Sem querer provocar susceptibilidades, muito pelo contrário. É que, enquanto Aécio teve uma postura correta e louvável no pós-urna, infelizmente alguns de seus apoiadores estão longe de manifestar maturidade democrática. Então, por favor, se percebam, caiam na real. Dez tópicos para ajudar a pensar no tranco. Esta é um análise técnica. Coloquem de lado a paixão e acompanhem.

1 – Numericamente, Dilma venceu por menos de 4 milhões de votos. É bastante coisa, mas estatisticamente nem tanto. Só que Dilma teve, em São Paulo, mais de 8 milhões de votos. Ou seja, na hipótese extrema, se Dilma não tivesse eleitores paulistas, teria perdido para Aécio pela diferença pela qual venceu. Ou seja, São Paulo elegeu Dilma, mesmo dando maioria local a Aécio. Sacou? Se a ideia é separar os Brasis, comecem a separar “São” de “Paulo”.

2 – Aécio, incrivelmente, perdeu em Minas nos dois turnos. Cai por terra a teoria sustentada por ele durante os debates de que teria boa avaliação dos mineiros. Não, não tem. Mostra que Aécio perdeu para si mesmo, porque era um candidato fraco, incapaz de vencer em seu próprio quintal. Em quase todas as eleições da história da República quem perde em Minas perde a eleição.

3 – Dilma venceu no Rio e venceu bem, com uma margem bem mais ampla que a esperada. Se Aécio tivesse vencido no Rio pela margem que perdeu, teria ganho a disputa nacional.

Em três itens, falamos de três dos maiores colégios eleitorais brasileiros. Todos eles foram fundamentais para a derrota de Aécio, até onde ele venceu, porque nem aí venceu com a margem necessária. Estes três Estados estariam, no mapa imaginário dos separatistas, no “Brasil do Sul”, teoricamente tucano. Ledo engano. Foi aí que a derrota foi construída.

4 – Findo o primeiro turno, os analistas projetaram a vitória de Aécio tomando como base que os votos de Marina eram “de oposição”, logo, migrariam para Aécio. Nada mais equivocado. Considerando todos os municípios onde Marina liderou no primeiro turno, Dilma venceu na maioria deles no segundo, independente de região. Fica a dica: cada turno de eleição é uma história. Tanto é assim, que Dilma e Aécio também trocaram de posições em alguns municípios nos quais lideraram no primeiro turno. A vontade do eleitor é volúvel, sempre, até a última hora.

mapa5 – Na reta final, Aécio perdeu votos importantes entre os indecisos. Era comum ver, a cada debate, aecistas comemorando a “vitória” de seu candidato no debate. Confundiram eloquência e agressividade com superioridade. Não duvido que a mesma confusão feita entre os apoiadores tenha sido cometida pelos estrategistas de campanha e pelo próprio candidato. A Globo.com mostra como foi a reação de 8 mulheres paulistas ao último debate. Veja a opinião delas no link abaixo e perceba que, enquanto Aécio falava para seus eleitores já cativos, estava perdendo o debate entre quem realmente deveria conquistar: os indecisos. Um caso típico em que o umbigo falou mais alto:
http://oglobo.globo.com/videos/t/todos-os-videos/v/veja-como-oito-indecisas-reagiram-ao-debate-da-globo/3719855/

6 – O Nordeste, tratado como “vilão” entre oposicionistas (principalmente entre paulistas) é a região que mais cresceu nos últimos anos (4% a.a. x 1% a.a. do resto do País), a que gerou mais empregos, a que gerou mais vagas em escolas federais e universidades, a região que já foi sinônimo de seca e que foi onde menos faltou água, a região que mais recebeu obras de infra-estrutura.

Resumir tudo ao Bolsa-Família é aviltante e, sobretudo, preconceituoso. É querer reforçar um estereótipo de que o Nordeste não evoluía por preguiça de seu povo e, em contraste, São Paulo era fruto da força de trabalho dos paulistas. Curiosa visão, considerando que foram os migrantes nordestinos que construíram a riqueza industrial paulista.

Acontece que São Paulo parou de crescer, e milhões de trabalhadores têm feito o caminho de volta. O Nordeste – até outro dia exportador de mão-de-obra – é, hoje, a região que mais recebe migrantes. A intervenção do Estado como ente indutor da economia é muito mais perceptível nas regiões menos desenvolvidas anteriormente. Este não é um debate apenas no Brasil, é global. Até que ponto o Estado deve intervir menos ou mais? É natural que um lugar como São Paulo, beneficiário das benesses públicas por mais de um século, que teve o desenvolvimento bancado pelo resto do Brasil, agora comece a pensar que o Estado é um estorvo. Ora, nada mais lógico que São Paulo vote no PSDB e o Nordeste no PT. São interesses opostos e tem a ver com o peso que a presença de um Estado indutor-desenvolvimentista tem para cada um, neste momento histórico. Estranho seria o contrário.

7 – A máxima de que “é a economia, idiota” quem define a maioria dos votos é presente nesta eleição. Mas não é a economia teórica, as apostas do dito “mercado”, os comentários dos abreu-e-lima-Guga-Matos-JCespecialistas por encomenda dos telejornais. É a percepção do cidadão comum, o quanto o bolso pesa para ele no período em questão. Algum terrorismo pode fazer efeito em um cidadão aqui, outro lá, mas não decide eleição. Fale-se o que quiserem, a inflação hoje é menor que no período em que o Brasil foi governado pela oposição, há pleno emprego, o PIB é maior e o poder de compra da massa salarial é bem maior em valor real. É aí que uma eleição é ganha.

8 – Disputar com o adversário o título de quem é mais corrupto não leva os partidos políticos a lugar algum, não vence eleição e, ainda por cima, coloca em risco toda a democracia. Na opinião do eleitor médio, todos os partidos são igualmente corruptos. O pior de tudo: o eleitor não está errado na sua percepção.

Se os partidos (oposição e situação) estivessem mesmo comprometidos em diminuir a corrupção – e não apenas em usar o tema como arma eleitoral – teriam feito um esforço conjunto nesta direção. A começar por vetarem – todos juntos – o financiamento empresarial de campanhas e por reduzirem os cargos públicos sem acesso exclusivo por concurso ao primeiro escalão de governos; daí para baixo (ou seja, exceto Ministro, Secretário de Estado,  Presidente e Diretor de Estatal) emprego público só exclusivamente por concurso. Fora disso, quem acusa de uso e instrumentalização da máquina pública, está fazendo demagogia. Sendo assim, tentar se beneficiar de escândalos de última hora sob encomenda, é visto pela maioria da população como manobra barata, ataque à democracia e apelação. Há uma classe média-alta que finge acreditar nos falsos escândalos, apenas por hipocrisia, apenas porque precisam acreditar. Não fazem maioria para ganhar eleição, independente de Estado ou região.

mobilizacao19 – Em 1932, São Paulo tentou se separar do Brasil. Sua economia era agrária e comandada por coronéis. Hoje, com a economia combalida pelo encolhimento industrial do Estado, São Paulo faria péssimo negócio. A economia paulista migra, cada vez mais, para o setor de serviços e administração. Serviços prestados ao resto do Brasil exatamente por fazer parte do Brasil. Tire o Brasil de sua órbita, e São Paulo desmorona. São Paulo hoje não é autossuficiente em água, em energia e em petróleo. E tornou-se obsoleto em tecnologia implantada. E sua logística está saturada. Qual a chance disso funcionar economicamente, sem fazer parte de um todo que o complemente? Melhor fariam os paulistas se engolissem em seco este orgulho bobo.

10 – Os Estados Unidos têm 50 Estados. Mais de 40 votam, há décadas, ou apenas em democratas, ou apenas em republicanos. O bi-partidarismo de fato, caminho natural em democracias representativas maduras, leva a isso. Acostumem-se que dói menos. Nos Estados Unidos, e três a cinco Estados mais volúveis decidem as eleições a cada quatro anos. Aqui, a tendência será a mesma. Isso não significa um país dividido em dois, até mesmo porque, como vimos no início, mesmo nas regiões em que um é nitidamente derrotado, as votações de cada um são expressivas. O mapa dos Estados é praticamente igual hoje há quatro anos, quando Dilma venceu Serra. Mas Serra ficou bem mais distante da vitória que Aécio. Porque o Brasil não é dividido entre azul e vermelho, são os tons de roxo que decidem a eleição.