A foto ao lado, que vi no Facebook e reproduzi, é de uma partida pelo Campeonato Brasileiro de 1984. Flamengo 2, Santos 2.

Eram outros tempos. Tempos onde as equipes jogavam três, quatro vezes na semana. Aquele Flamengo e Santos era o terceiro envolvendo as duas equipes no espaço de uma semana, dois pelo Campeonato Brasileiro – então chamado de Copa Brasil – e um pela Taça Libertadores da América.

Hoje, sob este aspecto estamos melhores. Não há mais casos de duas partidas em 48 horas, como era normal naqueles tempos. O calendário atual ainda pode melhorar bastante, mas o progresso é claro.

Também não havia internet, telefone celular, tv a cabo. As fontes de informação eram as rádios, a televisão aberta e os jornais. Todos mais ou menos controlados pelos mesmos grupos, o que tornava o poder destes muito maior.

Hoje, ainda são muito significativos, mas o advento da “notícia em tempo real” trazido pela internet e pelas redes sociais abriu flancos neste oligopólio de poder da mídia, ainda concentrada praticamente nos mesmos grupos e mesmas famílias – no caso, os herdeiros.

Faço este preâmbulo, este “nariz de cera” como gostam de dizer os jornalistas de fato, para escrever que certas coisas não mudam. E, 33 anos depois, o pedido por Diretas Já e por democracia está de volta.

Parêntese: o período marca exatamente o intervalo entre os dois últimos títulos da Portela. Não é nada, não é nada, é uma coincidência. Fecha o parêntese.

Esta partida foi no domingo anterior à votação da “Emenda Dante de Oliveira”, que restabelecia as eleições diretas no Brasil. Como a História registra, a emenda foi derrotada e o primeiro governante civil em 21 anos foi eleito por via indireta em janeiro de 1985.

A política brasileira, o Estado brasileiro, rodou, rodou e 33 anos depois se encontra no mesmo momento: clamando por eleições diretas. As “Diretas Já”. Contudo, quando o governo de Michel Temer, não eleito, finalmente cair, seu sucessor deverá ser eleito pelo Congresso Nacional.

Uma diferença importante é que naquele momento se vivia o estertor de um regime militar advindo de um golpe de estado. Neste momento, o golpe de estado ainda está fresco na memória.

E os fatos, as delações, deixam a cada dia mais claro que esta ruptura institucional não teve nada a ver com a “corrupção”. Mais que isso, foi para implantar um programa econômico rejeitado pelas urnas, mas que interessa sobremaneira ao chamado “grande capital”. Aí incluídos grupos da grande mídia.

Em 1984 o Brasil economicamente vivia uma grave crise econômica, advinda de diversos fatores como a crise do petróleo, a falta de divisas externas e da extrema concentração de renda na década de 70. Tempos do “primeiro o bolo cresce, depois a gente divide”. Se der – nunca deu…

Neste momento também vivemos grave crise, com potencial para se aprofundar ainda mais. Economia estagnada, Estado impedido de investir pela “PEC dos Gastos Públicos” e uma sociedade que sofre com a política de concentração de renda implantada pelo governo atual. Além da desarticulação de setores importantes da economia nacional, dentro da filosofia que “é melhor comprar de fora”.

Voltarei ao tema mais à frente, embora meu prognóstico é de que o atual presidente, mesmo com as fartas evidências de crimes de responsabilidade, só deverá finalmente ser ejetado do cargo após aprovar as reformas previdenciária e trabalhista.

O mote deste texto é de que o Brasil precisa, urgentemente, de um novo arranjo político a fim de substituir o trazido pela chamada “Nova República” e que claramente se esgotou neste processo todo.

Escrevi anteriormente algumas vezes sobre o assunto antes de todas estas crises políticas, mas os últimos meses deixam claro que precisa haver algum tipo de “salvação” da política. Substituir o sistema político por juízes sem voto ou pelos ditames do poder econômico é uma alternativa claramente pior, ainda que levemos em conta todos os problemas do nosso sistema político atual – claramente esgotado.

Isso passa por algumas vertentes, a meu ver.

A primeira é uma reforma política digna deste nome. Diminuição do número de partidos com cláusulas estritas de barreira, regras claras de financiamento das campanhas – com dinheiro público e proibição de financiamento privado, voto distrital misto.

Eu era contra este último, mas não brigo com fatos: na prática, grande parte dos deputados é eleita em um sistema distrital. Fazendo-se de forma mista, os chamados “deputados de opinião”, com votação pulverizada, não ficam alijados do processo.

Com menos partidos a estabilidade do Congresso se torna maior e isso diminui o chamado “toma lá, dá cá” fisiologista que vemos hoje.

Dentro deste processo, até aceitaria uma anistia ao chamado “Caixa 2” passado, desde que com regras rígidas a partir de agora e algum tipo de punição financeira. Algo que venho notando é que, propositadamente ou não, vem se confundindo os crimes de “Caixa 2” e “propina pessoal” no mesmo balaio, que são coisas claramente diferentes.

Como medidas acessórias, vejo necessárias uma simplificação da Lei 8.666 (que rege as licitações), e algum marco regulatório do mercado de mídia a fim de diminuir a concentração – escrevi sobre isso aqui tempos atrás.

Também ajudaria o entendimento entre os líderes das diferentes correntes políticas brasileiras, a fim de manter um ordenamento jurídico básico e diminuir o clima de ódio na sociedade que se vê hoje.

Um outro ponto importante é que este novo sistema precisa ser referendado por eleições diretas livres, sem impeditivo de corrente política “A” ou “B”. E eleições diretas imediatas, em todos os níveis.

Diretas Já!

Algo até mais amplo que 1984, onde a emenda visava apenas as eleições para presidente. Isso em parte se explica pelo fato de, em 1982, o Brasil ter tido eleições mais ou menos livres para os outros cargos representativos – e sem um golpe de Estado no interregno.

Penso que o Brasil pode até caminhar para uma nova ditadura aberta nos tempos vindouros. Talvez tenhamos um sucessor eleito indiretamente e, posteriormente, eleições não totalmente livres em 2018 – se é que haverá.

Contudo, me parece claro que, mais cedo ou mais tarde, algum rearranjo terá de ser feito para que haja a “refundação” da política e a volta aos tempos de normalidade democrática.

Criminalizar a política e substituir por um sistema de poder exercido por togados ou por prepostos do poder econômico, além de não atender à maioria da população, gera uma instabilidade a médio prazo ainda maior. A Polícia pode reprimir por um tempo, mas não reprime o tempo todo.

Ainda mais em tempos de extensa perda de direitos e de poder de compra por parte da população.

Finalizo este artigo com uma nota histórica: o governador do estado do Rio de Janeiro era Leonel Brizola, apoiador de primeira hora das “Diretas Já” naquela ocasião. Não surpreende, então, que o Maracanã – então estatal – tenha sido veículo da mensagem à população.

Outros tempos, no caso…

Imagens: Reprodução

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2 Replies to “Diretas Já – Por Um Novo Sistema Político”

  1. Migão,

    Você quer o voto distrital misto “travado” ou o alemão?

    No 1° o número de deputados é fixo, dividindo igualmente as vagas em lista e distritais, que são disputas totalmente separadas.

    Porém no sistema alemão, o número de deputados é variável. em casos extremos poderá variar entre o exato número de distritos e o dobro desse número.

    Lá se vota no deputado distrital x e no partido y, em votos separados. A quantidade de cadeiras de cada partido é decidido apenas pelo voto no partido.

    Mas, para ocupar as vagas do partido, aqueles deputados vencedores em seus distritos tem preferência. Só se o partido tiver mais vagas que deputados distritais é que o resto das vagas é preenchido com a lista do partido. Essas cadeiras são “extras”.

    Da mesma forma, todos os deputados vencedores em seus distritos tem suas cadeiras garantidas, mesmo que o partido a que pertençam tenha mais distritos vitoriosos do que vagas pelo voto no partido.

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