Nesta semana, a coluna do jornalista esportivo Fred Sabino relembra os 30 anos do bicampeonato mundial de Fórmula 1 conquistado por Nelson Piquet, feito comemorado nesta semana.

O brilhante bicampeonato de Nelson Piquet

Na última terça-feira completaram-se trinta anos de uma das mais importantes conquistas do automobilismo brasileiro. No dia 15 de outubro de 1983, Nelson Piquet faturava o bicampeonato mundial de Fórmula 1 com a terceira posição no Grande Prêmio da África do Sul, no saudoso circuito de Kyalami.

Lembrar da conquista nunca é demais, ainda mais em um país em que os feitos dos nossos ídolos costumam ser esquecidos. Ainda mais um campeonato tão brigado, com voltas e reviravoltas. Vale os mais jovens entenderem o que se passou há três décadas.

Foi uma conquista memorável sob vários aspectos. Primeiro, pelos adversários: Alain Prost e seu consistente Renault, e René Arnoux e Patrick Tambay (este alijado da briga na penúltima prova) e suas poderosas Ferraris. Segundo, pela incrível reação de Piquet nas provas finais. E terceiro, pelas inúmeras variáveis daquele campeonato.

Vale lembrar que, a exemplo do que acontecerá em 2014, a Fórmula 1 passou por uma grande transformação no regulamento. Os carros-asa e suas minissaias foram proibidos e os projetistas tiveram de se desdobrar para construir bólidos com fundos planos, de acordo com as novas regras.

Em uma época onde a tecnologia era bem inferior à de hoje, a mudança teve um impacto absurdo e isso atrapalhou as equipes, que já estavam em andamento nos projetos para 1983 quando a Federação Internacional de Automobilismo anunciou as alterações.

Uma das equipes mais afetadas foi justamente a Brabham de Nelson Piquet. O brilhante projetista Gordon Murray precisou refazer o projeto às pressas. E o resultado foi o lindíssimo modelo Bt52, com o fortíssimo motor BMW, que em condições de classificação ultrapassava com facilidade os 1000 cavalos.

1983-Piquet

Na primeira corrida, no absurdamente desativado autódromo de Jacarepaguá, as equipes ainda estavam acertando os novos carros (a Renault ainda nem tinha lançado o seu) e Keke Rosberg surpreendeu ao cravar a pole com a Williams de motor aspirado. Mas na corrida, Piquet deu show e venceu com facilidade (foto ao lado).

A segunda prova, disputada nas ruas de Long Beach, mascarou o potencial dos carros e ainda permitiu aos aspirados brilharem. John Watson, largando de 22º aproveitou o melhor desempenho dos pneus Michelin e levou o McLaren-Ford à vitória, com o companheiro Niki Lauda em segundo. O austríaco naquele momento era o líder da tabela.

Mas logo a força dos turbos prevaleceria. Na terceira corrida, na França, Prost e a Renault conseguiriam a primeira vitória, com extrema facilidade. Piquet, constante, terminou em segundo, ciente de que os franceses tinham o melhor carro naquele instante, e reassumiu a ponta na tabela.

As provas seguintes veriam uma Ferrari dominante com René Arnoux e Patrick Tambay e uma Renault ainda forte com Prost. Enquanto isso, Piquet ia catando pontos, à espera de melhorias no modelo BT52. Também venceram corridas Keke Rosberg (Williams) e Michele Alboreto (Tyrrell) em circuitos de rua, nos quais o motor Ford ainda tinha chances.

No GP da Holanda aconteceu o lance que mais tarde seria considerado decisivo para o campeonato. Com evoluções no Brabham, Piquet fez a pole e liderava com Prost nos calcanhares. Numa enorme bobagem, o francês tentou uma ultrapassagem suicida sobre Nelson e acabou batendo no brasileiro, que ficou fora (foto abaixo). Pior, o Renault ficou danificado na asa e Prost não percebeu, o que rendeu um acidente que também o tirou da prova.

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Caso tivesse feito a ultrapassagem sobre Piquet ou percebesse o problema para ir aos boxes trocar a asa danificada, Prost quase que certamente marcaria os pontos necessários para ser campeão no frigir dos ovos.

Mas Prost bobeou e a melhora da Brabham foi suficiente para dar a Piquet duas vitórias consecutivas, em Monza e Brands Hatch. O brasileiro então chegou a 55 pontos contra 57 de Prost, enquanto Arnoux ainda tinha chances remotas com 49 pontos.

Com a Brabham forte, Piquet e Murray optaram por uma estratégia diabólica na última corrida do ano, na África do Sul. Cientes de que os rivais previam uma corrida tática por parte do brasileiro, os dois decidiram que Nelson largaria com pouquíssima gasolina para abrir muita vantagem no começo da prova e tentar voltar do pit stop na frente.

Dito e feito. Enquanto o companheiro Riccardo Patrese virava tempos bem mais lentos e segurava o pelotão atrás dele, Piquet disparou na frente e manteve a ponta na saída dos boxes. Prost e Arnoux forçaram o ritmo com os carros mais pesados e abandonaram com problemas.

Piquet ainda permitiu a ultrapassagem de Patrese e de Niki Lauda, e se posicionou em terceiro, resultado que lhe daria o campeonato já que Prost estava fora. Lauda depois parou e Piquet cedeu passagem a Andrea de Cesaris (Alfa Romeo). O terceiro lugar, de fato, garantiu o bicampeonato (foto abaixo).

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E também garantiu o cumprimento de uma profecia, já que, mesmo quando estava atrás na tabela, o próprio Piquet previu o título quando Murray fez as mudanças no carro da Brabham. Arrogância? Não! Apenas confiança na própria capacidade e na inteligência na leitura de uma corrida e de um campeonato.

Um feito para poucos.

Fotos: Getty Images e BMW

3 Replies to “Sabinadas: “O brilhante bicampeonato de Nelson Piquet””

  1. Com todo respeito ao Emerson e ao Senna, mas não houve campeonato mais sensacional conquistado por um brasileiro do que este de 1983. A recuperação do Nelson Piquet em cima da francesada é histórica. Só Räikkönen em 2007 fez algo semelhante. Não, não considero o feito do Prost em 1986 parecido.

    1. Em 1986, mesmo com os méritos do Prost, o Mansell cagou na largada no México e, mesmo correndo em terceiro, conseguiu destroçar os pneus na Austrália. Aliás, até hoje ninguém respondeu de verdade se o Piquet tinha condições de seguir até o fim sem trocar os pneus…

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