Este editor chefe dá uma pausa nos artigos sobre a Rio 2016 para escrever sobre uma das épocas mais aguardadas pelos amantes do samba carioca: as disputas de samba enredo.

Para 2017, já tivemos algumas escolas recebendo seus concorrentes, tanto do Grupo de Acesso A como do Especial. Foram seis escolas no grupo A (Sossego, Inocentes, Império da Tijuca, Unidos de Padre Miguel, Rocinha e Estácio) e uma no Especial (Tuiuti) até a noite do último domingo. A Grande Rio receberia seus concorrentes na noite de ontem, após o fechamento deste texto.

Ao contrário do ano passado, este ano a Lierj não exigiu que as escolas do Acesso fizessem suas finais até o dia 30 de agosto, por conta da Rio 2016 o prazo para as finais foi postergado. Outras escolas, principalmente do Especial, farão disputas mais curtas a fim de não estabelecer conflitos com as competições – até porque está prevista a presença de diversas agremiações não somente na Abertura como nos diversos Parques Olímpicos e “live sites”.

Com uma amostra de aproximadamente 30% do total das escolas que desfilam na Marquês de Sapucaí, já se percebem alguns fenômenos diferentes nesta temporada de 2017.

O primeiro dele é a queda na quantidade dos concorrentes. Até agora a escola que teve mais concorrentes inscritos foi o Império da Tijuca, com apenas 12. O Paraíso do Tuiuti, que subiu para o Especial, teve apenas nove – e normalmente quando a escola sobe isso gera um efeito motivador sobre as inscrições, as aumentando.

Segundo, o número de componentes em cada parceria está visivelmente maior. O que se percebe é que parcerias que normalmente competiam entre si se uniram a fim de enfrentar a maior demanda financeira dos concursos – como já escreveu aqui o colunista Aloisio Villar.

Isso leva a outro ponto: como eu e os colunistas Aloisio Villar e Rafael Rafic já apontamos em outras ocasiões, ao que parece a “bolha” financeira dos concursos de samba parece perto de estourar de vez. Essa união de parcerias parece uma medida tomada a fim de sustentar os crescentes custos envolvidos nas disputas, que, a meu juízo, são insustentáveis a médio prazo.

Também é reflexo disso a presença de compositores importantes assinando em mais de uma escola. Samir Trindade e Cláudio Russo são dois exemplos deste fenômeno. Nomes consagrados tem maior poder de atrair parceiros que possam financiar os estratosféricos custos das disputas.

Feitas estas considerações iniciais, pequenos comentários sobre cada safra em si.

Império da Tijuca – levando-se em conta o enredo sobre São João Batista e seu sincretismo com Xangô, confesso que esperava bem mais da safra. Gostei do samba assinado por Gilmar Silva e parceiros (acima). A composição assinada pelo intérprete Pixulé também tem bom nível, mas ambos estão abaixo do que este tipo de enredo pode proporcionar em termos de safra.

Também faço o registro do concorrente assinado por Vicente das Neves e parceiros. A letra da composição é até boa, mas a melodia me parece “animadinha demais” para um enredo desta densidade. Pode ser gosto pessoal meu, mas enredo afro não pede melodia “oba oba”.

Inocentes de Belford Roxo – a impressão que se tem ouvindo a enxuta safra é que o enredo se apresentou de forma bastante confusa. Com isso, não consigo apontar nenhum samba que se destaque entre os concorrentes.

https://www.youtube.com/watch?v=2EAGvt_waAE

Estácio de Sá – esta safra tem uma particularidade. Ouvindo os sambas se percebe que as letras foram bastante limitadas pela sinopse, mas em média as composições tem melodias bastante agradáveis de se ouvir. Gosto muito da composição de Wilsinho Paz e parceria (acima), mas o samba assinado pelo filho do homenageado Daniel Gonzaga desponta como franco favorito.

Acadêmicos da Rocinha – sete sambas em sua disputa. É aquela disputa onde não há nada ruim, mas que o escolhido, seja qual for, será esquecido já no domingo de carnaval. Chama a atenção também a excessiva menção a Joãozinho Trinta em pelo menos três dos contendores.

Paraíso do Tuiuti – é um caso semelhante ao da Rocinha. Para uma escola que volta ao Especial depois de 16 anos, um samba mais marcante se faria mais adequado. Gosto da assinada pelo multicampeão Cláudio Russo, mas nada que me faça apertar o “repeat” – longe disso.

Acadêmicos do Sossego – retornando à Sapucaí, a escola traz mais uma vez um concorrente bastante diferente da parceria encabeçada pelo compositor Felipe Filósofo (abaixo), escrito em forma de diálogo. Entretanto, a junção entre a letra e a melodia me parece bastante problemática, pelo menos aos meus ouvidos.

Destaco o samba da parceria de Celso Tropical (acima), que parece aqueles sambas da Mangueira dos anos 80. Pixulé, intérprete da Unidos de Padre Miguel, também está nesta disputa. Eu, pessoalmente, não acho lá muito ética esta situação de intérprete oficial disputar samba em outra escola no mesmo grupo; mas se houve esta combinação, não custa caro.

Unidos de Padre Miguel – “last, but not least”. E, neste caso, o que ficou por último nem de longe é o pior. Ao contrário, o enredo sobre Ossain, o Orixá das ervas e da saúde rendeu uma safra com apenas seis sambas, mas onde três deles ganhariam qualquer uma das outras disputas.

Seja qual for o vencedor, as composições de Dudu Nobre, dos galácticos Cláudio Russo e Samir Trindade e de D´Vincci são fortes candidatos a abocanhar todos os prêmios da imprensa especializada. São daqueles sambas que não se conseguem parar de ouvir, nem escolher um favorito. É a mostra de que o gênero samba enredo vive sim, está muto vivo.

Aqui coloco as três composições. Desafio o leitor a apontar uma favorita – eu não consigo. Impossível parar de ouvir – e a diretoria da escola vai ter trabalho para apontar o vencedor.

Com o decorrer das disputas, voltaremos aqui para dar nosso pitacos sobre as demais safras. Enquanto isso, vamos ouvindo os concorrentes.

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14 Replies to “E começou a temporada 2017 dos sambas concorrentes”

  1. Só tive tempo de ouvir os concorrentes do Tuiuti, onde concordo com sua análise Pedro, e da Unidos de Padre Miguel, onde discordo um pouco, gostei dos outros dois sambas, mas acho que o do Samir Trindade sobra, que samba! Talvez o do Dudu Nobre melhorasse se fizessem outra gravação. Claro que fica difícil entrar nesse mérito por não ser músico ou compositor, mas achei a gravação desse samba bem estranha, e olha que é com o Ito Melodia, um craque…

    Assim que puder pretendo ouvir todos, e já aguardando Grande Rio e Salgueiro, que deve receber os sambas domingo, essa é a época que mais gosto no pré-Carnaval, junto com os dias que antecedem a festa!

    1. Samba do Dudu está mal gravado sim. Eu sinceramente não consigo me decidir por um dos três.

      Alegria e Porto da Pedra divulgaram ontem seus sambas também.

  2. Vamos por partes

    Inocentes: safra HORRÍVEL. Salva-se o Serginho Castro. Próximo.

    I. da Tijuca: bem fraca, muito aquém do que o enredo pede.

    Estácio: safra razoável, na minha opinião fica entre o China do Estácio e Daniel Nowosh, o do Gonzaga achei bem fraco.

    Rocinha: fez uma boa safra sobre Viriato. A parceria do Edinho se sobressai.

    UPM: Boa safra. Fica entre o Dudu Nobre, W. Correa, e o D’ Vincci.

    Sossego: tem tudo pra colocar o melhor samba da sua história e dos últimos anos.

    Tuiuti: boa safra, fica entre o Claudio Russo (dois degraus a frente) e o Benson

    Adiantando as que não entraram no texto: Grande Rio tem uma safra ruim, salvando-se dois sambas; Porto da Pedra tem uma safra razoável, sendo que uma obra que deve ganhar com um pé nas costas. Alegria com uma safra muito abaixo do que o enredo pedia – a exceção do MA Filho.

    1. Pensei totalmente diferente de você em relação aos sambas da Estácio, achava o samba do Nowosh não ia resistir aos próximos corte, não vi nada demais nele, somente a repetição da palavra “é”.Por outro lado não sei se foi pelo apelo emocional ou pelos nomes envolvidos na parceria de Daniel Gonzaga, penso que é o mais forte e popular na disputa, pode até não ser o melhor, mas achei que ia até ganhar e o vice ia ficar com a parceria de China. A parceria de Gonzaga tem um trecho muito bonito e emocionante: ” Que palavra por palavra, eis aqui minha escola se entregando.”Achei que os estacianos iam ter arrepios cantando essa frase.

  3. Na Inocentes de Belford Roxo, são sambas trashs, mas não me desagrada e nem me ofende, deve ser porque acho o tema interressante e uma verdadeira salada de vilões. Não acho o samba da parceiria de Serginho Castro tenha tanta vantagem em relação aos demais, acho que vai disputar com o samba criticado da parceria de Samir. Não entendi ainda os quilombolas nessa história vilões e anti-heróis, sempre achei que eram mocinhos.

  4. Império da Tijuca achei que os compositores tiveram uma dificil missão, pois é um enredo que começa no cristianismo, tem um toque afro e termina falando do forró, fogueiras, balões e afins. Eles não conseguiram unir esses elementos muito bem. Em alguns sambas o toque afro surge do nada e vai embora sem dizer nada. Apesar disso apostos nas parcerias de Pixulé ou Gilmar, eu gostei demais da parceria do Vicente apesar de achar que não tem chance, ele é bem resolvido e esse enredo não é tão afro pelo que li e vi até agora.

  5. Achei extremamente infeliz essa frase “Também é reflexo disso a presença de compositores importantes assinando em mais de uma escola. Samir Trindade e Cláudio Russo são dois exemplos deste fenômeno”

    Pq, os outros compositores não são importantes ?

    E além disso, Pedro Migão, você escreveu muita besteira nesse texto

    1. Prezado Gustavo, a referência aos dois compositores foi no sentido que são pessoas que estão há bastante tempo na composição de samba enredo, com muitas vitórias. Poderia ter citado outros nomes.

      Sobre besteiras, não se pode agradar a todos. Todo compositor acha a sua obra maravilhosa e soberana, o que é absolutamente normal. A gente não critica um filho nosso, correto? Obrigado pela leitura e opinião.

  6. Leonardo ,você esta certíssimo quando diz que o enredo da Império da Tijuca não é afro.O enredo é bíblico.
    Gustavo. concordo plenamente com sua visão.Quando o cara tem nome e escreve um samba fraco
    culpam o enredo.e quando é um compositor que não tem “nome” ele é massacrado por estes comentaristas bola murcha que não sabem distinguir um enredo afro de um bíblico.Já que estes caras se acham os detentores da sabedoria em escrever sambas enredos deveriam pelo menos além de ler mais de uma vez a sinopse;também escutar a explanaçao dos carnavalescos.daí pagariam menos Micão.

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