A estranheza constatada na declaração de bens entregue pelo Senador Aécio Neves ao Tribunal Superior Eleitoral, que constatei no post da última terça feira, me levou a fazer um “passeio” pelas declarações de bens entregues pelos candidatos nas últimas eleições.
Optei por fazer um levantamento por amostragem, envolvendo apenas políticos cariocas – precisava restringir o escopo de análise. Como já esperava, encontrei algumas coisas incoerentes e outras no mínimo inusuais.
Coloco aqui alguns casos que optei por verificar. Mas o leitor pode e deve aprofundar a análise. O espaço deste Ouro de Tolo está aberto.
Começamos pelo Governador Sérgio Cabral. Ele declara ter cerca de R$ 850 mil em bens entre imóveis, veículo e aplicações financeiras. Causou-me estranheza não haver nenhum imóvel na cidade do Rio de Janeiro registrado em seu nome, bem como a avaliação em apenas R$ 200 mil de um sítio em Mangaratiba – que estimativas de corretores indicam valer pelo menos R$ 1 milhão. Salvo aplicações financeiras, apenas este sítio e um veículo Toyota Corolla estão em seu nome.
O vice governador Luiz Fernando “Pezão” declara R$ 271 mil em bens, sendo R$ 102 mil em aplicações financeiras e um imóvel na Barra da Tijuca com valor declarado de R$ 168 mil. Não é um caso tão gritante quanto o da cobertura da Lagoa do Senador Mineiro, mas também é algo claramente abaixo do valor de mercado. O vice governador não informou a pose de veículos ou outras propriedades em seu nome.
Senador eleito, Lindbergh Farias (PT) declara apenas três terrenos no estado da Paraíba e cerca de R$ 20 mil em dinheiro, totalizando R$ 195 mil em bens. Não há registro de imóveis nem veículos no Rio de Janeiro, o que causa certa dúvida.
O segundo senador eleito, Marcello Crivella (PRB), declara R$ 739 mil em bens, sendo R$ 602 mil referentes a apartamento adquirido de forma financiada em Jacarepaguá. Somente por este último imóvel percebe-se que há algo estranho nas declarações de valores do Senador Aécio Neves e do vice governador Pezão.
Sendo Bispo licenciado da Igreja Universal, é possível que o senador usufrua de bens registrados em nome da Igreja, em que pese haver um veículo Nissan Sentra registrado em seu nome.
O deputado federal Anthony Garotinho (PR), ex-governador entre 1998 e 2002 declara um patrimônio de R$ 80 mil. Ele declara um terreno em São João da Barra (R$ 2 mil), um apartamento de R$ 45 mil em Campos e cotas de duas empresas. Sinceramente, os sinais externos do atual deputado não são os de um homem que tenha patrimônio de apenas R$ 80 mil, sem imóveis na cidade do Rio de janeiro, nem carros, nem valores aplicados.O padrão de vida aparente do ex-governador não é o de um homem que tenha apenas estes bens em seu nome.
Outro deputado federal, Édson Santos (PT) tem registrados R$ 79 mil em bens: um Toyota Corolla e R$ 21 mil em conta corrente. Não há registro de imóveis em seu nome.
Leonardo Picciani (PMDB), filho do ex-czar do estado, “mago das finanças” e candidato derrotado ao Senado Jorge Picciani tem R$ 1,4 milhão em bens declarados, entre eles um apartamento na Av. Sernambetiba avaliado pelo político em R$ 320 mil (vale bem mais, mas pode ter sido declarado pelo chamado “valor venal”), cotas de empresas e um dado que me chamou atenção: um veículo Chevrolet Captiva avaliado em apenas R$ 21 mil – o carro, uma “SUV”, custa novo cerca de R$ 120 mil.
Também federal, o presidente do DEM e filho do ex-prefeito Cesar Maia Rodrigo Maia declarou R$ 654 mil, referentes a três imóveis. Todos eles foram avaliados por valores bem abaixo do mercado, mas não se pode afirmar com certeza se é o mesmo caso de avaliação pelo “valor venal”.
Chico Alencar (PSOL) declarou R$ 222 mil, basicamente um terreno em São Paulo, imóvel no Rio de Janeiro e veículo Peugeot 206. Não tenho como avaliar se os valores do terreno e da casa (esta última não tem o bairro informado) estão coerentes, mas a declaração de bens é compatível com o tempo de mandatos parlamentares exercido pelo deputado.
O para lá de polêmico Eduardo Cunha (PMDB), envolvido em diversos momentos nebulosos dos últimos anos, declara R$ 1,5 milhão em bens. São três carros, duas salas comerciais e empresas. Não constam quaisquer imóveis residenciais no nome do político, e ao que me parece este patrimônio declarado está bastante aquém dos sinais de riqueza demonstrados pelo parlamentar.
O parlamentar que recebeu meu voto, Brizola Neto (PDT), tem R$ 130 mil em bens, basicamente valores em uma conta bancária em Montevidéu e um automóvel Tucson. Não foram declarados imóveis em seu nome.
Paulo Melo (PMDB), deputado estadual e tido como uma das “eminências pardas” do estado informa patrimônio de R$ 3,4 milhões, concentrados especialmente em imóveis na região de Saquarema. Chama a atenção, além de seu tempo na política e do patrimônio amealhados 111 bois declarados pela bagatela de R$ 46 mil, claramente sub avaliados a partir de pesquisas que fiz.
Domingos Brazão (PMDB), outro político influente no Governo do Estado informa R$ 5 milhões ao TSE. Seu patrimônio é composto basicamente por imóveis e postos de gasolina, e pelo menos estes últimos aparecem visivelmente com valores bem abaixo dos reais. Pelo menos dois dos imóveis declarados, na Avenida Ernani Cardoso e na Rua Piauí são informados com valores risíveis.
Ainda que alto, estes R$ 5 milhões me parecem claramente avaliados bem abaixo do real.
Dionísio Lins (PP), homem notadamente rico, que tem centros sociais em seu nome e auxilia escolas de samba no carnaval declarou apenas R$ 585 mil em bens, basicamente imóveis. Não aparece qualquer menção a empresas de ônibus, das quais o político já foi, ou é, dono. Das que pesquisei, foi outra que me surpreendeu bastante.
Marcos Abrahão (PT do B), já deputado, acusado de assassinato político, simplesmente declarou não possuir nenhum bem em seu nome. É…
Fico longe de esgotar aqui a pesquisa. Se fosse olhar os 46 deputados federais e 70 estaduais eleitos já teria assunto para uns quinze dias de blog. Mas somente nesta amostra aleatória fica claro que muito do que vemos em nosso dia a dia não corresponde ao que é informado na declaração de bens.
Também fica claro que há problemas na avaliação de imóveis para fins de informes, com alguns casos que saltam aos olhos claramente. Cabe à sociedade pesquisar, divulgar e analisar os dados, que são públicos – podem ser visualizados aqui.
Sem dúvida alguma, é uma boa diversão para o cidadão neste feriado.