Não. Não irei escrever sobre o Brasil em Copas do Mundo.

Quando soube que o Ouro de Tolo estava programando uma série sobre os grandes jogos de Copas do Mundo – ou melhor, os inesquecíveis, segundo seus colunistas, de cara pensei num jogo singular que, por uma feliz coincidência do destino teremos, eu e o Editor Chefe o prazer de assistir, ao vivo, nesta Copa 2014 no Brasil: o duelo eletrizante entre Bélgica e União Soviética .

OK, algum purista poderá dizer que a União Soviética já acabou e que a Rússia não é a mesma coisa que a URSS. Sinceramente? Acho que, à despeito do regime político vigente, a capital continua a mesma – Moscou – e os russos falam a mesma língua (ou pelo menos umas das línguas) que parte da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas falava. Então dá no mesmo.

photo2Vamos ao jogo.

No dia 15 de junho de 1986, em uma tarde de calor escaldante no estádio Nou Camp, em León, deu-se o encontro de Bélgica e URSS, duas seleções que vinham, até então, cumprindo campanhas bastante distintas naquele mundial. Os belgas haviam caído no Grupo B – que tinha o México (país anfitrião), o Paraguai e o Iraque.

Fizeram uma primeira fase discreta, perdendo o primeiro jogo para o México, por 2 a 0, ganhando do Iraque por 2 a 1 e empatando com o Paraguai em 2 a 2. Podemos dizer que o desempenho da Bélgica na fase de grupos fora decepcionante, já que o país sagrara-se vice-campeão europeu em 1980 (a Bélgica superou, naquele campeonato, nada menos do que Itália, Inglaterra e Espanha, só perdendo na final para a campeã Alemanha Ocidental). Já o maior feito da Bélgica em Copas do Mundo, até então, tinha sido estragar o jogo de abertura da Copa de 1982, vencendo a Argentina (campeã de 1978) por 1 a 0.

Já os soviéticos caíram no Grupo C. E surpreenderam. Ficaram em primeiro lugar no grupo, com uma campanha no mínimo convincente: golearam a Hungria pelo placar de 6 a 0 – a seleção da Hungria era aguardada com grandes expectativas na Copa (os húngaros tinham vencido o Brasil, num amistoso antes da Copa, por 3 a 0) -, depois venceram a fraca seleção canadense por 2 a 0 e terminaram a fase de grupos empatando com a forte seleção da França em 1 a 1.

photo3Tanto Bélgica e URSS avançaram, rumo às oitavas de finais. E aí e que se deu o pulo do gato dos belgas – os “diablos vermelhos”: numa partida emocionante, de sete gols, aliaram muita raça, técnica e determinação, e venceram a favorita URSS – tida até então como uma máquina de fazer gols, cujo artilheiro era Belanov, jogador do Dínamo de Kiev, e que acabaria sendo eleito pela revista France Football o melhor jogador europeu de 1986. No tempo normal, empate em 2 a 2. Na prorrogação, vitória da Bélgica por 2 a 1. O placar final terminou em 4 a 3 para os belgas. E olhem que naquele jogo, Belanov ainda marcou três gols…

O segredo da Bélgica? Creio que soube aliar experiência com juventude; jogadores técnicos com jogadores com garra. Os destaques do time eram os experientes Eric Gerets, Stephane Demol e Jan Ceulemans, alem do fantástico goleiro Jean Marie Pfaff – eleito o melhor da Copa. Integrava também o grupo uma jovem promessa: o meia Enzo Scifo, então com 20 anos, além do excelente Van Der Elst.

photo4Naquela campanha belga, em terras mexicanas, o jogo contra os soviéticos foi provavelmente o mais importante, já que alavancou a seleção daquele pais para uma memorável campanha a partir do mata-mata: além do triunfo nas oitavas, os belgas despacharam a temida Espanha nas quartas de finais, por 5 a 4 nos pênaltis – a “Fúria” havia massacrado a Dinamarca (“Dinamáquina”) no jogo anterior por 5 a 1, numa atuação memorável do centroavantes Emilio Butragueño, que marcara quatro gols naquela partida – um recorde em Copas.

A “sensação” belga só parou diante da Argentina – a mesma que eles haviam pregado uma peça quatro anos antes. E vamos dar um desconto: perderam para aquela que seria a campeã do mundo naquela Copa. E com Maradona no auge da carreira como jogador.

Por isso que Bélgica 4 x 3 URSS é, pra mim, saindo do lugar-comum de se falar em Seleção Brasileira em Copas, o jogo que até hoje me lembro, quando se fala em Copa do Mundo.

Quem sabe no dia 22 de junho, Bélgica e Rússia não repetem a dose, em pleno Maracanã?