Passada uma semana do fim dos Jogos Olímpicos, já dá pra analisar de uma maneira mais fria o desempenho brasileiro no mesmo.

Vivemos uma grande euforia, refletida pela maioria da imprensa pelo fato de o Brasil ter batido recorde de medalhas de ouro e em geral na Olimpíada 2016. Euforia que aumentou com o fato de o futebol e o vôlei masculino, os dois esportes mais populares do país, terem ganho ouro nos dois últimos dias. Mas essa alegria e euforia têm de ser debatidas.

Será que foi bom mesmo? Os números dizem que não, mas que sim também.

Ser nosso melhor desempenho em uma Olimpíada em casa é obrigação. Todos os países sedes melhoram seus desempenhos. A questão é no quanto foi essa melhora. Normalmente os países melhoram em cerca de 30% e, se formos pensar que o Brasil ganhou 17 medalhas em 2012, teria que ter vencido 22,1 medalhas em 2016. Ok, vamos ser legais, 22 medalhas. Ganhamos 19.

voleifemininorio2016Por esse lado foi ruim, já que ficamos três abaixo e passamos raspando pela marca de 17, mas poderíamos ter chegado nas 22. Seleção feminina de vôlei não vencer foi uma surpresa, Robert Scheidt pela primeira vez passou em branco, só aí seriam 21. Poderíamos ter vencido futebol feminino, mais uma no vôlei de praia feminino e só aí chegaríamos a 23. Mas assim como poderíamos ter vencido mais, poderíamos também ter perdido, então o que vale mesmo é que foram 19.

O COB planejou o Brasil em 10°. Não ficou. Planejou mais medalhas. Não ocorreu. Repito, passamos raspando as 17 medalhas e só no penúltimo dia garantimos mais ouros do que em 2004, nosso recorde. Isso mostra uma estagnação. O que deu errado?

Várias coisas. Primeiro, essa política imediatista que cerca em tudo o Brasil, não só esporte. O COB tinha uma grande necessidade de ganhar medalhas, mostrar serviço, e assim o grande volume de dinheiro investido nessa Olimpíada (sim, nessa teve bastante recurso) foi nos ditos atletas de ponta. De ponta, vírgula, já que para ser radical, de ponta mesmo dá pra contar nos dedos quantos temos. Zanetti? Robert? Quem mais? Quantos mais eram dominadores em seus esportes antes dos Jogos? Os atletas de ponta do Brasil têm mais histórico de “amareladas” do que vitórias.

O Brasil está longe de ser uma potência olímpica. Em 96 anos disputando os Jogos, nunca fez um tricampeão em esportes individuais, sendo que o Bolt foi em três Olimpíadas e o Phelps só nessa ganhou cinco. Nessa que no ciclo olímpico ele ficou bebendo cerveja, fumando maconha e sendo detido pela polícia. Claro que Phelps é um cara de outro planeta e fica difícil comparar com os atletas brasileiros. Mas nessa Olimpíada chegou em um ponto em que ele tinha 23 medalhas de ouro e o Brasil em toda sua história, 24. É pouco, muito pouco.

Por isso pensaram em Pelé para acender a pira, por isso foi difícil arrumar nome de consenso entre olímpicos, por não termos uma história forte e isso reflete nos atuais. Investiram uma grana preta em atletas e a maioria talvez não merecesse. Aí fica a decepção, a célebre frase “Não deu para o Brasil…”. A solução para fazer um país forte esportivamente não é dar dinheiro apenas a atleta de ponta.

É investir na base, em novos atletas. Como se faz isso? Simples, exemplos temos aos montes.

phelpsA maior potência esportiva do mundo é os Estados Unidos e como eles fazem? Política esportiva forte em escolas e universidades. O caminho é esse, o esporte é primo-irmão da educação. Em vez de despejar rios de dinheiro em atletas de ponta, que se invista em escolas, universidades, centros de treinamento para surgimento de grandes atletas e uma política esportiva de verdade. Em 1997, o Brasil começou a querer sediar os Jogos quando se candidatou à Olimpíada de 2004. Ali teria de começar essa política. Se ali tivesse começado, não brigaria por décimo lugar em sua Olimpíada e sim quinto ou quarto.

Costumamos chamar os atletas de ponta brasileiros de heróis e algumas vezes é verdade, mas nem sempre. Como eu disse, muitos deles tiveram recursos para essa. Alguns aproveitaram, outros falharam. O que dizer de Fabiana Murer que mais uma vez não conseguiu nem saltar? (N.do E: há um mês da Olimpíada, a atleta foi diagnosticada com uma hérnia de disco). Da natação, onde nossos nadadores só faltaram morrer afogados? Estava vendo a hora que em aquele histórico nadador da Guiné-Equatorial passaria pelos nossos. A natação não teve dinheiro? Teve. Muito. O basquete masculino não tem?

Mas a natação, por exemplo, preferiu não levar Cesar Cielo para a Olimpíada porque não alcançou o índice. Podem falar que o Cesão está decadente, não é o mesmo sem o maiô ou depois do doping, mas mesmo com tudo isso ele é melhor que qualquer brasileiro que disputou os jogos. Usain Bolt passou pela mesma situação. Na hora do índice pela Jamaica se machucou e não conseguiu. Mesmo assim a Jamaica convidou para os Jogos. O resto vocês já sabem.

Quem estava certo? Brasil ou Jamaica?

Faltam recursos, muitas vezes como faltam talento e preparo psicológico também. Quantas vezes já não ouvimos que o brasileiro foi mal de forma surpreendente porque durante o ano venceu tal adversário que lhe derrotou ou fez tempos melhores que nos Jogos? Brasileiro tem sangue quente, sangue latino e é emocional. isso é bom e ruim. Com trabalho de base bem feito também é realizado um preparo emocional.

Olimpicos3Mas como eu disse também teve seu lado bom. Mais finais que em Londres, mais vezes entre os 8 primeiros, volta a disputar medalhas onde não disputava há décadas como tiro e lançamento de martelo. Esportes que nunca fomos fortes surgiram como canoagem, o boxe se confirmou. Grandes nomes surgiram para presente e futuro como Rafaela Silva, Thiago Braz, Robson Conceição, Isaquias Queiroz, Arthur Nory, redenções como Diego Hypolito. O investimento na base tem que se iniciar e nesses atletas que mostraram força no Rio continuar.

Mas será que as confederações vão colocar dinheiro onde devem? Algumas histórias que vêm surgindo deixam dúvidas. Mas será que o querido presidente Temer manterá investimentos? Pelo visto, corremos riscos.

O legado esportivo, assim como para a cidade do Rio, só conheceremos com o tempo. O problema é que não podemos deixar o tempo passar. Taí, poderíamos chamar pra coordenar nosso projeto olímpico alguém que mostrou no Rio aproveitar bem o tempo que tem.

Chamem o Bolt!

Twitter – @aloisiovillar

Facebook – Aloisio Villar

2 Replies to “Chamem o Bolt!”

  1. Caro Villar, tenho alguns pontos a observar em certas análises. Começando pelo Cielo. Cobri as seletivas e torci para que ele obtivesse o índice. Sem dúvida alguma a presença do Cesar na equipe daria grande peso. Mas acontece que ele só nadou uma vez abaixo de 22 segundos. Ele não estava lesionado, como o Bolt. Ele foi superado – e mais de uma vez – por outros nadadores no critério que, se não é perfeito, é o mais justo. Concordo que a natação brasileira decepcionou nos resultados. Mas tenho imensas dúvidas de que teria sido diferente com o Cielo. Quanto à Fabiana ela foi vítima de uma postura que, muitas vezes, foi encarada como “amarelada”. Ela não tinha condições físicas de disputar a medalha. Deveria ter desistido antes? Ter anunciado a todos que não poderia competir em igualdade de condições? Talvez. Mas do que seria chamada? Acho que foi corajosa ao saltar machucada e, mesmo assim, se submeter ao julgamento (e condenação) frio de um público que adora salto com vara quando o Brasil é ouro mas não tem a menor ideia de como funciona a mecânica da modalidade. Sobre a participação brasileira eu acho que ficou dentro da normalidade de uma Olimpíada mais pulverizada, em que o desempenho que ficou marcado mesmo foi o da Grã Bretanha. A Rússia, mesmo barrada no baile em alguns esportes, foi acima da expectativa. Futuros testes de controle de dopagem podem ou não explicar o porquê. Todos os outros ou eram esperados (EUA) ou “decepcionaram” (China). Concordo que não temos uma política esportiva de base e temo pelo futuro dos investimentos. No entanto, nem tudo que foi feito nos últimos anos pode ser desprezado. Grande abraço.

Comments are closed.