Nossa coluna “Samba de Terça”, no dia de hoje, irá falar de um dos carnavais do início da carreira do atual campeão do carnaval: Renato Lage.
Ele estreou como carnavalesco solo em 1980, trazendo a Unidos da Tijuca para o Grupo 1A (atual Grupo Especial) com um enredo sobre Delmiro Gouveia, industrial que resistiu aos coronéis alagoanos do início do Século XX.
Para 1981, objeto de nosso texto, Renato Lage trouxe para a reestréia da Unidos da Tijuca entre as principais escolas de samba o enredo “Macobeba, o que dá pra rir, dá pra chorar”. Baseado no livro de Manoel Cavalcanti Proença “Manuscrito Holandês”, o enredo conta a história do herói Mitavaí contra o malvado Macobeba.
“O Manuscrito Holandês se aproxima de uma epopéia por apresentar um herói que enfrenta obstáculos sobrenaturais. Porém, este herói não o faz em nome de uma nação e sim em nome de um amor. A imagem de herói de Mitavai fora criada por interesses políticos e econômicos e por esses mesmos interesses essa imagem foi denegrida. Se Mitavaí foi herói, este reconhecimento verdadeiro ele só teve por parte da natureza, de quem ele recebera amizade verdadeira e desinteressada. Quando o caboclo adentra a cidade, é manipulado pela astucia dos poderosos. Mitavaí é um herói de gestos e palavras simples a quem o povo caboclo admira.”
Naqueles tempos de pré-abertura política, o enredo pode ser visto como a luta do povo oprimido, mas forte, contra a opressão política e o poder do dinheiro que já então reinava. Era uma metáfora da situação da época.
Macobeba era o dinheiro, o poder, a força que oprimia o povo mas não o vencia. Mitavaí era a representação deste povo represado desde 1964, mas que não poderia contido ser por muito mais tempo.
Eram tempos alegóricos, liberdade vigiada.
O samba soube traduzir bem este espírito e navega entre o livro e a situação nacional com grande desenvoltura, permitindo-se, ainda, um trocadilho no refrão final – que pode ser cantado com um palavrão no último verso.
Como campeã do Grupo 1B (atual Acesso A), a Unidos da Tijuca abriu o desfile do domingo de carnaval, primeiro de março de 1981. Trazia como novidades a estréia do puxador Sobrinho como intérprete oficial e o depois afamado Laíla na direção de Harmonia. A passarela de desfiles já era a atual Marquês de Sapucaí, com arquibancadas desmontáveis.
A escola fez um valente desfile e conquistou o oitavo lugar na apuração com 131 pontos, cumprindo o seu objetivo de permanecer no grupo principal. Eram tempos onde não se rebaixavam automaticamente as escolas que vinham do grupo de Acesso…
Vamos à letra do samba, que pode ser ouvido, em sua versão original, aqui:

Autores:
Celso Trindade, Negâ, Azeitona, Ronaldo, Ivar, Buquinha e Edmundo Araujo Santos

“É tão sublime exaltar
Neste dia de folia
(E cantar) a odisséia de um valente brasileiro
Contra o monstro estrangeiro
Que com todo o seu dinheiro
Quer calar a nossa voz (e o nosso herói)
E o nosso herói sai no rastro da maldade
Pelos campos e cidades
Atrás do gafanhoto feroz

Tetaci, Tetaci, agasalha com seu manto
O nosso herói Mitavaí

Mitavaí, bom lavrador e vaqueiro
Deixa o sertão brasileiro
Vai combater Macobeba Maldita
Que devora o mato e o mito
Rádio, jornal e TV
Lança e com certeiro bote
Fere o monstro no cangote, pra valer !
E ferido assim de morte
Bicho ruim não quer morrer
E o caboclo injuriado
Toma o caminho do mar
Jurando que um dia vai voltar
Tira daqui, leva pra lá
O que hoje dá pra rir
Amanhã dá pra chorar

Maldito bicho
Se me ouviu
E não gostou do meu samba
Vai pra longe do Brasil

Abaixo, o leitor pode ver um vídeo com parte do desfile da escola.

Semana que vem, iremos brincar de roda: “Parece até que foi ontem”, Unidos de Vila Isabel 1985. Até lá.

2 Replies to “Samba de Terça – "Macobeba, o que dá pra rir, dá pra chorar"”

  1. Adorei o texto fiquei emocionado esse enredo é lindo, até hoje este samba é um dos melhores. Parabéns amigo.
    Roberto frigideira.
    Abraços….

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