Aproveitando o excelente post da manhã do Rodrigo Salomão, gostaria de escrever algumas linhas ainda sobre o caso dos “ativistas” abordados na coluna. Saliento aos leitores que este texto não tem a intenção de ser uma coluna, mas apenas um comentário um pouco grande à coluna anterior.

Mais uma vez, concordo com a opinião do Rodrigo. Porém, o que mais lamento neste caso é sobre a postura da nossa OAB-RJ  (digo nossa, pois somos advogados) que continua fechando os olhos e apenas confronta a polícia do Rio mais uma vez bradando a plenos pulmões que a polícia está cerceando o direito de manifestação.

Lamento ainda mais porque, juntando os cacos, tenho a fortíssima impressão que isso está sendo feito por meros intuitos eleitoreiros. O “se” em história não existe, mas me pergunto se o PT ainda fizesse parte do governo do Rio a OAB estaria defendendo os “ativistas” a ferro e a fogo. Lembro que a posição de confrontação mais explícita da instituição com a polícia só começou com o caso “Amarildo” em julho de 2013, justamente quando já se começava a articular no PT estadual a saída estratégica do governo para o lançamento de candidatura própria (o que se concretizou tempos após).

Fica ainda mais difícil colocar o prestígio da instituição, logo de todos os advogados do Rio de Janeiro, representados pela OAB-RJ, em jogo quando pelo menos dois dos advogados dos acusados são conselheiros da atual diretoria da OAB-RJ, os excelentes Fernanda Tórtima e João Pedro Pádua (um dos meus melhores professores), sendo que Tórtima até pouco tempo dirigia a comissão de Defesa, Assistência e Prerrogativas da instituição. Não bastasse o ponto levantado no parágrafo anterior, fica parecendo que a máquina da instituição está sendo utilizada a serviço dos trabalhos particulares de seus membros.

Frise-se que nada há de errado em que membros da diretoria da OAB, logo advogados profissionais, tenham trabalhos particulares, afinal são exatamente esses os seus sustentos.

felipe santa cruzPara piorar a situação e deixar ainda mais margens a interpretações eleitoreiras da situação o ex-presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, é atual candidato a deputado federal justamente pelo PT. Ressalte-se que, além de Damous eleger seu sucessor, o atual presidente Felipe Santa Cruz (foto), boa parte dos conselheiros atuais também compuseram as chapas de Damous e Santa Cruz.

Peço que os mais afobados distingam minha crítica à confrontação pública da instituição OAB contra a polícia em prol dos “manifestantes” do direito fundamental que todos as pessoas tem de ter um advogado para fazer sua defesa e orientá-lo para o melhor possível.

Alias, tal margem de orientação inclui sugerir ao cliente a pedir asilo diplomático, por quê não? Cabe ao outro estado avaliar se concede ou não. Vou ainda mais longe, também cabe ao advogado orientar qual seria o melhor país para fazer tal solicitação, sopesando todos os interesses políticos internacionais.

E aqui, sinceramente, não entendi muito bem a escolha do Uruguai. Apesar de ser o país mais liberal da América do Sul na concessão de asilos, o atual governo do Uruguai tem fortes laços com o governo brasileiro e é país membro do Mercosul.

Se o Uruguai concede asilo diplomático aos militantes, implicitamente estaria afirmando que o Brasil ou não é democrático ou está com sua democracia fortemente abalada e isso poderia gerar uma grave crise internacional. O MERCOSUL, através do Protocolo de Ushuaia, impôs uma “cláusula democrática” aos seus países-membros e a quebra dessa cláusula deverá ser punida. Ou seja, não faria sentido o Uruguai conceder o asilo e não cobrar sanções contra o Brasil no MERCOSUL.

uruguai fronteiraA “cláusula democrática” ficou ainda mais importante pois foi com ela que Brasil, Uruguai e Argentina suspenderam o Paraguai do Mercosul logo após o “golpe do impeachment” de Fernando Lugo em 2012 e aproveitaram tal suspensão para, ilegalmente na minha opinião (mas isso é assunto para outra coluna inteira), aprovar a entrada da Venezuela no MERCOSUL.

Se nada fosse feito, ficaria uma sensação estranha de que o Uruguai usaria dois pesos e duas medidas diferentes para dois Estados que, na visão uruguaia no caso de concessão de asilo, estariam na mesma situação.

Logo, era muito provável que o Uruguai negasse o pedido de asilo, como o fez na noite da segunda-feira passada.

5 Replies to “Alguns Comentários Sobre o Caso dos Militantes”

  1. Caro Rafael,

    Como superintendente de Comunicação da entidade e leitor do blog, no intuito de colaborar para o debate, reproduzo aqui uma nota da OAB/RJ sobre o assunto:

    “A OAB/RJ trabalha pelo exercício digno da advocacia e ,também, pela manutenção e pelo aprimoramento da democracia. O que está em questão no caso citado é a legalidade da ação do Estado, e não a defesa de ações violentas. Como tem deixado claro desde junho de 2013, a Seccional defende o direito à manifestação, repudiando, no entanto, atos que violem a lei. A OAB/RJ preza pela transparência em sua atuação e cobra essa mesma clareza do Judiciário”.

    Grande abraço,
    Marcelo

  2. Marcelo,

    Muito obrigado pela resposta. Não duvido nem reclamo da defesa dos advogados e da manutenção da democracia feita pela OAB-RJ em toda a sua história, o que não é diferente no momento atual.

    Porém discordo que a posição tomada pela OAB-RJ neste caso seja a melhor para o aprimoramento da democracia e para a credibilidade da mesma como defensora da legalidade e da legitimidade perante a sociedade, por isso escrevi crítica.

  3. Certo, Rafael. Gostaria de acrescentar o seguinte. Seu artigo afirma que “a posição de confrontação mais explícita da instituição com a polícia só começou com o caso “Amarildo” em julho de 2013”. É verdade. E a razão é simples: foi em julho que as manifestações começaram a descambar mais fortemente para a violência, tanto por parte da polícia quanto de alguns ativistas. Natural que a entidade tenha feito confrontação mais explícita a partir deste momento, certo? Mas, mesmo nas notas e nos posicionamentos críticos quanto à ação da polícia (estão todos disponíveis até hoje no site da instituição e podem ser lidos), a OAB/RJ não deixou de repudiar atos violentos de manifestantes. Escrevo isso, em caráter eminentemente pessoal e como leitor do blog, apenas para reparar o que entendo ser uma injustiça com a Ordem.

    Grande abraço

  4. Marcelo,

    Quanto a posição da OAB, são impressões e opiniões diferentes e as respeito. Não sou o dono da verdade e a discussão argumentativa aqui é incentivada.

    Quanto à Fernanda Tórtima, tem toda razão. Confundi a CDH com a CDAP, já acertei no texto e peço desculpas pela confusão.

    Abraços.

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