Finalizando nossa longa revisão do projeto olímpico, fecharemos com a caótica Zona Deodoro e o conjunto de obras de transporte que estão levando o carioca a loucura por causa de seus fortes impactos no trânsito.

Zona Deodoro

Esta Zona, propagandeada como o maior legado dos Jogos por deixar um parque esportivo para os jovens em uma parte pobre da cidade e ligada as estruturas das Forças Armadas foi esquecida entre confusões de responsabilidade entre os governos federal, estadual e municipal. Com isso, suas obras só começaram no mês retrasado, após o pito de John Coates. Todas elas deverão ser motivo de preocupação até as vésperas do início dos Jogos Olímpicos por causa do inicio tardio das obras: elas começaram juntas em julho deste ano, quando já deveriam ter sido começadas, no máximo, em março ou abril de 2013.

Dentro da preocupação geral que engloba esta zona, uma obra chega a causar calafrios: o Estádio Olímpico de Canoagem Slalom. É uma obra difícil, cara, complexa e que exige uma grande engenharia hidráulica. Também costuma demorar 3 anos, mas sua obra só começou no fim deste julho e tem previsão para terminar em março de 2016.

Até Londres 2012, que teve uma preparação muito tranquila, teve problemas na construção do seu slalom, apesar de ter sido a primeira obra entregue. Com os vários atrasos de Deodoro, todo o tempo de se consertar erros foi embora, a construção terá que ser acelerada e esta é uma obra que costuma sofrer com muitos atrasos em todas as sedes olímpicas. Das instalações esportivas é, de longe, a maior preocupação. Luz vermelha de alerta ligada e com sirenes tocando.

Alias, o COI deveria rever a canoagem slalom nos Jogos. Ela exige uma construção própria (nunca a cidade a tem pronta), sem compartilhamentos, cara e é de transformação em legado extremamente difícil. O Rio 2016 jura que este centro será transformado em parque aquático de diversões para a população de Deodoro, algo que eu duvido que ocorra por ser inviável economicamente em uma cidade costeira.

O Estádio de canoagem Slalom ficará em um complexo chamado “Arena Radical do Rio” que também abrigará o Ciclismo BMX e o mountain bike. A construção dessas duas áreas de ciclismo também começou em julho e devem terminar na data programada, até o fim de 2015, já que são obras de menor complexidade.

Deodoro também ganhará um ginásio de 5 mil lugares que abrigará alguns jogos preliminares de basquete e a parte de esgrima do pentatlo moderno na segunda semana. É outra construção que só começou em julho, até porque seu projeto inicial era para ser uma arena exclusiva de esgrima (transferida para o Parque Olímpico da Barra) e tem previsão para terminar em março de 2016. Outra obra para se ligar a luz amarela.

A última construção totalmente nova desta área será o Centro de Hóquei na Grama. Inicialmente o hóquei ficaria no Parque da Barra, mas em uma decisão correta da Rio 2016 foi transferida para Deodoro, onde a seleção brasileira já treina no campo que ficou de legado do Pan de 2007. Tem previsão de término para o fim de 2015. Essa obra não tem motivos para atrasar e dentro do caos que se tornou Deodoro é um dos menores problemas.

O Rugby e as modalidades de hipismo e combinado (tiro e corrida cross-country) do Pentatlo Moderno serão feitos em uma arena temporária para 20 mil pessoas, que também começou suas obras em julho e está previsto para terminar em março de 2016, em um prazo um tanto curto para o tamanho das obras. Outra luz amarela.

As outras instalações esportivas já existem do Pan de 2007 e dos Jogos Mundiais Militares de 2011, mas todas precisarão passar por readequações. Das instalações já existentes, o Centro Nacional de Hipismo e o Centro Nacional de Tiro são os mais complicados.

Apesar de já existir, a readequação e a ampliação terão que ser profundas no Centro Nacional de Hipismo (ao lado), sendo necessária uma obra de fôlego com direito a três prédios de sete andares para abrigar os tratadores. A matriz de responsabilidade indica uma previsão de término em junho de 2016, muito apertada em uma obra que, por sua complexidade, tem boas chances de atrasar. Luz vermelha.

Já o Centro de Tiro, que foi licitado em conjunto com a Arena Radical, a de Rugby e a de basquete também tem previsão de entrega apenas para junho de 2016. Apesar da previsão de reforma de todos os sete stands de tiro, não entendi qual é a complexidade desta reforma para ser dado um prazo de término tão apertado.

Ainda temos o Centro Aquático, que abrigará somente a natação do pentatlo moderno. Ele também precisará ter a piscina reforma e fazer uma pequena arquibancada temporária. Obra prevista para março de 2016 sem maiores dramas.

Por fim, todas essas obras esportivas precisarão contar com um reforço na infraestrutura elétrica da Zona Deodoro a tempo dos jogos, um desafio e uma forte candidata a ganhar um contrato de emergência com essas obras de prazo apertado se espalhando para todos os lados.

Transportes

Aqui, tudo começa no Aeroporto Internacional Tom Jobim (ou Galeão, foto ao lado) portal de entrada para o Rio de Janeiro. Após muita demora da Infraero (que nunca faz nada), finalmente o Galeão foi concedido (mesmo com a Infraero ainda tendo 49%) para a iniciativa privada que não perdeu tempo e já começou as obras de ampliação da capacidade de pousos e decolagens no Galeão.

Hoje as pistas do Galeão tem capacidade de transportar mais de 200 mil pousos e decolagens por ano, mas só faz 140 mil por falta de espaço de pátio e locais para embarque. A concessionária promete que todas as obras estarão prontas no inicio de 2016. Caso elas fiquem prontas, o Galeão deverá suportar o tráfego olímpico sem problemas.

As principais obras prometidas para melhorar a mobilidade durante os Jogos no dossiê de candidatura foram 4 linhas de BRT que não existiam em 2009: Transoeste, Transcarioca, Transolímpica e Transbrasil (mapa abaixo, no qual também são retratadas a Av. Brasil e a Linha Amarela, vias urbanas em amarelo. A Transbrasil não está representada, mas segue o curso da Av. Brasil a partir da Transolímpica). Todas elas a cargo da prefeitura.

A Transoeste está pronta desde 2012 e funcionando a contento. Apenas precisa ser ligeiramente alargada para que o seu atual ponto final no Terminal Alvorada seja conectado com o futuro ponto final da linha 4 do metrô em construção. São apenas 10km em grandes vias já existentes, portanto não há pressa para seu término e este prolongamento, já em construção, deve ser entregue em março de 2016, juntamente com a linha 4 do metrô no trecho até o Jardim Oceânico.

A Transcarioca, a mais complicada das 4 linhas, já tem sua linha principal completa e já está funcionando 24h nas principais estações. Aos poucos o sistema está crescendo e deverá ter capacidade completa até o fim deste ano.

Ficará faltando a parte que vem sendo chamada de “Viário da Barra”, que será comum à Transcarioca e a Transolímpica, que fará a ligação dessas duas linhas de BRT com o Parque Olímpico, o Riocentro e a Vila Olímpica. Também não é um espaço grande, apesar do alargamento necessário das Av. Embaixador Abelardo Bueno e Salvador Allende. As obras já começaram, mas tem previsão para terminarem apenas em março de 2016 por causa da Transolímpica que ainda está em construção.

Já a Transolímpica, que fará a conexão entre a Zona Barra e a Zona Deodoro, está em ritmo frenético de construção. Ela só começou a ser construída no fim de 2012 e é uma obra complicada. Boa parte de seu trajeto entre a Estrada dos Bandeirantes e a Av. Brasil (altura de Magalhães Bastos) será feita em uma via expressa nova, que além da faixa exclusiva do BRT terá duas faixas de rolamento em cada sentido.

Para complicar ainda mais a abertura desta nova via, não bastassem as várias desapropriações que terão que ser feitas, ainda será necessário escavar um túnel de 1,8km de extensão com duas galerias paralelas embaixo do maciço da Pedra Branca. Para se ter uma ideia da dificuldade da obra, o Túnel da Covanca (túnel da Linha Amarela) de tão difícil escavação tem 2,1km de extensão com as mesmas 3 faixas de rolamento.

Por conta destas dificuldades, a inauguração da Transolímpica está prevista apenas para junho de 2016 e, é bastante possível que seja inaugurada no mesmo sufoco que foi a Transcarioca para a Copa do Mundo, ou seja, apenas com o ônibus expresso Barra-Deodoro funcionando durante os jogos e com condições precárias.

Já a Transbrasil sequer teve sua licitação terminada por causa de questionamentos do Tribunal de Contas do Município e de um recurso interposto por uma das derrotadas na licitação. Apesar de boa parte dela já estar pronta (será simplesmente a faixa seletiva da Av. Brasil) o prazo é cada vez mais curto para que ela se torne realidade para os Jogos de 2016, tanto que ela sequer consta da Matriz de Responsabilidade da Autoridade Pública Olímpica.

Ainda há esperanças que apenas o trecho até o Caju esteja funcionando para os Jogos, deixando a ligação Caju-Candelária para uma data futura, já que será impossível mexer no Caju enquanto o nó feito na região portuária com a derrubada do viaduto da Perimetral não for desatado. Mas até a ligação com o Caju tem grandes chances de não sair a tempo.

Para os Jogos Olímpicos em si, caso os VLTs fiquem prontos a tempo, a Transbrasil não será tão vital, mas seria importante que a prefeitura não abandonasse o projeto pois ele é importante para a cidade mesmo após 2016.

Outra obra prometida para os Jogos Olímpicos e bastante anunciada é a criação de 6 linhas de VLT (veículo leve sobre trilhos, mapa ao lado) no centro da cidade. Essa obra será vital para interligação da Rodoviária Novo Rio e do Aeroporto Santos Dumont (o aeroporto doméstico do Rio) com o resto dos transportes públicos de massa, já que hoje eles ficam completamente isolados.

As obras começaram pela área do Porto, que já está repleta de obras e a prefeitura promete todas as linhas entregues para junho de 2016. É uma obra complicadíssima e ainda nem está perto de um de seus maiores problemas: a construção dos trilhos em plena Av. Rio Branco. É outra obra para se olhar com lupa e com sinal vermelho, já que o prazo é bastante exíguo.

A prefeitura promete que a linha principal entre a Rodoviária e o Aeroporto já esteja sendo testada entre dezembro de 2015 e janeiro de 2016. Várias frentes de trabalho serão abertas em conjunto, inclusive nas Av. Rio Branco, Rua da Constituição, Rua Sete de Setembro e Av. Beira-Mar. Sabe-se lá como ficará o trânsito do centro que já está completamente caótico, com vias tendo velocidade média de 1,8km/h (ou seja, a pé é mais rápido).

Outra ligação complicada é a da Zona Copacabana com a Zona Barra. Hoje ela é feita exclusivamente pela Autoestrada Lagoa-Barra que tem seu ponto mais crítico no Elevado das Bandeiras, um viaduto encravado entre o mar e um grande rochedo. No projeto de candidatura, estava prevista a duplicação do elevado e da Av. Niemeyer, uma das alças de acesso ao elevado.

Porém, logo após a primeira revisão do projeto, ainda em 2009, a ideia da duplicação foi descartada porque ficou acordado que o governo estadual iria construir a linha 4 do Metrô (um caso de aberração no qual o 4 vem antes do 3) ligando Ipanema ao início da Barra, fazendo a mesma função da Lagoa-Barra, em uma obra de R$ 8 bilhões.

Até aqui, tudo correndo bem. Mesmo contra todos os prognósticos negativos iniciais a obra da linha 4 começou logo após o anúncio e, salvo um problema mais sério já contornado, vem ocorrendo tranquilamente dentro do cronograma. Os testes deverão começar em abril de 2016 e em maio ou junho de 2016 as estações do ramal até a Barra (há outro ramal simultâneo sendo construído para a Gávea) já deverão estar operando publicamente.

Ocorre que ninguém pensou que todos os principais hotéis da família Olímpica (dirigentes, convidados do COI e patrocinadores) estão na orla de Copacabana, enquanto o coração dos jogos será Barra. Logo eles também precisarão fazer o trajeto Copacabana-Barra e essa “turma” não anda de metrô, mas de carro particular.

Por óbvio, mesmo com o metrô, o COI continuou exigindo a linha olímpica (faixa de rolamento exclusiva para carros credenciados durante os Jogos) na Lagoa-Barra. Como essa via já está completamente saturada hoje, não há a menor condição dela suportar a linha olímpica. Logo, a duplicação do Elevado das Bandeiras (foto ao lado) também terá que ser feita. Com ou sem Jogos Olímpicos a cidade necessita dela com urgência.

Por tudo isso essa obra também está atrasada e o edital só saiu em junho deste ano. Espera-se que a obra comece finalmente em setembro próximo (já deveria ter começado no meio do ano passado) e a prefeitura espera entregar o novo elevado em junho ou julho de 2016 em um ritmo bastante acelerado de obras. Esta obra é outra com luz vermelha e o funcionamento razoável do tráfego Copacabana-Barra durante os jogos ficará muito ameaçado caso ela não fique pronta a tempo.

Por último, mas não menos importante, ainda há a rede de 5km de túneis subterrâneos prometidos para a região do Porto para substituir o Elevado da Perimetral que foi ao chão de vez neste ano. A prefeitura promete entregar todos os 4 túneis subterrâneos em junho de 2016 e eles serão fundamentais para que o trânsito do Rio não entre em total colapso durante os jogos.

Essa renovação do Porto é a “menina dos olhos” do prefeito Eduardo Paes que vem trabalhando em ritmo frenético nela para o exercício de muita paciência do carioca com o trânsito, já que grandes vias de circulação da parte norte do centro foram fechadas sem a entrega de suas substitutas.

As obras ocorrem desde junho de 2011 e até agora cumpriram o cronograma e o prazo final se mantém inalterado desde o início. Não há motivos para não acreditar que elas serão entregues a tempo.

Como visto, há muitas obras em andamento e o pior ainda nem começou: se o carioca já não aguenta mais, pode se preparar que ainda virão muitos mais transtornos pela frente até o início dos Jogos Olímpicos.

A notícia boa é que todas as obras fundamentais já começaram ou estão com seu início engatilhado. A má notícia é que muitas obras que deveriam ter começado em 2012 ou 2013 só começaram em 2014 e causarão muitas preocupações, seja quanto ao seu término a tempo, seja nos recursos utilizados para isso, através dos famigerados contratos de emergência.

Cabe a nós cidadãos fiscalizar o andamento dessas obras e cobrar agilidade e honestidade dos nossos gestores públicos, sempre tendo em mente que tudo terá que estar entregue, testado e aprovado até o dia 5 de agosto de 2016.

Após essa longa explanação sobre o projeto da Rio 2016, encerro com uma frase fantástica do colunista Aloísio Villar “Com tanta obra, tanta renovação e tanto transtorno, só restam duas opções para o Paes ao final do mandato: ou ele se torna Presidente da República ou não é eleito nem mais síndico de prédio.”.

Imagens: Rio 2016 (Centro Nacional de Hipismo) site Cidade Olímpica (Centro Aquático), WikiRio (Aeroporto), Wikipedia (mapa de BRTs e VLTs) e COPPE-UFRJ (Elevado das Bandeiras)