As últimas horas tem sido tensas, beirando traumáticas para Lula. Depois de anos surfando na onda dos bons ventos econômicos que sopraram do oriente, somados a uma boa capacidade de gerir pequenas crises e decisões muito interessantes que incrementaram de forma definitiva a vida do brasileiro em geral, ele teve de ir a uma delegacia de policia.

Tudo o que você já tinha que ver sobre tal, você já leu com todo o veneno e ódio atuais. Mas a ida de Lula ao psicólogo, você só vai ler aqui, pois nosso enviado especial, o mesmo que cobriu a ida de Mãe Dinah à Ilha esteve presente… Pois bem, vamos….

São oito horas de sábado, cinco de março. Um carro preto da Presidência da República sobe apressado ao elegante prédio preto da A Prestes Maia, no bairro Santa Terezinha em São Bernardo do Campo. “Bóra que o “hómi”” não gosta de atrasos. Um drible nos cones sempre presentes na frente do prédio e ele vem.

BeFunky_Marta, Eduardo Suplicy, Sócrates, Adilson e Lula - 1985_-BlogEntra, dá bom dia e pergunta se a dupla que acompanha já tomou café da manhã. Resposta positiva, é hora de andar. Depois da Prestes Maia o carro entra na Marechal Deodoro, rua que desemboca no Paço Municipal de tantas lutas e glórias ao movimento sindical alí enraizado. Antes passaram pela Matriz, que tantas vezes teve que ser fechada no dia 1 de maio por ordem do então Bispo de Santo André Dom Claudio Hummes, para proteger a classe trabalhadora das doídas cacetadas de borracha da Policia sedenta por prender nos anos de chumbo.

Ao passar pela prefeitura, Lula dá uma coçada na barba e olha para o andar onde tantas vezes o amigo Maurício Soares o recebeu enquanto era prefeito. Fundador do partido, saiu falando que um dia o PT ia se afundar na própria ganância de poder. Logo que o carro entra na Rua Senador Vergueiro para em frente a um elegante conjunto de prédios, Dra Caren está à porta e pergunta se está tudo bem. “Na medida do possível, sim”. Ela lhe dá o braço e pede para que a assistente lhe de um café e permite de forma exclusiva que ele se acalme com sua cigarrilha holandesa, vicio dos tempos presidenciais.

lula31Lula deita, olha para o teto e irremediavelmente pensa: “Onde foi que eu errei?”.

E passa na cabeça dele todo um filme de roteiro surpreendente que o levou do sertão ao planalto, do estádio de Vila Euclides aos palácios do mundo, do colo de sua mãe aos aplausos das massas. Lembra-se dos primeiros companheiros e da ligação de Suplicy na noite anterior. “Eu não disse que a casa um dia ia cair com essa gente te empurrando”.

Lula's_presidential_inauguration,_2007Não é fácil, pensa. Nunca foi nunca será. Aqueles que alertaram que vender a alma ao diabo hoje estão aí, ainda solidários aos princípios democráticos, mas em outras fileiras. Gabeira, Freixo, Marina, Heloisa, Manuela, Vladimir Palmeira, Ivan Valente, Chico Alencar…. Luiza Erundina, a amiga de tantas horas. Alertava isso desde as intermináveis reuniões com os grupos de trabalho. Ela querendo levar ao povo cultura, educação e participação. Outros querendo obras, asfalto e muita comissão. Luiza não se furtou a aceitar um ministério de Itamar Franco. Era um momento de união, o processo de impeachment é dolorido e ela percebeu. Nós não, radicalizamos o discurso e perdemos a companheira.

Fazer o certo tem preço? Parece que sim! As pessoas não reconhecem. Ou só reconhecem se tiverem garantias. A maior empresa do país nunca esteve tão bem e porque não se reconhece tal? As refinarias não trazem os empregos que os brasileiros anseiam? Sempre tinha alguém perguntando, mas Lula, a que preço? Sei lá, o preço que tiver que pagar?

Brazil's former president da Silva gives the thumbs-up during a demonstration in Rio de JaneiroNão saber o preço das coisas é um dos grandes problemas das casas dos brasileiros. E olhando para o teto, Lula se lembra dos grandes momentos, das posses, da emoção de passar a faixa a Dilma. Um sorriso. A cara de Dirceu subindo a rampa junto, quebrando uma tradição secular de apenas o vice acompanhar. Era a senha que algo podia escorrer pelas mãos.

Quando a doutora abre a porta Lula se levanta e diz que já pensou demais e precisa falar com a militância. Ela diz para ele voltar porque ela precisa falar com ela, como militante. “Com todo o respeito, quando é que o senhor vai explicar esse papo de empreiteira bancar sua vida pós-planalto? Quando?”

Lula coça a barba.

Vamos recomeçar doutora. Não sei onde errei… Sei sim… a sanha do poder… o poder embriaga… o doce é bom demais, você faz coisas e permite coisas que jamais imaginariam. Não da para ter uma vida diferente senão lidar com esses profissionais do poder. Enquanto o povo teve emprego pleno quem reclamou? E agora, querem saber até como eu pago um cofre?

Sim Lula… é assim… acho melhor recomeçar a história… Do Brasil!