Neste domingo de semana dedicada às escolas de samba, o colunista Aloísio Villar traz mais uma edição da coluna “Orun Ayé”, contando a primeira parte de uma história de final muito feliz: a disputa de samba da União da Ilha para 2012.
Serão duas colunas. Vamos à primeira.
“Era Uma Vez Um Sonho – Parte I
Essa era uma coluna muito aguardada por mim, desde que escrevi a coluna sobre o Orun Aye que foi na época do começo da disputa da União da Ilha. Eu tive a idéia de escrever essa coluna quando acabasse a disputa. 
Como eu já falei algumas vezes aqui – e estou sendo repetitivo – meu amor pela União da Ilha começou quando descobri sua existência, apuração do carnaval de 1985. Lá se vão vinte e seis anos. 
Eu recém torcedor da Mocidade Independente de Padre Miguel descobri na apuração que havia uma escola da Ilha nela e estava sendo rebaixada. ‘Virei casaca’ e comecei a torcer pela escola ali. A Mocidade foi campeã com Ziriguidum 2001, um desfile histórico, a Ilha foi rebaixada e perdi a primeira e única chance até hoje de ser campeão do carnaval. 
O ano passou e não liguei muito pra carnaval, eu era muito novo – tendo outras coisas para me complicar. 
Estudava a 3° série e me apaixonara por uma menina que nada quis nada comigo e ficou com um amigo meu no meu aniversário  – na frente de todo mundo. Minha mãe me obrigou a botar aparelho nos dentes, coisa que eu detestava, minha avó cismou que eu tinha que entrar pra escola militar e o Flamengo minha nova paixão foi eliminado do Brasileirão pelo Brasil de Pelotas e no Estadual pelo Bangu. 
Coisas muito mais importantes pra um menino de nove anos 
Chegou 1986 e pela primeira vez assisti ao desfile de escolas de samba. Não me lembro muito bem dos desfiles, só que vi quase tudo dormindo na última escola de cada dia. Lembro da Mangueira campeã, da Beija-Flor desfilando debaixo de chuva e da União da Ilha. 
Foi a primeira vez que assisti a um desfile da escola e “Assombrações” de Arlindo Rodrigues estava lindo demais. A escola me surpreendeu e conseguiu um quinto lugar, muito bom para ela que fora rebaixada em 1985 e só ficou na primeira divisão do samba devido a uma “virada de mesa”.
Em 1987 eu já estava mais inteirado sobre a União da Ilha e os desfiles em si. Me aborreci com o desfile da Vila Isabel que foi lindo e isso poderia tirar o título da Ilha. Eu amava o samba da União de Bujão e J.Brito “Olha eu aí, olha eu aí/ vim botar a banca na Sapucaí”. 
Pela primeira vez vi um ensaio seu, nas ruas do bairro do Cocotá terminando na praça. Eu tinha certeza que a escola seria campeã. Mas não foi. Seu desfile foi lento e no fim teve que correr para não estourar o tempo máximo. Ficou em nono lugar. 
Em 1988 foi o ano até então que conheci o samba mais cedo. Na final do brasileiro de 1987 entre Flamengo e Internacional fui com a família para Magé e no rádio tocou o samba e me amarrei no refrão ainda mais porque falava no Flamengo “a gaitinha tocando é gol/a galera vibrando Mengooo”.  [N.do.E.: o enredo era sobre Ary Barroso, grande rubro negro]
Em 1989 o grande desfile. A Ilha fez uma festa profana na Sapucaí que seria campeã em qualquer ano  – menos em 1989. O desfilaço acabou em terceiro lugar e consagrou à eternidade os versos “eu vou tomar um porre de felicidade/vou sacudir eu vou zoar toda cidade”. 
Em 1990 eu tinha certeza que a escola seria campeã. O início do desfile foi sensacional, emocionante com um samba que é um dos meus preferidos na agremiação e começa com verso que eu e Pedro Migão inserimos em nosso concorrente no Acadêmicos do Dendê esse ano, escola que homenageia a União da Ilha: o verso “Sonhei que a vida fez um rei”
1991 trouxe o sambão do Franco “De bar e bar Didi um poeta”, primeira vez que comprei os Lps de samba-enredo. Em 1992 veio o primeiro samba na escola dos hoje meus parceiros de samba Carlinhos Fuzil e Marquinhus do Banjo e lembro-me de cantá-lo para o vigia do colégio onde eu estudava. Em 1993 morando no Mato Grosso recebi fita k7 das escolas com o samba sobre o circo cantado pelo Mauricio 100 [N.do.E.:100 de “sem pescoço”]
1994 meu ídolo Quinho voltou para a escola e pela primeira vez fui à Sapucaí. Fui ver o desfile das campeãs e minha felicidade: a União da Ilha estava lá. Aquele 4° lugar com “Abrakadabra, o despertar dos mágicos” foi a última vez que a Ilha desfilou nas Campeãs. 
E assim foi caminhando e aumentando minha paixão pela União da Ilha. Sempre assistindo os desfiles sozinho pela TV seja no Rio ou no Mato Grosso, algumas vezes com lágrimas nos olhos vendo minha escola passar. 
Até que…
…em 1997 vendo a coluna de um jornal descobri que a Ilha entregaria sinopse de “Fatumbi a Ilha de todos os santos” e a ala de compositores estava aberta. Eu sempre gostei de escrever e em 1994 já tinha comentado com meu pai vontade de escrever samba-enredo na Ilha e só não fiz porque tinha que voltar para o Mato Grosso. 
Fui à escola com a cara e a coragem. Pela primeira vez entrei numa quadra de escolas de samba, não conhecia ninguém do meio, não sabia como era uma disputa, se gastava dinheiro, botava torcida, nada disso. Comecei do zero numa história que tinha tudo pra dar errado. 
E começou dando errado. Fui eliminado na primeira eliminatória da escola, mas mesmo assim acompanhei todas as eliminatórias como eu já contei em outra coluna e extasiado acompanhei a final. 
Depois do resultado todos os compositores da escola subiram no palco pra festejar, fui tentar também e o segurança me barrou mesmo eu falando que era compositor. Foi preciso o compositor Paulinho Rocha me ver e mandar que o segurança me liberasse. 
Naquela noite jurei a mim mesmo que voltaria a subir um palco da União campeão de samba. [N.do.E.:a promessa foi cumprida domingo passado]
Os anos foram passando, na disputa do carnaval de 1999 outra vez eliminado de primeira, em 2000 de segunda – sendo que até me emocionei quando ouvi meu samba classificado no primeiro corte. Em 2001 de novo eliminado no primeiro corte. 
Em quatro anos três eliminado no primeiro corte e uma no segundo. Sempre fui muito vaidoso como escritor e isso era uma punhalada na minha vaidade. 
Decidi então que daria um tempo de União da Ilha para aprender a escrever, ir a outras escolas. Não queria me acostumar a “cair de cara”. Eu tinha confiança que escrevia bem, via vários compositores na escola sendo apontados como compositores que eram eliminados logo, só faziam figuração e eu não queria aquilo para mim. 
No mesmo ano ganhei meu primeiro samba na vida, pelo Boi da Ilha e esse conquistou o Estandarte de Ouro de melhor samba do grupo A, apenas o segundo Estandarte em sambas da história do bairro. O outro foi o samba “Domingo” de 1977 da União da Ilha. 
Ganhei o prêmio na terça de carnaval. No dia seguinte a União da Ilha foi rebaixada para o acesso A, ia desfilar junto com o Boi. Eu fui à quadra prestar solidariedade e também para mostrar que eles não me quiseram – e eu era um Estandarte de Ouro. 
A Ilha ficou oito anos no acesso e eu percorrendo outras escolas, ganhando sambas, respeito e experiência. Em 2004 coloquei samba na escola no acesso e cheguei entre os 8. Meu melhor resultado disparado na agremiação até então. 
Em 2009, convidado pelo nosso amigo Walkir pela primeira vez entrei em uma parceria de ponta na escola. O samba deixou a desejar, mas realizei o primeiro dos sonhos: cheguei à final. 
Perdemos a final, fiquei triste, claro, mesmo sabendo que não dava para ganharmos. Mas orgulhoso por finalmente minha história começar na agremiação. 
Nesse mesmo ano ganhei o prêmio S@mbaNet de melhor samba do grupo B pelo Boi da Ilha e no dia seguinte a União da Ilha foi campeã do acesso, voltando ao Especial. 
Mais uma vez eu ganhava um prêmio importante e o dia seguinte seria também importante à União da Ilha. 
Não escrevi no ano seguinte e no carnaval de 2011 voltei com quase toda parceria atual que faço parte. Uma parceria montada sem grandes pretensões, mas que fez um belo samba e chegou à final. 
Perdemos a final, outra derrota doída. Ainda mais porque chegamos perto de vencer e por ter terminado meu namoro justo no fim de semana da final. 
Triste por uma série de circunstâncias, mas orgulhoso de não ser mais aquele compositor que “cai de cara”. Sabia que estava pra chegar a minha hora. 
Aí veio a disputa pro carnaval de 2012 e… 
… essa é uma outra história, que conto semana que vem. 

SAMBA EXALTAÇÃO DA UNIÃO DA ILHA 


(Aroldo Melodia/Leôncio) 

Azul, vermelho e branco 
São as cores da minha escola querida 
Ela é minha paixão 
Que eu trago guardada no fundo do meu coração 
Respeitando opiniões, de outras agremiações 
Eu sou mais a União 
Com ela, aprendi a ser sambista 
E hoje sou até artista 
Dessa escola popular 

Se um dia ôôô 
Eu deixar de desfilar papai do céu 
Pela União da Ilha 
Vou chorar


Orun Ayé!