Um dos bairros de maior extensão territorial do Rio de Janeiro, Jacarepaguá chega a ter sub-bairros em sua área. Cidade de Deus, Freguesia, Taquara, Anil, Gardênia Azul, Praça Seca, Curicica, Tanque. Neste último está sediada a escola de maior sucesso recente da região, a Renascer de Jacarepaguá.

Não é a mais tradicional agremiação, honraria que pertence à União de Jacarepaguá, cuja ala de compositores foi mais honrosamente frequentada ainda por Paulinho da Viola (a verde e branco mais tarde, em 2009, homenagearia o ilustre componente mais identificado posteriormente com a Portela, como é notório).

A Renascer é fenômeno mais recente. Foi fundada em 1992 e chegou à atual Série A em 2005. Desde então, tem se notabilizado muito menos como escola de samba e muito mais como escola de sambas. O trocadilho não desmerece os bons carnavais já apresentados. Ao contrário, exalta a boa qualidade de sambas enredo produzidos nesta década por ela. Convido os amigos a viajar na discografia. É louvável a regularidade apresentada pela Renascer nestes dez desfiles. Colabora o fato de haver uma repetição de autores, o que cria uma linha de trabalho.

Cláudio Russo, um dos bambas da atualidade, tem um trabalho autoral de sambas densos, bem trabalhados em letra e melodia. É o que se nota na obra de 2007 (uma das minhas favoritas, por sinal), cujo refrão principal é muito inspirado e traz uma primeira de poesia sublime. No ano anterior, um samba mais divertido, irônico, com uma pegada diferente mas a mesma capacidade de traduzir muito bem a sinopse.

Mesmo na efêmera passagem pelo Grupo Especial, quando homenageou o artista plástico Romero Britto, a Renascer levou para a avenida um samba que, se não está entre os melhores desta década na agremiação, julgo de ter sido vítima daquela canetada clássica que se dá à escola que chega do Acesso. Volta e meia me pego cantando trechos desta obra que, para mim, tem passagens líricas e melódicas bem agradáveis.

Vale a pena escutar de novo essa lista aqui:

2015: “Manifesto ao povo em forma de arte” Candeia (Cláudio Russo, Teresa Cristina e Moacyr Luz). Estandarte de Ouro.

2014: “Olhar caricato, Simplesmente Lan” (Cláudio Russo e Moacyr Luz)

2013: “Rio, uma viagem alucinante” (Gabriel da Penha, Deco, Igor do Cavaco, Leandro Nogueira e Luiz Gustavo)

2012: “O artista da alegria dá o tom da folia” Romero Britto (Cláudio Russo, Adriano Cesário, Fábio Costa e Isaac)

2011: “Águas de Março” (Jayme Cesar, Marquinho Valle, Di Bamba, Carlos Dias e André Kaballa)

2010: Aquaticópolis (Cláudio Russo, Adriano Cesário, Tinga, Fábio Costa e Beto Lima)

2009: “Como vai, vai bem? Veio a pé ou veio de trem?” (Gabriel da Penha, Leandro Nogueira, Luiz Gustavo, Deco e Hélio Luna)

2008: “É chegado a Portugal o tempo de padecer. Se te oprime a cruel França sorte melhor hás de ter” (Adriano Cesário, Josemar, Teleco, Julião e Leléo)

2007: “Jacarepaguá, fábrica de sonhos” (Cláudio Russo, Carlinhos Detran, Marquinhos, Flavinho do Cavaco, André Malheiros, Julinho Cê)

2006 “A Divina Comédia Brasileira” (Cláudio Russo, Carlinhos do Cavaco, Julinho Cê, Jefinho do Amaral)

Para 2016 (acima, o áudio) a Renascer repete a fórmula dos últimos dois carnavais. Não promove concurso entre seus compositores. Aí aquele trocadilho acima se justifica. A escola não se firmou quando esteve no Especial justamente porque falta a ela a essência de uma Escola de Samba.

A Renascer não tem a força comunitária necessária para se estabelecer, para fincar raízes. Isso fica evidente na falta de uma ala de compositores mais atuante e num certo desmonte sofrido depois da queda – quando havia um cenário favorável para aquele passo à frente.

Ainda assim, com o luxuoso trabalho de Cláudio Russo e Moacyr Luz, somado à chegada de Teresa Cristina, a turma do Largo do Tanque segue sendo uma escola de sambas. Depois de Lan e Candeia, duas maravilhas para os ouvidos em tempos de safras tão irregulares, vem aí “Ibejís. Nas brincadeiras das crianças os orixás que viraram santos no Brasil”. O enredo, de argumento e sinopse muito bem construídos, originou mais um sambão da Renascer de Jacarepaguá.

A Série A, que deve ter um CD de altos e baixos pelo que se nota, terá, uma vez mais uma faixa para ser ouvida e repetida. A do samba, como de costume, muito bem interpretado por Diego Nicolau e Evandro Malandro. E se a Renascer ainda é jovem e pode evoluir em vários quesitos é certo que, novamente, estará bem representada e forte em seu samba enredo.

[N.do.E.: o curioso é que, oficialmente, faço parte da Ala de Compositores da Renascer, após quatro desfiles na ala – no alto do post, reunida antes do desfile de 2014. PM]