O ex-mandatário renunciou alegando “problemas de saúde” – que realmente existem – mas está claro para todo mundo que acompanha minimamente o futebol que a razão principal é o desdobramento do escândalo das propinas da ISL, que já escrevi aqui por ocasião da resenha do livro “Jogo Sujo” e que está em vias de ser totalmente revelado ao público. Além disso os desentendimentos com o governo federal e com a própria Fifa por ocasião da organização da Copa de 2014 e a revelação de outras suspeitas de corrupção também parecem ter pesado na decisão – que, aliás, me foi antecipada há mais de um mês por uma fonte otimamente informada.
Digo que fica um travo amargo na boca porque não parece que a CBF vá ficar melhor após a esperada saída do mandatário. Por outro lado a renúncia não foi provocada por novos ventos na entidade, mas sim para prolongar o atual estado de coisas. Teremos uma CBF de Ricardo Teixeira sem o próprio – talvez até pior em certos aspectos.
Não sou daqueles que demonizam o dirigente totalmente. Como tudo na vida houve coisas boas e coisas ruins.
Diria que foram méritos a criação da Copa do Brasil, a instituição dos pontos corridos em 2003 e a organização do caixa da entidade: em que pesem algumas operações notoriamente lesivas à entidade hoje a Confederação parece dispor de uma situação financeira confortável, com bons contratos de publicidade. A Seleção obteve dois títulos mundiais e fez mais uma final e, mal ou bem, conquistamos o direito de sediar uma Copa do Mundo.
Destacados os pontos positivos, vamos às mazelas, que foram muitas. Nem citarei aqui os escândalos de corrupção envolvendo a CBF e seu (agora ex) mandatário, fartamente explanados e que são a principal razão da saída. Mas aos efeitos do futebol brasileiro como um todo.
Em sua gestão Teixeira optou por fortalecer a Seleção em detrimento dos clubes. A visão era de que o futebol brasileiro é simples exportador de “pé de obra” para a Europa e outros centros, com os clubes locais não importando. Grosso modo é a repetição da velha política econômica de exportar produtos agrícolas e e importar industrializados, adaptada ao futebol. Os clubes estão mais endividados e mais fracos, enquanto a Seleção desfruta de ótima situação financeira. É uma paradoxo curioso: a Seleção está bem financeiramente enquanto os clubes foram abandonados à própria sorte. Um modelo a longo prazo insustentável – e começa a ficar claro isso.
Apesar das Séries A e B estarem razoavelmente organizadas, o modelo adotado para as divisões inferiores mostrou que os clubes menores não eram considerados no quadro do futebol brasileiro: as Séries C e D padecem de problemas de organização e viabilização economico-financeira. Estas foram abandonadas à própria sorte.
No âmbito nacional houve uma maior racionalização do calendário, mas se avançou muito pouco na profissionalização das gestões, nas relações com a televisão e em outras questões adjacentes. Houve pelo menos dois grandes escândalos de arbitragem, os Casos “Ivens Mendes” e “Edílson” – curiosamente, nos dois casos o Corínthians foi o clube principal beneficiado. Ainda deu de presente ao clube paulista um estádio novinho em folha, naquele que a meu ver é de longe o maior escândalo desta organização da Copa do Mundo de 2014.
Também ficam como marcas indeléveis o desprezo pela opinião pública e por parte da imprensa.
A saída de Teixeira seria salutar se envolvesse a entrada de pessoas novas, com ideias modernas e que dessem à entidade e ao futebol brasileiro maiores profissionalismo, justiça e transparência. Entretanto, ao que parece incrivelmente teremos regressão em todos estes aspectos com a saída do mandatário. Explico.
Com a saída de Teixeira, que deixou tudo bastante amarrado para que não houvesse uma devassa nas contas da entidade ou houvesse mudanças substanciais na gestão da entidade, apesar de estar assumindo o vice mais velho José Maria Marin o poder estará de fato nas mãos do Presidente da Federação Paulista Marco Polo Del Nero e do Diretor de Seleções Andrés Sanchez (ex-presidente do Corínthians). Isto significa que pelo menos em termos internos teremos duas castas de clubes para a CBF: os paulistas e o resto.
Del Nero já afirmou em mais de uma oportunidade que em sua visão o Campeonato Brasileiro ideal teria de dez a doze clubes do estado de São Paulo. Lógico que ele estava defendendo os interesses da Federação da qual era presidente, mas conhecendo os cartolas brasileiros arriscaria afirmar que a CBF será dirigida como uma imensa Federação Paulista de Futebol. Isto a médio prazo tende a ser péssimo para os clubes de fora do estado e em especial para o Campeonato Brasileiro. Também acho que se deve sepultar quaisquer esperanças de ver mudanças no calendário a fim de diminuir o tamanho dos Estaduais, que hoje representam quatro meses de partidas absolutamente inúteis.
Quanto ao Comitê Local da Copa, a meu ver a tendência seria a de uma maior participação do Governo Federal, que em última instância é quem está pagando a conta. Não era segredo para ninguém que a Presidenta Dilma Roussef estava muito insatisfeita com Ricardo Teixeira e lamentando não poder intervir diretamente na entidade. Agora resta ver qual será a postura dos novos mandatários da entidade em relação ao Governo Federal.
Ao fim e ao cabo, a renúncia de Ricardo Teixeira somente serviu para que ele se livrasse da responsabilidade sobre os diversos escândalos de corrupção e malversação de verbas dos quais era suspeito e permitir que leve um final de vida sossegado em Miami. Mal comparando, me lembrei daqueles senadores e deputados que renunciavam aos mandatos para não serem cassados por seus pares.
Ou seja, caro leitor: infelizmente esta é uma “vitória de Pirro”. Teremos um “teixeirismo sem Teixeira” a partir de agora – em certos aspectos, pior. E o presidente que sai não responderá pelos seus atos – na prática, uma gigantesca pizza.
Portanto, não podemos comemorar, infelizmente.
(Charges: Mário Alberto, Lance)
Texeira é como o Lula. Nao é o ideal, tem diversos porens, mas só de lembrar do que tinha antes eu dou graças a deus por ele ter chegado lá.
Abs, MArco.