Encontrei o Botequim de bêbado tem dono (2008) em um estande na Bienal deste ano e, assim que vi o livro escrito por Moacyr Luz e com incríveis ilustrações de Chico Caruso, não tive dúvida de que ele iria para a minha estante.

As crônicas que tratam dos vinte e cinco bares apresentados combinam humor e memória afetiva para contar histórias boêmias e impregnadas de amor à cidade. Adquirir esse livro em um evento que não teve sequer uma mesa para discutir a crônica carioca ao menos serve de alento a quem é declaradamente fascinado pelo gênero.

O leitor, que a todo momento tem a agradável sensação de fazer parte de um bom papo de mesa de bar, tem a oportunidade não só de ligar-se intimamente a um traço cultural da cidade – o botequim –, mas também de receber preciosas dicas relacionadas a ele. O melhor chope, obviamente com colarinho, está no Adonis; no Momo é servido um bife a cavalo sem igual; no Costa foi descoberto um Steinhager batizado, à época, de “a mais recente relíquia de Vila Isabel”; são especiais os bolinhos de bacalhau do Paulistinha, e é lá que tem caldo de galo e roda de samba em homenagem a São Jorge.

desenho-autorAlém disso, os pastéis de angu do Beco do Rato, as torradas ao alho do Getúlio, os filés à francesa do Lamas, os salgadinhos do Bracarense e a batida de maracujá e os torresmos do Real Chopp também merecem destaque. E por falar em destaque, o cronista chama a atenção para a excelente música do Bip-Bip e afirma que, “se o samba invadiu de novo a cidade, a retomada nasceu nas mesinhas do estabelecimento”.

Nas andanças pelas ruas do Rio de Janeiro, que tem sua memória resgatada no Paladino, passamos pela Rua da Conceição, pelos becos da Lapa, pela Miguel Lemos, pela São Luiz Gonzaga e por muitas outras que guiam os passos ébrios ou ainda sóbrios aos botecos. Pra citar João Nogueira, essa “vida boêmia de bar em bar” encontrada em cada página mostra o botequim como ambiente democrático, avesso às chatas regras de boas maneiras e profundamente imerso na vida suburbana que pulsa em nossa cidade.

Voltando às particularidades de cada boteco, cabem as lembranças de que o Capela – feito para profissionais – registrou a presença de Zé Keti, Nelson Cavaquinho e Geraldo Pereira e de que no Sobrenatural Elton Medeiros cantou “Peito Vazio”. Se os bares têm tantas boas histórias, Moacyr Luz é quem tem a pena da galhofa para registrá-las. E tudo isso com as ilustrações que Chico Caruso proporciona ao final de cada crônica, captando o instante que aproxima ainda mais o leitor dos relatos reunidos no livro.

Vale dizer por fim que, neste tempo em que o jornal(ismo) agoniza e perde seus suplementos literários, a publicação semanal das crônicas de Moacyr Luz em O Dia acalenta os leitores ávidos pelos bons textos que o caráter dogmático da imprensa tem combatido.

[N.do.E.: acima, o samba de autoria de Moacyr Luz com o qual a Renascer de Jacarepaguá irá desfilar em 2016. PM]