Excepcionalmente nesta quinta feira, a coluna “Made in USA”, do advogado Rafael Rafic, segue sua série de artigos sobre os Jogos Olímpicos fazendo um panorama do possível quadro de medalhas.
Uma Perspectiva para o Quadro de Medalhas
Ainda no tema dos jogos olímpicos, que não custa lembrar se iniciam dia 27 deste mês de julho (sendo que o futebol já joga dia 25), chegou a hora de debatermos prognósticos para o quadro de medalhas de Londres 2012.
Antes, também preciso dizer que estou considerando para meus comentários abaixo a classificação clássica do quadro de medalhas, ou seja, aquela que prega a supremacia absoluta do ouro. Uma medalha dourada vale mais que qualquer quantidade de medalhas de prata e cada medalha ganha representa uma medalha no quadro.
O COI não tem uma classificação oficial do quadro de medalhas, até porque isso vai contra o espírito olímpico. Toda essa história de quadro de medalhas, posição, metodologia de cálculo, etc. foi mais uma invenção da imprensa especializada para mensurar a participação dos países que “pegou” e foi adotada maciçamente. Inclusive há enormes debates sobre a metodologia clássica do quadro de medalhas e seus problemas, mas isso será assunto da próxima coluna (possivelmente a última antes dos jogos).
Para começar, a questão de sempre: quem irá liderar o quadro de medalhas?
Não há qualquer dúvida que apenas dois países podem disputar o topo: China e EUA. Os EUA estavam dominando tranquilamente o quadro (em qualquer tipo de metodologia) desde o fim da União Soviética. Porém a China, após um forte trabalho visando os jogos de Pequim 2008, deu um sufoco inesperado nos Estados Unidos em Atenas 2004 e, em casa quatro anos depois, deixaram os americanos para trás. Foram 51 ouros chineses contra “apenas” 36 americanos.
Esses números impressionantes estão levando os entendidos (e outros nem tanto) a assegurarem que a China continuará no topo do quadro em 2012.
Ouso discordar.
Explico: é conhecido o famoso efeito sede que eleva consideravelmente o número de medalhas, inclusive as de ouro, dos países que sediam os jogos. Além disso também incluo um “efeito pré-sede” que já aumenta um pouco o número de medalhas dos países que sediarão os próximos jogos – que alias deverão ser sentidos pelo Brasil em Londres.
Após o ‘efeito sede’, os países mantêm algum ganho, mas nunca nos mesmos patamares de quando recebeu os jogos. Atribuo muitas medalhas da China ao efeito sede e assim aposto que o país terá entre 36 e 40 ouros em Londres, a mesma marca que aposto para os EUA.
Acredito que será uma batalha muito acirrada entre os dois por toda a duração dos jogos, com a China sempre um pouco a frente. Mas os EUA devem ganhar dois ou três ouros nos esportes que encerram os jogos (basquete, vôlei e luta livre) para virar o placar.
Ressalte-se que o grande trunfo da China são os saltos ornamentais, no qual eles levaram 20 dos 24 ouros oferecidos em 2004 e 2008. Qualquer falha aqui pode ser fatal para os chineses. Enquanto isso os EUA tem uma gama bem mais diversificada de medalhas, o que lhes permite suportar algumas zebras.
Depois dos EUA, e agora a China, ficava a Rússia. Mas acredito que teremos mais um capítulo da decadência russa no Reino Unido.
Após perder as repúblicas que compunham a União Soviética, a Rússia ainda fez uma campanha bastante decente em Atlanta 1996 – com 26 ouros – e mostrou força em Sydney 2000 com 32 ouros. Porém, após isso a queda foi vertiginosa: 27 ouros em Atenas 2004 e 23 em 2008.
O esporte russo não vem passando por uma boa fase e sinceramente não aposto em mais do que os mesmos 23 ouros para a Rússia em 2012.
Sendo assim, as portas do terceiro lugar ficariam abertas para a Grã-Bretanha, que já teve um bom desempenho em 2008, impulsionado pelo efeito pré-sede pulando de nove para dezenove ouros. Aposto em 25 ou até 30 medalhas douradas para os bretões em casa.
Percebam que estou estimando para os primeiros colocados números muito altos de medalhas. Isso reflete uma tendência que começou em 2004, se acentuou em 2008 e tudo indica que continuará com força em 2012: a maior concentração de medalhas nos países do topo do quadro.
Para melhor ilustrar o fenômeno seguem números: em 2000 11 países ganharam dez ouros e 13, oito ouros. Em 2004 apenas 8 países ganharam dez ouros e 14, oito. Já em Pequim 2008 a queda foi vertiginosa: apenas sete países ganharam dez ouros e nove, oito ouros. O 14° colocado no quadro em Atenas ficou com oito ouros, em Pequim com apenas cinco.
Infelizmente eu acredito que a tendência continuará em Londres e não vejo mais do que seis países ganharem 10 ouros. A concentração, principalmente nos quatro primeiros só está aumentando.
Este fenômeno acaba influindo diretamente na posição brasileira no quadro de medalhas final.
Com o embalo do efeito pré-sede, como eu indiquei na coluna passada, espero que nosso país conquiste cinco ouros em Londres. Número igual ao de 2004, no qual ficamos em 16° lugar no quadro. Com esses mesmos cinco ouros, teríamos ficado em 15° em 2008. Como eu acredito que a concentração seja ainda maior esse ano, aposto em um honroso 13° lugar para nossa delegação, no que seria a melhor colocação de nossa história.
Essa posição não é melhor por causa do que eu chamo de países “brilharecos”. São aqueles que não tem a menor tradição esportiva mundial, trazem delegações pequenas, mas por serem muito bons em algum nicho que distribui muitas medalhas aparecem no quadro muito melhor do que realmente são.
Os grandes exemplares são Jamaica e Quênia que não fazem absolutamente nada além de terem, respectivamente, um timaço de atletismo de velocidade e um timaço de atletismo de fundo. Estes sozinhos lhes garantem quatro, cinco ou seis ouros (ambos ganharam seis ouros em 2008) e uma vaga ‘imerecida’ no top 20. Posso ainda citar como candidatíssima a brilhareco a Etiópia (atletismo de fundo).
[N.do.E.: há um caso ainda mais insólito em 2008, o do Zimbabwe. O país teve quatro medalhas, sendo uma de ouro, e todas com uma única atleta: a nadadora Kirsty Coventry (foto), que apenas nasceu no país mas vive nos EUA]
Dentro do continente americano, isso daria ao Brasil o segundo ou terceiro lugar. A dúvida fica por conta da grande interrogação: a participação de Cuba.
Cuba tem uma excelente rede de esportes estudantis que dão base para uma potência olímpica de dar inveja a qualquer país desenvolvido. Se levarmos em conta a penúria econômica pela qual a ilha passa, o feito é ainda mais memorável.
É verdade que a grande força de Cuba sempre foi o boxe, modalidade na qual o país consegue pelo menos três ou quatro ouros em todos os jogos. Porém diferente dos “brilharecos” eles também são muito respeitados em outros esportes, tais quais como atletismo, vôlei, luta greco-romana e judô. Isso sempre lhes rendeu em média 10 ouros por edição das Olimpíadas.
Porém ocorreu na delegação cubana em Pequim uma débâcle parecida com o que ocorreu com o Brasil em 2000: grandes nomes emperraram na prata constantemente. Cuba perdeu as quatro finais de boxe em que chegou, o fantástico time de baseball perdeu o ouro para a Coréia do Sul e o judô perdeu as três finais em que chegou. Só se salvaram Dayron Robles, que estava dominando os 100m com barreiras, e Mijain Lopez na luta greco-romana.
Resultado a linha de medalhas de cuba despencou de nove ouros em 2004 para apenas duas, em compensação o número de pratas catapultou-se para onze.
É fato que Cuba começa a sentir os efeitos de sua depressão econômica. O número de desertores só aumenta e são tão bons que não tenho a menor dúvida de que se Cuba deixasse a ideologia de lado e permitisse a esses desertores competirem, Cuba tinha 10 ou 15 ouros fáceis. Porém os desertores existem e não podem competir.
Também é fato que, apesar do trabalho de base ainda ser muito bom, cada vez mais Cuba tem dificuldades em manter seus atletas em grande nível, seja por causa da falta de intercâmbio (mania castrista), seja por falta de boas condições físicas e financeiras de treinamento.
Mas até que ponto isso se refletirá no quadro de medalhas cubano? 2008 começará a ser a tônica para o futuro, foi apenas uma má-sorte ou é algo entre os dois extremos? Sinceramente não sei o que responder ao leitor.
Cuba não brilha mais no boxe como brilhava antigamente. Que o diga o mundial amador do ano passado, quando eles voltaram com apenas dois ouros e uma prata e sequer foi a melhor delegação do evento – que foi a Ucrânia com quatro ouros. Ainda sim é uma boa equipe. Eles continuam (junto com o Brasil, frise-se) como uma das grandes potências do judô. Ainda tem bons lutadores greco-romanos.
Então, realmente apenas podemos esperar e ver o que essa delegação cubana irá fazer em Londres. Com os resultados em mão, já poderemos traçar uma tendência. Minha aposta é que lutaremos ouro a ouro com Cuba pelo segundo lugar das Américas, já que Cuba também deve rondar os cinco ouros.
Por fim, duas potências olímpicas que merecem ser olhadas são Austrália e França.
A Austrália fez muito bem seu dever de casa e impulsionada por um belo trabalho de base e de alto-rendimento, aliada ao efeito sede, conseguiu um honroso quarto lugar no quadro em 2000 e a condição de super-potência olímpica (junto com EUA, Rússia e China).
Porém, enquanto a China evoluiu bastante e a Russia ainda manteve o patamar de 20 ouros, a Austrália patinou em Pequim e “só” conseguiu 14 ouros, ficando atrás também da Grã-Bretanha e da Alemanha.
Como a Austrália passa uma pequena crise em sua grande fonte de ouros, a natação, espero outra queda no número de primeiros lugares australianos e o fim de qualquer resquício de “super-potência” olímpica, mas ainda sim continua sendo uma potência. Espero entre 8 e 10 ouros para a Austrália.
Já a França, além de passar por problemas políticos em seu comitê olímpico, ainda mais após a horrível campanha de Annecy para sede dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018, está vendo sua condição de potência olímpica se esvair.
Desde Atlanta 1996, os gauleses só descem a escada. Foram 15 ouros em 1996, 13 em 2000, 11 em 2004 e apenas sete em 2008. Diferentemente da projeção do USA Today (11 ouros), eu espero outra edição magra da França, na mesma balada do Brasil com cinco ou seis ouros. Talvez seja o grande país em crise no mundo olímpico. A propósito, grupo ao qual Cuba pode se juntar ao fim de Londres 2012.
Aguardemos.

One Reply to “Made in USA – "Jogos Olímpicos: Uma Perspectiva para o Quadro de Medalhas"”

  1. Seu comentário demonstra conhecimento dos jogos olímpicos. No entanto, acredito na vitória da China sobre os EUA>

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