A coluna de hoje fugirá do usual. Não teremos um artigo, um texto como sempre foi por aqui. Dessa vez vou lhes pedir licença para trazer um conto de minha autoria. Escrevi há cerca de dois anos, mas o tema é mais atual do que nunca. Em breve as eleições chegarão e, com elas, muitas falácias serão ditas. Trago, então, para vocês uma pequena reflexão, que corre assim:

“Nossa história se passa nos dias atuais. Uma conversa simples, entre pai e filho. Um diálogo fictício, mas que pode ter acontecido em algum lugar, com alguma família brasileira. Seria natural. Um pai, divorciado, com seus 40 anos. Um filho, curioso, de 11.

— Pai!

— Sim, filhão.

— O que é política?

— Nossa, que pergunta! Por que você quer saber?

— Porque eu tenho ouvido muito essa palavra, pra lá e pra cá, e nunca entendo o que quer dizer.

— É assunto pra gente mais velha. Tem a ver com governo, direitos, deveres, enfim, essas coisas complicadas demais.

— Você gosta de política, pai?

— Eu? Claro que não. É muito chato e não leva a lugar nenhum. Tudo ladrão.

— Viu?! Primeiro você fala que política é uma coisa. Agora vem falar que é coisa de ladrão. Tudo é política?

pizza— Não, não. É que está tudo ligado mesmo. As pessoas se candidatam para assumir o governo, reduzir nossos direitos, aumentar nossos deveres e roubar de todo mundo.

— Ah, tá. Acho que entendi. Mas, pai, se influencia tanto na nossa vida, por que você não se interessa?

— Porque tem coisa que é melhor nem ver. Muita sujeira.

— A professora falou que é muito importante a gente saber sobre política. Ela disse que devemos ter um voto consciente.

— Vocês são novos demais pra falar disso.

— Eu queria saber mais o que é voto consciente.

— Não importa muito. Esse negócio de governo é coisa pra alimentar pessoas que não têm o que fazer. O que importa é trabalhar, ganhar seu dinheiro e ponto.

— E quem não tem trabalho, pai? O marido da dona Zezé não trabalha. Ela disse que está desempregado.

— Um vagabundo, isso sim.

— Ela disse que ele não estudou em nenhuma escola. Estranho né?

— Viu só, filhão? O negócio é estudar, trabalhar e não ter do que reclamar depois olhando pro teto às custas do salário de doméstica da esposa.

— Eu estudo, pai. Pode deixar.

— Esse pessoal é muito engraçado. Não estuda, não quer saber de nada e acha que vai se dar bem? Aí chega o governo e dá esmola. Esmola que nós pagamos!

— A gente que paga pro marido da dona Zezé?

— Como se fosse. Essa gente não quer saber de nada. Eles não querem aprender a usar o anzol, pescar e cozinhar. Eles querem o peixe prontinho. Assim é fácil.

homeless-veteran-new-york-city— Peixe?! Não entendi.

— É forma de falar. Deixa pra lá. Perco a paciência só de pensar nisso.

— Pai, você falou em peixe e acabou me dando fome. Vamos almoçar?

— Boa ideia. Vamos pedir uma pizza, porque hoje é domingo, e a dona Zezé não vem.

— Ainda vai pedir? Demora muito. Por que você mesmo não faz algo?

— Porque eu não sei cozinhar.

— Por que você não aprende?

— Porque não tem quem me ensine hoje, e você está com fome. Não vai dar tempo de aprender nada agora. Deixa pra outro dia.

— Está bem, pai. Pena que vamos pedir pizza. Se fosse peixe, a gente pedia pro governo.”