No último sábado assisti ao filme “Aviões” (acima, o trailer oficial em português), nova animação dos estúdios Disney. O curioso é que vi a película em uma sessão privada dentro do shopping Ilha Plaza, dentro do aniversário de um coleguinha da minha filha mais nova.

Funciona da seguinte forma: a sessão é realizada pela manhã (fora do horário normal do cinema), distribuem-se pipoca, refrigerantes ou água para os convidados, assiste-se ao filme e depois canta-se parabéns e corta-se o bolo. Para um pai que desde 2008 vem em uma batida de 40/50 festinhas infantis por ano, não deixa de ser interessante…

O filme em si é uma espécie de “irmão mais novo” da animação “Carros”. Um avião de pulverização de agrotóxicos resolve participar da maior competição de aviões existente no mundo. Após uma série de percalços, o bem vence o mal, ele se supera e vence a competição realizada ao redor do mundo – e sim, isto é um “spoiler”.

Sendo visto como uma animação, é um filme até divertido. Contudo, um olhar mais “político”, por assim dizer, nos traz alguns elementos e algumas questões bastante incômodas, para se dizer o menos.

A primeira delas é que o filme promove os defensivos agrícolas o tempo inteiro. Chamado pelo protagonista de “vitamina”, em diversas cenas o protagonista enaltece as virtudes do tal produto que ele pulverizava na cultura de milho. Por outro lado, o mau cheiro lembrado pelos vilões do desenho animado tem o papel de transformar algo ruim (o mau cheiro dos agrotóxicos) em coisa boa: o frescor da “Vitamina” das plantas.

Embora tal informação não esteja disponível nos créditos, me parece claro que a película teve patrocínio ou apoio da Monsanto. A mensagem é clara: agrotóxico é vitamina, agrotóxico é bom, agrotóxico promove a saúde e torna as plantas mais viçosas. Nada mais falso, como sabemos – e sugiro aos leitores dedicarem duas horas de seu tempo para assistir ao vídeo deste post.

O segundo ponto me incomoda menos, mas é digno de registro. Antes da competição em si o protagonista participa de uma etapa classificatória para a competição que é claramente inspirada na “corrida aérea” organizada pela Red Bull – e que teve uma etapa muito tumultuada aqui no Rio de Janeiro anos atrás. Ou seja: merchandising declarado – e sabemos que o público alvo do desenho animado são personalidades em formação. Inclusive, como escrevi em post dos primórdios deste blog, sou a favor da proibição das propagandas e comerciais em canais de televisão dedicados ao público infantil.

Outra trama paralela, envolvendo o instrutor do protagonista, glorifica o poderio militar norte americano. O instrutor é o melhor porque serviu na esquadrilha de um porta aviões americano sediado no Pacífico. Ou seja: tem algum problema? Recorra à polícia do mundo…

Finalizando, uma das tramas secundárias traz um personagem brasileiro, chamado de Carolina. O avião é um Embraer, mas isso nem é o mais importante: ela é a “moça bonita” dos competidores, sendo cortejada por um personagem “latin lover” até ceder. Some-se a isso a dublagem da cantora Ivete Sangalo e temos o estereótipo perfeito: a mulher brasileira sendo retratada como a morena sensual, fácil e “desfrutável”. A mensagem é clara: o Brasil é terra para se arrumar mulher – e se divertir.

Vale lembrar que o outro personagem feminino, namorada do protagonista, tem origem no Sudeste Asiático – outro lugar associado a turismo sexual. Coincidência?

Acaba se reproduzindo e se incutindo em crianças, com personalidade em formação, conceitos que sabemos inadequados. Enquanto isso, temos o canal “Cartoon Network” retirando de sua grade o desenho “Tom e Jerry” sob alegação de que o desenho é “politicamente incorreto”. Não conheço casos de terroristas e assassinos sob influência deste divertido desenho (eu mesmo seria um), mas sabemos dos danos causados pelos defensivos e pelas hordas de vôos charters com turistas em busca de mulheres no Brasil, no Sudeste Asiático e em outros países.

Santa incoerência, Batman! Ou seria o poder das grandes corporações?