A prefeitura de Porto Ferreira, no interior de São Paulo, anunciou no começo deste mês que cortou os ‘gastos’ com o carnaval para a compra de uma ambulância. Muito louvável a atitude da prefeita da cidade em se preocupar com a saúde da população. O país vive um momento de crise e as prefeituras cada vez arrecadam menos e tem que economizar para conseguirem sobreviver. Os cerca de R$ 120 mil reais que seriam investidos no carnaval vão agora, então, para a compra da ambulância.
A cidade de Hortolândia, também no interior de São Paulo, anunciou que os R$ 300 mil que seriam investidos com as escolas de samba da escola seriam agora remanejados para outras áreas mais prioritárias, como a saúde.
Muito lindo, muito bonito, mas até onde isso não passa de uma demagogia pré-eleitoral? 2016 é ano eleitoral e anunciar que ‘deixou de gastar com carnaval para gastar com aquilo que é necessário’ pega bem para os governantes. O Facebook fica cheio de elogios para os governantes.
Pegando a cidade de Porto Ferreira como exemplo, o orçamento da cidade de cerca de 54 mil habitantes é de R$ 173 milhões para o ano de 2016. Dessa verba, R$ 32 milhões irão para o departamento de saúde e R$ 49 milhões para o departamento de educação. O departamento de cultura é a pasta que menos receberá verba. Os R$ 2,05 milhões só são maiores que o orçamento da Procuradoria do município (R$ 1,13 milhão). Segundo dados da imprensa de Porto Ferreira, o orçamento foi aprovado ainda em dezembro de 2015. Já o anúncio do fim do carnaval veio em Janeiro deste ano.
Para se fazer um evento como o carnaval a administração municipal usa o orçamento da pasta (cada prefeitura com a sua) pensado no ano anterior. Assim que essa verba for aprovada, ela não pode ser remanejada entre as secretarias. Se quando a prefeitura fez o orçamento para o ano de 2016 estava previsto a realização do carnaval, ela mudar isso agora e remanejar de pasta é errado.
Mas a prefeitura não pode desistir do carnaval? Sim. Se for antes do Orçamento feito, ela pode muito bem remanejar a verba que iria para a Cultura e transferir para outra pasta. Depois que o orçamento foi aprovado, a prefeitura pode cancelar o carnaval, mas aquela verba já destinada para a pasta da Cultura ficará lá por todo ano de 2016 e que depois irá ser gasta em outros eventos da pasta.
É bom ter muita atenção para isso. Governante não pode mudar dinheiro de pasta. Se ele fizer é crime. Se ele anunciar que não vai ter carnaval sendo que a verba já está carimbada é demagogia pré-eleitoral.
Mas carnaval é prioridade assim?
Quando defendo que a cidade em que o carnaval existe deve mantê-lo não é apenas porque gosto de carnaval, mas sim porque o carnaval é, talvez, a maior representação cultural do nosso país. O leitor pode até não gostar de samba-enredo, samba ou de axé, mas deve reconhecer que o carnaval faz parte da nossa cultura e quando digo cultura não é apenas os grandes desfiles na Marquês de Sapucaí até aqueles nas pequenas cidades. O carnaval é cultura assim como teatro, música, dança e cultura também é educação. Não se faz educação apenas nas salas de aula. Nas passarelas também se faz ensinando a história de nosso país que passam pelo samba, pelo axé, pelo carnaval.
É demagogo, elitista, hipócrita esse discurso que Cultura (e coloco esporte também) é ‘gasto’.
Cultura é investimento porque é na cultura que conhecemos o passado do nosso país, da nossa gente, da nossa raiz. Cultura é investimento porque resgata jovens das drogas e da violência.
É preciso separar investimento em cultura com o ‘pão e circo’. O carnaval, como disse, é cultura e algumas coisas devem ser levadas em consideração.
Um governo não fazer um carnaval de R$ 800 mil numa cidade de 50 mil habitantes para fazer um de R$ 150 mil e valorizando a cultura carnavalesca é investimento, é cultura.
Um governo contratar duplas sertanejas para alegrar o povo nos quatro dias é pão e circo.
Convocar concurso de marchinhas é valorização da cultura.
Montar uma estrutura para música eletrônica é pão e circo.
É necessário dividir cultura e pão e circo neste momento. Não é porque são quatro dias de festa que deve ser festa a qualquer tipo com dinheiro público e falar que é investimento.
Cultura sim. Demagogia, pão e circo não.
Muito bom! O que mais enche o saco nesse período são os malas da internet comentando em cada notícia sobre carnaval que “é, tem mais que fazer festa mesmo, está tudo bem na saúde, educação”, ou o clássico “se o povo brasileiro gastasse a atenção e energia usada no carnaval com política, o país não estava assim”…
Brazão, outro exemplo da demogagia é São Gonçalo (RJ), cidade que vivo, onde cancelaram o carnaval “por causa da crise”…
Mas aposto que a Porto da Pedra vai receber a subvenção da Prefeitura local, como recebe todo ano…