Nesta semana, a coluna traz uma entrevista exclusiva com um dos carnavalescos mais vencedores do carnaval de São Paulo. Cria da Mocidade Alegre, Sidnei França sentiu o gostinho do título formando a comissão de carnaval em 2007. Dali em diante, passou a assinar carnavais na escola e ergueu mais quatro taças (2009, 2012, 2013 e 2014)

O artista foi carnavalesco da Vila Maria em 2017,com o enredo sobre os 300 da aparição da imagem de Nossa Senhora Aparecida, quando terminou na sétima colocação; agora o desafio será na Gaviões da Fiel, escola tradicional que já venceu o carnaval quatro vezes, mas que não conquista o carnaval desde 2003.

Nesta entrevista, Sidnei conta sobre sua relação com a Mocidade Alegre, o enredo de 2018 na Gaviões “Guarus… Na Aurora da Criação a Profecia Tupi – Prosperidade e Paz aos Mensageiros de Rudá” e principalmente sobre o fato de não poder usar a cor verde em um tema de cunho indígena.

Vamos a ela:

Ouro de Tolo: Como está o seu início de trabalho na Gaviões? Quais os motivos que o levaram a trabalhar na escola, que nos últimos 15 anos não consegue brigar por título?

Sidnei França: O início na Gaviões da Fiel está sendo extremamente prazeroso, até porque a diretoria está muito engajada em fazer um grande carnaval e também pela liberdade para que eu expresse a minha visão a respeito do desenvolvimento de um desfile. Vários motivos me fizeram trabalhar aqui, o primeiro foi o fato de ser uma escola com muita força e garra, que tem muita tradição, afinal de contas já fi campeã quatro vezes, então são pessoas que já sentiram o gosto do triunfo e possuem dentro de si o desejo pela vitória. E conta também o fato de eu ser corintiano. É a escola que representa a torcida, então não posso negar que levei isto em conta, pois sempre tive muito carinho pela Gaviões. Será um grande prazer ter meu nome na história da escola.

OT: Você já assinou carnavais de diversos estilos, usando muito bem elementos como palha e plumas, com abordagem​ lúdica, biográfica, afro, religiosa e pela segunda vez seguida virá com um tema histórico. Você se considera eclético ou tem um estilo definido?

SF: Realmente já concebi desfiles de diversos estilos, porém o que vejo em comum neles, primeiro, são temas que valorizam sua relação com o ser humano. Em 2010 por exemplo fiz o enredo sobre o espelho mostrando não o objeto, mas sim a capacidade do homem ver refletida nele a sua imagem, a sua verdade, pois você mente para o outro mas não para o espelho. No Carrossel de Ilusões a mesma coisa, mostramos a capacidade homem de iludir e foi assim em todos eles. Outra característica do meu trabalho é mostrar de maneira muito clara cada alegoria e cada fantasia. Nada é gratuito, tudo deve ter um link para dar o entendimento correto ao público. Mas sim, me considero eclético.

OT: Como você pode resumir sua proposta para o enredo de 2018 da Gaviões da Fiel?

SF: Se trata de mais um enredo com uma carga antropológica muito forte. È um resgate de essência, de ancestralidade através da visão do índio sobre o desenvolvimento de sociedade, de construção de vida em comum. É uma mensagem de positividade através de uma pureza que o índio tem como traço universal, todos os povos enxergam os índios como seres poéticos e integrados com a natureza.

OT: A grande discussão quando o enredo de 2018 foi anunciado é sobre um tema indígena sem poder ter o verde no desfile. Em 2016 o Zilkson fez um abre alas com uma floresta toda em marrom. De que maneira você pretende conceber essa solução estética?

SF: Eu não tenho uma visão crítica a respeito do não uso do verde na escola, é apenas um traço característico, assim ela poderia na utilizar neon ou penas artificiais, ela não utiliza essa cor. Devo respeitar e me aliar a essa ideologia. Não vejo nenhum problema em desenvolver um enredo idígena com a limitação do uso do verde, até porque quando elaborei o tema tornei como fio condutor a ideologia Tupi, oriunda do elemento fogo, assim as cores que predominam são o laranja e o amarelo. Referente ao que o Ziko (Zilkson Reis) fez em 2016, achei extremamente bem sucedido. O pouco que eu me lembro do abre alas, teve um apelo estético muito forte para narrar o tema proposto. O importante é buscar recursos para se adaptar as características da escola em que estamos.

OT: Qual a sua relação com a Mocidade Alegre depois de uma década vencedora?

SF: Amor, respeito e gratidão. Imagine um filho que se mude da casa de seus pais para buscar novos desafios e oportunidades. Mas com um imenso amor, pois foi a Mocidade Alegre que me tornou sambista e me deu a oportunidade de ser carnavalesco. Meu objetivo é perpetuar por onde eu passar tudo o que eu aprendi na Morada do Samba.

OT: Dos carnavais que você assinou qual você considera o melhor desfile? 

SF: É complicado dizer qual o melhor, foram vários momentos. 2012 com Ojuobá eu considero a melhor concepção de enredo na valorização de uma figura como Jorge Amado. Mas em 2010 no espelho foi muito legal também, assim como em 2015 com Marília Pêra, por contada dignidade da homenageada e também pelo trabalho em si.

OT: Quais carnavalescos você mais admira e qual o enredo que você ainda gostaria de fazer?

SF: Admiro diversos carnavalescos, principalmente Joãozinho Trinta, nosso grande revolucionário. É o pai de todos nós, independente de estilo e caminho que tenha seguido na estética, ele é a fonte de um delírio que perdura por todas as nossas idéias.

[related_posts limit=”3″]