Nesta segunda feira, a coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro, mostra o quadro atual do jornalismo de massa brasileiro, suas interações com a política e a necessidade de uma regulamentação.
Discordo de alguns pontos do texto, mas é um artigo que merece atenção até por reforçar a necessidade de uma regulamentação sobre o setor.
A Imprensa Brasileira em Clima de Fla x Flu
Essa semana me contaram que em Belo Horizonte inventaram um jeito novo de transmitir os jogos de futebol nas rádios. Quando é jogo do Cruzeiro, a transmissão fica a cargo de radialistas cruzeirenses; jogo do Galo, entra uma equipe de atleticanos. Esqueci de perguntar como fazem em clássicos, talvez misturem os profissionais e cada um puxa a sardinha para a sua brasa.
Não sei se a história é verdadeira: algum leitor mineiro pode depois confirmar para a gente. Mas não duvido que em breve a coisa chegue aqui no Rio Grande do Sul: tem uns loucos que ficam cronometrando a programação esportiva e quando descobrem que um time teve dois ou três minutos a mais do que outro, protestam nas redes sociais que a imprensa “se vendeu” ao adversário.
O curioso é que no futebol, onde seria totalmente justificável que o sujeito tivesse lá suas paixões e as deixasse aflorar, a imprensa ainda se esforça para manter neutralidade quase absoluta, para não ferir a sensibilidade dos leitores, ouvintes e telespectadores que torcem para um time diferente.
Já no noticiário de política estamos, todos, como os ouvintes de Belo Horizonte: só podemos consumir matérias que coincidam com nossa visão de mundo.
Se você não pode nem ouvir falar no PT, o Globo, a Folha, o Estadão e principalmente a VEJA são o Santo Graal da liberdade de expressão. Estão aqui para impedir que os barbudinhos implantem o Stalinismo e transformem a música de Mercedes Sosa, “Volver a Los 17”, no novo hino da República Socialista do Brasil. Afinal, estamos na iminência de uma revolução comunista e não fosse pelo heroísmo e resistência deles, José Dirceu já estaria alçado ao posto de Secretário Geral do Partido Único dos Trabalhadores e seria uma versão tropical de Kim Jong II.
Mas se do lado esquerdo do seu peito bate um coração vermelho, então nem toque nessa imprensa vendida e manipulada por um baronato elitista. Esta está interessada apenas em dar um golpe contra a democracia, para impedir os avanços que a sociedade brasileira experimenta desde 2003 e que retiraram milhões de desvalidos da pobreza, revoltando os ricos que nunca se conformaram de ver um metalúrgico comandar essa revolução social. Leia a Carta Capital, assista a Record, acesse os blogs independentes. É a única forma de furar o bloqueio maldito da grande imprensa e assim consumir informação verdadeira, porque as quatro famílias que controlam a mídia nativa sofrem de indignação seletiva e só divulgam aquilo que lhes convém.
Os dois lados sempre se atacando: um chama o outro de PIG (Partido da Imprensa Golpista), o outro revida inventando o PEG (Partido da Esgotosfera Governista). Não é a Raça Rubro-Negra falando da Young Flu. São jornalistas com anos de experiência e um nome a zelar, jogando lama uns nos outros, assegurando ao seu público que a exclusividade da ética e da moral lhes pertence e que o outro lado sim, foi corrompido por interesses econômicos.
Eu pensei que com o fim da campanha eleitoral de 2010 o ápice dessa baixaria tivesse ficado para trás, mas estava enganado. Nada se compara em termos de desinformação e proselitismo do que o noticiário sobre a CPI do Carlinhos Cachoeira.
A própria existência da CPI já é uma aberração. Um senador que posava de vestal foi pego com a boca na botija e derreteu seu capital político, virando um zumbi no Congresso Nacional. Carlinhos Cachoeira, o bandidão do momento, estava na cadeia. A Polícia Federal tinha três anos de investigação, com provas evidentes de crimes profundos. CPI para que? CPI serve para investigar, descobrir aquilo que não se sabe. O que falta mais para descobrir nesse caso que já não fosse de conhecimento da PF?
A CPI só serviria para constranger publicamente adversários políticos. Sua instalação foi um tremendo erro de avaliação, pois afora o Tiririca (o deputado mais atuante dessa legislatura, com 100% de presença em todas as sessões desde 2011 e que até se mudou para Brasília com a família para nunca chegar atrasado), o Jean Wyllys e mais uns gatos pingados, todo mundo tem alguma coisa para esconder naquelas casas de tolerância com o desvio alheio.
Não tardou para a CPI desvendar o labirinto que enredava Cachoeira com a construtora Delta, atual campeã de obras públicas no governo federal e em governos estaduais aliados a este, como no Rio de Janeiro, onde o governador e o dono da Delta dançavam animados em Paris e Monte Carlo [N.do.E.: a Delta também tem contratos polpudos com o governo paulista, de oposição]. Mas também não tardou para vir à tona a umbilical relação de Cachoeira com o chefe da sucursal da Veja em Brasília, que se valeu do criminoso para produzir reportagens achincalhando o PT.
É aí que entra o ponto que me incomoda profundamente: por acaso alguém precisava dessa investigação para descobrir que a Veja há muito deixou de ser uma revista informativa para ser um manifesto semanal dos odiadores do Governo? Algum leitor da Veja é ingênuo o suficiente para deixar de perceber o alinhamento da revista ao ajuntamento demo-tucano? Óbvio que não!
O que se quer é ir um pouco além: aproveitar a CPI para vingar-se do notório posicionamento político da revista, antiético quase sempre, flertando com o ilícito em alguns casos, mas dentro do sacrossanto direito de dizer a bobagem e a mentira que bem entender, desde que haja gente disposta a consumir esse lixo travestido de informação.
Mas, afinal, qual a extensão do envolvimento do agora famoso jornalista Policarpo com Cachoeira? Segundo a turma que não gosta da Veja, há “mais de 200” ligações entre os dois. Já para a Veja, há meras 2 ligações diretas e 46 menções ao nome de Policarpo em outras conversas captadas pela Polícia Federal.
Por que nós, leitores, estamos há duas semanas sem que alguém divulgue publicamente o áudio de, sei lá, pelo menos umas dez ligações, com algum tema comprometedor? Ou que Policarpo diga, claramente, qual a razão de ter feito essas duas ligações que admite e por que seu nome aparece outras tantas em conversas? Não sei dizer. Mas suspeito que deixar tudo meio nebuloso convém a ambos os lados, que podem continuar a se acusar mutuamente, pouco se importando em se aproximar da verdade factual.
Em meio a esse quadro desolador, a liga anti-Veja reacende um debate que me é muito caro: a regulamentação da atividade de imprensa.
Eu coordenava o Departamento Jurídico do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro quando o então Presidente Lula apresentou o projeto de criação do Conselho Federal de Jornalismo. Jamais vi um tema ser tão grosseiramente manipulado pela imprensa, que se revoltou como nunca antes na história desse país. Eu escrevi vários artigos chamando atenção para o total descasamento entre as críticas feitas ao projeto e o que ele representava na prática, pois o que se pretendia era regular tão somente o EXERCÍCIO da profissão de jornalista, nunca a atividade de comunicação. Era uma espécie de OAB ou CREA do jornalismo, para impedir a prática da atividade por quem não fosse formado em comunicação social.
Perdemos o debate e passados quase 10 anos, ainda há quem acredite que Lula mandou uma proposta destinada ao controle da imprensa. Uma lástima, porque nada é mais necessário no Brasil do que aumentar a regulação dessa atividade.
Regulação para impedir propriedades cruzadas, monopólio excessivo, exclusividade de informação. Para impedir que uma TV compre a exclusividade de um evento e dificulte a sua exibição. Para impedir que distribuidores de sinal de TV paga se recusem a admitir a entrada de novos produtores de conteúdo que concorram com seus controladores – como recentemente vimos no caso da Fox Sports.
Para resgatar a necessidade de que a profissão de jornalista seja exclusiva de quem possui formação específica. Para que não haja práticas que limitem a concorrência mediante a concessão de polpudos descontos para anunciantes que se comprometam a não anunciar em veículos concorrentes.
Para isso tudo precisamos de regulação.
Mas quando eu ouço vozes a defender regulação para criar um órgão que possa interferir de algum modo quando uma revista pilantra se alia a um bicheiro para inventar matérias, eu tremo nas bases. Parece que há mesmo o desejo de calar opiniões divergentes. Afinal, se há crime envolvido, o caso é de polícia, não de um órgão regulador.
Deixem a Veja falar as bobagens dela em paz. Há quem acredite em bruxas. Há quem goste de Paulo Coelho. Há quem se emocione com o Sertanejo Universitário. Há quem goste de ser enganado pela Veja. Fazer o que, né? Vive la Différence!

2 Replies to “Bissexta – "A Imprensa Brasileira em Clima de Fla x Flu"”

  1. Concordo com quase tudo. O problema maior é que a OAB é comandada e dirigida por advogados. O CREA, o mesmo por engenheiros.

    O projeto do governo de regulação colocava o governo no meio da agência. Assim a coisa muda completamente de figura. Um projeto como esse deve ser bastante discutido (sem nenhuma pressa) para se evitar atropelamentos.

    Ao mesmo tempo que a imprensa bateu impiedosamente no projeto, a intenção do governo era aprova-lo como um rolo compressor em convescotes que só tinham represantes pelegos.

    Aí também não dá. Continuam as acusações de lado a lado sem qualquer clarificação do que se propõe, as quais a coluna mostra que parece interessar a ambos os lados.

    Assim perdemos todos.

  2. Parei no “Assiste a Record”…

    Que isto…pq não a TV Bilionária do Lula, a TV Brasil?…

    Muito chapa-branca este texto…

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