Estou para escrever sobre este fato desde o início da semana, mas a vida está bem corrida nos últimos dias.

No último sábado contratamos os serviços de um eletricista para fazer dois pequenos reparos no apartamento em que moro. Nada muito complicado mas além da minha total inaptidão para serviços domésticos – costumo dizer que se dependesse da minha habilidade manual para sobreviver já teria morrido de fome há muito tempo.

Já no finalzinho do serviço a escada cedeu e o eletricista desabou junto com a mesma, batendo o braço no chão e aparentemente sofrendo uma luxação ou uma fratura, necessitando, portanto, de atendimento médico. E se iniciava a nossa via crúcis atrás de um ortopedista.

Somente na Ilha do Governador rodamos clínicas particulares e hospitais públicos. Na Santa Maria Madalena, clínica particular, foi nos informado que o único ortopedista estava em uma cirurgia e não havia previsão de atendimento. Fomos a outra clínica particular, especializada, e o quadro era o mesmo.

Rumamos para a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) pública do Cocotá, ainda na Ilha. Nem entramos: foi nos dito que não havia ortopedista em final de semana e que nem adiantava ir ao Paulino Werneck – o hospital de emergência do bairro – que também não tinha. Alertado por um outro paciente rumamos para o Hospital de Saracuruna, onde teria ortopedista – e que não fica nada perto de onde estávamos.

Chegando lá, vimos que a informação era errada: também não encontramos profissional disponível. O funcionário responsável pela triagem recomendou que fôssemos ao hospital Moacyr Rodrigues do Carmo, público e que pertence ao município de Caxias, que lá encontraríamos o especialista necessário ao atendimento.

Pega o carro e se retorna até o hospital citado (acima), que fica na Rodovia Washington Luis, bem no início e é administrado pela prefeitura do município. Curiosamente, exatamente ao lado do parque gráfico do jornal O Globo. Nisso já haviam transcorrido mais de duas horas do acidente e eu já havia rodado uns 60 quilômetros entre idas e vindas.

Realmente a indicação de Saracuruna revelou-se correta: o hospital dispunha de ortopedista. Apesar de não se permitir que acompanhantes entrem no espaço da emergência, o atendimento foi até razoavelmente rápido: uns 10 minutos depois de nossa chegada ele já passou pela triagem e foi indicado ao especialista, que o examinou e imediatamente o encaminhou ao raio-x. Este processo todo deve ter levado pouco mais de uma hora, quando se teve o diagnóstico: fraturas no braço, no punho e um dos dedos – o que me surpreendeu dado que tinha sido uma queda até “boba”.

A indicação original era cirúrgica mas, no momento em que escrevo, esta não seria necessária. Ainda assim ainda no sábado ele fez os exames do chamado “risco cirúrgico” e teve o braço imobilizado. Na medida do possível, ele está bem.

Um fato curioso é que, ao que parece, o hospital é referência de maternidade na região. Poucas vezes vi tantas grávidas em tão pouco tempo, 80% delas ainda adolescentes. A ponto de ver mãe e filha ambas grávidas (a menina, com muito boa vontade, devia ter uns 13 anos) e um casal com as três filhas grávidas, duas em trabalho de parto – neste caso todas já adultas. Parece claro que precisa haver massificação maior de métodos anticoncepcionais a fim de diminuir os índices de gravidez na adolescência.

No sábado em que estive lá estavam chegando cadeiras para substituir as disponíveis aos pacientes na área de emergência e para os acompanhantes do lado de fora. Apesar deste inconveniente de não se poder acompanhar o atendimento, fiquei bem impressionado com o processo: não foi muito diferente de um hospital particular, com todos os exames feitos na mesma tarde e o encaminhamento para retomar na segunda feira a solução do caso.

Aliás, pelo menos a percepção que tenho é de que em termos de emergência a diferença entre hospitais públicos e privados me parece bem pequena: além desta experiência, em outros casos em que precisei de atendimento para minha filhas na rede privada não vi muita diferença em termos de tempo necessário para se encaminhar uma solução ou ainda exames requeridos. Não sei se a realidade mas minha percepção, pelo menos, é essa.

Outro ponto é a dificuldade de se encontrar ortopedistas para atendimento emergencial aos finais de semana: como o leitor pode ver apenas no sexto local procurado conseguiu-se encontrar este especialista. Não sei se há falta generalizada deste tipo de profissional, embora a experiência que tenha em termos de consultas – tenho problema crônico nos joelhos – indique que sim. Novamente não vi vantagem na rede particular ou na privada – me parece que a vantagem desta última está na sequência do tratamento, não na presteza do atendimento inicial.

E o hospital caxiense me surpreendeu de forma favorável, sendo uma opção razoável até para moradores de bairros próximos do Rio de Janeiro. Sou crítico do prefeito da cidade, José Camilo Zito, mas não vi a situação de abandono a que muitas vezes a imprensa se refere.

Retornei para casa por volta de 17 horas, com o caso encaminhado. Um susto grande e a experiência de comprovar na prática a quantas anda a saúde no Rio de Janeiro e em sua região metropolitana. A meu ver não está nem tão bem quanto a população merece, nem tão ruim de acordo com relatos catastrofistas de certos órgãos de imprensa e de analistas.

2 Replies to “Um passeio pelo sistema de saúde brasileiro ‘in loco’”

  1. pedro,

    Excelente relato, especialistas nos fins de semana em hospitais particulares são raros, em geral atende nos PS e com gravidade chamam alguém, mas demora de 2 a 4 horas. Tenho experiência com as travessuras das filhas. Mesmo em procedimentos simples os hospitais particulares demoram muito, falo de bons hospitais,que o convênio cobre.

    Arnobio

Comments are closed.