Obs: para uma explicação do procedimento das prévias americanas e de alguns termos técnicos usados nesta coluna, leia a coluna explicativa

Nesta semana ocorreram as prévias de Nevada e South Carolina, essa última apenas para republicanos, que são as últimas primárias dessa fase inicial, antes da Super-Terça que será na próxima terça, dia 1º.

No caso democrata, antes da Super-Terça, ainda haverá a prévia de South Carolina no próximo sábado, mas dada a proximidade dela com a Super-Terça, escreverei sobre ela junto com os resultados do dia 1º.

As prévias de Nevada e, especialmente, a de South Carolina, clarificaram a situação do partido republicano; já no Democrata tudo continua como antes: Clinton continua favorita, mas a nomeação ainda não é iminente.

Vegas-1Partido Republicano

Conforme as pesquisas da semana haviam indicado, Trump teve uma vitória incontestável em South Carolina, mesmo que teoricamente não fosse esperado, dado o perfil evangélico do estado, mais favorável a Cruz.

Com 32,5% dos votos Trump liderou as prévias em todas as regiões do estado, seja interior ou litoral, bases militares ou redutos evangélicos. Como ele liderou em todos os distritos congressionais (aqueles que elegem os deputados no voto distrital americano), pela regra do partido republicano no estado, ele ganhou todos os 50 delegados do estado para a Convenção.

Ted Cruz, o ultraconservador evangélico que era favorito teoricamente dado o perfil dos eleitores, sequer ficou em 2º lugar, mas apenas em terceiro, com 22,3%.

Surpreendendo mais uma vez e se recuperando do aperto no debate da semana anterior, Rubio “roubou” o 2º lugar de Ted Cruz com 22,5%.  A diferença de votos entre Rubio e Cruz foi de apenas mil votos, mas Rubio se consolidou como o candidato preferido pelas lideranças do partido e seus doadores, por ter se mostrado a única candidatura menos radical de dentro da política a se mostrar viável dentro do Partido Republicano.

Mas talvez o grande fato das prévias de South Carolina tenha sido a desistência do outrora favorito Jeb Bush. Após gastar mais de 10 milhões e ver tal gasto se transformar em apenas 8% dos votos, Bush desistiu da corrida presidencial. Em seu discurso, ele bateu forte em Trump, em uma disputa que se tornou pessoal, mas não anunciou endosso a nenhuma candidatura remanscente.

Em Nevada, mais uma vitória convincente de Trump e pela primeira vez ele passou a barreira dos 40%. Trump ganhou com 46%, contra 24% de Rubio e 21% de Cruz. Ressalte-se que, apesar de Nevada ser um estado com muitos latinos, 95% dos inscritos em partido estão no Democrata. Dentro do Partido Republicano os latinos em Nevada são franquíssima minoria.

south carolinaEm delegados, na distribuição proporcional de Nevada, Trump ficou com 14, Rubio com 7, Cruz com 6, Carson com 2 e Kasich com 1.

Rubio comemora o fato de depois dessas prévias ter se firmado como o grande desafiador de Trump, mas Trump simplesmente conseguiu ganhar 3 das 4 primárias iniciais, todas elas com margens folgadas de diferença para o 2º colocado. Aos poucos a nomeação de Trump começa a ganhar o selo de “inevitável”.

Até o matemático e especialista em dados políticos Nate Silver, que meses atrás não acreditava na sustenção a longo prazo da candidatura de Trump já dá como 50% a probabilidade dele ser o nomeado do partido. Ainda por esse cálculo dele, outros 40% seriam de Rubio e os 10% restantes ficam dividos entre Cruz, Kasich e Carson.

Por falar em Kasich e Carson, ambos tiveram péssimo desempenho nos dois estados, abaixo de 10% em South Carolina e abaixo de 5% em Nevada, e se não conseguirem nada na Super Terça, devem abandonar a disputa.

Contagem Parcial de Delegados (estimativa):

  • Trump – 81
  • Cruz – 17
  • Rubio – 17
  • Kasich – 6
  • Carson – 5

Número mágico: 1237

Partido Democrata

Os resultados de Nevada deixaram a disputa democrata ainda mais indefinida. Se Hillary ganhou em um estado que sempre lhe foi fiel, graças aos latinos que são quase 1/3 da população (e ainda mais dentro do Partido Democrata) a diferença em porcentagem para Sanders não foi exatamente a esperada: 53% x 47%. Para complicar, o processo de prévias democratas em Nevada é o de “caucus” fechado, aquele que teoricamente é o mundo perfeito para Hillary.

hillary-clinton-speech-0310-super-169Se para Hillary ela ganha o 2º estado nas 3 primeiras prévias, caminhando para 3 em 4 pois ela é favorita em South Carolina, e mostra que Sanders apesar de fazer uma boa campanha não tem força para derrotá-la, para Sanders a eleição também não foi ruim pois ele demonstrou que sua campanha é organizada o suficiente para competir mesmo em caucus fechados (onde há necessidade de uma articulação e organização dentro do partido bem maior) e que o eleitorado latino não é totalmente impenetrável para sua campanha – como muitos supunham.

A pancada em delegados foi maior do que porcentagem faz supor: 20 a 15 para Hillary,  que assim eliminou a diferença sofrida no massacre de New Hampshire. Tal desproporção em delegados se deu porque Hillary, apoiada pelo seu feudo cativo de trabalhadores de cassinos de Las Vegas, varreu Sanders no 4º distrito e assim conseguiu mais delegados nesse distrito.

Três dos quatro estados iniciais das prévias eram favoráveis a Hillary e provavelmente Clinton garantirá a 3ª vitória em South Carolina, especialmente após o endosso de um dos principais líderes negros do estado a Hillary. Ainda sim, graças a proporcionalidade estrita em todas as prévias democratas, Sanders ainda está próximo de Hillary e a batalha parece que não durará pouco. Depois da Super Terça, que ainda deverá ser de sofrimento para Sanders, virá uma sequência de estados favoráveis a ele no calendário.

Contagem parcial de delegados* (estimativa):

  • Clinton – 52
  • Sanders – 51

Número mágico: 2382,5

* Neste momento inicial não contaremos os “superdelegados”, pois dependendo do resultado das sucessivas primárias, é possível mudanças. Atualmente, pelo levantamento da CNN existem 445 “superdelegados” apoiando Hillary e apenas 18 apoiando Sanders. Tal fenômeno de troca de posição de “superdelegados” foi visto com intensidade quando da disputa entre Hillary e Obama há 8 anos atrás.

Próximas Prévias

TedCruzWidePartido Republicano

Dia 1/3 – Super Terça (653 delegados, formas variadas)

Com a desistência de Bush e a iminente desistência de Kasich e Carson, Rubio deve se tornar o centro das atenções para destruir Trump. Porém, mesmo com resultados surpreendentes em segundos e terceiros lugares, até agora em momento nenhum Rubio sequer passou a frente de Trump. Rubio precisa ganhar desesperadamente em alguns estados na Super-Terça, ou além da contagem de delegados de Trump começará a ficar inatingível, Rubio passará a imagem de que não é forte suficiente para derrotar Trump em lugar algum.

O trunfo com o qual o Rubio e Cruz contam é com o “teto de votos” de Trump. Por mais que Trump tenha ganho 3 das 4 prévias até aqui, em nenhuma delas ele o fez com a maioria absoluta de votos. Os políticos tradicionais acreditam que este é o teto de votação de Trump e que a medida que as outras candidaturas forem desistindo, os votos se concentrem no candidato remanescente que não seja Trump.

Em minha análise, essa é uma visão muito otimista da situação. Por mais que realmente deva haver tais migrações em massa dos votos em Bush, Kasich e Carson para Rubio, tenho fortes dúvidas se isso ocorrerá com os eleitores de Ted Cruz, caso ele venha a desistir da disputa (é muita antecipação falar isso antes dos resultados do dia 1ª). Cruz é o único candidato do ultraconservadorismo e do TEA Party e esse último é conhecido justamente por apoiar nomes de fora do círculo das elites partidárias, círculo esse que Rubio sempre fez parte. Em uma comparação rápida, o perfil do eleitorado de Cruz se identifica muito mais com Trump do que com Rubio e é justamente essa migração de votos que deve fazer Trump romper a marca dos 50%.

bernie-sanders_ap-photo5Partido Democrata

Dia 27/02 – South Carolina (53 delegados, proporcional)

Dia 1/3 – “Super Terça” (865 delegados, proporcional)

Aqui ainda há a parada em South Carolina antes da Super-Terça. Clinton conseguiu o apoio das organizações de apoio aos negros em um estado com forte presença deles nas hostes democratas. Porém o processo de prévias será o de primárias abertas (ou seja, até republicanos podem votar), um processo que teoricamente é favorável a Sanders, que deve conquistar o voto em massa dos independentes. Por mais que as pesquisas hoje mostrem uma bela vantagem de Clinton, o mesmo filme já foi visto em Iowa e Nevada com Sanders ganhando muitos votos na reta final e apertando a disputa.

O mantra para Sanders até a Super Terça é apenas “dificultar a disputa”. O calendário de prévias iniciais foi cruel com Sanders, enfileirando vários estados que não lhe são favoráveis em um primeiro momento.

É claro que ele não poderá sair de mãos abanando da Super-Terça, afinal são 11 estados, inclusive alguns estados com mais de 100 delegados. Mas provavelmente ele não deverá conquistar mais do que 3 ou 4. A meta dele tem que ser conquistar Massachusetts, Virginia e Minnesota além de seu estado natal, o pequeno Vermont. No resto apenas perder de bem pouco.

Caso ele consiga manter uma desvantagem pequena para Hillary, a partir do dia 8 de março até o fim do mês haverá uma avalanche de fortes estados favoráveis para ele reverter o jogo.

Já para Hillary Clinton, o mantra é o exato inverso: “vencer e trucidar”. Ela tem que trucidar Sanders em South Carolina e ganhar muito na Super Terça para devolver à sua nomeação a aura de “inevitabilidade” que ela tinha antes do Natal e abrir tanta vantagem para Sanders, que pareça inútil uma tentativa de arrancada por parte deste a partir do dia 8. Mesmo que não obtenha uma vantagem esmagadora nos estados da Super Terça, ao menos ela precisa de umas 8 vitórias iguais as de Nevada em estados importantes.