A décima coluna da Série Sambódromo em Trinta Atos, do jornalista esportivo Fred Sabino, remete ao desfile de 1993, no qual o Salgueiro conquistou o título com uma apresentação que até hoje é lembrada como um dos últimos momentos de pura emoção na Sapucaí.

1993: Na maior felicidade, Salgueiro explodiu a Sapucaí

Com o rebaixamento de três escolas no Carnaval de 1992, finalmente a Liesa atingiu para 1993 o objetivo de limitar o número de agremiações do Grupo Especial a 14. Por tabela, estava eliminado o que, para a entidade, era um grande problema: os desfiles sob a luz do sol.

Meses depois do impeachment de Fernando Collor da presidência da República, a economia do país ainda convivia com a inflação e uma outra medida no regulamento dava a dimensão das dificuldades pelas quais as escolas atravessavam: o número máximo de alegorias seria de 12, em vez de 15, e a quantidade mínima seria nove.

A crise econômica acabou se refletindo nos desfiles e, salvo poucas exceções, a qualidade de alegorias e fantasias acabou sendo inferior à de outros carnavais. Mas isso, de forma nenhuma, significou que as escolas se apresentaram mal. Ao contrário: as escolas, na maioria, fizeram apresentações com muito samba no pé.

As expectativas para o Carnaval de 1993 eram diversas, mas uma ausência seria muito sentida: pela primeira vez desde 1973, Joãozinho Trinta não assinaria nenhum desfile no Grupo Especial. A substituta na Beija-Flor seria a carnavalesca Maria Augusta Rodrigues, que levaria à Sapucaí o enredo “Uni-duni-tê, a Beija-Flor Escolheu, É Você!”, sobre o imaginário infantil.

Depois do título de 1992, a Estácio de Sá escolheu uma temática completamente diferente. O enredo “A Dança da Lua” era baseado numa lenda dos índios Karajás sobre a lua e suas quatro fases. A vice-campeã Mocidade optou por um enredo mais leve: “Marraio, Feridô, sou Rei”, sobre o universo dos jogos.

Havia grande expectativa em relação ao Salgueiro, que desfilaria com o enredo “Peguei um Ita no Norte”, sobre os migrantes do Norte e Nordeste do Brasil que tentavam a sorte no Centro-Sul. O samba já se mostrava com uma grande pegada com o refrão “Explode Coração” prenunciando um ótimo desfile.

Outra escola que dava esperanças aos seus torcedores era a Portela, que contratou o carnavalesco Mário Monteiro, campeão pelo Estácio, para desenvolver “Cerimônia de Casamento”, que prometia levar ao público tudo sobre a tradicional instituição.

Terceira colocada em 1992, a Imperatriz Leopoldinense contaria a história do Carnaval desde o nascimento de Cândido José de Araújo Viana, o Marquês de Sapucaí, ocorrido exatamente duzentos anos antes.

Já a Estação Primeira de Mangueira faria um enredo sobre o fruto manga e ainda uma auto-homenagem. A Viradouro, depois do desastre de 1992, falaria sobre o amor, enquanto a União da Ilha voltaria às suas características de leveza e irreverência, e teria como temática o circo.

A Unidos de Vila Isabel, depois de quase ser rebaixada, tentaria a volta por cima com um enredo de temática negra: “Gbala, Viagem ao Tempo da Criação”, sobre a criação e evolução do homem sob a ótica religiosa africana e com a esperança de um futuro melhor repousada nas crianças. O samba de Martinho da Vila era o melhor do ano.

A polêmica da fase pré-carnavalesca residia em Pilares. Na volta à Caprichosos, o carnavalesco Luiz Fernando Reis prometia exaltar o subúrbio, mas uma alegoria sobre a Zona Sul com uma prostituta e um assalto a um turista não caíram bem para a Liesa e a Riotur.

Completavam o desfile de 1993 Unidos da Tijuca, falando sobre as danças brasileiras, e as emergentes Grande Rio, com outro enredo sobre a Lua mas com viés diferente, e Unidos da Ponte, que abriria os desfiles contando a história das máscaras.

OS DESFILES

Com o perdão do trocadilho, a Ponte acabou não conseguindo mostrar a cara e o desfile não foi dos melhores. Três dos nove carros alegóricos quebraram, o que fez a escola desfilar com um número de alegorias abaixo do exigido pelo regulamento.

Para piorar, a chuva comprometeu o acabamento de carros e fantasias, sem contar que havia poucas máscaras num desfile sobre máscaras – no Acesso, a Tradição desfilou com o mesmo tema e passou bem melhor, a ponto de ser campeã.

vilaisabel1993Segunda escola a desfilar, a Vila Isabel se recuperou muito bem do fraco desfile de 1992. Com Martinho da Vila ajudando Gera no carro de som, o samba rendeu o que dele se esperava (ganhou o Estandarte de Ouro), e o enredo desenvolvido pelo carnavalesco Oswaldo Jardim foi passado com coerência, mesmo com a escola ainda enfrentando dificuldades financeiras.

A chuva ainda insistia em atrapalhar, mas a criatividade das fantasias e alegorias ficou evidente, principalmente no carro “Criação do Homem”, que tinha pessoas sendo “moldadas” em barro.

Não dava para a Vila brigar lá em cima, já que outras escolas mais bem estruturadas viriam a desfilar. Mas a Azul e Branco deu muito bem o recado de que estava viva. O samba dizia “Gbala é resgatar, salvar”, e a escola estava mesmo salva.

Já a União da Ilha entrou na avenida com um enredo diferente, sobre os tipos de circo. O carnavalesco Silvio Cunha, ex-Portela, abordou desde os circos na época medieval até os circos da televisão e da Fórmula 1, com direito a trocadilho no samba: “O domador quando entra em Senna não dá mole pro Leão”, numa referência ao tricampeão e ao rival Nigel Mansell.

A verdade é que essa parte do desfile foi inferior à que abordava os palhaços e o espetáculo circense, no caso o ponto alto da exibição insulana. Nesse setor, destacou-se o grande palhaço Carequinha, ainda em boa forma.

Foi uma apresentação alegre, com a cara da Ilha, e o público pela primeira vez naquele ano ficou mais empolgado, até porque a bateria de Mestre Paulão brilhou com diversas paradinhas.

Em seguida entrou na Sapucaí a Unidos do Viradouro, levando ao público o amor em diferentes aspectos, desde o amor à própria escola até o amor pela natureza ou pela liberdade e também famosos romances como o de Maria Bonita e Lampião.

Max Lopes, apoiado pelo então jovem Mauro Quintaes, voltou a brilhar na concepção de alegorias (como a do amor de Tiradentes pela liberdade) e fantasias, mas a escola acabou realizando uma apresentação fria, e com problemas de evolução.

Isso porque, depois dos problemas causados pelo incêndio e a perda de pontos em cronometragem em 1992, a direção de harmonia da escola apertou o passo dos componentes desde o início do desfile, que acabou tendo claros em alguns momentos.

Cercada de expectativa, a Mocidade Independente de Padre Miguel pisou forte na pista para tentar recuperar o título. Antes do desfile, o patrono Castor de Andrade foi vaiado após fazer um discurso inflamado contra a “perseguição” aos bicheiros encampada pela juíza Denise Frossard – meses depois, Castor e outros patronos de escolas de samba foram condenados a prisão.

Na avenida, e enredo da Mocidade sobre os jogos visitou a Grécia Antiga e os Jogos Olímpicos modernos, viajou do jogo de dados até os games eletrônicos e Renato Lage brindou o público com um show high tech.

A comissão de frente representava o Dream Team do basquete americano da Olimpíada de Barcelona, e era formada por jogadores de basquete negros e carecas. Jogos como dados, xadrez e bola de gude (que, aliás, tinha referência no título do enredo) não foram esquecidos.

mocidade93Mas o grande destaque em termos de alegorias foi o carro “Diversões Eletrônicas” (foto), com um menino gigante jogando videogame com um joystick. O garoto usava um óculos 3D cujas lentes eram televisores e a ideia surtiu belo efeito. Além disso, o carro emitia sons de videogame.

O samba, para o meu gosto, era bem inferior aos dos três anos anteriores, mas até que a harmonia da escola esteve bem. E, claro, a Bateria Nota 10 teve atuação segura. O desfile foi o melhor do ano até aquele momento, e a Mocidade brigaria sem dúvida pelas primeiras posições, embora em posição não tão forte como de 1990 a 1992.

A Portela foi a penúltima escola a desfilar no domingo (já era madrugada de segunda) e não teve uma apresentação das melhores. O enredo sobre o casamento teve alguns bons momentos em alegorias e nem tanto em fantasias, já que a Majestade do Samba sempre teve no luxo dos figurinos o ponto forte e a concepção naquele ano foi diferente.

A águia desfilou acompanhada por uma fêmea e um filhote, numa bela ideia do carnavalesco Mário Monteiro. As alas estavam bem divididas, apesar da concepção das fantasias, e a formação da família, bem como temas modernos como o casamento gay e os relacionamentos sem compromisso foram apresentados ao público.

O samba era agradável e a condução da Tabajara do Samba era garantia de uma boa nota. Mas o público não se empolgou tanto e a Azul e Branco deixou a Sapucaí com um gosto de quero mais. A crítica de “O Globo” carregou nas tintas: “Os componentes, que começaram animados, terminaram arrastando os pés. Muitos chegaram à Apoteose literalmente andando.”

Falando em Apoteose, no fim a bateria foi mal posicionada à direita da pista, por onde deveriam passar as alegorias. Isso gerou confusão na dispersão e um bate-boca entre diretores da escola – o presidente Carlinhos Maracanã teve de intervir pessoalmente para amenizar os ânimos.

A Imperatriz Leopoldinense encerrou o desfile de domingo como a melhor escola até então, à frente da Mocidade. Pouca gente sabia quem era o Marquês de Sapucaí que dava nome à avenida que virou pista de desfiles e a carnavalesca Rosa Magalhães aproveitou o gancho do bicentenário deste para “apresentá-lo”, e ainda fazer uma linda viagem pela história do Carnaval desde então.

imperatrizA comissão de frente (foto) esteve simplesmente espetacular, com figurinos de extremo bom gosto que remetiam ao tempo da nobreza imperial, com suas inconfundíveis máscaras. Era a primeira de uma série de comissões de frente da Imperatriz que marcariam época nos desfiles.

A Rainha de Ramos relembrou os tempos das grandes sociedades e das celebrações nas ruas, e prestou linda homenagem aos carnavalescos que abrilhantaram o Carnaval contemporâneo, como Fernando Pinto, Arlindo Rodrigues, Joãozinho Trinta e Viriato Ferreira, que chegou a trabalhar com Rosa na criação das fantasias daquele desfile, mas morreu no fim de 1992.

O samba teve ótimo rendimento no desfile, com Preto Joia (vencedor do Estandarte de Ouro daquele ano) e Rixxa primorosos no canto, e a bateria mostrou um excelente andamento, nem tão rápido nem tão cadenciado.

De volta ao Grupo Especial, a Acadêmicos do Grande Rio abriu muito bem a segunda noite de desfiles. O enredo sobre a lua foi bem desenvolvido pelo carnavalesco Alexandre Louzada, com um conjunto alegórico pertinente ao tema e boas fantasias.

O samba cantado pelo estreante Nêgo caiu no gosto popular com o refrão central “Ô luar, ô luar/Vem pratear a nossa rua/A semente da fartura semear/Virar o mundo de bumbum pra lua” sendo entoado a plenos pulmões por componentes e público.

As diferentes fases da lua, a lua de mel e até a corrida espacial rumo ao satélite da Terra foram abordados no desfile, que deixou a clara sensação de que manteria a agremiação na elite do Carnaval carioca com folga.

Com o carnavalesco Luiz Fernando Reis de volta, a Caprichosos foi a segunda a desfilar, e a apresentação foi decepcionante. Não sei houve problemas de recursos ou de barracão, mas esteticamente a escola esteve bem inferior às demais.

O enredo sobre o subúrbio, polêmico desde a escolha, poderia ter sido tratado de uma forma mais poética e não tão agressiva, exaltando o que a Zona Norte tem de melhor e não deixando no ar um confronto Zona Norte/Sul ou Norte/Oeste.

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O desfile seguinte foi o que considero até hoje o mais empolgante de qualquer escola de samba de todos os tempos – já foi tema até de uma coluna minha no Ouro de Tolo. Isso porque o que o Salgueiro fez na noite de 22 de fevereiro de 1993 dificilmente será igualado algum dia. Aliás, a própria agremiação da Tijuca equivocadamente tentou manter a fórmula de samba estilo Ita e se deu mal.

Mas voltando a 1993, salgueirenses famosos estavam entorpecidos de emoção durante o cortejo, como o cantor Jorge Ben Jor, o ator Eri Johnson e a triatleta Fernanda Keller. Na cabine da Globo, Fernando Vannucci dava o tom do que estava acontecendo: “Dá vontade de sair da cabine e ir lá fora cantar. Não preciso falar mais nada. O povo fala!”

Mas não foi apenas um samba contagiante que ganhou aquele Carnaval. O enredo, inspirado na canção de Dorival Caymmi e que falava de uma viagem de Belém ao Rio, retratando as diferentes culturas do Brasil, foi muito bem contado.

salgueiro93bAs alegorias poderiam não estar no nível de uma Mocidade ou Imperatriz, mas se retratavam bem o enredo, que mal há nisso? Assim como aconteceu em desfiles da Mangueira em algumas oportunidades, o conjunto alegórico, embora mais simples, era bastante claro para o público e jurados.

As fantasias estavam superiores às alegorias e criaram um conjunto de cores belíssimo, com o vermelho e branco da escola sendo valorizado, mas ao mesmo tempo intercalado com prata e ouro.

O Ita, ou melhor, o desfile, fez diversas paradas em cidades brasileiras e no fim o sonho realizado da chegada da embarcação ao Rio de Janeiro não foi apoteótico apenas no que o enredo contava, mas na prática também.

Falar do rendimento do samba é chover no molhado e a comunicação com o público foi ainda melhor do que o Estácio conseguiu em 1992. Houve momentos em que mal se ouvia o carro de som, tamanha a euforia do público, que fez coreografia em todos os setores de arquibancada.

O samba ainda estava à feição do estilo irreverente do intérprete Quinho e a bateria de Mestre Louro, embora mais acelerada do que em anos anteriores, como sempre deu o recado com extrema competência.

salgueiro93dO único pecado do Salgueiro, que até poderia ameaçar a anunciada vitória, foi a evolução. Como de costume, a escola desfilou inchada, com cerca de 5 mil componentes, e houve alguns descompassos. Para piorar, a porta bandeira Taninha caiu em frente a um módulo de jurados e, dependendo do sorteio das notas, poderia haver perda de pontos.

De qualquer forma, foi uma apresentação inesquecível e o Salgueiro era superhipermegafavorito ao título salvo alguma outra catarse pouco provável àquela altura.

Passado o grande desfile salgueirense, a Unidos da Tijuca entrou na passarela com o enredo “Dança, Brasil”, sobre as diversas danças de nosso país desde o descobrimento até aquela época.

Com o público ainda cansado depois de cantar e vibrar na apresentação do Salgueiro, a Tijuca também não ajudou ao fazer um desfile morno, até porque o samba não era vibrante e visualmente o conjunto não era dos melhores.

Já a campeã Estácio de Sá teve um desfile repleto de problemas e acabou não reeditando a excelente apresentação do ano anterior. Minutos depois de a escola ter iniciado sua exibição, o sistema de som falhou e Dominguinhos parou de cantar o samba. A Vermelho e Branco exigia que o relógio fosse zerado e tudo recomeçasse, mas o presidente da Liesa, Capitão Guimarães, não aceitou.

Depois de uma áspera discussão, Dominguinhos recomeçou a cantar quando o cronômetro já marcava nove minutos. Com isso, o Estácio teve uma evolução apressada e “esburacada” o tempo todo e, para piorar, o som voltou a falhar, o que matou de vez a harmonia da escola.

De qualquer forma, a despeito de o samba ser melódico e de figurinos e alegorias terem qualidade, o desfile sobre a lenda karajá e as fases da lua não empolgou. O tema era mais denso do que aquele apresentado pela Grande Rio, que sem dúvida teve melhor comunicação com o público.

Sem Joãozinho Trinta, a Beija-Flor fez uma bonita e correta, mas morna apresentação. Maria Augusta deu sua cara ao Carnaval da escola, com alegorias multicoloridas e de fácil leitura, mesmo sem serem tão grandes como as de desfiles anteriores da escola.

No entanto, para o meu gosto, isso não impediu que a escola apresentasse muito bem o enredo sobre a infância. A qualidade de acabamento de figurinos e carros e o bom gosto eram indiscutíveis. Nos demais quesitos a escola passou bem, mas faltou um item fundamental: empolgação.

Aí vale relembrar uma história contada por Neguinho da Beija-Flor anos mais tarde. Segundo o grande cantor, ele chegou à Sapucaí “derrotado” depois de ver pela televisão o incrível desfile do Salgueiro. Não sei se por isso, o samba foi cantado num tom um pouco abaixo (e menos alegre) do que na gravação do CD. Fato é que os componentes cantaram, sim, mas sem aquele “sangue nos olhos” típico da comunidade nilopolitana.

Pelo sim, pelo não, Neguinho jura que, desde então, não vê mais os desfiles anteriores ao da Beija-Flor… Mas fato é que a Deusa da Passarela deu muito bem o seu recado em 1993.

mangueira93A última escola a desfilar foi a Estação Primeira de Mangueira. E foi uma apresentação das mais vibrantes daquele ano. Para começar, a diretoria da escola distribuiu milhares de bandeirinhas da Verde e Rosa nos setores de arquibancada e a solução deu belo efeito e levou o público para o lado da escola no começo do desfile.

O samba, como de costume, foi elevado a um outro patamar graças à interpretação sem igual de Jamelão, que recebeu o competente apoio de Sobrinho e Eraldo Caê. A bateria de Mestre Taranta teve um excelente andamento e era quase uma certeza de nota máxima.

O enredo sobre a manga foi bem desenvolvido e as origens do fruto, bem como a multiplicação em outros países, foram traduzidas em um bom conjunto alegórico e de fantasias. Alguns torceram o nariz pelo fato de o carnavalesco Ilvamar Magalhães ter usado diversas cores, sem se ater muito ao verde e o rosa. Mas não compartilho dessa opinião, e a divisão cromática foi coerente para que o enredo se propunha.

A última parte do desfile foi dedicada a uma auto-homenagem e um belo trecho do samba dizia “Entre tantos tipos de mangueira/Há uma especial na Estação Primeira/Ela simboliza o samba/É união de gente bamba/Onde desabrocham tantas flores”.

A Mangueira manteve-se empolgada até o fim de sua apresentação, que, no entanto, teve falhas de evolução. O carro da caravela (foto acima), onde estava Angélica, era muito alto e não passava pela torre de TV. A escola parou por alguns minutos até a apresentadora ser retirada e empurradores vencerem a torre na marra, danificando o topo da alegoria. Apesar disso, foi o melhor desfile mangueirense em anos e a escola poderia brigar em cima.

REPERCUSSÃO E APURAÇÃO

Terminado o desfile de 1993, a expectativa era a de uma vitória do Salgueiro, pelo conjunto da obra e a empolgação de sua exibição. Imperatriz, Mangueira e Mocidade, também com ótimas exibições, poderiam incomodar, mas nem o salgueirense mais pessimista temia um revés.

Na apuração, o Salgueiro, mesmo merecendo a vitória, acabou tendo uma dose de sorte, pois, no sorteio dos julgadores, a jurada do módulo no qual a porta-bandeira Taninha sofrera sua queda não teve a nota computada.

A única ameaça ao título salgueirense por incrível que pareça foi a Beija-Flor, de quem não se falava muito. Mas nos últimos quesitos o Salgueiro consolidou a vitória que quebrou o jejum de 18 anos sem títulos, e a escola de Nilópolis perdeu o vice para a Imperatriz, que, de fato, desfilou melhor.

Completaram o grupo das cinco primeiras colocadas a Mocidade e a Mangueira. Como foram comprovadas tentativas de manipulação de resultados, não houve rebaixamento para 1994 e as duas últimas colocadas, Caprichosos e Unidos da Ponte, foram salvas.

Por outro lado, subiram para o Grupo Especial a Tradição e o Império Serrano, ambas depois de dois anos fora da elite. Como já contado, a Tradição fez um enredo sobre as máscaras no Carnaval, enquanto o Império fez uma auto-exaltação com um extraordinário samba de autoria de Aluísio Machado.

RESULTADO OFICIAL

POS. ESCOLA PONTOS
Acadêmicos do Salgueiro 300,5
Imperatriz Leopoldinense 298
Beija-Flor de Nilópolis 296,5
Mocidade Independente de Padre Miguel 295,5
Estação Primeira de Mangueira 292,5
Estácio de Sá 289,5
Unidos do Viradouro 289
Unidos de Vila Isabel 287
Acadêmicos do Grande Rio 286
10º Portela 280,5
11º União da Ilha do Governador 279
12º Unidos da Tijuca 278
13º Caprichosos de Pilares 275,5
14º Unidos da Ponte 245,5

CURIOSIDADES

– Como já havia ocorrido em 1988, a Manchete não transmitiu os desfiles do Grupo Especial do Rio. Naquele ano, a emissora acabou tendo de concentrar sua cobertura no Carnaval da Bahia, que estava crescendo em âmbito nacional, e o narrador Paulo Stein foi para Salvador narrar os shows dos trios elétricos.

– Sem a Manchete para concorrer com ela, a Globo montou um timaço de comentaristas para o desfile de 1993: Fernando Vannucci na narração, com comentários de Albino Pinheiro, Sérgio Cabral, Jorge Aragão e Leci Brandão.

– A transmissão do Grupo de Acesso de 1993 ficou a cargo da recém-criada OM. O comentarista principal era o grande Dominguinhos do Estácio, que se mostrou muito desenvolto na função. Outra atração era Paulo Silvino, que atuou como repórter na concentração e mostrou a habitual irreverência nas entrevistas – nos casos das entrevistas com mulheres, por que não dizer, saliência…

– Com o nono lugar em 1993, a Grande Rio consolidou sua permanência no Grupo Especial, de onde jamais saiu até hoje.

– O belo samba-enredo da Beija-Flor teve como um dos autores o compositor Edeor de Paula, o mesmo de “Os Sertões”, considerado por muito bamba o melhor samba de todos os tempos.

– O extraordinário intérprete Rixxa foi um quase bivice-campeão em 1993. No Acesso, ele gravou o lindo samba “Império Serrano, um ato de amor”, de autoria de Arlindo Cruz, Aluízio Machado, Bicalho e Acyr Marques, mas não desfilou devido a divergências com a diretoria. No Grupo Especial, Rixxa cantou ao lado de Preto Joia na Imperatriz. No ano seguinte, ele e seria o cantor do Arrastão de Cascadura no Acesso e apoio de Jamelão na Mangueira.

– Em 1993, duas das musas do Carnaval carioca estiveram em escolas nas quais o público não estava acostumado a ver: Monique Evans desfilou pelo Estácio de Sá e Luma de Oliveira, pela Mangueira.

– Duas escolas do Acesso homenagearam a Mangueira. A Unidos do Jacarezinho, com o enredo “Mangueira, Beleza Que a Natureza Criou”, e a Mocidade Unida da Cidade de Deus, com “Dona Zica e Dona Neuma, Enredos de Verdade”. Num desfile com 16 escolas, a Jacarezinho acabou em 13º lugar e a Mocidade Unida em último, rebaixada.

CANTINHO DO EDITOR – por Pedro Migão

1993 marca a única vez em que se comprovou tentativa de manipulação de resultados. Foram divulgadas escutas telefônicas envolvendo a Grande Rio, a Caprichosos e a manipulação de resultados via jurados. Como consequência, não houve rebaixamento.

Antes mesmo do desfile a Caprichosos estava envolvida em polêmica. A Riotur fez muita pressão para que a agremiação alterasse o abre alas, que mostrava um pivete assaltando um turista e uma prostituta na Zona Sul. A escola optou por não alterar sua alegoria.

A Portela chegou como grande favorita ao desfile de 1993, especialmente devido à contratação do carnavalesco campeão no ano anterior Mário Monteiro. Muitos portelenses colocam a culpa do fiasco na figurinista da Globo Beth Filipecki, responsável pelas fantasias, que teria desenhado roupas para novelas e não fantasias de carnaval.

Além dos problemas no som, a Estácio claramente sentiu com o gigantismo que acomete escolas campeãs no ano anterior. Estima-se que a agremiação trouxe 7 mil componentes.

Chama a atenção a diferença de pontos entre as duas escolas promovidas ao Grupo Especial e as demais – 15.

A carnavalesca da Beija Flor Maria Augusta muitos anos depois afirmou que teve muitos problemas internos para a realização do carnaval da escola. A escola trouxe no abre alas seu símbolo, a ave que batiza a escola de Nilópolis.

A Unidos de Villa Rica venceu o Grupo de Acesso B, na terça feira gorda. Também subiram a Canários das Laranjeiras e a Independente de Cordovil.

Abaixo, a capa do Jornal do Brasil da Quarta Feira de Cinzas daquele ano.

JB 1993

Links

O desfile campeão do Salgueiro em 1993

A bela apresentação da Imperatriz Leopoldinense

A exibição high tech da Mocidade

http://www.youtube.com/watch?v=vHs-ccKwGsQ

O desfile da Estação Primeira de Mangueira

http://www.youtube.com/watch?v=7CYVPDO8d9A

O desfile que devolveu o Império Serrano à elite

7 Replies to “Sambódromo em 30 Atos – “1993: Na maior felicidade, Salgueiro explodiu a Sapucaí””

  1. Uma coincidência interessante é que tanto em 1992 e 1993, a terceira escola desfilar na segunda foram campeãs: Estácio e Salgueiro.

    No desfile da Vila Isabel, teve o caso do queijo do destaque que quebrou e que assustou muita gente.

    E se não me engano, teve um princípio de incêndio no último carro da Mocidade, o que céu e do inferno.

    Acho que o mais legal, desse carnaval, foi a permanência do samba do Salgueiro ao longo do ano como grito de guerra. Todo mundo usava esse refrão.

    Abraços!

  2. Como salgueirense,sempre me emociono com esse desfile de 1993, o primeiro em que vi a minha escola sendo campeã. Pela TV, os comentaristas da Globo se preocupavam que a escola não fosse conseguir terminar o desfile no tempo regulamentar, por conta do excesso de componentes. Ao terminar o desfile, alívio e emoção! Lembro da alegria da Ilha, do high tech da Mocidade e do belo desfile da Grande Rio. Bons tempos!!

  3. É importante uma série de matérias como esta levar ao conhecimento do público o que de fato aconteceu ano após ano nesses 30 carnavais da Era Sambódromo. Às vezes dá raiva ler tanta besteira em fóruns diversos, mesmo sabendo que muitos carecem de leitura e embasamento sobre aquilo que dizem. Como salgueirense, não poderia me sentir mais privilegiado ao fazer minha estreia na Ala das Crianças neste desfile. Por sinal, a minha ala também foi premiada com o Estandarte de Ouro. Me sinto duplamente vitorioso. Imagens que falam por si, de uma época onde o samba no pé e a emoção se sobrepunham à tecnicidade de agora. Assim como a torcida do Flamengo acabou de conduzir o fraco time ao título da Copa do Brasil, foi o público da Sapucaí quem conduziu a Academia à vitória. Pena que o perfil desse público mudou e hoje se comporta de forma mais apática nas arquibancadas, salvo raríssimas exceções, como o desfile da Vila Isabel este ano.

    Pena que terei de esperar mais 16 segundas-feiras até 2009, já que a partir daí vieram tempos difíceis pro meu Salgueiro. Parabéns pela pesquisa, Fred.

    1. Mas justamente o sucesso do samba de 93 que acabou prejudicando a escola nos anos seguintes. O Salgueiro se embrenhou “em busca do Ita perdido…”

      Abraços e obrigado

      1. Verdade. Mas sob um olhar mais amplo, não foi só o Salgueiro que buscou “o Ita perdido”. Foi um mal que assolou outras escolas também. Creio eu que nos últimos anos (enfim) a escola superou suas deficiências nesse sentido e tem buscado novos horizontes. O samba para 2014 é um bom exemplo desse desprendimento do passado.

        Eu nunca sei a quem agradecer. Um abraço pra vocês, Pedro e Fred.

  4. Sobre o desfile da Mocidade, o samba perdeu preciosos pontos (justamente), mas passou muito bem, bela apresentação da bateria e do carro de som, com Wander Pires se destacando muito. Em alegorias, a segunda metade dos 12 carros que passaram foram bem superiores a primeira.

  5. Bons tempos que o chão da escola e o samba ainda eram fundamentais. Mesmo com o tombo da Taninha, mesmo com problemas na evolução, não tinha a MENOR POSSIBILIDADE do Salgueiro obter outro resultado que não fosse o título!!

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