Ultimamente tem sido muito difícil escrever nesse blog. Não por falta de ideias, mas, por excesso delas. Tenho sofrido de muitas incertezas. Nelas, eu procuro sistematizar algum pensamento lógico e plausível, mas, logo no outro dia, sou o primeiro a por em dúvida o que tinha acabado de pensar e e até mesmo dizer.

Talvez essa característica seja bem marcante nos dias atuais. A quantidade aviltante de informação e notícia faz com que tenhamos um bilhão de possibilidades de argumentos. Somos bombardeados por tanta coisa… como filtrar?

E não foi diferente em relação aos acontecimentos desse final de semana. Eu, assim como muitos, faço uma análise crítica dos movimentos dos dias 13 e 15 de março. Fiquei chocado com a pouca experiência ou desconhecimento de causa de muita gente que foi na manifestação do Domingo, especialmente. Me indignei com a ideia de impeachment da presidenta Dilma, ainda que tenho clara noção de que estou mais alinhado a oposição de esquerda a esse atual governo. Me transtornei, ao ouvir algumas pessoas pedindo intervenção militar, em outras palavras, golpe. Tal sentimento se manifesta sobretudo porque fiz mestrado em História e o tema da dissertação foi o Terrorismo de Estado da ditadura brasileira e a perseguição a exilados brasileiros na Argentina.

É, não tem sido nada fácil compreender nossa atual sociedade brasileira. Sou historiador, mas também sou contemporâneo de nossa época. Tenho muita curiosidade para saber o que os historiadores do futuro falarão sobre esses episódios. Qual será o recorte? O que tem por trás disso tudo? Certamente não podemos ignorar que esses não são os primeiros manifestos de rua.

noticia_262003_img1_protesto-em-curitiba1E eu não estou me referindo a junho de 2013.

Estou me referindo aos protestos que ocorreram mês passado em todo o estado do Paraná, contra o governador Beto Richa, do PSDB. Os protestos, mesmo sendo de esfera estadual, tiveram muito mais propósito e radicalidade em suas atuações. A ameaça aos direitos dos trabalhadores fez com que até o comando da polícia estadual se recusasse a cumprir ordens do governador, de dispersar com bala e bombas a população enraivecida com estadio paranaos ditames do governo paranaense, que, vale ressaltar, não era petista.

Milhares de pessoas ocuparam a assembleia legislativa daquele estado; 20 mil pessoas lotaram um estádio para decidir pela manutenção da greve até a retirada da pauta de votação pelos deputados. Ou seja, o arquivamento do projeto de arrocho salarial tucano foi rechaçado em menos de 3 meses da posse, após ser reeleito.

E importante frisar que, quando faço a metáfora sobre “o feitiço e feiticeiro”, não estou necessariamente me referindo ao fato do remédio amargo que os últimos governos petistas tem sofrido com a nova classe média que saiu da linha da pobreza, mas que reclama, veementemente contra a corrupção ou contra o corte de direitos. Nem com os últimos protestos, entre eles, o dos caminhoneiros, contra o pedágio, preço alto do diesel e por uma nova tabela de frete. Ou mais recente ainda, dos garis do Rio de Janeiro e de Curitiba.

A construção de cidadania através do consumo foi um erro crasso petista, sobretudo porque nessa trajetória, o partido foi perdendo sua identidade, sua função, que muitos militantes um dia ajudaram a construir ou militaram em prol da causa mais nobre, a do trabalhador, não existe mais. O PT desconfigurou-se e perde cada vez mais a noção de suas raízes históricas, o que pode sair muito caro para os movimentos sociais, esses que, ao tentarem se reerguer, tanto da cooptação e silêncio, diante dos abusos cometidos pelos lideres petistas, não consigam se levantar. Ou seja, o PT esta em fase de extinção. Muito dificilmente vai conseguir recuperar seu prestígio e sua principal razão de existir, ou que um dia serviu para tal intento: defender incondicionalmente a classe trabalhadora.

Mas não é sobre a crise de identidade do PT que eu quero tratar. Tampouco sobre quem vai ocupar esse vácuo. Mas, todavia, ver por um outro prisma o que meu amigo e professor, Aquiles Lazarotto (http://mestreaquiles.blogspot.com.br/) apontou numa conversa com café, num fim de tarde de blackblocsegunda-feira e que, de certa forma, provocou minha vontade e inspiração para discorrer sobre o assunto. O feitiço PODE se voltar contra o feiticeiro tem muito a ver com o que a escritora Eliane Brum disse: “A rua é, historicamente, o território das incertezas – e do incontrolável”. (http://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/16/opinion/1426515080_777708.html). Ou seja, o que quero dizer é que o povo está aprendendo a ir pra rua. E pior (ou melhor), está gostando de protestar. De sair. De gritar. E sinceramente isso pode sair do controle sim, até da rede globo e cia ltda.

Por que digo isso? Se até no Egito manifestações foram convocadas pelo facebook, nada impede que muitos daqueles que realmente estão indignados com a corrupção e contra os rumos do país, (o que é bastante louvável) que foram na manifestação do dia 15, tenha caído de para-quedas e esteja realmente desesperados por dias melhores, de repente, passam a não seguir mais o que grande mídia noticia. GARISPassam a enxergar com outros olhos os movimentos, sindicatos e partidos que não apoiam o governo petista, e também não querem saber de golpe militar ou “impitíma”. Estamos falando que a guinada para esquerda só pode ser dada pela esquerda, e não por um governo que tem como ministro da Fazenda, um defensor do mercado como Joaquim Levy, ou uma ministra da Agricultura como Katia Abreu. Quem vai dar a tônica de qualquer guinada serão aqueles que sempre tiveram experiência de rua. E não estamos nos referindo a um movimento de direita, bancado por bilionários. Estamos falando daqueles que já defenderam o partido do atual governo, de jovens que lutam contra a homofobia, o machismo e o racismo, o feminicídio, o extermínio de comunidades indígenas e quilombolas. São esses os prováveis protagonistas das próximas manifestações. São esses que poderão fazer com que a direita raivosa se arrependa arduamente de ter ensinado o caminho das pedras chamado “manifestação de rua”. Que mais protestos ocorram toda semana, não só no final de semana. Que os panelaços pelo aumento do tomate ocorram. Que ocorram mais de uma vez por semana. Que globo, Veja e cia ltda temam pelo povo que eles estimularam a se mover. Afinal, as massas podem ser de manobra por um tempo, mas parte dela vai perceber qual jogo ela está fazendo. Como já dizia Rosa Luxemburgo “quem não se movimenta, não sente as correntes que o prendem”. E toda essa indignação pode se tornar muito maior, ao perceber que o PT é a própria direita.assembleia parana

Aqueles que não concordam com os ditames do governo, o mesmo que não fez nenhuma delimitação de terras indígenas, que construiu a usina Belo Monte, que cortou verbas da educação, que vempraticando uma política econômica tão contestada pelo PT histórico, de esquerda e de luta vão se manifestar. Irão se manifestar aqueles também que foram na manifestação do dia 15, pois nem todo mundo que foi nesse dia deseja a volta da ditadura ou o impeachment. Estão desesperados e, na ingenuidade e inexperiência de atos de rua pensam que basta gritar “fora dilma” que tudo se resolve. Mas o ato subversivo de ir pra rua foi provocado e ele e incontornável.

Agora, para que essa possibilidade se concretiblack-bloc-rioze, vai depender bastante dos movimentos sociais e partidos de esquerda em agir (isso obviamente exclui o PT e partidos governistas), ou se vão agir e qual forma utilizar. A necessidade de sair da zona de conforto e lutar, mas não apenas fazer campanha salarial, mas defender a Petrobras, ainda que ela representa a exploração de um combustível poluente, e também lutarmos por reforma política. Pois só a luta muda a vida. E a luta agora é bem mais abrangente do que esse ou aquela carreira de servidores. Estamos falando de ataques diretos a direitos dos trabalhadores, os quais foram conquistados com muita luta no século passado e que, pasmem, estão sendo destruídos por orientação de um partido que nasceu na base de sindicatos e movimentos sociais no período de redemocratização.

Portanto finalizo dizendo: “o feitiço pode se voltar contra o feiticeiro”, mas não podemos esperar que isso ocorra de forma espontânea. Ou os trabalhadores reagem ou a direita e/ou governistas farão o que bem entenderem de nossas vidas.