muito na turma. Será entre estas cinco que a disputa por medalha ocorrerá.

O Brasil tem o time mais técnico e talentoso, mas o futebol feminino cada vez está mais físico e abrutalhado, em um fenômeno feio igualzinho ao que está ocorrendo no masculino, que está matando a beleza do futebol com a frouxidão dos árbitros para marcar faltas. Como é justamente porte físico que o falta à nossa seleção (na Copa de 2011 os EUA com 10 estavam correndo mais que o Brasil com 11 ao fim do jogo) não a vejo passando por EUA ou Suécia.

Aqui ocorre algo interessante: da mesma forma que o Brasil dificilmente passa pelos EUA, os EUA podem perder (como já perderam) para as japonesas. Elas, por sua vez, podem ser presas fáceis para o talento brasileiro. Sorte nos cruzamentos será fundamental para todos. Não há favoritos dentro do grupo acima mencionado. Aposta: Brasil medalha, não sei a cor.

Handebol

O Brasil nunca chegou ao mesmo nível dos grandes times europeus do handebol e só classifica times para os Jogos Olímpicos graças ao ridículo nível do esporte nas Américas, no qual o Brasil por ser caolho se sobressai em cima dos cegos.

No feminino não há ninguém que nos acompanhe. No masculino, temos apenas a Argentina, contra quem sempre fazemos jogos épicos na final do Pan-Americano na disputa pela vaga. Após ganharmos em 2003 e 2007, perdemos para eles em 2011 e por isso só iremos para Londres com o time feminino.

Feminino: esse time foi a minha grande decepção em Pequim. Eu vi esse time jogando de igual para igual com o ótimo time dinamarquês um mês antes dos Jogos em 2008. Eu apostava, contra todos os prognósticos, em uma medalha de bronze.

Quando chegaram os jogos olímpicos, vi uma seleção que jogou de igual para igual contra as gigantes Alemanha, Hungria e Suécia apenas para perder dois jogos e deixar empatar um nos segundos finais por causa dos nervos. Depois disso me desiludi um pouco com o time e deixei de acompanhá-lo tão de perto.

Mas pelo que já vi ultimamente o time que levaremos a Londres é inferior ao de quatro anos atrás e ainda não ajustou os nervos. Assim, seremos presas fáceis os times europeus, que devem dominar o torneio. Aposta: Brasil cai ainda na primeira fase.

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