É uma data bastante arquetípica do sincretismo religioso brasileiro, por envolver adeptos da Igreja Católica, do Candomblé e da Umbanda – embora a primeira, oficialmente, comemore hoje, dia 26, após a Reforma Litúrgica realizada pelo Vaticano em 1969 ter alterado a data de 27 para 26 de setembro.
Cosme e Damião, segundo a tradição, eram médicos gêmeos que viveram no Século III e que praticavam a medicina de forma caridosa, sem exigir pagamento. Ainda de acordo com a convenção ambos foram martirizados na Síria durante a perseguição feita pelo imperador Diocleciano – o mesmo que teria sido algoz de São Jorge – e após suas mortes o povo transportou seus corpos para Roma.
Objetivamente há dúvidas sobre a maneira como os irmãos pereceram e, até mesmo, sobre sua existência. Alguns grupos de pesquisadores argumentam que Cosme e Damião são a versão romana da lenda grega dos filhos gêmeos de Zeus.
Mas isto não vem ao caso.
Cosme e Damião são os padroeiros dos médicos, dos farmacêuticos (ato falho: havia escrito “feiticeiros” originalmente) e diz-se que a Fé nos santos ajuda mulheres que tenham dificuldade a engravidar.
Na Bahia os santos são cultuados especialmente pelos adeptos do Candomblé, que possuem como tradição o denominado “caruru de Cosminho”, oferecido em Igrejas, Templos e nas casas dos fiéis – mais ou menos similar ao hábito carioca de oferecer doces.
Na tradição baiana Cosme e Damião são associados aos ibejis, divindades gêmeas do Candomblé. Nos cultos afro-brasileiros Cosme e Damião estão sincretizados a entidades infantis, apesar de sua representação como adultos por parte da Igreja Católica.
No Rio de Janeiro, outro local onde o culto a São Cosme e São Damião é bastante forte, há – melhor dizer havia, explico mais abaixo – uma prática bastante antiga, principalmente no subúrbio: distribuir doces nesta data na rua.
É tradição tanto de adeptos da Igreja Católica que fazem promessas aos santos ou simplesmente querem agradecer quanto de fiéis de cultos afro-brasileiros. Estes últimos, especialmente adeptos da Umbanda – mas não somente esta.
Fazendo um parêntese, talvez este seja o motivo pelo qual até hoje não ligo muito para doces.
Naquela época (década de 80) a média era em torno de trinta a trinta e cinco saquinhos conseguidos a cada ano. Era bala para uns vinte, trinta dias de consumo.
Eu costumava apartar quando chegava em casa os saquinhos de doces “bons” e os “mais ou menos”, dentro da qualidade que eu percebia. Quando tinha “Batom” ou pastilha de hortelã da Garoto (aquela embalagem verdinha) era uma festa. Chocolate de boa qualidade, então, era uma bênção.
Sobre o primeiro, vale uma nota.
O avanço destas denominações pentecostais e neo pentecostais sobre a sociedade carioca não somente diminuiu o número daqueles que ofereciam os doces de “Cosme e Damião” como também efetuou influência bastante perceptível na quantidade de crianças que saem dia 27 de setembro “correndo atrás de doces”. É um caso evidente de como estas alterações no mapa religioso carioca estão alterando e até suprimindo manifestações culturais do Rio de Janeiro.
A cultura brasileira tem como marca o sincretismo desde a formação do país e a postura excludente dos dirigentes, teólogos e adeptos destas seitas acaba causando uma transformação na sociedade com o sentido de homogeneizá-la de forma compulsória. E perda de cultura e de tradições culturais – pois mais que religiosa, é uma tradição cultural antes – nunca pode ser considerada salutar, ainda mais em nome de um duvidoso sectarismo.
Tenho que concordar que é uma tradição que está se perdendo. Junta-se ao texto do autor o fato da enorme sensação de insegurança que acomete a todos. As mães não querem que seus filhos aceitem doces de estranhos com medo de possíveis substâncias injetadas. É uma sociedade paranóica turbinada com doses de fundamentalismo religioso. E com isto morre-se uma tradição. Pena.
Caro Flávio, obrigado pela visita.
Você toca em um ponto que me passou despercebido, e verdadeiro.
abraços
Eu e minha irmã gêmea nascemos de uma promessa a São Cosme e Damião e minha mãe entrega doces até hoje. Quando morávamos na Tijuca e éramos crianças, todos iam para a rua pegar doces e tocávamos a campainha dos aptos para ver quem dava docinhos. Saudades dessa época. Hoje em dia vejo pouco isso. As pessoas tem muitos amigos virtuais, se trancam cada vez mais em seus mundos, por medo, insegurança. O contato com as crianças como existia na minha época infelizmente não existe mais. Lembro das crianças que diziam, Posso levar pro meu irmão menor, pra minha mãe, para alguém doente. A gente dava sempre um saquinho extra, mesmo sabendo que, muitas vezes, era pra eles mesmos.
e verdade
meu irmão tbm nasceu de uma promessa a são cosne e damião… esse é o 2 ano que minha mae dar doce *-* , é verdade é bem dificil ver gente dando doce. até que aonde eu moro tinha muita criança correndo atras de doce. mais mt pouca gente dando :(
Graças a Deus que práticas como estas estão desaparecendo. Isto mostra que a população está abrindo os olhos e entendendo que práticas contrárias a Palavra de Deus devem realmente desaparecer e devem surgim práticas que glorifiquem a Deus como o Natal, dia de ação de graças, …
Radical!