Mais um domingo, e mais uma coluna “Orun Ayé”, do compositor Aloisio Villar. O tema hoje são as duas maiores metrópoles brasileiras, Rio de Janeiro e São Paulo (foto)
Rio, São Paulo e Eu
Essa semana um dos amores de minha vida fez aniversário, então resolvi fazer uma coluna em sua homenagem. 
Na verdade o aniversário é de seu padroeiro, São Sebastião, mas o carioca já incorporou como sua data. Sim, estou falando do Rio de Janeiro. 
Sou o que podemos dizer ‘carioca da gema’. Nasci em um hospital da Tijuca no dia 9 de agosto de 1976 e como todo bom carioca que ama a noite e a boemia nasci faltando dez minutos pra meia noite. Se existe uma coisa que sempre amei nessa cidade foi sua noite. 
Só nasci na Tijuca, logo fui levado pra minha casa na Ilha do Governador, casa que tirando os anos de 1992 e 1994 sempre morei. Sou carioca, bairrista convicto, apaixonado por minha cidade e moro naquele que eu penso como bairro perfeito pra mim. Assim como eu amo o Rio de Janeiro, amo a Ilha do Governador [N.do.E.: eu moro na Ilha. Se ele tivesse de estar às nove no Centro não sei se amaria tanto assim…]
A Ilha do Governador com todos os seus problemas, que não são poucos, é um bairro que me agrada muito porque faz parte de uma grande metrópole e mesmo assim conserva jeito de cidade do interior. Nada dá mais alívio a quem mora aqui que chegar à ponte do Galeão e ter a sensação que chegou em casa. 
Mas pretendo falar da Ilha em outra ocasião. 
Dificil falar no que mais gosto no Rio de Janeiro, não é a toa que ela tem o nome de “Cidade Maravilhosa”. 
Apesar de não gostar muito de Sol (é, sou diferente dos cariocas normais nesse sentido) eu sou apaixonado pelas praias de Copacabana e Ipanema. Sempre que recebo visita de outros estados em casa faço questão de levar pra conhecer. E todos saem maravilhados. 
Copacabana e Ipanema devem ter as praias mais famosas do mundo, as mais cantadas e seus calçadões exalam arte, magia. 
A sensação que eu tenho quando caminho por aqueles calçadões é que caminho pela história, pela beleza. Amo ver as pessoas felizes bebendo nos quiosques, na praia se bronzeando ou praticando esportes. 
As garotas de Ipanema com seus biquinis deixando ver toda a maravilha que nos enfeitiçam no doce balanço a caminho do mar ou em Copacabana a princesinha do mar, a nossa torre de Babel que junta várias tribos, pessoas completamente diferentes em suas belezas e perigos. Porque as belezas de seus dias se tornam um perigo excitante de noite. 
Copacabana me fascina desde criança. Aquele calçadão, aquelas luzes de noite, o seu reveillón.. 
Conheci o reveillón de Copacabana em 1997. Nunca tive vontade de ir, mas fui convencido por minha mãe e minha avó. Acabei me apaixonando de cara. 
É dificil descrever a energia que passa em uma virada de ano em Copacabana. Eu não tenho vontade nenhuma de passar em Nova York, Paris, Tóquio… Copacabana tem tudo que eu quero e preciso, pessoas felizes, música, estouro de champanhe, emoção e os fogos…
Falar o que dos fogos? Passei doze reveillóns em Copacabana e nos doze me emocionei e senti orgulho da cidade que nasci. Não dá pra passar em palavras o que são aqueles fogos, mas dá para sentir a certeza que um ano que começa daquela forma não pode ser ruim. 
O Rio de Janeiro é bem mais que Copacabana e Ipanema. Um dos meus cantos preferidos na cidade é o Arpoador. E de lá vejo toda a orla e sinto uma sensação gostosa de liberdade. O Arpoador é um lugar famoso, já cantado por Skank, Cazuza e que conheci recentemente ao pedir uma pessoa em namoro. 
Voltei algumas vezes lá depois com essa recordação para sempre na minha mente. 
Uma vista bonita e se emocionar? O Cristo Redentor taí pra isso. O nosso símbolo. Para ser um turista completo pode passar no Pão de Açúcar também. 
Mas o Rio tem outros lugares para você se divertir. Uma sexta na Lapa onde você encontra pessoas de todos os tipos e amanhecer jogando sinuca em um boteco. Um sábado na feira de São Cristóvão para comer um baião de dois e se divertir com os amigos. 
O Rio de Janeiro é uma das cidades do mundo que melhor recebe os imigrantes. As provas são a feira de São Cristóvão e o SAARA. O SAARA é um conjunto de ruas no centro da cidade que contém lojas populares. 
Tem a Barra da Tijuca e seu jeito de “novo rico”, lugar de megas shoppings e megas condomínios. Santa Teresa e seu bondinho, Leblon e seu cenário de novela, Vila Isabel e Madureira terras que fornecem samba de qualidade. 
As favelas e seus medos, mas também terra de gente guerreira e que luta por um futuro. Gente talentosa que sonha com um amanhã melhor vindo atrás das UPPs. 
O Rio de Janeiro é isso. Terra do futebol e do carnaval. Única cidade do mundo a ter quatro grandes clubes de futebol. Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo fizeram o Maracanã de grande companheiro e cúmplice de alguns dos momentos mais importantes da história do futebol – e em alguns deles eu estava lá. 
Assim como Bangu, América e outros clubes que fizeram a história futebolística de nossa cidade. 
Como Portela, Mangueira, Império Serrano, Salgueiro, Imperariz Leopoldinense, Mocidade Independente, Vila Isabel, Unidos da Tijuca, União da Ilha e outras escolas de samba fizeram na Praça Onze, Presidente Vargas, Avenida Antônio Carlos e rua Marquês de Sapucaí a história do nosso carnaval. 
Desfiles de escolas de samba que começaram como coadjuvantes dos desfiles das grandes sociedades e foram crescendo ao longo dos anos, passando das arquibancadas de madeira e tapumes até o mega evento que é hoje televisionado pra dezenas de países. 
Mas o carnaval do Rio não são somente as escolas de samba. Têm os bailes populares dos bairros, concursos de fantasias, bailes de salão, blocos com milhões de seguidores. 
O Rio de Janeiro é do Cacique de Ramos, Bafo da Onça, Cordão da Bola Preta, Monobloco, Banda de Ipanema, Suvaco de Cristo e de muitos outros blocos grandes e pequenos que fazem a alegria dos foliões cariocas e dos turistas. 
Rio de Janeiro de Noel Rosa, Tom Jobim, Chico Buaque de Holanda. Rio musical, da rádio Nacional, bossa nova, do samba, tão cantado e exaltado por milhares de artistas sendo cariocas ou não. 
Rio de Janeiro do baiano Gilberto Gil que entre a prisão e o exílio fez a música “Aquele Abraço” se despedindo da cidade e mostrando aos amigos que estava vivo. Cenário de filmes, livros, peças de teatro, novelas. Cenário de amor. 
Difícil falar o que mais gosto do Rio de Janeiro. Mas acho que o que mais gosto é do carioca. 
Pode não parecer, mas o carioca é um povo sofrido. É a violência, a desigualdade social, dengue, enchentes, falta de hospitais, cidade que não se acostumou ainda de ter visto tomada de si o título de capital federal, muitas vezes falta de amor de seu governante consigo… 
… mas nunca falta de amor do povo com a cidade. 
Nunca faltam amor e humor. O carioca encara tudo com ótimo humor, com sorriso muitas vezes desdentado nos lábios. Carioca enxuga o suor e vai a luta. Em tudo tem uma piada, tudo transforma em samba. Assim como o sertanejo, carioca antes de tudo é um forte. 
Ou como preferimos dizer aqui: carioca é maneiro. 
Falei bastante de minha cidade. Agora quero falar de outra, que faz aniversário nessa semana, dia 25. 
Assim como todo carioca sempre tive pé atrás com São Paulo. Via São Paulo como o “diferente”, tudo aquilo que o Rio não é. 
Achava São Paulo cosmopolita demais, aqueles prédios todos, o cinza no céu. São Paulo e Rio de Janeiro sempre foram o contraste. O Sol e a chuva, o Yn e o Yang, água e óleo, o Rubens Barrichello e um carro de Fórmula 1. O nada a ver. 
Até meus 31 anos tinha ido a São Paulo duas vezes na vida em excursões com familiares. Mas quis o destino que a partir de 2007 começasse a me apaixonar por suas nativas. E elas por mim. 
Entre 2007 e 2008 fui cinco vezes a Bauru, interior do estado de São Paulo, terra do melhor churros do mundo. Mas minha relação com a capital mesmo se iniciou em 2009. 
Em 2009 me apaixonei por uma paulistana e com a cara e a coragem fui até a cidade conhecê-la. Fiquei cerca de doze horas apenas na cidade e nessa viagem só conheci a rodoviária e a Avenida Paulista. 
Mas ali foi só o começo. 
Voltei mais doze vezes a São Paulo e acreditem cariocas: São Paulo não é tão estranha quanto parece. 
Eles colocam purê no cachorro quente e não botam queijo nas pizzas, mas são um povo agradável e cortês além de abrigarem lugares lindos como o Museu da Língua Portuguesa, a estação da Luz e seu concreto que assim como nossas praias e calçadões deu poesia. 
Suas meninas não têm a pele bronzeada como as nossas, mas exalam charme e simpatia. Vestem-se bem e tem um sotaque insinuante. O Mercado Municipal tem um sanduíche de mortadela delicioso e a rua Augusta assim como Copacabana a noite esconde prazeres proibidos e excitantes. 
São Paulo de Adoniran Barbosa e seu trem das onze, de Paulo Vanzolini e sua ronda que para na avenida São João, dos novos baianos que sentiram alguma coisa acontecer em seus corações. 
São Paulo de Corinthians, Palmeiras, São Paulo e também de Vai Vai, Rosas de Ouro, Nenê da Vila Matilde, Vila Maria, Peruche, Gaviões da Fiel, Mancha Verde, Império da Casa Verde, Mocidade Alegre, Leandro de Itaquera e outras escolas e sambistas que mostram que a cidade não é o túmulo do samba. 
A maior cidade do país, a mais “internacional” por receber gente do mundo inteiro pra realizar negócios e a mais “nacional” por receber em sua rodoviária no Tietê uma quantidade enorme de imigrantes de todo país que enxergam na cidade a chance de ter uma vida melhor. 
São Paulo do parque do Ibirapuera, do Zôo com Simba Safari, da Praça da Sé, do Pacaembu, do Anhembi, da Avenida Paulista e de todos os brasileiros, da lanchonete do estadão que não fecha e serve feijoada até de madrugada, do mercado da 25 de março, São Paulo terra da Garoa e dos Demônios da Garoa, do Brás e do parque Dom Pedro que me fizeram tão bem. 
Do Capão Redondo e do Morumbi, do rap da periferia à rua OscarFreire. Cidade heterogênea, cidade de todos. 
Cidade que me fez muito feliz. 
Não fui tão feliz na minha última viagem a São Paulo. Sonhos acabaram despedaçados numa melancólica madrugada na rodoviária, mas o que guardo da cidade é muito mais positivo que negativo. Fiz amigos eternos em São Paulo, fiz amores eternos em São Paulo. Sempre muito bem recebido. 
E com o tempo percebi que Rio de Janeiro e São Paulo não são assim tão diferentes. Uma completa a outra e juntas fazem muito da força de nosso país. 
Sou carioca, amo minha cidade, mas tenho carinho por São Paulo e até acredito em alguns momentos que tenho a alma paulistana. 
Duas cidades tão diferentes e próximas que até festas fazem com diferença de apenas cinco dias. 
E só me resta parabenizar e agradecer duas por tudo. Com a certeza que esse nosso triângulo amoroso ainda renderá muitos frutos.
Orun Ayé!