Um pouco menos de seis anos atrás escrevi uma coluna sobre o fracasso. Escrevi porque meu samba acabara de ser eliminado de um concurso na União da Ilha em que toda a disputa foi um grande fracasso para nós. Mas as coisas mudaram desde então.

Muitas coisas daquela coluna não existem mais. Eike Batista não é mais o cara mais rico do Brasil, está todo enrolado com a lei, não ando compondo sambas de enredo e venho conhecendo o prazer e o sucesso em áreas como literatura e dramaturgia. Há cinco anos passei a ter uma vida mais saudável em exercícios e alimentação e não tenho mais dor nenhuma nas costas.

Então por que relembro esse artigo hoje?

Porque nosso maior orgulho, a Seleção Brasileira, vem de um fracasso em Copa do Mundo, e nessas horas parece que está tudo errado e o mundo desaba. Não, não está tudo errado nem o mundo precisa desabar quando fracassamos até porque o fracasso faz parte da vida e sempre pode haver a reviravolta como eu disse acima. Não é um artigo de auto-ajuda, é sobre a volta por cima que pode valer no futebol e nas nossas vidas.

Com vocês então “O fracasso nosso de cada dia”.

O fracasso nosso de cada dia (23/9/2012)

Ninguém gosta de se dizer fracassado.

Todos nós gostamos de passar uma imagem vitoriosa. Pessoas felizes, com estabilidade familiar, financeira, elogiadas e respeitadas em suas profissões e que não tem prisão de ventre.

Mas a vida não é bem assim…

… A verdade é que se tivermos uma posição bem crítica da vida vamos nos frustrar muito. A gente sempre renega o lado ruim, os fracassos, os defeitos. Não queremos passar uma imagem ruim e nem aceitar que temos falhas. Quando eu vejo o programa da Marília Gabriela no SBT e ela parte para o “bate bola” a última pergunta sempre é “fulano por fulano”. Ou seja, o entrevistado tem de falar como se vê.

Em 99% das vezes o entrevistado só passa elogios, coisas boas deles e a Gabi invariavelmente é forçada a perguntar: “e o lado ruim?”. A maioria ainda consegue desviar mesmo com essa pergunta. Muitas vezes responde “sincera demais” e como sabemos que sinceridade a princípio é uma virtude, na verdade ela quer dizer: “eu to certa, mas o mundo não aceita”.

O pior exercício que existe é mergulhar dentro da própria alma, admitir nossos defeitos e, principalmente, admitir nossos fracassos.

E acredite, leitor: somos movidos a fracassos, todos os dias fracassamos e temos muito mais fracassos na vida que sucesso.

Essa afirmação é polêmica, né?

Assusta, parece amarga, mas é verdade e acho sinceramente que admitir que somos seres fracassados nos faz chegar com mais facilidade à vitória.

Sim, parece incoerente, mas vou explicar.

Evidente que pode haver uma discussão. Como assim somos todos fracassados? Como podemos falar isso, por exemplo, de gente como Eike Batista, o homem mais rico do Brasil ou Mark Zuckerberg, criador do Facebook e o bilionário mais jovem do mundo?

Pois o Eike foi notícia outro dia por perder uma grande quantia de dinheiro. Além de anos atrás ter sido traído pela sua então esposa Luma de Oliveira com um bombeiro. Zuckerberg colocou o Facebook na bolsa e esse perdeu 40% do valor desde então.

Até eles erram, até eles fracassam.

Quando você acorda e planeja seu dia sai tudo como imaginou? Você consegue ser vitorioso em tudo na sua vida? Tem nada nela que não vá como você queria? Você é hoje aquilo que imaginou quando criança?

Jesus Cristo espalhou o bem, mensagem de paz, operou milagres, foi o filho do Senhor e preterido por Barrabás por aquele povo que ajudou morreu na cruz perguntando “Pai, por que me abandonaste?”

Naquele momento até ele fracassou. O sucesso veio com a propagação de sua palavra através do tempo.

E a forma que essa palavra vem sendo usada hoje em dia, a forma como vem sendo deturpada mostra que infelizmente o ser humano não entendeu tudo o que ele quis passar. Assim, o sucesso não é completo.

Se nem Ele, o maior de todos os tempos conseguiu até hoje que as pessoas entendam que morreu por elas e não existe diferença entre os seres humanos, somos todos irmãos, radicalizando: se as religiões fracassaram porque temos que ser vitoriosos?

Na virada de ano prometemos um monte de coisa. Ganhar dinheiro, emagrecer, começar novo relacionamento, aquela viagem sempre adiada, ser mais amigo das pessoas e nem sempre isso dá certo. Muitas vezes felizes no amor e desanimados com a profissão, outras tendo o trabalho dos sonhos e ninguém em casa pra dividir essa alegria.

Todos nós fracassamos e muito, sem exceção, o vitorioso é aquele que admite que é falível, nem sempre vai alcançar seus objetivos, tem muitas falhas como ser humano e em cima dessas falhas ele trabalha pra atenuá-las.

Sabe que nunca vai acabar com as falhas e os fracassos, mas pode, trabalhando em cima deles e de seu lado bom, propagar mais, deixar mais frequentes seus momentos vitoriosos. O vitorioso consegue aos nossos olhos mostrar tanta força, poder, auto-estima (principalmente) que a gente acaba deixando seus fracassos de lado.

Eu acho que é por aí. A diferença está na auto-estima.

Enquanto para alguns os fracassos abalam e derrubam tudo, para outros vale uma gota de lágrima, uma passada de mão para limpar a roupa na queda, levantar e com cabeça erguida lutar para um novo fracasso ou sucesso.

E por que essa coluna justo agora? Resolvi mergulhar no mundo da auto-ajuda? Nada disso.

É porque eu venho de um grande fracasso e não tenho medo de admitir isso.
Já perdi sambas piores, que doeram mais. Vão me perguntar, essa foi a pior derrota de samba da sua vida? Não, longe disso.

Contudo, se perguntarem se foi meu maior fracasso nesses quinze anos de samba-enredo respondo, sem dúvidas, que sim. Foi.

Sábado passado fomos eliminados da disputa de samba da União da Ilha com oito sambas no concurso ainda. Não caía tão cedo na escola desde 2001. Aliás, não caímos propriamente, nos deram a opção de chegar à final do concurso ou cair. Preferimos cair. Isso dá orgulho? É atenuante? Não.

Porque a partir do momento que entre oito sambas, tendo na disputa sambas nitidamente inferiores ao seu, lhe dão essa opção é porque o projeto fracassou.
O projeto de quem venceu no ano anterior foi uma sucessão de erros – desde antes da entrega da sinopse – e acabou dessa forma melancólica. Para um atual campeão acabar uma disputa dessa forma é que foi tudo errado mesmo. Um grande fracasso.

E por que fracassou?

Fracassou porque não utilizou a principal norma para algo não dar errado: “se você quer agradar a todos, aí que dá errado”. Tentamos desde o começo o agrado de todos. Desde a montagem da parceria onde aconteceram situações traumáticas e irreversíveis, passando para o samba onde deixamos de colocar aquilo que acreditávamos pra agradar outras pessoas.

E justo ai, nessa parte, que o samba perdeu.

Existe política em samba?
Sim, muita. Sem política em ma disputa de samba-enredo você não passa do primeiro corte. Como é a política de samba na União da Ilha? Uma das mais complicadas que há, muitas vezes a política se sobressai ao samba e a escola sofre no final.

Há então decisões de concursos lá por interesses? Sim. Será assim esse ano? Quase certeza.

A escola tem alguma culpa de nosso fracasso? Nenhuma.

Fracassamos: fomos eliminados por culpa exclusiva nossa. Como eu disse lá no começo o ser humano nunca admite seu lado ruim, seus fracassos e acrescento, nunca admite suas culpas. Sempre que algo dá errado instintivamente joga a culpa nos outros, mas a vida não é assim.

Somos sempre responsáveis por nossos fracassos e se alguém foi responsável por ele foi porque nós permitimos.

E a maior culpa desse fracasso da União da Ilha é minha, porque desde o começo sabia que estava errado e me omiti. Não quis desagradar aos outros mesmo sabendo que às vezes é necessário, me deixei levar por euforia que era feita de vento e até amizade perdi no começo do processo em busca da perfeição quando ela não existe. Esquecendo que se ela não existe, a proximidade dela é estar cercado de pessoas que você gosta, confia e admira.
O “Maria vai com as outras” sempre é deixado pelas outras em alguma parte do caminho. Esse foi outro lema que esqueci.

Fora isso, ainda tenho uma nova companheira: uma hérnia de disco que dói demais depois de um certo tempo em pé. Essa hérnia me limitou muito esse ano e me deixava irritado, frustrado por não fazer tudo o que eu queria. Como no palco, quando todos se divertiam e eu ficava quase parado. Descia aborrecido: essa disputa em nenhum momento me deu prazer.

E não ter prazer numa disputa em escola grande que se disputa bicampeonato, aonde você vem de um ano de grande sucesso profissional e financeiro que acaba com uma reunião para se decidir cair da disputa, “abortar um filho”, é frustrante demais, não tem outra palavra pra definir.

Fracasso.

Estou sendo cruel comigo escrevendo essas coisas? Acho que não, porque como escrevi acima o primeiro passo para o sucesso é reconhecer o fracasso e não deixar mais que aconteça aquele. Vou fracassar mais vezes? Sem dúvidas, mas quero fracassos novos, repetir fracassos já não é ser fracassado: é ser burro.

E burro eu não sou…

… Nem me deixo levar por fracassos. Eles são o primeiro passo para minha vitória e eu sou um cara vitorioso no samba porque meus fracassos me fizeram assim.

De um fracasso na União da Ilha em 2001 veio o samba do Boi que foi minha primeira vitória e ganhou o Estandarte de Ouro. Do fracasso com o “samba da minha vida” na final do Boi em 2008 veio o samba da escola vencedor do S@mbaNet em 2009. De uma inédita queda na semifinal do Boi em 2010 veio a parceria vitoriosa da União da Ilha no biênio 2011/2012, com duas finais e uma vitória.

Então é certo que desse fracasso virá algo muito bom.

Pare pra refletir sua vida, caro leitor. Admita seus fracassos, que nada é capaz de evitar que você falhe, que você tem limitações e verá como sua vida vai mudar.

Faça por você antes que o fracasso faça.

A vitória virá.

Twitter – @aloisiovillar

Facebook – Aloisio Villar

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