A fase pré-carnavalesca de 1992 vinha cercada de polêmica. Com o rebaixamento de quatro agremiações em 1991, a Liesa atingiu inicialmente o número desejado de 14 escolas desfilantes, mas uma questão jurídica impediu que o objetivo fosse alcançado na prática.

No ano anterior, a Acadêmicos de Santa Cruz desfilou sob um apagão no sambódromo e, como não foi julgada, se sentiu prejudicada, recorrendo então à Justiça para subir ao Grupo Especial. A Verde e Branco da Zona Oeste conseguiu ganho de causa, e a elite passou a ter 15 escolas.

Alheias à confusão nos bastidores, as demais escolas se preparavam para mais um desfile. A expectativa geral era a do tricampeonato da Mocidade Independente de Padre Miguel. O enredo era abstrato, sobre os sonhos, e esperava-se mais um ótimo trabalho dos carnavalescos Renato Lage e Lílian Rabello. O samba era popularíssimo e incansavelmente executado nas rádios.

Apesar do impressionante favoritismo da Mocidade, as outras escolas não deixavam por menos e prometiam bons desfiles. Vice-campeão de 1991, o Salgueiro contaria a história do café, enquanto a Imperatriz Leopoldinense, na estreia de Rosa Magalhães como carnavalesca da agremiação, celebraria os 500 anos da descoberta oficial do continente americano.

Um interessante enredo prometia ser mostrado pela Estácio de Sá: “Pauliceia Desvairada” levaria o público de volta à Semana de Arte Moderna de 1922. O samba já era considerado popular, mas havia certa dúvida em relação a como um tema eminentemente paulistano seria recebido no Rio de Janeiro.

Grande expectativa também causava a Unidos do Viradouro e seu instigante enredo sobre os ciganos. Depois da ótima estreia em 1991, o talento do carnavalesco Max Lopes e o melhor samba da safra prenunciavam um excelente desfile.

As duas maiores escolas do Rio de Janeiro também teriam enredos de fácil leitura. A Portela faria uma viagem pela cor azul e ainda uma auto-homenagem já que, convenhamos, azul como o da Portela não há. Já a Mangueira homenagearia Tom Jobim, num estilo de enredo que muitas vezes rendeu bons frutos à escola – basta lembrar de Braguinha e Caymmi anos antes, além de Chico e Bethânia, depois.

A Beija-Flor tentaria voltar à briga pelo campeonato com um enredo sobre a história da televisão. Já a Unidos da Tijuca faria um passeio pela Baía da Guanabara e a União da Ilha viajaria pelas ilhas de todo o planeta.

Em grave crise financeira, a Vila Isabel, por sua vez, questionaria o descobrimento da América, num enredo diametralmente oposto ao da Imperatriz. A Caprichosos fugiria das suas características de irreverência e faria um enredo sobre o artesanato brasileiro.

Completavam o Grupo Especial as três escolas que subiram do Acesso: Leão de Nova Iguaçu, num enredo sobre a escritora de novelas Janete Clair, a Tradição, com um tema que falava das flores, e a Santa Cruz, que abriria os desfiles contando a mística do número 4.

OS DESFILES

Apesar da boa bateria e da interpretação sempre forte do extraordinário cantor Sobrinho, a Santa Cruz fez um desfile problemático. O enredo idealizado pelo carnavalesco Ney Ayan, morto pouco antes do desfile, até que rendeu um bom conjunto de fantasias.

O enredo, bem dividido, lembrou das quatro fases da Lua, dos quatro naipes do baralho, das quatro estações do ano, entre outros aspectos nos quais era possível lembrar do número, como o amor entre quatro paredes, e o próprio Carnaval, que termina numa quarta-feira. As alegorias estavam num nível abaixo em relação às fantasias, já que não havia grandes recursos, e a própria confirmação da escola no desfile do Grupo Especial saiu a pouco tempo do Carnaval.

Para piorar, com a quebra de dois carros, a evolução foi para o beleléu, e a escola evidentemente também perderia pontos no quesito Enredo. O destaque absoluto da Santa Cruz foi o inesquecível casal de mestre-sala e porta-bandeira formado por Élcio PV e Dóris.

Como a escola perdeu tempo no começo do desfile e começou a evoluir com atraso, a bateria passou reto pelo box, o que sempre é ruim. Sem uma harmonia inspirada, a escola já era candidata ao descenso.

Segunda a desfilar, a Leão de Nova Iguaçu tinha um samba-enredo bem agradável sobre Janete Clair e o enredo foi bem dividido, a despeito de uma certa irregularidade nas alegorias e fantasias, estas superiores aos carros.

Foi outro enredo bem apresentado, com as principais novelas escritas por Janete passando pela avenida. O destaque foi o carro que representava “O Astro”, com o próprio ator Francisco Cuoco como principal destaque.

Viúvo de Janete, o também escritor Dias Gomes desfilou logo atrás da comissão de frente, ao lado de Boni e Daniel Filho. Outros atores da Globo e amigos da saudosa escritora também participaram do cortejo, como o casal formado por Nicette Bruno e Paulo Goulart, no abre-alas, e Betty Faria.

A escola desfilou respeitando suas cores dourada, vermelha e branca e fez uma apresentação alegre, com destaque para a cadência da bateria, dirigida por Andrezinho, filho do lendário Mestre André. Mas a permanência no Grupo Especial não estava garantida.

Isso porque houve falhas de evolução, já que a Leão, a exemplo da Santa Cruz, se enrolou para evoluir nos primeiros minutos de desfile. Também atrapalhou a presença de artistas em frente à bateria, já que, obviamente os fotógrafos e cinegrafistas fizeram a festa bem no meio da pista… Mas foi um desfile muito agradável.

epm92Primeira das grandes escolas a pisar a Sapucaí, a Estação Primeira de Mangueira fez uma ótima apresentação na homenagem a Tom Jobim. O samba, que não era tão prestigiado na fase pré-carnavalesca, cresceu demais na avenida graças a mais uma fortíssima interpretação de Jamelão, que ganhou o Estandarte de Ouro de “O Globo”.

A divisão cromática, ao contrário do desfile de 1991, respeitou mais as cores da escola, embora com tons suaves de verde e rosa (sobretudo), e o conjunto de alegorias e fantasias contou muitíssimo bem o enredo, que fez um passeio pelos grandes sucessos do artista, sem esquecer, claro, da paixão de Tom pelo Rio, sobretudo Ipanema.

Um dos destaques era a apresentadora (ainda) infantil Angélica, no alto do carro “O Boto e as Rosas”, sobre a canção “O Boto”, que falava sobre a natureza, uma das paixões do artista.

Agradou muito o carro da Bossa Nova (foto), que tinha uma bem-humorada escultura de Vinícius de Moraes e um bar no qual desfilaram grandes amigos de Tom, como Miéle, Jaguar, Hugo Carvana, Nana Caymmi e a primeira e única Garota de Ipanema, Helô Pinheiro.

Aos 65 anos, Tom Jobim, apesar de receoso em relação à altura da alegoria, desfilou no carro “Tom e a Natureza”, no qual estava sentado diante de um piano branco cercado por bastante verde e componentes fantasiados de borboletas. No fim, o carro “Passarim” mostrava diversos pássaros fora das gaiolas, num belo simbolismo do que Tom pedia.

Curiosamente, com o perdão do trocadilho, o artista ficou engaiolado quando tentou descer do carro na Apoteose, pela gigantesca quantidade de repórteres que tentavam entrevistá-lo. Com a ajuda de diretores da Mangueira, Tom teve de sair na marra e se mostrou irritado com o assédio.

Mesmo com 5 mil componentes, a Mangueira não cometeu os equívocos de outros anos na evolução e, com a volta do lendário mestre de harmonia Xangô, fez seu mais equilibrado desfile nos quesitos desde o vice-campeonato de 1988.

Imperatriz1992Depois da Mangueira, a Imperatriz Leopoldinense levou o público a um passeio pelas inúmeras riquezas e histórias das Américas no belo enredo “Não existe pecado abaixo do Equador”, da carnavalesca Rosa Magalhães – que iniciaria uma brilhante trajetória de quase duas décadas na agremiação de Ramos.

Nesta primeira concepção à frente da Imperatriz, Rosa já mostrou a que veio e deixou claro o seu estilo de Carnaval: muito cuidado com alegorias e fantasias, e criatividade no desenvolvimento do enredo, sem falar na coerência da divisão de alas e na exposição das ideias.

Agradou muito a divisão cromática, que respeitava o verde e o branco da escola – além do dourado da coroa – e apresentou inúmeras nuances. Isso dava uma visão de conjunto maravilhosa ao desfile.

Depois de ser uma das pessoas mais faladas do Carnaval de 1991, a modelo Melissa Benson voltou a ser o centro das atenções ao desfilar numa bonita alegoria (foto ao lado) com o ator Leonardo Brício, simbolizando Adão e Eva.

A bateria teve uma apresentação muito firme, com o conhecido naipe de tamborins impecável e um andamento rápido mas adequado. Mas, apesar de uma empolgada atuação do cantor Preto Joia, que se firmava definitivamente na escola, o samba-enredo não caiu tanto no gosto popular como havia acontecido com a Mangueira.

O que empolgou mesmo foi uma ala coberta por um enorme tecido verde-água que, conforme os componentes evoluíam, dava um efeito como o balanço das ondas do mar. No fim, a Imperatriz deixou excelente impressão em seu desfile e tinha plenas chances de brigar em cima.

Quinta escola a desfilar, a Caprichosos de Pilares homenageou o artesanato brasileiro e se apresentou com alegorias de bom gosto e acabamento. Mas um problema atrapalhou: figurinos de uma ala não chegaram a tempo do desfile, o que gerou bate-boca na concentração, e alguns componentes desfilaram assim mesmo, o que renderia perda de pontos.

O samba-enredo, embora muito correto, não tinha o jeito alegre como é a cara da Caprichosos, exceto pelo refrão “Que batuque gostoso/um axé bem formoso/Salve a Bahia!”. De qualquer forma, as alas não passaram com muito entusiasmo. Por outro lado, a bateria agradou com o andamento bastante cadenciado – na época, isso ainda era comum nas escolas.

Em termos de alegorias, o destaque foi o abre-alas, que fazia menção ao artesanato da Ilha de Marajó. O carro que simbolizava o artesanato dos produtos da Feira Hippie também era interessante. Já as fantasias tinham um conjunto de altos e baixos. Foi aquele típico desfile de meio de tabela.

salgueiro92Ao contrário da Caprichosos, quem passou irreverente foi o Salgueiro, com um excelente enredo sobre a história do café. O carnavalesco Mário Borriello, que assumiu o barracão depois da saída de Flávio Tavares, optou por alegorias que tentavam tratar o tema com bom humor, mas que acabaram formando um conjunto de altos e baixos.

O abre-alas, no entanto, foi considerado excepcional, com uma enorme escultura de um preto velho socando o café no pilão – veja mais no Cantinho do Editor. O grande salgueirense Haroldo Costa, diga-se de passagem, diz que essa alegoria foi uma das que mais o deixou emocionado em tantos anos de desfiles.

O conjunto de fantasias estava superior ao de alegorias, e o ótimo samba foi sustentado, como sempre, com brilhantismo pela bateria do Mestre Louro. O intérprete Quinho, fugindo um pouco das suas características, até que se conteve mais nos cacos e, com isso, teve uma condução ainda mais segura.

Os 5 mil desfilantes desfilaram bastante animados e com uma evolução precisa do começo ao fim de uma apresentação que credenciava a Vermelho e Branco (cujas cores foram bastante respeitadas no conjunto visual) a ficar nas primeiras colocações.

Havia uma expectativa muito grande para a passagem da sétima escola da noite, a Unidos do Viradouro. O enredo “E a Magia da Sorte Chegou” era cercado de grande otimismo por parte de componentes, público e imprensa, já que o mundo cigano era de extrema riqueza. Durante a fase pré-carnavalesca, um vendaval danificou a cobertura da quadra, mas isso não abalou a escola.

Quando Quinzinho começou a cantar o melhor samba do ano, e a bateria comandada por Paulinho entrou para valer, as expectativas começaram a se confirmar (o Migão já comentou sobre esse desfile no blog). A comissão de frente com os Reis Magos, primeiros ciganos da Era Cristã, impressionou de cara, bem como o abre-alas, com uma enorme coroa, símbolo da escola.

Viradouro 92_carro que pegou fogoO carnavalesco Max Lopes fez naquele desfile um de seus mais brilhantes trabalhos em décadas de serviços prestados ao Carnaval do Rio, com um requinte extraordinário de fantasias e alegorias, que lembraram diversas vertentes ciganas e países como Egito, Índia, Hungria, Rússia e Espanha, com cada setor muito bem identificado pelas vestimentas.

Quando a Viradouro já se credenciava a brigar pelo título com muita força, dois incidentes aconteceram. O primeiro, até normal num desfile, foi em evolução, quando descompassos provocados pela exibição do casal de mestre-sala e porta-bandeira e pela entrada da bateria no box já fizeram a escola correr para preencher buracos. E, depois, como já sabemos, uma tragédia aconteceu.

Na verdade, uma tragédia sem mortos, mas uma tragédia pelo que causou a uma das melhores apresentações vistas nestes quase 40 anos de sambódromo. O carro da Rússia (na foto acima, a réplica levada pela Grande Rio em 2010), que tinha huskies siberianos e era feito em fibra de vidro e algodão, simbolizava com perfeição o efeito da neve típica daquela região. Mas o incêndio oriundo num gerador consumiu o carro em instantes – leia mais curiosidades sobre o incêndio no Cantinho do Editor.

FOTO-129VIRADOURO1992CARRO-DA-RUSSIA-PEGA-FOGO-NA-APOTEOSEA alegoria ainda estava chegando à dispersão e os destaques saíram às pressas, com alguns se ferindo. A alegoria em chamas foi largada na Praça da Apoteose (foto), e um caminhão do Corpo de Bombeiros entrou na pista no meio dos desfilantes. O incêndio foi debelado, e por sorte ninguém teve ferimentos mais severos, mas o caos tomou conta do restante do desfile.

Com garra, apesar do lamentável acidente, a Viradouro acabou estourando em 13 minutos o tempo regulamentar, já que a evolução parou para que os bombeiros apagassem o incêndio. Pena, porque era um cortejo digno de título, mesmo com nove desfiles restando.

Depois do alívio pelas notícias de que não havia mortos no incidente da Viradouro, a Beija-Flor de Nilópolis encerrou o desfile de domingo com o enredo “Há um ponto de luz na imensidão”. Apesar de alguns bons momentos, nem de longe a escola lembrou seus grandes carnavais.

Joãosinho Trinta recorreu a efeitos especiais até pertinentes ao enredo, mas o conjunto alegórico tinha altos e baixos. O abre-alas era muito bem concebido e tinha potente iluminação, o que chamou a atenção de todos. Também agradou o carro da novela Pantanal, além do elemento que lembrava o Carnaval, que encerrava o desfile fazendo uma homenagem ao imortal Chacrinha. No mais, João 30 não esteve tão inspirado como em outros anos.

Além disso, a chuva, que caíra em menor intensidade durante o desfile da Viradouro, aumentou quando a Beija-Flor passou, e isso afetou as fantasias. Para piorar, dois componentes desfilaram nus (só com purpurina e tinta prateada cobrindo as genitálias), e a escola provavelmente seria punida. Um deles, o jovem Torez Bandeira, de 18 anos, alegou que a chuva fez o esparadrapo de seu tapa-sexo cair…

Com um samba-enredo que também não era tido como dos melhores de 1992, até que os componentes cantaram com força, mas a arquibancada desta vez não acompanhou com tanta empolgação o desfile da Deusa da Passarela. Em resumo, desta vez a escola estava fora da briga pelo título.

“Não me arrepiou. Aquele choque do abre-alas no primeiro momento me deixou preparado para ficar impactado por mais momentos, mas isso acabou não acontecendo. Parece que a fórmula Beija-Flor chegou ao fim”, comentou José Carlos Rêgo, de forma incrivelmente profética, na transmissão da TV Manchete.

Isso porque, já no dia seguinte, Joãozinho Trinta anunciou que não seria mais carnavalesco da Beija-Flor, encerrando um maravilhoso e inesquecível ciclo de 17 carnavais – veja mais nas Curiosidades.

A primeira escola a desfilar na segunda-feira foi a Tradição, que voltava à elite após dois carnavais no Acesso. Lamentavelmente não foi uma boa exibição, até porque o samba-enredo, ponto forte da escola na primeira passagem pelo primeiro grupo, não empolgou.

O enredo lembrou das flores desde as marinhas até as típicas brasileiras e as estrangeiras. As oferendas a Iemanjá com entrega de flores também foram lembradas. No entanto, a chuva prejudicou o acabamento de alegorias e fantasias, que já estavam pesadas – o que piorou ainda mais com a água.

Digna de lembrança a última participação da lendária porta-bandeira Vilma Nascimento. Aliás, uma falha grave de evolução da escola se deu quando Vilma se apresentou, e a direção de harmonia bobeou. Isso sem contar o número de penetras na pista, o que piorou o cenário. Com tantos problemas, a escola de Campinho era forte candidata ao descenso.

Outra que se apresentou de forma decepcionante foi a Unidos de Vila Isabel. A falta de recursos, que já vinha sendo um problema desde o título de 1988, ficou ainda mais patente, e o enredo crítico ao descobrimento da América não pôde ser desenvolvido a contento.

O carnavalesco Gil Ricon, ex-Império Serrano, procurou questionar o Descobrimento da América de forma bem-humorada, deixando claro que o continente já era habitado muito antes. Uma das alegorias se chamava “A Galinha dos Ovos de Ouro” e mostrava que o interesse na América era por causa das riquezas contidas nela.

Apesar de os componentes terem cantado com força o criticado samba, a Vila teve um de seus piores desfiles. As fantasias e alegorias deixavam clara a falta de dinheiro no barracão, e nem mesmo uma alegoria com um canhão de laser empolgou.

“Quando eu rodava, as plumas iam caindo”, contou ao Jornal do Brasil a porta-bandeira Mariazinha, que terminou o desfile com a fantasia aos pedaços.

estacio92bPor outro lado, empolgação não faltou à Estácio de Sá, que já vinha obtendo colocações de destaque nos carnavais anteriores e prometia muito com o enredo dos carnavalescos Mário Monteiro e Chiquinho Spinoza sobre os 70 anos da Semana de Arte Moderna de São Paulo. E, de fato, as expectativas mais otimistas ainda foram excedidas, e a Vermelho e Branco fez uma apresentação inesquecível.

Desde os primeiros versos entoados pelo cantor Dominguinhos, o público ficou enlouquecido com o samba-enredo, que, além de popular, contava muito bem o enredo em homenagem aos grandes artistas que emplacaram o Modernismo no Brasil, como Villa Lobos, Di Cavalcanti, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Ronald de Carvalho, entre outros. O nome do enredo, “Pauliceia Desvairada”, remetia ao título de um livro de Mário de Andrade.

A comissão de frente formada por pierrôs e arlequins com pernas de pau é inesquecível até hoje, e o abre-alas retratando o Theatro Municipal da capital paulista (foto) ficou imponente, a despeito de um problema no letreiro de néon ter deixado a iluminação da palavra Estácio falhando em parte do desfile. Havia ainda alguns pequenos problemas nas alegorias, que, no entanto, eram de facílima leitura.

Outra alegoria que chamou muito a atenção, e até hoje é lembrada pelos apaixonados pelos desfiles das escolas de samba, foi a do Trem Caipira (foto). O carro, embora não tão gigante, era muito bem resolvido e teve um grande efeito, até porque ia de um lado para o outro na pista e fazia o clássico “piuí”.estacio92c

As fantasias também apresentaram o enredo com correção, tinham diversas cores, sem deixar de lado o Vermelho e Branco da escola, e permitiam ainda uma evolução vibrante durante todo o tempo, sem que os componentes se cansassem.

Um dos momentos mais bacanas foi a passagem da ala das crianças, com fantasias brancas de pierrots. A alegria dessas crianças chegou a ser comovente, numa pura demonstração do que é carnaval na essência.

Outro destaque do desfile estaciano foi o jovem, mas já brilhante, casal de mestre-sala e porta-bandeira formado por Claudinho e Selminha Sorriso, que anos depois seriam consagrados na Beija-Flor como uma das maiores duplas de todos os tempos.

Com incrível euforia, o público nos setores de arquibancada até fez coreografia para acompanhar o samba, que, além de empolgante, tinha um refrão central que era um “chiclete para os ouvidos”: “Me dê, me dá/Me dá, me dê/Onde você for/Eu vou com você!”.

sargentelliA catarse era tanta, que a modelo Luciana Sargentelli, filha do grande Oswaldo Sargentelli, não parou de sambar em cima de um dos carros alegóricos (foto) mesmo com os pés sangrando por ela ter pisado em pedaços cortantes que se soltaram do acabamento. Além da própria beleza, a garra de Luciana até hoje é lembrada.

Outro fator positivo que poderia ser decisivo na apuração foi a perfeita evolução dos componentes até a linha final, tanto que a Estácio terminou seu desfile com tranquilidade aos 76 minutos, portanto, quatro antes do tempo regulamentar.

Quando a escola chegou à Praça da Apoteose, parecia que o desfile ainda estava começando, tamanha a energia de componentes e público, que não parava de cantar “é campeã”. Simplesmente memorável, e a Estácio era candidata séria ao título, principalmente depois dos problemas da Viradouro e por nenhuma outra escola ter brilhado tanto antes ou depois.

Depois do fantástico desfile da Estácio, a Unidos da Tijuca fez uma correta apresentação exaltando a Baía da Guanabara. O destaque absoluto foi a comissão de frente, que tinha fantasias simbolizando caramujos, com muita espuma e plástico, materiais sempre usados com muita inteligência e criatividade pelo saudoso carnavalesco Oswaldo Jardim.

O samba-enredo também era popular, com o famoso refrão “É no balanço desse mar, que eu vou / Vou navegar, eu vou / Vou na proa, vou na boa / Pra Ilha de Paquetá”, e o público cantou, embora não tenha se empolgado como na passagem estaciana – vale lembrar que o carro de som cantou o samba num tom muito mais alto do que o do disco…

A bateria do Mestre Paulinho agradou, com boas paradinhas e convenções. No ano da Rio 92, a preocupação ecológica esteve presente, e houve até uma alegoria com cachoeiras jogando água em modelos à la Melissa Benson na Imperatriz em 1991. O desfile lembrou ainda que a baía já era muito poluída – infelizmente continua…

mocidade92Quinta agremiação na programação de segunda-feira, a bicampeã Mocidade Independente de Padre Miguel entrou cheia de confiança em busca de mais um título. Confiança até demais, eu diria. Na concentração, o clima era traduzido no grito de guerra do grande intérprete Paulinho Mocidade, que pediu perdão às concorrentes, mas anunciou que a campeã estava entrando na avenida.

De qualquer forma, o enredo “Sonhar Não Custa Nada, ou Quase Nada” prenunciava mais um grande desfile e os integrantes, sobretudo diretoria, realmente já falavam em tri ainda na concentração. O presidente do Conselho Deliberativo, Paulo de Andrade, prometeu “bicho” de 15 mil dólares para cada integrante da bateria caso a Mocidade levasse o caneco.

De fato, foi um desfile excepcional, com os carnavalescos Renato Lage e Lílian Rabello outra vez dando um show de competência na concepção plástica e de conteúdo da escola.

Meu carro favorito, até porque eu tinha 10 anos no desfile de 1992, era o do sonho infantil, maravilhosamente concebido e resolvido, simplesmente espetacular. A Mocidade não esqueceu dos diferentes tipos de sonhos, até os eróticos e mesmo os pesadelos.

O samba-enredo era popularíssimo e estava na boca do povo, embora a bateria tenha tido um andamento um pouco mais acelerado do que em anos anteriores. E a empolgação da arquibancada não foi tão grande como no desfile do Estácio, tanto que apenas no início foram ouvidos os gritos de “campeã”.

Houve ainda falhas de evolução, como por exemplo na inexplicável demora da bateria em deixar o box, enquanto a ala seguinte já estava distante. De qualquer forma, a qualidade do desfile da Mocidade era indiscutível, e o tricampeonato se mostrava um sonho (desculpem mais esse trocadilho) palpável.

Durante a dispersão da Mocidade, o carro “Esperança” bateu num fio de alta tensão na Rua Frei Caneca, altura do número 401, o que matou uma pessoa, desligou o som da escola nos instantes finais da apresentação e ainda causou falta parcial de luz enquanto os últimos componentes ainda estavam saindo da Sapucaí.

Por mais duas vezes, a alegoria bateu nos fios, e isso afetou severamente a apresentação da penúltima escola, a União da Ilha. A Tricolor já entrou na Avenida com boa parte do sistema de iluminação apagado.

Ainda houve uma outra polêmica sobre a colocação de um dos carros da Mocidade na área em que a Ilha deveria estar fazendo a armação de seu desfile. Reza a lenda que um dos diretores da escola insulana teria ameaçado dar um tiro em Castor de Andrade…

Para conduzir o enredo “Sou mais minha Ilha”, o carnavalesco Luiz Fernando Reis criou um personagem chamado Insulano de Tal, que viajava por diversas ilhas do planeta, como a Grã-Bretanha, Madagascar, e chegava à melhor de todas, claro, a Ilha do Governador.

A Ilha acertou ao conferir leveza à maior parte das fantasias, o que facilitou a evolução dos componentes. Por outro lado, o luxuoso figurino da bateria reproduzia o luxuoso uniforme dos soldados da cavalaria britânica. Já as alegorias estavam um tanto irregulares, mas a Tricolor fez uma apresentação muito simpática, com um enredo bem dividido.

Com a escola já ocupando parte da pista, a iluminação foi sendo restabelecida. Mas quando a comissão de frente estava no meio da passarela, houve uma pane total. Em poucos minutos, todas as luzes ficaram acesas, mas houve nova queda total quando a bateria deixava o box, nos minutos finais do desfile. Como se não bastassem tantos percalços, o carro “Ônibus Londrino” teve um princípio de incêndio, rapidamente controlado.

Apesar dos problemas, a Ilha continuou evoluindo com garra ao som do saudoso cantor Aroldo Melodia e da sempre impecável bateria de Mestre Paulão. Mesmo com o calor do público, que apoiou bastante a escola durante a queda final de energia, a Tricolor não conseguiu um desfile que a credenciasse aos primeiros lugares.

Desfile Portela 1992 ÁguiaCom o perdão do trocadilho (prometo que é o último…), a entrada da última escola, a Portela, foi cheia de tensão. Com a iluminação do sambódromo ainda em pane, o presidente Carlinhos Maracanã bradava que a escola não entraria na pista até o problema ser resolvido, enquanto o mandatário da Liesa, Capitão Guimarães, exigia o início do desfile.

“A escola não entra na avenida sem luz, se for preciso vamos esperar até o sol nascer!”, ameaçava Carlinhos Maracanã, enquanto o público do Setor 1 gritava “Não entra! Não entra!”

Com meia hora de atraso e, só com a iluminação enfim funcionando a contento, a deslumbrante águia portelense bateu asas e adentrou a Sapucaí para conduzir o enredo “Todo Azul que o Azul Tem”. E o carnavalesco Silvio Cunha, assim como em 1991, fez um belo trabalho na concepção estética da Majestade do Samba.

A história de uma das cores da mais vitoriosa agremiação do Carnaval do Rio foi muito bem contada desde o surgimento do azul, na Pérsia, e, no fim, a escola fez uma auto-exaltação, lembrando nomes como Natal e Clara Nunes. Agradou muito a ala “Danúbio Azul”, na qual dançarinos misturavam passos de samba com valsa, conseguindo ótimo efeito.

A bateria de Mestre Timbó teve a meu ver a melhor atuação do Carnaval-92, com uma cadência perfeitamente adequada ao samba. Curiosamente, a Águia desfilou com duas madrinhas de bateria: Luiza Brunet, depois de anunciar que não desfilaria por causa de uma infecção estomacal, chegou de última hora à Sapucaí e dividiu o reinado com Solange Couto, que havia sido convocada para substitui-la.

O samba-enredo, apesar de não ser uma “pedrada” como em 1991, era de ótima qualidade e foi bem cantado pelos componentes, que evoluíram com fluidez. A Portela fez um dos melhores desfiles do ano, no nível de Mangueira e Imperatriz e ligeiramente abaixo de Estácio, Mocidade e Viradouro, esta última certamente sem chances de brigar pelos primeiros lugares por causa dos problemas já citados.

REPERCUSSÃO E APURAÇÃO

As manchetes dos jornais apontavam uma disputa acirrada pelo título entre Estácio e Mocidade. A Vermelho e Branco faturou o Estandarte de Ouro de “O Globo” de Melhor Escola, enquanto a Mocidade ganhou a eleição do Ibope e a Apuração Paralela feita pela TV Manchete.

Na apuração real, a disputa direta pelo campeonato, de fato, ficou entre Estácio e Mocidade, embora na abertura dos primeiros envelopes, Salgueiro e Mangueira ainda estivessem brigando. Apenas na leitura do quesito Alegorias e Adereços (sétimo de dez quesitos), madrinha e afilhada caíram fora da briga, e as favoritas dispararam.

Desta vez, a emoção superou a técnica, e a Vermelho e Branco conquistou seu primeiro, e até agora, único título no Grupo Especial, para alegria e alívio de Dominguinhos, que estava muito tenso durante a contagem das notas e disparou a berrar (nesse caso, não dá para dizer cantar…) o samba quando o título foi sacramentado.

“Tinha certeza de que não morreria sem ver a vitória da minha escola!” comemorou o lendário mestre-sala Bicho Novo, que tinha 82 anos e só viria a falecer em 1995.

A Mocidade terminou na segunda posição, a 1,5 ponto da Estácio, seguida por Imperatriz, Salgueiro, Portela, Mangueira e Beija-Flor, que obteve seu pior resultado desde 1976 após ter perdido dois pontos pela “genitália desnuda” de dois componentes. Presidente da escola, Anísio Abraão David disparou, em entrevista publicada em “O Globo”:

“Não esperava ver a Beija-Flor ganhar, porque não merecia. Mas 7 em alegoria? Outras escolas também com nota baixa e a Mocidade com 10? Só com muita grana…”

A Viradouro, com os 13 pontos perdidos em cronometragem, mais as despontuações decorrentes do incêndio em Evolução, Harmonia e Alegorias e Adereços, ainda assim terminou em nono lugar, sem riscos de descenso. Caso não tivesse perdido os pontos em cronometragem, a escola teria terminado em terceiro. Imaginem vocês se o incidente não tivesse ocorrido… Talvez tivéssemos uma outra campeã. Mas não era para ser, e a Estácio mereceu o título.

Na parte de baixo da tabela, caíram a Leão de Nova Iguaçu (num dramático desempate com a Vila Isabel  no quesito bateria), além de Tradição e Santa Cruz.

RESULTADO OFICIAL

POS. ESCOLA PONTOS
Estácio de Sá 298,5
Mocidade Independente de Padre Miguel 297
Imperatriz Leopoldinense 294,5
Acadêmicos do Salgueiro 294
Portela 292,5
Estação Primeira de Mangueira 292
Beija-Flor de Nilópolis 288,5
Unidos da Tijuca 284,5
Unidos do Viradouro 281,5
10º União da Ilha do Governador 280
11º Caprichosos de Pilares 279
12º Unidos de Vila Isabel 270,5
13º Leão de Nova Iguaçu 270,5 (rebaixada)
14º Tradição 264 (rebaixada)
15º Acadêmicos de Santa Cruz 236,5 (rebaixada)

Subiram para o Grupo Especial a Acadêmicos do Grande Rio e a Unidos da Ponte, num dos desfiles do Acesso (e safra de sambas) de melhor nível, com uma acirradíssima disputa nas primeiras colocações, após 17 horas de ação na Sapucaí.

A Grande Rio apresentou um dos melhores sambas de sua história, para o enredo “Águas Claras para um Rei Negro”, sobre as religiões e mitos afro-brasileiros. Com alegorias grandiosas, a escola foi praticamente perfeita em todos os quesitos.

Já a Ponte, com outro bom samba, apresentou o enredo “A cor do pecado”, falando sobre inveja. Embora não tão luxuosa como a Grande Rio, a escola de São Mateus fez uma grande apresentação nos quesitos de pista.

Grande Rio e Ponte ficaram empatadas na apuração até o quesito Alegorias e Adereços, no qual a Tricolor abriu um ponto de frente. A diferença ficou a mesma nos quesitos seguintes, mas o último julgador de Mestre-Sala e Porta-Bandeira deu 9 para a escola de São João de Meriti e 10 para a de Caxias, sacramentando o primeiro e até hoje único título da Tricolor em todas as divisões.

Mesmo sem subir com o terceiro lugar, o Império Serrano foi para a avenida com um fortíssimo samba de protesto contra o rebaixamento de 1991 e falando sobre a sua história – o último composto pelo lendário Beto Sem Braço antes de sua morte (o Migão escreveu sobre esse desfile).  O trecho “Sou Império, sou patente/Só demente é que não vê/Do samba sou expoente/Abra meu livro, pois tu sabes ler …” é emblemático, embora alguns tenham achado exagerado.

O Arranco do Engenho de Dentro acabou em quarto, e o samba foi dos então jovens André Diniz e Evandro Bocão, que se consagrariam anos depois na Vila Isabel. A Rocinha, outra com um grande samba e enredo idealizado por Joãosinho Trinta, ficou em quinto (o Migão também já fez uma coluna sobre o desfile).

Caíram Independentes de Cordovil e Unidos de Campinho, e, a partir de 1993, o desfile do Grupo 1 passaria a ser dividido em dois dias, a exemplo do que já vinha ocorrendo no Especial.

Com o enredo “Carnaval, ontem, hoje e amanha”, a Arrastão de Cascadura venceu o Grupo 2, que desfilou na terça feira de carnaval no Sambódromo. Acadêmicos do Cubango e Mocidade Unida de Jacarepaguá também conquistaram o acesso ao Grupo 2, que teria 16 escolas.

carnaval_sennaO Desfile das Campeãs foi marcado por uma presença para lá de ilustre: o tricampeão mundial de Fórmula 1 Ayrton Senna esteve no camarote da Brahma e, depois, eufórico, desceu para a pista na apresentação da Estácio.

Maior ídolo do esporte brasileiro na época e um dos atletas mais populares do mundo, Senna sambou de forma um tanto desajeitada com passistas e usou um chapéu de um dos integrantes da bateria, fazendo a festa dos fotógrafos.

Minha falecida tia Silvia estava no camarote da Brahma nesse dia e, segundo ela viu, o tricampeão autografou as camisas de várias mulheres na altura do busto usando o corpo das mesmas como apoio.

Na época eu tinha apenas dez anos e isso não me interessava muito, pois eu na verdade queria um autógrafo de um dos meus ídolos e, na confusão, minha tia não se tocou. Obviamente levou um sonoro esporro, coitada… Até porque Ayrton viria a falecer dois anos depois, sem voltar a pisar no sambódromo.

“Rival” de Senna, o também tricampeão Nelson Piquet esteve no desfile oficial e, relaxado, deu entrevistas no primeiro dia de desfile. Às vésperas da sua primeira participação nas 500 Milhas de Indianápolis, Piquet revelou que torcia pelo Salgueiro, para deleite do grande salgueirense Haroldo Costa na transmissão da TV Manchete.

CURIOSIDADES

– Foi a última vez que o grande intérprete Sobrinho foi o cantor principal de uma escola do Grupo Especial, pela Santa Cruz. Em 1993 e 1994, ele foi apoio de Jamelão na Mangueira. Infelizmente Sobrinho ficou praticamente cego devido ao diabetes e atravessou dificuldades financeiras até seu falecimento.

– Como havia ainda a incerteza quanto à participação da Santa Cruz no Grupo Especial, a faixa com o samba-enredo da escola foi gravada no disco do Acesso. Diga-se de passagem, foi a última vez que o famoso grito de guerra de Sobrinho “vai meu rrrrrrrrrrritmo!” foi ouvido numa gravação.

– O Carnaval de 1992 foi o último de Joãosinho Trinta como carnavalesco da Beija-Flor, e ainda por cima com o pior resultado: sétimo lugar. João garantiu que continuaria na Beija-Flor, mesmo sem ser carnavalesco, mas que gostaria de tocar um projeto social com crianças. No entanto, houve divergências entre João 30 e a direção da escola em relação ao projeto. Em 1993, Joãosinho não assinaria nenhum desfile no Grupo Especial.

– Joãosinho Trinta e os atores Torez Bandeira e Ana Darce, que ficaram nus durante o desfile da Beija-Flor, foram ameaçados de processo por ato obsceno em público. João 30 tentou apaziguar os ânimos, mas Torez criticou: “O desfile é cheio de mulheres nuas. Por que logo eu vou ter que pagar? Outra coisa é que sempre que acontece alguma coisa, alguma autoridade vem para aparecer”.

– Um dos repórteres da Globo na concentração era o saudoso Marcelo Rezende, falecido em 2017. Mas, não. Naquela época ele não dizia “corta pra mim”, “corta pra 18” ou “lente nervosa”… Em grande fase na carreira, Fernando Vannucci passou a narrar os desfiles de todas as escolas. No time de comentaristas, a novidade era Maria Augusta.

– Na Manchete, a transmissão voltou ao seu estilo mais tradicional, com Paulo Stein narrando todas as escolas. A maior parte da clássica equipe de comentaristas foi refeita, com as participações de Haroldo Costa, José Carlos Rêgo, Roberto Barreira e Mestre Marçal. Ainda faltava Fernando Pamplona, que voltaria ao time só em 1994. A jornalista Therezinha Monte, que era presidente da Unidos do Cabuçu na época, esteve pela única vez nas transmissões. Já o Botequim da Manchete teve o comando de Osvaldo Sargentelli e Adelzon Alves.

– Um mal-entendido envolveu Mestre Marçal e Andrezinho, que atuou como diretor de bateria da Leão de Nova Iguaçu. Chegou até Marçal que o filho de Mestre André lhe teria chamado de “esclerosado”, e, durante a passagem da Leão de Nova Iguaçu, o antigo diretor da bateria da Portela não perdoou: “Esse garoto vai morrer, vai nascer de novo, e nunca vai chegar a ser um Marçal”. Horas mais tarde, Andrezinho, que estava pronto para desfilar convidado pela bateria da Caprichosos de Pilares, garantiu em entrevista à TV Manchete que jamais fez qualquer crítica a Marçal, a quem chamou de padrinho e mestre. Marçal agradeceu pelo esclarecimento, e ficou tudo certo.

– Foi a primeira e única apresentação da Leão de Nova Iguaçu na elite do Carnaval carioca, e, diga-se de passagem, com um rebaixamento bastante contestado.

– Neguinho da Beija-Flor conquistou a última vitória dele como compositor de samba-enredo na agremiação de Nilópolis – em 2011. seu filho JR venceria a disputa para o samba em homenagem a Roberto Carlos.

– Xuxa foi enredo da Unidos do Cabuçu no Grupo 1 e quase chegou atrasada ao desfile. A escola terminou apenas na oitava colocação.

CANTINHO DO EDITOR – por Pedro Migão

Sobre o incêndio da Viradouro, reproduzo história que contei na coluna Samba de Terça” que abordou este desfile:

“Poucos dias antes do desfile, um dos carnavalescos, Max Lopes, mostrou o barracão a um grupo de ciganos que fora convidado especialmente para este fim. Ao final da visita, um dos líderes do grupo virou para Max Lopes e disse que “estava faltando uma fogueira, que toda festa cigana tem fogueira e que deveria haver alguma representação desta em um dos carros”. 

O carnavalesco disse que não iria alterar o projeto e depois da partida do grupo teria feito o seguinte comentário: “eu já estou homenageando os caras, ainda querem se meter no meu trabalho?”

Deu no que deu… Em 2013 a Viradouro homenageou o Salgueiro em seu enredo mas o último setor, curiosamente, era dedicado a este desfile de 92. Outro trabalho assinado por Max Lopes.

Após o desfile da Mangueira, Tom Jobim deu uma declaração que foi mal interpretada e que gerou uma crise entre ele e a Mangueira. Ele havia sentido muito medo em cima do carro e declarou que se a escola voltasse, ele não gostaria de voltar. A declaração foi interpretada como um desejo de que a Mangueira não voltasse ao Desfile das Campeãs, o que criou um imenso problema. E a escola acabou não voltando mesmo…

Na apuração, a Portela vinha sossegada em terceiro até o último quesito, Mestre Sala e Porta Bandeira, quando tomou notas muito baixas e acabou em quinto.

A safra do Grupo de Acesso talvez seja a melhor de todos os tempos do grupo, com vários sambas que se tornaram clássicos. Além dos já citados Império Serrano, Rocinha e Arranco, tínhamos Grande Rio, Ponte, Lucas, Jacarezinho, São Clemente e a extinta Unidos de Campinho com grandes sambas.

Aliás, este 2013 a Rocinha “esquentou” com este samba de 1992 e vi muito “entendido” de samba-enredo nas frisas me perguntando que samba era este…

A Unidos de Campinho desceu de forma tão meteórica como havia subido após as prisões de seus financiadores, se é que entendem este editor.

A escultura do Preto Velho trazida pelo Salgueiro iniciaria uma longa jornada pelos desfiles cariocas, tendo passado por várias escolas e em vários anos – a ponto de admiradores do carnaval chegarem a dizer que a escultura sabia vir sozinha para a Sapucaí… Anos depois a Tradição fez uma réplica, menor, que hoje se encontra no carnaval de Cabo Frio.

O então presidente da Estácio de Sá Acyr Pereira Alves – que seria assassinado em 2002 – colocou pessoas nos setores das arquibancadas com o objetivo de inflamar a torcida. Funcionou.

Muitos componentes da Mocidade cantavam da seguinte forma o samba enredo: “Eu vejo a lua no céu / A Mocidade ser tri / De verde e branco na Sapucaí”

O Grupo C, quarta divisão, desfilou domingo de carnaval na Rio Branco, tendo a Vizinha Faladeira como campeã. Unidos de Villa Rica e Difícil é o Nome também foram promovidas ao Grupo B e à Marquês de Sapucaí para 1993 – a escola de Copacabana, aliás, iniciaria outra ascensão meteórica que a levaria ao Especial em 1995.

O Grupo de Avaliação desfilou na segunda feira de carnaval, também na Rio Branco, e foi vencido pela Acadêmicos de Vigário Geral, com a vice Mocidade de Vasconcelos também sendo promovida.

Abaixo, a capa do Jornal do Brasil da Quarta Feira de Cinzas daquele ano:

Carnaval 92

Links

O desfile campeão do Estácio de Sá em 1992

A ótima exibição da vice-campeã Mocidade

O lindo, porém, desastroso desfile da Viradouro

A homenagem da Mangueira a Tom Jobim

Fotos: O Globo, Extra e reprodução de internet

11 Replies to “1992: Desvairada Estácio agita o povão e acorda Mocidade no meio do sonho…”

  1. Fred, o título deste texto é sensacional, merece um prêmio!

    Dominguinhos estava num estado de nervos tão profundo que achava que a menor nota era descartada, tanto que antes das notas do módulo 2 ele dizia “falta 1 dez” mas na verdade faltavam dois e um improvável 8,5 daria o tri a Padre Miguel

    Aliás, a torcida da Estácio estava no meio das mesas ao invés de estar nas arquibancadas.

    A então rainha de bateria do Leão, Luciana Sargentelli, atualmente está fora dos holofotes, além de ser casada com o radialista Jimy Raw

    Max Lopes aprendeu a lição, não se deve mexer com os ciganos…

    Tem gente que preferia o rebaixamento da Vila ao invés do Leão de Nova Iguaçu

    O samba da Grande Rio de 92 é sensacional! Tinha uma mensagem parecida com o samba da Viradouro do próximo carnaval. Aliás, era a estreia de David do Pandeiro no carnaval.

    A Unidos da Ponte não foi muito feliz quando reeditou “Da Cor do Pecado” anos depois…

    1. Carlos Alberto,

      Sobre “mexer” com ciganos, eu achava que mexer com o caipiroto é que dava azar.

      O samba da Leão é um samba que entra no meu TOP 30.

  2. Olá,

    Quais foram as escolas que a escultura do Preto Velho passou nos anos seguintes? Parabéns ao site por esse material (guardarei todos numa pasta). Bons tempos (apesar de jovem) que escolas sem tanta mídia tinham vez e voz no Grupo Especial. O time da Estácio de Sá era muito bom e merece o reconhecimento com louvor.

  3. Fazendo uma analogia com o futebol e com a maneira como o esporte caminhou para um abismo financeiro entre os clubes, esse título da Estácio está para o Carnaval de hoje como o do Bahia no Brasileiro de 1988. Ou mudam os formatos ou nunca mais veremos algo igual. Uma escola enorme na história mas média em termos financeiros batendo as gigantes. Bem como um clube do Norte-Nordeste quebrando a hegemonia do eixo Sul-Sudeste. A Copa do Brasil não entra em tal comparação porque, obviamente, tem outro formato, que permite mais surpresas. Seria lindo se o desfile das escolas de samba voltasse a equilibrar o peso de quesitos de emoção e essência do samba aos plásticos. Hoje, bastam duas ou três fotos de um barracão onde não se veja uma escultura de 30 metros ou uma porção de materiais caros em cima das alegorias para muita gente do próprio mundo do samba vaticinar o descenso de uma agremiação. E o samba? A bateria? A harmonia? A evolução? Tem gente que acaba ajudando a fundamentar a impressão equivocada de que alegoria é só o que conta para ganhar o desfile. Mas, infelizmente, parece que tem mais peso mesmo. Valeu, Estácio. Uma linda vitória do samba esta de 1992.

  4. Não tinha idade para lembrar o desfile desta época, mas vendo vídeo consigo entender como a Estácio ganhou aquele Carnaval.

    Desfile visceral, onde a emoção permeia todo o espetáculo. Samba bem cantado pelo Dominguinhos e pela comunidade. A bateria bem afinada com os tamborins e o surdo de primeira, que conseguiram captar muito bem no áudio.

    Imagine uma escola carioca, por conta de todo o bairrismo imbecil que alguns tem, falar de São Paulo.

    Sou Mocidade e aquele ano ela estava mágica, mas faltou um décimo…

      1. Literalmente sim…rsrsrs. Me expressei mal, pois o “décimo” que me referi foi no quesito “algo a mais”, “um pouquinho”, “um fio de cabelo” para ter o que a Estácio teve para se sagrar campeão.

        Mas bom apontamento Carlos.

        Abraços!!!

  5. Tinha escrito algo sobre esse desfile aqui, mas acho que teve algum problema na hora de enviar, pois não vejo meu comentário (ê google chrome…) Em todo o caso, vou resumir:

    Lindo desfile da Mangueira, nele que me descobri verdadeiramente mangueirense, belo trabalho do Ilvamar Magalhães, o 6º lugar foi injusto, acho que o horário de desfile influenciou nas notas.

    Estácio maravilhosa, com muita emoção, mereceu o título, e contra a Mocidade, que realmente era a escola a ser batida, tinha a melhor estrutura, ótimo barracão, carnavalesco, intérprete, Toco fazendo sambas lindos, porém aparentou ter exagerado mesmo no “já ganhou”…

    Conforme disse o autor do texto, não fosse a tragédia no desfile da Viradouro, e poderíamos ter outra campeã. Infelizmente nunca saberemos…

    E uma curiosidade: A Beija-Flor, falando do universo da tv, ficou com o 7º lugar esse ano, fora das campeãs depois de muitos anos, o que só viria a acontecer novamente em 2014, com um novo 7º lugar num desfile homenageando Boni, um grande nome da… televisão!

  6. A Mocidade mereceu perder em 1992. A soberba resultou em público não tão empolgado, um acidente com carro alegórico, uma morte e problemas com a União da Ilha.

    Humildade faz bem.

    Engraçado é ver o Anísio reclamando da grana. Ué, e o que a Beija-Flor faz nos dias de hoje? Só se garante com a grana. Ou tem outra explicação para a troca dos quatro julgadores de samba-enredo de 2014 para 2015??

  7. Comecei a torcer pela Mocidade em 90 e a perda desse título foi muito frustrante e marcante porque fiquei maravilhado com o desfile contando sobre os sonhos. Eu era pequeno e conseguia entender tudo o que a escola contava na avenida….

    Mas uma pena mesmo foi o que aconteceu com a Viradouro porque seu desfile estava impecável e esse refrão mágico embalava o desfile: O sol brilhará, oi/Surge a estrela-guia/E sob a proteção da lua/Canta Viradouro que a sorte é sua

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