Nesta sexta feira, a coluna “Tangentes Paralelas”, assinada pela historiadora Gabriela Alves, discorre sobre a condição da lésbica na sociedade brasileira a partir da 10ª Caminhada de Lésbicas e Homossexuais de São Paulo, realizada no último sábado (acima e no vídeo que fecha este post).

Sem dúvida alguma, pelo menos em meu superficial olhar sou obrigado a concordar que a homofobia em relação às mulheres é bem menos visível que a masculina – e por isso mesmo tem de ser divulgada e combativa.

Vamos ao texto.

A visibilidade lésbica no Brasil contemporâneo

O último final de semana foi agitado para as causas da comunidade LGBT. No sábado ocorreu a 10º Caminhada de Lésbicas e Bissexuais de São Paulo, com o tema “Celebrando e discutindo as relações entre mulheres”. A Caminhada foi o resultado de uma semana de atividades promovidas pela Liga Brasileira de Lésbicas, além de organizadoras autônomas.

Na Caminhada, a chamada ‘visibilidade lésbica’ se tornou o norte para os passos que se seguiriam Avenida Paulista à frente. Isto porque, numa sociedade machista como se evidencia ser a nossa, as relações lesboafetivas sofrem de um tipo específico e direcional de preconceito. Destacar a ‘lesbofobia’ do âmbito da ‘homofobia’ não é excluir as relações lésbicas do mesmo tipo de preconceito que recai sobre as relações homossexuais em geral, mas é atentar para as diferenças originárias de um tipo de preconceito, que se diferencia bastante daquele dispensado às relações entre homens.

De onde, senão do fetiche, o machista contemporâneo interpreta as relações lésbicas?

O fetiche por duas mulheres – preferencialmente nuas e decididamente ‘femininas’ – habita a consciência e a inconsciência machista no contemporâneo. Um quê de nada.

É isso que soa, ou não soa, aos ouvidos machistas que se deparam com a frustrante relação entre duas mulheres. Frustrante aos olhos masculinos médios, claro. Já que não corresponde a qualquer expectativa de uma relação que se leve minimamente a sério, assim como não se leva a sério uma comida vistosa, mas sem tempero.

O tempero fálico, que parece ser tão necessário, ali inexiste. Por certo devem ser só muito amigas, que por vezes fazem algo estranho, parecido com sexo, mas que não é, obviamente. Conceber que duas mulheres poderiam, em propriedade de seus corpos, serem capazes de causar o prazer mútuo é inconcebível no mundo real – aquele fora dos vídeos pornôs mainstream.

Se notarmos todo um hábito social, que caminha em vias de estranheza, preconceito, violência, fobia e /ou completa nulidade para com as relações lésbicas, hoje já muito distantes da protegida ilha de Lesbos – e igualmente muito distantes do gueto-lésbico do seriado norte-americano “The L Word”, notamos que para além da sexualidade a mulher em última instância não perdeu o seu posto no ralo da fragilidade, no ranço do silêncio e na sujeira da violência.

Se estas mulheres ainda hoje encontram barreiras ao travar seus vínculos afetivos/sexuais com parceiros homens, quiçá quando lésbicas. Ou elas somem, no silêncio de uma piada que não teve graça, ou são abordadas grosseiramente, e sem aviso, ao cruzar uma rua qualquer: “sapatão!”, “cabe mais um?”, etc.

Desta forma, ainda que não estampem freqüentemente os noticiários por sofrerem agressões no novo palco da violência contra homossexuais que se tornou a mesma Avenida Paulista, onde ocorre a Caminhada, lésbicas sofrem com uma frequente e potente avalanche de humilhações, agressões e ameaças todos os dias, mas por terem sua ‘visibilidade’ comprometida, pouco são notadas tais ações discriminatórias.

Caminhemos assim para que a visibilidade lésbica ganhe os tão desejados contornos do respeito, que afasta o machismo, a homofobia e a lesbofobia de suas relações.

Até a próxima semana!