Em um post do ano passado do blog, escrevi sobre o TibaNews, aquele que considero o primeiro “blog’ brasileiro. Era assinado pelo jornalista Celso Itiberê e eu era um dos colaboradores.
Do grupo que se formou surgiu uma brincadeira em forma de campeonato de kart indoor, que intitulamos de “Fórmula Tiba”. Ocorreu nos anos de 1999 e 2000, deixou saudades e chegou a reunir quase 50 pessoas em algumas provas.
O recente comentário sobre o buggy em Barra do Piraí me evocou algumas histórias daquele tempo, e reparto uma com vocês aqui.
Era a terceira ou quarta etapa do campeonato de 2000, na antiga pista do Shopping Nova América – que hoje está no Norte Shopping Tínhamos um grupo de pilotos semi-profissionais de kart, entre  os participantes da brincadeira, obviamente em um nível muito mais alto e que até aquele momento dominava a classificação geral.
Eu não era exatamente uma sumidade, mas o treino somado a uma boa visão tática e a trinta quilos a menos – eu pesava 57 quilos à época – me davam condição de andar no pelotão intermediário na classificação geral e entre os líderes da minha classe, que era a Graduados, intermediária . Eu havia sido campeão da Iniciantes ano anterior e, por isso, subido de grau.
Como não cabia todo mundo junto na pista, fazíamos as baterias com 50 voltas estipuladas – aproximadamente 16 a 17 minutos – e juntávamos os tempos, sempre se preocupando em mesclar as baterias – um piloto em uma chave muito forte daria menos voltas e sairia prejudicado no cômputo geral.
Em minha bateria naquela tarde ficaram dois integrantes deste grupo semi-profissional. Um deles era William Cardia – irmão do grande iluminador teatral Gringo Cardia – e do outro, absolutamente não me recordo o nome.
Só que, como eram karts de aluguel, haviam disparidades, e me coube um verdadeiro “foguetinho”. Mesmo sendo muito inferior tecnicamente aos dois, utilizando-se do meu pouco peso, do meu carro e da tática de esperar a pista limpa para dar a volta de classificação coloquei-me na segunda posição do grid, atrás de Cardia e à frente do outro amigo.
Entretanto, eu tinha um problema: levava sete ou oito voltas até encontrar um bom ritmo de corrida. Mantive o segundo lugar, mas cedi a passagem quando percebi que estava mais lento – era uma espécie de “código” tácito.
Como escrevi lá em cima, estava com uma máquina bem mais rápida. Não deu outra.
Umas cinco voltas depois, colei nele, mas, como era acostumado, ele não me deu passagem ainda que eu estivesse muito mais rápido. Atrás dele, eu não tinha muito o que fazer, porque o traçado era travado e estreito e a reta principal, curta. Bastava ele trazer o carro para a linha de dentro e, mesmo sacrificando a primeira curva, eu não passaria sem causar um acidente. As voltas passavam e, muito mais veloz, não adiantava nada.
O leitor leu no início que eu tinha uma visão tática da corrida, não foi ? Pois é, me veio uma idéia na cabeça.
Uma das regras da empresa dona da pista era de que quem estivesse defendendo posição não poderia fazer dois movimentos de trajetória: se trouxesse para a linha de dentro, não poderia voltar para fora – o chamado “zigue-zague”. A punição estabelecida é a troca de posição ou, em casos mais extremos, a eliminação da bateria.
O que eu passei a fazer: quando chegava na reta principal, passei a fazer o movimento  de alterar a trajetória com o kart colado no dele e a gesticular para o diretor de prova apontando para o carro da frente, como que dizendo: “ele tá me segurando fora das regras”.
Minha idéia, e assumo sem nenhum prurido, era induzir a direção de prova a puní-lo e fazer com que ele me cedesse a posição. O leitor pode até me criticar, mas admito que foi uma idéia calcada em puro pragmatismo – e muito melhor que bater em adversário para ser campeão, como por exemplo fizeram Ayrton Senna, Alain Prost e Michael Schumacher. E não estava infringindo nenhuma regra, era catimba pura.
A cada volta eu mais gesticulava, mais eu apontava para o segundo colocado e para o diretor da prova. Os outros pilotos do lado de fora também pediam a punição – ou seja, tinha “colado” a idéia. Cardia, líder, andava mais lento que eu e poderia ainda tentar alguma coisa se me livrasse do segundo colocado. Mal comparando, era como se eu estivesse esbarrando no zagueiro adversário dentro da área e “desabando” no chão para que o árbitro marcasse o pênalti. E, a bem dizer, pelo menos em duas ocasiões ele alterou a trajetória – tecnicamente uma eventual punição não seria absurda.
Faltando oito voltas veio a ordem para a inversão das posições. Na volta seguinte, sob protestos, ele me cedeu o lugar, e saí voando atrás do líder, que tinha mais ou menos meia pista de vantagem – uns 15 segundos.
Guiando uma barbaridade, marquei as voltas mais rápidas daquela bateria e ainda cheguei ao final colado nele, mas não houve tempo para tentar uma ultrapassagem. Acabei em segundo na bateria, mas com o bom ritmo acabei vencendo a minha categoria e em quarto no geral – minha melhor posição até aquele momento e com a segunda melhor volta de toda a tarde.
O piloto punido saiu do kart ao final reclamando um pouco da “severidade” da decisão, embora admitisse que tinha realmente em uma ou duas ocasiões dado motivo para tal. Mas nada que uma boa cerveja não resolvesse, a amizade estava acima de tudo. Ninguém percebeu a minha estratégia.
Ou melhor, quase ninguém.
Na hora de ir embora, eu sempre pegava uma carona com o Luciano Barcelos, na época vizinho, grande amigo e um kartista dos melhores – sinto falta dele, pois o dia a dia acabou nos afastando. Dentro do carro, retornando, ele vira para mim e fala:
 – Vem cá, Migão, aqui só pra nós… eu percebi que você induziu o diretor de prova a punir o cara e te ceder a posição…
Pano rápido.
P.S. – A foto é da última etapa do campeonato daquele ano, o único registro fotográfico que tenho daqueles tempos. Com apenas duas vitórias em dez etapas na categoria acabei como campeão na Graduados, obtendo o quarto lugar na geral.

2 Replies to “Malandragem dá um tempo”

  1. kkkkkkkkk… pior que tudo isto foi verdade!!! Tava acompanhando a prova bem de perto pois era interessado direto nesta disputa pois acabei como campeão da categoria graduados e vice-campeão geral em 2000 (Dois troféus que guardo hoje com muito carinho). Achei interessante a tática do Pedro Migão pois induziu a organização a tomar uma decisão com base no frenético zigue-zague que ele imprimia atrás do pobre coitado do William Cardia que tava realmente num ritmo muito mais lento por conta do Kart que não o ajudava. Eu só olhava pros meus companheiros de equipe Sergio Milani e Alvaro balançando a cabeça e rindo com a simulação toda!!! Foi ridículo mas valeu a idéia pois houve realmente a ordem da ultrapassagem após algumas voltas. Em casa eu não parava de rir!!! Bons tempos!!! Saudações – Luciano Barcelos.

  2. Salve, salve, Luciano !

    Duas pequenas correções: a tua categoria se chamava Federados, não Graduados – que era a minha. E o Cardia ganhou a bateria, não me lembro do nome da ‘vítima’… risos

    Bons tempos… vamos ver se marcamos de andar de kart.

    abração e saudades

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