A última semana viu uma mudança bastante significativa de conjuntura econômica: a taxa de câmbio do real em relação ao dólar desvalorizou-se repentinamente, alcançando patamares não vistos desde meados de 2009.
A taxa, que chegou a estar abaixo de R$ 1,60, subiu rapidamente até o patamar de R$ 1,96 na última quinta feira, recuando posteriormente após ação do Banco Central – necessária pela primeira vez desde junho de 2009. No momento em que escrevo (madrugada de sábado), o dólar está em R$ 1,83, com recuo significativo – mas ainda uma expressiva alta nesta última semana de 5,5%.
O leitor mais antigo do Ouro de Tolo sabe que vinha escrevendo insistentemente sobre o risco que representa o câmbio apreciado à nossa economia. Também sabe que somente a redução da taxa interna de juros interna e a diminuição do diferencial com as taxas externas fariam com que este problema se minorasse.
Então, você pode perguntar: “Migão, a Taxa Selic só baixou meio por cento e assim mesmo o dólar explodiu. Por quê?”
Simples.
O leitor deve se lembrar do artigo que escrevi aqui tempos atrás sobre a Grécia. O que acontece é que a crise se agravou no país, se agravou em outros estados europeus – como Portugal, Espanha e Itália, entre outros – e começa a ficar claro o que escrevi lá atrás: que a única solução é a renegociação das dívidas destes países, com deságio – não chega a ser um calote total mas é parcial.
Como os investidores internacionais certamente terão perdas nestes países por causa da inevitável reestruturação, surge a necessidade de retirar investimentos em outros países a fim de cobrir as perdas. Com isso a quantidade de dólares na economia brasileira cai e, pela Lei da Oferta e da Demanda, seu “preço” sobe. Foi exatamente o que ocorreu.
Além disso, a incerteza mundial gerada pela proximidade de uma nova crise econômica causou um certo pânico nos mercados. Nestes momentos o investimento em dólar costuma ser considerado mais “seguro”, ou seja: há uma corrida à moeda, e esta demanda faz com que seu preço suba. 
Parece claro que haverá uma nova crise de consequências imprevisíveis na economia mundial. Os Estados Unidos ainda se ressentem da equivocada condução da crise de 2008, onde o dinheiro que deveria estimular a economia acabou virando bônus para executivos de Wall Street. Por outro lado a Europa Ocidental convive há tempos com economia estagnada e crises como as citadas acima.
O Banco Central entrou no mercado na quinta e na sexta feira vendendo dólares para que a cotação não subisse de forma abrupta. Isto causaria impactos fortíssimos sobre grandes empresas que possuem dívidas em dólar, que teriam os valores destas em real subindo de forma quase que geométrica. Além disso haveria um fator de incerteza decorrente desta quase “corrida” à moeda norte americana.
Evidentemente que as divisas retiradas por agentes internacionais para cobrir perdas nos mercados europeus não irão retornar, o que significa a princípio que R$ 1,80 seria um novo “piso” para a taxa de câmbio. A ação do Bacen parece ter sido mais no sentido de conter a especulação e acalmar os mercados.
Ainda assim, é uma desvalorização considerável, tendo em vista que em 01 de agosto a taxa de câmbio, por exemplo,era de R$1,55 por dólar. São aproximadamente 17% em pouco menos de dois meses.
Este patamar, embora ainda aquém de que a meu ver seria uma taxa de equilíbrio, já permitiria algum fôlego à indústria e ao agronegócio nacionais. O patamar anterior, com sobrevalorização, estava tornando inviável a competição em certos setores, com muitos casos onde as empresas tornaram-se apenas montadoras de produtos fabricados em outros países – notadamente a China – para sobreviverem. 
O agronegócio padecia do mesmo problema, custos altos em dólares e perda de competitividade no mercado mundial.
Com o câmbio desvalorizando empreende-se um duplo movimento: os produtos importados ficam mais caros aqui pois mais reais precisam ser cobrados para se obter a mesma remuneração em dólares original. Por outro lado os produtos nacionais ficam mais baratos lá fora pois seus custos são valorados em reais e menos dólares equivalem aos mesmos reais de custo.
Como efeito colateral, deve-se ter um pequeno repique da inflação, pois os produtos importados estarão mais caros em nosso mercado. Um bom exemplo são os apreciadores de cervejas especiais, como eu, que deverão ter de suportar um aumento significativo nos custos destas mercadorias.
Também perdeu quem marcou viagens de férias ao exterior para o início de 2012, pois terão de gastar mais reais para levar a mesma quantidade de dólares. Quem pagou passagens parceladas em dólar no cartão também vai sentir diretamente no bolso estas mudanças.
Por outro lado as empresas brasileiras ganham maior competitividade e maior condição de manter empregos e renda, estancando-se o (preocupante) processo de destruição da indústria nacional que estava em marcha.
Pretendo voltar ao tema ainda esta semana, tratando das possíveis consequências da crise na economia brasileira. Até lá.
(Gráfico: Folha de São Paulo)