Em um dos primeiros posts deste Ouro de Tolo, escrevi uma espécie de “Decálogo de Gestão” rubro negro, com algumas sugestões de medidas que melhorariam bastante a precária administração do “Mais Querido”. 
Incrivelmente, o texto ainda está bastante atual. Trago aqui uma versão revisada e ampliada, de forma a contribuir com a melhoria dos aspectos administrativos. Vale lembrar que o novo contrato da televisão, em que pese ter sido aquém do que se poderia, traz o clube a um novo patamar financeiro. Espero que seja bem utilizado para garantir um futuro auspicioso ao Flamengo.
São algumas pequenas idéias que nem precisam, necessariamente, da troca de Diretoria ou de reformas estatutárias para serem implementadas. Com pequenas adaptações, serviriam também para muitos clubes brasileiros.
1) Gerenciamento de Contratos:
Esta é uma idéia simples e que evita muitas dores de cabeça. Trata-se de manter um controle de todos os contratos que o clube tem, com principais cláusulas, datas de pagamento e de término do contrato.
Evitaria, por exemplo, o problema ocorrido na troca do fornecedor de material esportivo. Bastava ter notificado judicialmente o anterior na primeira falta de material registrada. Na hora em que quis romper o contrato, bastava apresentar as notificações.
Outra vantagem é permitir que se tenha um controle de todos os contratos de materiais e serviços, em especial na construção do CT (Centro de Treinamento). Isto evita redundâncias e permite que se façam grandes contratos de material, com economias de escala.
2) Planejamento Plurianual:
No início de cada gestão, estabelecer metas e previsões orçamentárias para cada setor do clube, com a respectiva cobrança, para os três anos.
Assim se evita o “barata voa” que ocorre todo meio de ano no futebol, onde muitas vezes acaba se contratando sem critério – gastando muito mais. Também evita as famosas “contratações emergenciais”, que deixam muitas dúvidas sobre tais transações.
3) Adequação Orçamentária:
Não se tem como montar um time caro e estar cheio de penhoras ou sem o CT construído. Listar as despesas fixas – dívidas, penhoras, estrutura et alli – e, a partir daí, determinar o teto orçamentário do futebol.

Vale lembrar que de acordo com o último balanço o clube deixou novamente de pagar impostos federais e estaduais. Este é um processo de consequencias bastante nefastas mais á frente.

Se o clube só tem grana para uma folha salarial de R$ 500 mil, que seja.
Outro ponto é respeitar o orçamento anteriormente feito, ou fazer um se não houver. Planejamento é tudo.
4) Estrutura
Um CT estruturado se faz fundamental, para dar tranquilidade de trabalho, evitar os corneteiros e se trabalhar em tempo integral. O Ninho do Urubu já é sede dos treinos mas há muito a ser feito.
Ah, não tem dinheiro ? Busca através de parcerias, ou de sócio torcedor. O marketing está aí para isso. Vale lembrar também que parte do valor das luvas do novo contrato de televisão – estimadas em pouco mais de R$ 40 milhões –  pode ser perfeitamente utilizado para terminar a construção do Ninho do Urubu.
5) Profissionalização das Pessoas
Se não dá para profissionalizar a gestão, pelo menos as pessoas. Contratar por competência. Afastar pessoas que tenham outros interesses no futebol. Montar uma estrutura que permita um mínimo de organização.
Infelizmente, este é um ponto que parece ter piorado muito na atual gestão de Patrícia Amorim. Basta ver que o responsável pelo futebol hoje, na prática, é o Vice de Finanças Michel Levy – e isto é uma aberração.
6) Marketing
Trazer realmente o torcedor para junto do clube. Fazer “visitas guiadas” à Gávea. Estabelecer um bom relacionamento com os parceiros do clube, estruturando uma relação “ganha-ganha”. Infelizmente, hoje a política é de que o torcedor “quanto mais longe estiver, melhor”.
O trabalho feito é muito ruim. Basta ver o tempo em que o clube está sem um “patrocinador master” para a sua camisa de jogo. A inação e a acomodação são a marca do marketing rubro negro – e isto desvaloriza tremendamente a marca que deveria ser valorizada pelo que é: a mais importante do futebol brasileiro.
A verdade é que qualquer estagiário do terceiro período de marketing conseguiria fazer melhor… Por outro lado, a impressão é que financeiramente o clube está vivendo de antecipações de cotas televisivas – o que a médio prazo é uma “bomba relógio”.
7) Buscar novas fontes de recursos
Trabalhar o torcedor a fim de que este possa consumir produtos do clube. Buscar estrutura através de parcerias.
8) Estudar os “benchmarks”
Quem é os líder do processo aqui no Brasil? O Inter. Conhecer, visitar, aprender, ver o que pode ser feito e o que podemos aprender com cada um deles.
Eu mesmo já relatei aqui minhas visitas ao Atlético-PR e ao ABC de Natal. Uma passagem aérea para Curitiba ou Natal não sai tão cara. O time nordestino, recém promovido à Série B, tem um modelo de marketing muito melhor que o nosso.
A Diretoria deveria se envergonhar disso.
9) Um bom projeto de sócio-torcedor
Um projeto de sócio torcedor que dê prioridade e descontos em ingressos, descontos em produtos oficiais do clube e em produtos de parceiros e direito – ainda que com limitações – de voto pode angariar de forma conservadora 50 mil novas inscrições, tomando por base os números de projetos como o vascaíno ou mesmo o do ABC – que tem cerca de sete mil sócios.
Cobrando-se uma taxa de inscrição de R$ 100 (parceláveis) e uma mensalidade de R$ 80, são, por baixo, R$ 4 milhões mensais de receita, com R$ 5 milhões de entrada imediata.
Resolve-se o problema das dívidas e se banca boa parte dos custos do clube, sem depender de outras fontes de renda e sem estabelecer relação de “mendicância” com a televisão.
Outra possibilidade, que não exclui a do sócio-torcedor, é a criação de um “torcedor oficial’, com mensalidade mais baixa, carteirinha e descontos em produtos oficiais – em menor escala que o sócio-torcedor.
A questão é que a atual diretoria pretende fechar ainda mais a já corroída estrutura de poder do clube, inclusive restringindo o direito de voto na mais recente proposta de reforma do Estatuto – e isso significa manter o torcedor o mais afastado possível.
10) Transparência e Governança Corporativa
Transparência de gestão. Controles internos. Contas na internet. Isso é o básico, pois traz credibilidade.
O balanço patrimonial do clube, além de irreal, não prima exatamente pela transparência. Sejamos justos: ainda que de forma bastante atabalhoada o atual presidente do Conselho Fiscal tem tentado fazer valer a sua função no clube. Entretanto, isso é muito pouco.
Reafirmo que não apóio quaisquer das correntes políticas do clube e defendo que novas pessoas, com idéias novas, possam influir em seus destinos. Me preocupa sobremaneira a falta de renovação de quadros: de 1977 para cá as únicas novidades na política interna do clube foram Kleber Leite, Edmundo Santos Silva e Patrícia Amorim, que não significaram, necessariamente, revoluções administrativas – muito pelo contrário.
Não é exagero dizer que o clube basicamente ainda é gerido da mesma forma que em 1980 – e isso, hoje, é inaceitável.
(Foto: Pedro Migão, 2008. A sede do clube não está muito diferente hoje)

3 Replies to “Decálogo de Gestão Rubro negro”

  1. Incrível o texto continuar pertinente e atual. Passam os anos e a administração esportiva continua a mesma e nas mãos de amadores. O caso do Flamengo, que eu pude acompanhar de perto (além de torcedor e sócio, fui dirigente por um período breve), é sintomático e vergonhoso. As diretorias são avaliadas pelos resultados imediatos, por um ou outro campeonato, e não pelo legado que deixam. Se o mesmo decálogo for publicado aqui nos próximos 10 anos, permanecerá novo e intocado.

  2. Pedro, meus parabéns pelo texto. Por este e pelo do patrocínio master. São de pessoas como você que o Flamengo precisa para evoluir efetivamente. Pessoas com mentalidade profissional e empreendedora e, fundamentalmente, que não tenham interesses escusos e parasitários. Terias, por acaso, interesse em concorrer à presidência?

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