(Foto: Blog da Cidadania)

Neste domingo, o compositor Aloisio Villar em sua coluna “Orun Ayé” traz texto que deveria ter sido publicado domingo passado, mas que acabou não sendo por uma falha de comunicação entre o colunista e este editor. Paciência, acontece.
O tema é a recente aliança do PT paulista com o PP, representado por Paulo Maluf.
Confesso que discordo de boa parte da coluna, por dois motivos: primeiro porque está aí o exemplo do Paraguai e segundo porque pior que o representado por Maluf é a política atual do PSDB/PSD na cidade – pretendo voltar ao tema esta semana.
Isto não significa que eu não compartilhe das objeções pessoais do colunista quanto a Paulo Maluf – que, a meu juízo, deveria estar preso. Mas se o próprio FHC foi oposição ao candidato do seu partido em 98 para apoiar o político em questão, mesmo com toda a folha corrida do mesmo…
O Velho Comunista se Aliançou
Sim, eu sei que Lula nunca foi comunista, mas logo quando pensei nessa coluna lembrei dessa toada do Boi Garantido, a mais famosa toada dos bois de Parintins.

Uma imagem mexeu com todos uns dez dias atrás, ninguém ficou indiferente a ela: foi a de Lula na casa de Maluf e os dois apertando as mãos. Que sentimentos essa foto trouxe? Em muitos asco, constrangimento, tristeza e nos que apóiam o ex-presidente uma tentativa envergonhada de defendê-lo e dizer que isso faz parte da política.

Evidente que alianças fazem parte da política, mas qual é o limite? Aliás, existe um limite? Vender a alma ao diabo e esquecer suas convicções fazem parte do jogo?

Antes quero deixar bem claro que sou “Lulista” convicto, ferrenho, não mudei com essa história e provavelmente nunca mudarei. Acho Lula o melhor político que eu vi, o melhor presidente desde que acompanho política e um dos melhores presidentes de nossa história. Mas isso não me faz ser cego, nem minha mãe era perfeita e infalível, o Lula então que não vou achar.

E essa foto e o que dizem pra defender essa aliança me incomodam muito.

Vai ver porque sou inocente, romântico em relação a política. Sempre fui um garoto estranho, devo ter sido a única criança com oito anos de idade que em vez de ver desenho assistiu na TV a votação do colégio eleitoral que decidia entre Tancredo Neves e o próprio Paulo Maluf quem seria o presidente do Brasil. Detalhe: assistia e entendia o que ocorria. [N.do.E.: éramos dois]

Essa foi apenas a primeira eleição que acompanhei e que tive minhas torcidas, já que não podia votar. Foi dessa forma até 1989, naquela que foi para mim a mãe de todas as eleições, a presidencial direta, primeira desde 1960.

Políticos importantes de nossa história disputaram o pleito. Leonel Brizola, Mário Covas, Ulysses Guimarães, Fernando Collor de Mello e Luis Inácio da Silva, o Lula. Encantei-me com a história de vida daquele barbudo mal encarado, como ele queria transformar o país, a visão romântica de um político de esquerda que achava seu partido puro e queria mudar o Brasil através da igualdade social.

O político que foi metalúrgico, que liderou greves em plena ditadura, tomou borrachada da policia, foi preso e enquanto estava na cadeia sua mãe morreu, ele saiu para o enterro e voltou pra cela.

Retirante nordestino, conhecedor aprimorado da miséria que esteve presente em sua infância como a bola e a pipa estão em crianças com vidas “normais”, veio com a família pra São Paulo, enfrentou a pobreza, a falta de instrução, tragédias como morte de esposa e filho no parto. Conseguiu uma profissão, virou líder sindical, fundou o maior partido de esquerda da América Latina, foi várias vezes candidato a presidente perdendo todas (e eu junto com ele no começo só apoiando e depois votando) e finalmente virou presidente.

E se transformou em um dos maiores governantes da história do Brasil. Tirou milhares da pobreza, ajeitou de vez a economia que suportou sólida a crise global, se tornou um dos homens mais influentes e respeitados do mundo com até o presidente dos Estados Unidos virando seu fã e deixou o governo com 96% de aprovação da população. Fez sua sucessora, uma pessoa que quase ninguém conhecia e o Brasil elegeu por causa dele.

Qualquer um lendo o que escrevi acima pensa: “Que história do cacete!! Esse homem é formidável !!”.

Pois é, mas aí que está, porque com tudo isso a gente que gosta dele às vezes se incomoda e se constrange tendo que lhe defender envergonhado? Porque a pessoa com essa biografia maravilhosa, de um grande estadista mundial têm histórias no mínimo estranhas em seu currículo?

Como um chefe de estado não sabe de um grande esquema de corrupção envolvendo deputados, senadores e pessoas próximas, de confiança embaixo de seu nariz? Eu fui um dos que saiu em sua defesa e brigava por ele quando o fantasma do impeachment pairava no ar, mas é aquilo… Se ele não sabia então foi muito bobo, foi enganado e essas coisas não combinam com um cara que saiu dos grotões do Nordeste e conquistou o mundo.

Se aliar, assim como navegar e viver é preciso, mas com Sarney? Um dos maiores patrocinadores da miséria desse país? O Lula sabe muito bem o que esse cidadão faz com o Maranhão e se alia a esse cara e pior, ao Collor de Mello que para ganhar uma eleição dele coloca uma ex-namorada sua na televisão falando que o Lula tentou impor um aborto a ela.

Mas aí alegam que é importante para a governabilidade e nós constrangidos aceitamos e repetimos o mantra “O Lula sabe o que faz”. Mas essa do Maluf não dá pra ignorar.

Por quê Maluf? Aquele que é o símbolo da corrupção e do atraso no nosso país, de tudo que é ruim e a gente tem nojo na política. Pra ganhar um minuto e meio na tv? Ganhar seus eleitores? Sem essa, Maluf é um político decadente, só a Hebe Camargo vota nele hoje em dia.

O Haddad não vai ganhar votos com o apoio do Maluf, malufista não vota no PT e vai perder daqueles que se envergonham com essa aliança e farão como a Erundina batendo em retirada.

Tudo bem, alegam que o PP já faz parte da base aliada, mas o PP ser da base e ir na casa do Maluf posar para fotos é como você trair a namorada e depois colocar o vídeo da traição na internet, é desnecessário, não precisa.

Alegam também que o jogo político é assim, os fins justificam os meios e o importante é tirar o Serra e o PSDB de São Paulo, também não sou fã do PSDB e muito menos do Serra, mas vale o preço? Manchar 32 anos de lutas junto ao povo, suas convicções e ideologias pela prefeitura de São Paulo? Aí que entra meu romantismo, minha ingenuidade: para mim tudo tem um limite e prefiro perder uma eleição a olhar no espelho e não me ver.

Essa história me fez lembrar outra que ouvi tempo atrás e até fui pesquisar pra ver se era verdade e descobri que sim, ela é e o fato de ser verdade me assombra e me assombra ainda mais ver gente que concorda.

Durante a Segunda Grande Guerra Olga Benário, uma judia, foi presa e mandada pelo presidente Getúlio Vargas para a Alemanha nazista. Qualquer idiota sabe o que aconteceria com a judia Olga na Alemanha de Hitler. Olga foi mandada a um dos piores campos de concentração e morreu nele. Olga não era só a esposa: era o amor da vida do líder comunista Luis Carlos Prestes.

Alguns anos depois Vargas procurou Prestes e pediu apoio em sua candidatura a presidente. O que fez Prestes? Na certa deu três tiros em Getulio e depois cuspiu na sua cara vingando sua amada né?

Não, aceitou apoiar Getúlio sobre a alegação que “os interesses do partido tem que ficar acima dos dramas pessoais”.

Bonito isso né? Acima de tudo os interesses do partido, têm muita gente boa que acha esse ato de Prestes louvável, coerente com sua história, um grande heroísmo… Ah,vá pro cacete!! Matam minha mulher, a mulher que eu amo e depois eu vou apoiar o cara? Eu quero esse cara morto, minha vida, as pessoas que eu amo valem muito mais que interesses de partido.

Que magia tem o poder, o interesse político que faz com que gente importante de nossa história traia seu coração como Prestes e seu pensamento como Lula?

Eu devo ser o tal “analfabeto político” que Brecht falou, aquele que é o pior tipo de analfabeto por não entender e não aceitar que gente que eu admire faça esse tipo de coisas em prol da política.

Lula você nos disse uma vez e eu segui: não tenho medo de ser feliz, mas, por favor, não me faça ficar triste. Sua aliança é com o povo, não com quem lhe estupra, mas não mata.

Abraço companheiro. Orun Ayé!

3 Replies to “Orun Ayé – "O Velho Comunista se Aliançou"”

  1. Show de bola esse texto. Me identifiquei de cara, no meu caso aos 5 anos de idade fui comemorar a “bravura do povo de Fortaleza” que elegeu Maria Luiza a primeira mulher a governar uma capital e logo de esquerda contra tudo e contra todos. Ah, nem a Hebe vota mais no Maluf, ela virou tucana e como muitos de SP que tem nojo de pobre “vai com a cara de Dilma” por ela “não ser retirante nordestina e apedeuta”.

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