No lançamento da saga Guerra nas Estrelas, eu tinha 11 anos de idade. Foi um pouco antes do início de minha autonomia para escolha da minha agenda cultural. Aos 11, eu ainda ouvia os discos do meu pai, ia ao cinema levado pelos mais velhos, lia os livros que havia à mão. Os mais jovens talvez estranhem, porque hoje qualquer bebê já é levado a fazer este tipo de escolha desde sempre. Mas a geração de quem tem hoje cerca de 50 anos, como eu, só começava a ter voz sobre a própria vida a partir da adolescência.

Quando foi lançado o segundo capítulo da saga, O Império Contra-Ataca, considerado por muitos como o melhor de todos os filmes de toda a série, eu estava entrando no Ensino Médio, tinha a minha própria patota, estava cercado de gente que curtia ficção científica, imerso num ambiente em que a tecnologia era um assunto entre jovens.

Eu vinha de uma influência doméstica dos grandes musicais, havia visto A Noviça Rebelde umas dezenas de vezes. A transição havia se iniciado com The Song Remains the Same (Rock é Rock Mesmo), o filme-concerto do Led Zeppelin, que eu fui ver com os amigos da Escola Técnica umas cinco ou seis vezes seguidas. Mas o que consolidou a minha fase “adulta” de cinéfilo foi O Império Contra-Ataca, com direito a rever o original Guerra nas Estrelas (depois denominado Episódio IV – Uma Nova Esperança). Foi ali, em 1980, aos 14 anos, que a tela grande entrou na minha vida.

Nem por isso eu me tornei um obcecado pela sequência. Um fã moderado, mas não um fanático. Mas fã o suficiente para acompanhar com ansiedade e contagem regressiva o lançamento do Episódio VII – O Despertar da Força.

Assim, comprados os ingressos para o dia do lançamento, programei as atividades cotidianas de forma a chegar ao cinema com tranquilidade e antecedência, o que deu a oportunidade de curtir o clima tanto de outros fãs que chegavam para a mesma sessão, quanto daqueles que saíam das sessões anteriores. Com cuidado para não ouvir comentários que pudessem ser spoilers.

Da mesma forma, nesta coluna evitaremos qualquer informação que possa revelar detalhes desconhecidos da trama para quem ainda não viu o novo filme. Mas estamos partindo do princípio de que, se você veio até este parágrafo, você já sabe que o Anakin e o Darth Vader são a mesma pessoa, e que o Luke Skywalker é filho dele, não é?

Ok, então você já sabe também que os antigos personagens dos episódios IV a VI estarão de volta 30 anos mais velhos nesta nova trilogia. Pelo menos, os que sobreviveram às batalhas passadas. Isso não é apenas um dado fundamental, mas é a linha-mestra da nova sequência: a retomada da magia de Guerra nas Estrelas, como já comentaram nove entre dez críticos de cinema.

Por isso mesmo, a sensação no saguão do shopping era a de que estávamos prestes a entrar num templo, prontos para grandes revelações metafísicas, iniciados numa religião. Com direito a camisetas, espadas “a laser”, capas e todo tipo de memorabília.

E é correndo o risco de cometer uma heresia que eu digo que este sétimo episódio é agora o melhor filme da série. Eu tenho ideia do tamanho da ousadia desta afirmação, mas o filme é realmente fantástico. Consegue reunir ação, roteiro, saudosismo, técnica, geração de expectativas, ritmo, boas atuações e bons cenários.

Minha grande dúvida antes de entrar na sala de projeção era sobre o que pesaria mais: a equipe contratada para conduzir o filme, reconhecidamente competente e respeitosa para com as franquias em que já trabalharam; ou o que eu chamaria de efeito-Disney, ou seja, a infantilização e extrema mercantilização da sequência.

Como se sabe, a Lucas Films, detentora dos direitos sobre Guerra nas Estrelas, foi vendida pelo cineasta e criador George Lucas ao império Disney. O efeito imediato foi uma campanha maciça de marketing antecedendo em muitos meses o lançamento, a entrada prévia no mercado de todo tipo de produto de merchandising e o anúncio de novos personagens adolescentes na saga. Deu medo.

Por outro lado, o diretor/produtor J.J.Abrams, anteriormente responsável por dois mega-sucessos da saga “rival” Star Trek, filmes nos quais resgatou o espírito original da série televisiva dos anos 1960. Envolveu-se com Missão Impossível, em que deu novo ritmo à sequência estrelada por Tom Cruise. Abrams também é um mestre na produção de tevê, sendo mais conhecido pela série Lost. É o tipo de profissional que não assina bobagens, garantindo a junção equilibrada entre sucesso comercial e competência artística.

A equipe de roteiristas ficou sob comando de Lawrence Kasdan, autor de O Império Contra-Ataca. A ele, se somaram o próprio Abrams e o oscarizado Michael Arndt (Pequena Miss Sunshine e Toy Story). Enfim, cinema de gente grande.

E é exatamente o roteiro o grande destaque de O Despertar da Força. Cumpre, com louvor, a missão de apresentar a saga aos novos fãs, iniciar a temática da nova trilogia, introduzir bem os novos personagens e mesclar os antigos heróis e vilões. Reserva um pequeno espaço para as personagens bizarras que são exigência das equipes de merchandising, porque vendem muitos bonequinhos, e isso seria inevitável. Entretanto, o roteiro consegue isolar estas criaturas da trama, sem infantilizar demais o filme.

No começo, a já tradicional abertura com o letreiro situando a plateia na trama, há um suspiro coletivo na sala. A cada aparição dos antigos personagens, palmas, apupos e respirações ofegantes são ouvidas na audiência. Os novos e jovens atores dão conta do recado e fazem a ponte para os novos capítulos por vir. Tudo corre redondo, com a agitação no ponto certo, com referências à primeira trilogia filmada, grudando os religiosos e simples fãs nas poltronas. O resultado é um filme para iniciados e iniciantes.

Vá ao cinema e confira. E que a Força esteja com você.