Com este texto damos ponto final à nona temporada da Justificando o Injustificável e mais uma vez fico feliz de poder dar minha contribuição para a melhora contínua do julgamento do Grupo Especial com comentários detalhados de cada um dos 36 cadernos de julgamento.
Porém, devo confessar que esse ano foi mais árduo do que os outros porque foi com tristeza que fiquei com uma sensação amarga de retrocesso à medida que lia os cadernos e escrevia os textos. A mudança do comparativo para o não-comparativo embaralhou os julgadores mais antigos, que perderam suas referências de julgamento, aliás tenho dúvidas se é possível ter alguma referência julgando arte sem comparação, que em conjunto com a troca de sete julgadores, ou quase um quarto do júri, de forma bastante atabalhoada geraram distorções no julgamento que não víamos desde 2017.
Uma explosão de notas 10, que trouxe a reboque muitas notas máximas de difícil explicação, justificativas polêmicas, problemas de dosimetria espalhados por todo o julgamento, alguns bastante graves, até chegar ao ponto culminante desse retrocesso que foi o desastre do julgamento de Samba-Enredo, com direito a invasões recorrentes em seara de outro quesito, no caso Enredo, em uma gravidade que há tempos não víamos no julgamento da LIESA.
Inclusive, a principal conclusão que chego ao final da viagem pelos cadernos deste ano é que a LIESA, antes de pensar em renovar ainda mais o júri para 2026, precisa parar, avaliar e repensar todo o processo de seleção e treinamento dos novos julgadores. A mudança nesse processo ocorrida em 2025 claramente não se provou eficiente e isso é visível ao olhar as análises desta coluna aos cadernos dos sete julgadores estreantes.
Já na área logística, esse ano os acompanhantes receberam ótima atenção da LIESA, assim como toda a logística dos julgadores nos dias de desfile funcionou a contento. Nesse ponto parabenizo a diretoria da LIESA e rogo mais uma vez que apenas seja aperfeiçoado essa logística permitindo aos julgadores que façam seus cadernos de julgamento no hotel e não na Sapucaí.
Por outro lado, todo o processo de feitura e entrega aos julgadores do Livro Abre-Alas precisa ser regularizado com urgência após os atropelos inaceitáveis ocorridos neste ano. Neste ponto, eu realmente acredito que houve apenas um enorme percalço de uma mudança de sistema mal-planejada e que no ano que vem tudo voltará ao normal, com um sistema mais eficiente e confiável.
Partindo para a parte estatística deste texto de encerramento, o dado mais importante e até impressionante deste julgamento foi a explosão da quantidade de notas 10. Mesmo que não seja nenhuma surpresa, tanto é que tal fenômeno foi previsto por mim ainda na live de fevereiro para o YouTube do Blog Ouro de Tolo, creio que isso é uma consequência óbvia da mudança de diretriz do julgamento para o não-comparativo.
Em números frios, somando todos os trinta e seis julgadores, saltamos de 210 notas máximas em 2024, ou 48,6%, para enormes 261, ou 60,4%, em 2025. Ou seja, em termos jurídicos saímos de um número de notas que sequer representava a maioria para um quórum capaz de aprovar emendas constitucionais!
Nas notas abaixo, apesar da quantidade de 9,9 ter ficado exatamente igual nos dois anos, 111 ou 25,7%, o outro dado chamativo é a queda abrupta de notas 9,7. De 24 em 2024, ou 5,6%, a quantidade despencou para apenas 9, ou 2%. Uma queda de praticamente dois terços!
O resultado final não poderia ser outro a não ser a abrupta redução na quantidade total de décimos retirados de todas as escolas na soma dos 36 julgadores. Se em 2024 tivemos 375 décimos retirados, em 2025 foram apenas 242 décimos retirados, uma queda enorme de 35,5%.
Ao final, nem essa hecatombe na quantidade de descontos foi capaz de reduzir os impactos dos quesitos plásticos no resultado geral do Carnaval.
Se, no ano passado, já aplicando os descartes, os quesitos plásticos retiraram nada menos que 10,7 pontos, contra apenas 6,3 dos quesitos de dança e 4,4 dos musicais; este ano foram 5,5 pontos perdidos nos quesitos plásticos, 3,2 pontos nos musicais e apenas 2,8 dos de dança.
Ou seja, os quesitos plásticos que tinham sido responsáveis por exatamente metade dos descontos válidos em 2024, responderam esse ano por 48%. Uma redução tão pequena que na prática é apenas um ruído estatístico.
Isso acabou ocorrendo porque, mesmo que a quantidade de descontos nos quesitos plásticos tenha se reduzido praticamente pela metade, os quesitos de dança sofreram uma depressão abrupta de quase 60% impulsionados pela explosão impressionante de notas 10 no quesito Mestre-Sala e Porta-Bandeira, como vimos no texto referente a este quesito na Justificando, e pelo achatamento considerável da dosimetria em Evolução.
Mesmo com todas essas mudanças, as notas 10 continuam mais rarefeitas justamente nos quesitos plásticos. Os três quesitos plásticos continuam dominando o ranking dos quesitos com menos notas máximas distribuídas: Alegorias & Adereços em primeiro com apenas 22, Fantasias em segundo com 24 e Enredo empatado em quarto com 28. O único intruso na lista foi, pasmem, Samba-Enredo em terceiro com 27, ou 56%. Só que para ter essa quantidade baixa de notas 10, a qualidade do julgamento de Samba-Enredo precisou ser esquartejada, como também vimos no texto referente a este quesito.
Por outro lado, tivemos Bateria, sempre ele, e Mestre-Sala e Porta-Bandeira com 75% de notas máximas na outra ponta da tabela.
Do mesmo jeito, no “andar de baixo”, os quesitos plásticos também dominam a distribuição de 9,7 e 9,8. Das nove notas 9,7, nada menos que oito ocorreram nos quesitos plásticos. A única exceção foi o 9,7 do Bruno Marques para a Mangueira em Harmonia, que, para piorar, ainda foi descartado garantindo os 30 pontos para a escola no quesito.
Mesmo os 9,8 ainda são mais concentrados nos quesitos plásticos, mesmo que de forma menos intensa que os 9,7. Dos cinquenta 9,8 deste ano, vinte e dois ocorreram nos quesitos plásticos. Mais do que os dezessete previstos caso a distribuição fosse igualitária entre os três grandes grupos de quesitos.
Obs: o único 9,6 de toda a apuração de 2025 foi também do Bruno Marques para o Tuiuti.
Como fazemos desde 2022, a Justificando o Injustificável 2025 termina com uma lista de sugestões gerais para melhorar o julgamento dos quesitos como um todo nos próximos anos, lembrando que as recomendações específicas já foram dadas ao final das colunas de cada um dos quesitos.
- Criar uma logística que permita aos julgadores uma rápida saída do Sambódromo de volta ao hotel oficial para que nele, com calma e longe do confusão da Sapucaí, eles possam finalizar e lacrar seus cadernos de julgamento com calma. Nesse caso, é possível que a versão definitiva do caderno de julgamento só seja entregue ao julgador no próprio hotel, assim que ele entrar no local designado para a escrita do caderno.
- Repensar todo o processo de seleção e treinamento dos novos julgadores. As mudanças feitas nessa área para 2025 terminaram por causar uma profunda regressão de qualidade em relação aos anos anteriores.
- Clarificar no Manual do Julgador em Evolução e Harmonia qual é o campo de visão, no caso de Evolução, e o momento de início e término da avaliação da escola, no caso de Harmonia, para o julgador fazer seu julgamento.
- Manter e aprofundar o diálogo institucional já criado entre julgados e julgadores em cada quesito. A situação com os compositores ainda é um desafio.
- Criar um calendário com reuniões posteriores com os julgadores para fornecer um feedback do trabalho por eles realizado e receber o mesmo feedback dos julgadores sobre as dificuldades que eles tiveram para realizar seu trabalho. Essa conversa também pode servir para entender melhor eventuais ocorrências inusitadas que poderão se tornar base para melhorias futuras do sistema de julgamento e, idealmente, ser feita diretamente com a coordenação de julgamento da LIESA antes do Simpósio.
- Abolir os subquesitos no julgamento de todos os quesitos, porém mantendo a divisão nos critérios de julgamento. Isso permitirá ao julgador uma maior liberdade para implementar sua dosimetria, podendo juntar pequenos problemas dos diferentes subquesitos para tirar apenas um décimo, o que é teoricamente proibido na dinâmica atual.
- Verificar a ausência de julgamento em qualquer dos nove quesitos da conexão artística entre alegorias e fantasias. Hoje, mesmo que elas sejam totalmente desconexas artisticamente entre si, não há nenhum quesito que puna isso.
Mais uma vez agradeço imensamente a todos que acompanharam a Justificando o Injustificável 2025 e, de forma especial, aos julgadores que aceitaram a conversa proposta por esta coluna. Mais uma vez reitero que suas experiências gentilmente compartilhadas são fundamentais para a qualidade desta série.